Acórdão nº 01626/13 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 17-09-2014

Judgment Date17 September 2014
Acordao Number01626/13
Year2014
CourtSupreme Administrative Court (Portugal)
Acordam no Pleno da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:

1. A………., S.A., com os demais sinais dos autos, dirigiu ao Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, ao abrigo do disposto no nº 2 do art. 25º do Decreto-Lei nº 10/2011, de 20 de Janeiro (regime jurídico da arbitragem em matéria tributária), recurso da decisão arbitral proferida na sequência de pedido de pronúncia arbitral no processo nº 19/2013-T do CAAD, que teve por objecto a liquidação oficiosa de IMT que àquela foi notificada através do Ofício nº 4993, de 5 de Junho de 2012, do Serviço de Finanças de Valongo.

Invoca, para o efeito, a oposição dessa decisão com o acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 26 de Janeiro de 2005 (Pleno da Secção Tributária), prolatado no recurso nº 0798/04, e remata as respectivas alegações de recurso com o seguinte quadro conclusivo:

I. O presente recurso tem fundamento na oposição de julgados resultante da decisão arbitral proferida no processo nº 19/2013-T do CAAD e da qual se recorre, e o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 26 de Janeiro de 2005 (processo nº 0798/04).

II. A questão fundamental de direito que opõe a decisão arbitral ao Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo é a de saber se, tendo sido o imóvel comprado para revenda, a realização de obras de conclusão e acabamentos constitui um desvio do fim daquela revenda para efeitos do artigo 11º, nº 5 do Código do IMT.

III. Quanto a esta matéria existe oposição entre a decisão arbitral recorrida, nos termos da qual «a demolição de paredes interiores para adaptação ao projecto, a construção de novas divisões na cave (arrumos) com colocação de paredes, o fecho da caixa de escada da cave para o rés-do-chão, a colocação de uma baía de estacionamento no exterior, para além da colocação ou substituição de praticamente todos os elementos de acabamento de um prédio: tubagens; carpintaria, serralharia, marquises e janelas; pavimentos; louças sanitárias; quadros eléctricos, aparelhagem, enfiamento para iluminação e tomadas; reboco e pinturas, entre outros» implica que tenha sido dado destino diferente ao imóvel adquirido para revenda, nos termos do artigo 11º, nº 5 do Código do IMT.

IV. E o Acórdão do Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, proferido em 26 de janeiro de 2005, no processo nº 0798/04, nos termos do qual «não obsta à isenção o facto de o prédio não estar ainda totalmente construído: o que foi adquirido nº 2 do probatório foi um “lote de terreno com um prédio em construção, ainda em tosco, a ser acabado”».

V. Tal decisão alinha, aliás, e com inteira justeza, com o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 23 de Fevereiro de 2000, onde se considerou que «o destino diferente da revenda surge quando o adquirente afecta o imóvel a utilização própria, ou o transmite por forma diversa da venda».

VI. De facto, não se pode conceber que as obras ocorridas no imóvel em causa sejam idóneas a desviar o seu fim (ou seja, a revenda) quando:

a. O imóvel foi adquirido pela Recorrente, no âmbito da sua atividade, mantendo-se como mercadoria da empresa, nunca sendo qualificado como matéria-prima.

b. As obras ocorridas no imóvel destinavam-se à finalização do projeto de construção anteriormente aprovado, tendo em vista a sua revenda.

VII. A interpretação seguida pela Supremo Tribunal Administrativo é a que melhor reflete a letra e o espírito da lei, nem fazendo qualquer sentido que se discrimine os revendedores em face dos construtores que não pagam IMT pelos prédios que constroem.

VIII. Deverá, pois, ser anulada a decisão arbitral recorrida dado que com as obras efetuadas no imóvel em causa não ocorreu desvio do fim.

IX. E, em consequência, seguindo-se a jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo, ser anulada a liquidação de IMT em crise com a consequente restituição à Recorrente de todos os montantes indevidamente pagos acrescidos de juros indemnizatórios.


1.2. Notificado que foi o Excelentíssimo Procurador-Geral-Adjunto junto do STA nos termos e para os efeitos do art. 146º nº 1 do CPTA, nada disse ou requereu.
1.3. A Autoridade Tributária e Aduaneira apresentou contra-alegações que rematou com o seguinte quadro conclusivo:

I. Atento o facto de o recurso por oposição de julgados só ser de admitir quando, verificado idêntico quadro normativo e a mesma realidade factual, haja sido uma divergente interpretação a determinar a prolação de decisões contraditórias sobre a mesma questão fundamental de direito, subjacente às decisões proferidas na Decisão Arbitral e no Acórdão Fundamento em confronto, não existe a mencionada identidade de facto, se bem que haja a mesma identidade legislativa.

II. O que confirma a não verificação, na situação sub judice, dos pressupostos do recurso por oposição de julgados.

III. Assim, face ao exposto, não deverá, em conformidade, o recurso ser admitido.

IV. Sem prescindir, a ser admitido o recurso, deverá ser o mesmo declarado improcedente, mantendo-se a decisão recorrida, porquanto a mesma afigura-se totalmente fundamentada e não padece de qualquer erro de julgamento, seguindo a orientação quer da doutrina, quer da jurisprudência (inclusive a citada pela Recorrente, como acórdão fundamento).

V. Sendo a principal questão suscitada uma questão de facto e tendo o douto tribunal arbitral considerado que dos factos dados como provados e dos factos dados como não provados resultou assente que as obras levadas a cabo pela recorrente consubstanciaram uma alteração substancial do edifício, é manifesto o bem fundado da decisão recorrida.


1.4. Colhidos os vistos dos Excelentíssimos Conselheiros Adjuntos, cumpre apreciar em conferência no Pleno da Secção.

2. Na decisão arbitral recorrida julgaram-se como provados os seguintes factos:

1. Em 13 de Maio de 2004, o Tribunal Judicial de Valongo, no âmbito do processo de execução ordinária n.º 1119/2001, adjudicou a B………. um imóvel sito na Rua …….., ……….., freguesia de ……….., descrito na Conservatória de Registo Predial de Valongo sob o nº 2315/19901108 e inscrito na matriz sob o artigo 9357;

2. No referido imóvel tinha estado implantado um edifício que à data da referida adjudicação (2004) já havia sido demolido e ao qual havia correspondido o artigo matricial 7023, entretanto eliminado e substituído em 2001 pelo artigo matricial 9357;

3. Da declaração para inscrição de prédio na matriz relativa ao artigo matricial 9357 consta a seguinte descrição sumária dos elementos do prédio: “parcela de terreno destinada à construção - onde se encontra em construção um prédio com área de construção de 2.026,30 m2 com 04 pisos, sendo 03 acima da cota de soleira e 01 abaixo da mesma cota com 12 fogos destinados à habitação”, sendo que na ficha da Conservatória do Registo Predial de … a descrição do prédio em causa era a seguinte: “Terreno e nele em construção edifício de cave, rés-do-chão e 2 andares - Coberta: 506,5 m2; - Descoberta: 190,5 m2”, com o valor tributável de 132.281,19 Euros;

4. Em 18 de Julho de 2005, o então proprietário, …, em virtude de a mencionada construção do edifício ter sido interrompida e ter ocorrido a caducidade da correspondente licença camarária, solicitou nova licença – “Licença Especial para Conclusão de Obras” – junto da Câmara Municipal de …, com fundamento no facto de o “edifício se encontrar de momento em estado de degradação, e necessitar de obras de recuperação para que seja possível pedir as vistorias e a respectiva licença de utilização”;

5. Em 6 de Setembro de 2005, a Câmara Municipal de … emitiu o “Alvará de Obras de Construção Especial para Conclusão de Obras Inacabadas N.º …/2005”, segundo o qual: “As obras aprovadas por Despacho, do Exmº. Sr. Vereador, de 12 de Agosto de 2005, respeitam o disposto no Plano Director Municipal e apresenta as seguintes características: “AMPLIAÇÃO E REMODELAÇÃO DE EDIFÍCIO MULTIFAMILIAR PRAZO DE VALIDADE DO ALVARÁ: Inicio: 06/09/2005. Termo: 05/09/2006.”;

6. Estas obras foram iniciadas no final de 2005 e consubstanciaram-se nas seguintes intervenções:

- limpeza geral ao edifício;
- verificação geral do estado de conservação do edifício, nomeadamente das redes de infra-estruturas: água, saneamento, águas pluviais, electricidade, telefone e gás, incluindo ensaios de funcionamento de todas as tubagens;
- eliminação das infiltrações de águas no telhado e no terraço de cobertura, com aplicação de chapas termolacadas e isolamento térmico e acústico em lã de rocha sobre a cobertura inclinada, reparação e substituição de caleiras e rufos onde necessário e impermeabilização de terraços e coberturas planas com telas de P.V.C.;
- remoção de vãos exteriores e interiores para posterior substituição e dos madeiramentos que se encontram bichados e deteriorados e levantamento das louças sanitárias;
- demolição de paredes interiores para adaptação ao projecto aprovado e remoção dos pavimentos dos quartos de banho e varandas;
- construção na cave de divisões/compartimentos de arrumos individuais com cerca de 2 m2 para cada uma das fracções autónomas, incluindo a pavimentação da cave e a colocação de paredes (alvenaria);
- vazado e acabamento a reboco areado;
- fecho da caixa de escada da cave para o rés-do-chão;
- colocação de material cerâmico nos pavimentos dos quartos de banho e de tijoleira nas varandas exteriores;
- execução da iluminação da garagem e enfiamento para iluminação e tomadas;
- limpeza e reparação de paredes interiores e pintura a tinta plástica;
- colocação das esquadrias exteriores das marquises e da restante serralharia e colocação de janelas;
- picagem de revestimentos exteriores e tratamento de fissuras onde necessário e revestimento das fachadas com reboco delgado armado do tipo “viero”;
- colocação de todas as carpintarias em falta e reparação dos móveis de cozinha;
- acabamento do terraço...

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