Acórdão nº 01510/13 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 02-04-2014

Data de Julgamento02 Abril 2014
Número Acordão01510/13
Ano2014
ÓrgãoSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)
Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:

RELATÓRIO
1.1. A…………, Lda., com os demais sinais dos autos, recorre da sentença que, proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, julgou improcedente a impugnação judicial deduzida contra as liquidações adicionais de IVA relativas aos anos de 2004, 2005 e 2006 e extinta a instância relativamente às liquidações de IVA do ano de 2003, por inutilidade superveniente da lide.

1.2. Termina as alegações formulando as conclusões seguintes:
A. O procedimento de liquidação adicional de IVA subjacente aos presentes autos encontra-se ferido de ilegalidade, por ter subjacente o recurso a métodos de avaliação indireta da matéria tributável;
B. Sem que tenha sido dado cumprimento ao procedimento constante do art. 87.º nº 1, e 90.º, nº 1, da LGT, aplicáveis ex vi do disposto nos arts. 87.º, nº 1 e 90.º, nº 1, do CIVA;
C. Nos presentes autos não estão em causa meras “correções técnicas”, que conferissem legitimidade à AT de proceder a uma avaliação direta, da matéria tributável, enquanto expressão quantitativa do facto tributário;
D. Na medida em que, conforme assumidamente resulta dos autos, verificou-se o recurso a um conjunto de indícios, perfeitamente alheios à contabilidade ou escrita da impugnante, que foram determinantes na fixação do respetivo quantitativo;
E. Que se traduziram em meras declarações apostas por agentes da Administração Tributária, apostas em relatórios elaborados no âmbito de procedimentos de inspeção tributária;
F. Os quais de modo algum podem ser considerados como estando abrangidos pela regras de incidência em sede de IVA, designadamente para efeitos de aplicação da exclusão constante do art. 19.º, nº 3, do CIVA.;
G. De onde resulta que a determinação da matéria tributável nos autos em presença teve subjacente o recurso a métodos de avaliação indireta, sem que tenham sido observadas as correspondentes regras procedimentais aplicáveis;
H. Normas violadas: art. 87.º nº 1, e 90.º, nº 1, da LGT, e arts. 87.º, nº 1 e 90.º, nº 1, do CIVA
Termina pedindo a procedência do recurso.

1.3. Não foram apresentadas contra-alegações.

1.4. O MP emite parecer nos termos seguintes, além do mais:
«A…………, Lda recorre da douta sentença do TAF do Porto de 28.03.2013, proferida no processo n.º 2359/08.2BEPRT que julgou extinta a instância, “relativamente às liquidações de IVA do ano de 2003, por inutilidade superveniente da lide” e “improcedente a impugnação de IVA dos anos de 2004, 2005 e 2006, por não provada”.
Nas Conclusões da sua Alegação, que definem e delimitam o objecto do recurso, sustenta a recorrente, no essencial, que:
- «O procedimento de liquidação adicional de IVA subjacente aos presentes autos encontra-se ferido de ilegalidade, por ter subjacente o recurso a métodos de avaliação indirecta da matéria tributável» – Conclusão A;
- «Sem que tenha sido dado cumprimento ao procedimento constante do art. 87.º, n.º 1, e 90.º, n.º 1, da LGT, aplicáveis ex vi do disposto nos arts. 87.º, n.º 1 e 90.º, n.º 1, do CIVA» – Conclusão B;
- «Nos presentes autos não estão em causa meras “correcções técnicas”, que conferissem legitimidade à AT de proceder a uma avaliação direta, da matéria tributável, enquanto expressão quantitativa do facto tributário» – Conclusão C;
- «Na medida em que, conforme assumidamente resulta dos autos, verificou-se o recurso a um conjunto de indícios, perfeitamente alheios à contabilidade ou escrita da impugnante, que foram determinantes na fixação do respectivo quantitativo – Conclusão D.
Vejamos:
Como flui da sentença recorrida, a liquidação adicional de IVA em crise assentou no juízo formulado pela A.T. quanto à indevida dedução pela impugnante, ora recorrente, do IVA que lhe foi liquidado em facturas emitidas pelas firmas identificadas no ponto I.1.1 do relatório de inspecção tributária (alínea c) do probatório), por não corresponderem a operações económicas reais realizadas, sendo as mesmas falsas ou simuladas.
Tal liquidação teve ainda por fundamento «o IVA indevidamente deduzido em resultado da contabilização de duas notas de crédito emitidas pela A………… no ano de 2006, em nome do adquirente B…………, Lda, por ter sido considerado não corresponder a qualquer devolução efectiva de mercadorias (...)» – cfr. fls. 208.
E, de facto, como prescrevia o art. 19.º, n.º 3 do CIVA, na redacção vigente à data dos factos, “não pode deduzir-se imposto que resulte de operação simulada ou em que seja simulado o preço constante da factura ou documento equivalente”.
Não podia, pois, a AF deixar de liquidar adicionalmente o IVA indevidamente deduzido.
Alega a ora recorrente que na sentença se verifica «um claro e inequívoco equívoco entre o conceito de “avaliação indirecta” e o conceito de “correcção técnica”, que a Administração Tributária apelida de “correcções meramente aritméticas”, em sede de IVA». Daí que sustente, nas Conclusões da sua Alegação de recurso, que nos autos não estão em causa meras “correcções técnicas”, que conferissem legitimidade à AT de proceder a uma avaliação directa, da matéria tributável, antes se está em presença de um procedimento de liquidação adicional que teve subjacente o recurso a métodos de avaliação indirecta, sem que tenham sido observadas as regras procedimentais aplicáveis – no caso os arts. 87.º, n.º 1 e 90.º, n.º 1, ambos da LGT.
Porém, salvo melhor entendimento, é a ora recorrente que labora num claro equívoco quando, reconhecendo embora que os indícios angariados pela AT a legitimavam a recorrer a um procedimento de liquidação oficiosa, acaba por sustentar que tal só podia configurar uma avaliação indirecta, afastando a possibilidade de num tal contexto poderem ser efectuadas “correcções técnicas” ou “meramente aritméticas”.
Com efeito, como referem Diogo Leite de Campos, Benjamim Silva Rodrigues e Jorge Lopes de Sousa in “Lei Geral Tributária, comentada e anotada”, 1999, pág. 299, «(a) avaliação indirecta é subsidiário da avaliação directa e, por isso, apenas se procede àquela quando em casos em que não seja viável determinar a matéria tributável através de avaliação directa (art. 85.º, n.º 1 da LGT)».
A AT, podendo rectificar, nos termos do disposto no art. 87.º, nº 1 do CIVA, as declarações dos sujeitos passivos e efectuar as correspondentes liquidações adicionais quando fundamentadamente considere que nelas figura um imposto inferior ou uma dedução superior à devida, apenas recorrerá aos métodos indirectos quando não seja possível quantificar a matéria tributável por métodos directos,
No caso em apreço, não obstante a AT tenha verificado e demonstrado, através da acção inspectiva que desenvolveu, que as facturas em causa, contabilizadas como “aquisições de mercadorias”, não titulavam operações reais, que as compras contabilizadas e declaradas pela ora recorrente concernentes a essas facturas constituíam operações simuladas, nada a obrigava a proceder à fixação da matéria tributável através de métodos de avaliação indirecta pois que não se estava em presença de uma situação em que os elementos existentes não possibilitassem o seu apuramento por avaliação directa, bastando-lhe para o efeito atender ao montante global do imposto a desconsiderar, deduzido com base naquelas facturas e a partir daí proceder à liquidação do imposto devido. A matéria tributável era, pois, perfeitamente quantificável e, como tal, susceptível de mera correcção técnica, como no caso ocorreu.
Aliás, como se assinala no douto Acórdão deste Supremo Tribunal de 12.10.2011, in Rec. n.º 0524/11, em casos como o dos autos as «(...)“correcções técnicas” ou “meramente aritméticas” aos valores das deduções de IVA (...), são legalmente impostas em razão da inadmissibilidade de dedução do IVA resultante de operações simuladas (artigo 19.º n.º 3 do (IVA) (...)».
Sendo manifesto, salvo melhor entendimento, que a matéria tributável em sede de IVA não foi nem tinha que ser determinada com recurso a métodos de avaliação indirecta, não procederá a pretendida ilegalidade do procedimento de liquidação adicional do IVA subjacente aos presentes autos nem, consequentemente, a invocada violação dos arts. 87.º, n.º 1 e 90.º, n.º 1, ambos da LGT e arts. 87.º, n.º 1 e 90.º, n.º 1 do CIVA.
Nesta conformidade, sem mais delongas, pronuncio-me no sentido da total improcedência do presente recurso e pela consequente manutenção do julgado.»

1.5. Corridos os vistos legais, cabe decidir.

FUNDAMENTOS
2. Na sentença recorrida julgaram-se provados e não provados os factos seguintes:
a) A agora impugnante – “A…………, Lda” exerceu a actividade de comércio por grosso de sucatas, e foi objecto de uma acção inspectiva de âmbito parcial em IVA e IRC dos anos de 2003, 2004. 2005 e 2006, que decorreu entre 21.11.2007 e 25.03.2008;
b) A impugnante cessou a sua actividade para efeito de IVA em 31.12.2007;
c) Na sequência da acção de fiscalização, referida na alínea anterior foi elaborado relatório de inspecção tributária, que consta do Processo Administrativo, em apenso, e onde se referiu que:
I – Conclusões da acção inspectiva
I. 1. Correcções aritméticas em termos de imposto sobre o valor acrescentado
I. 1. 1. IVA considerado indevidamente deduzido, por força do nº 3 do artigo 19º do Código do IVA, em resultado da contabilização de facturas de “aquisições de mercadorias” que não têm subjacente qualquer relação comercial com os emitentes identificados nessas mesmas facturas, conforme discriminação seguinte:

FORNECEDOR
NIPC
IVA indevidamente deduzido
2003
2004
2005
2006
J……… ……
155.542,04
M……, Lda ……
45.526,27
O……, Lda ……
337.835,52
171.419,54
13.304,56
I…… , Lda ……
152.650,82
653.158,44
Q……, Lda ……
13.877,17
381.495,41
U……, Lda ……
22.767,42
2.163,50
Y…… ……
40.525,02
T…… ……
42.736,39
Z……, Lda ……
10.185,33
R…… ……
110.745,20
AA…, Lda ……
449.716,40
AB……, Lda ……
140.981,86
AC…, Lda ……
529.243,40
TOTAL
538.903,83
454.161,69
1.047.958,41
1.232.8...

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