Acórdão nº 01443/13 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 12-02-2015

Data de Julgamento12 Fevereiro 2015
Número Acordão01443/13
Ano2015
ÓrgãoSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)
RECURSO JURISDICIONAL
DECISÃO RECORRIDA – Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto
. de 21 Março de 2013.
Julgou procedente a impugnação judicial e, em consequência, determinou a anulação parcial das liquidações do IRC dos anos de 2005, 2006 e 2007, e a substituição por outras onde não sejam consideradas as correções efetuadas, em função da cisão fusão, e considerados os encargos financeiros, em conformidade com a fundamentação supra.
Acordam nesta Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo

A Representante da Fazenda Pública, veio interpor o presente recurso da sentença supra mencionada, proferida no processo de impugnação nº 656/09.9 BEAVR instaurado por A…………, S.A., quanto às liquidações adicionais de IRC, dos anos de 2005, 2006 e 2007 no valor de € 1 015 461,69 e respectivas liquidações de juros compensatórios, tendo, para esse efeito formulado, a final da sua alegação, as seguintes conclusões:

1. O regime da neutralidade fiscal apenas pode ser aplicado nos casos taxativamente previstos no artigo 67.º e seguintes do CIRC.

2. A todas as situações não enquadráveis na neutralidade fiscal aplica-se o regime geral de tributação.

3. No caso cm apreço, o requisito da atribuição aos seus sócios de partes representativas do capital social das sociedades não foi respeitado.

4. A lei impõe expressamente a atribuição recíproca de participações sociais.

5. A fusão e a cisão são negócios jurídicos com carácter sinalagmático, pelo que pressupõem a existência de obrigações recíprocas, ou seja, emergem de uma relação de troca entre ambas as partes.

6. A tese defendida pela sentença recorrida apenas poderá valer nos casos em a sociedade cindida é detida a 100% pela beneficiária da operação de cisão-fusão.

7. No caso em apreço, a sociedade B…………, SA não era detida a 100% pela Impugnante. Além disso, a sociedade C………… foi criada propositadamente para receber as participações sociais da B…………, SA e de D………….

8. A Impugnante não detinha a sociedade B…………, SA a 100% e nunca deteve directamente qualquer participação na sociedade C………….

9. De acordo com o artigo 67.º do CIRC, para que uma fusão beneficie do regime da neutralidade, é necessário que verifiquem duas situações: transferência do património de uma ou mais sociedades (sociedades fundidas) para outra sociedade já existente (sociedade beneficiária) e a atribuição aos sócios das sociedades fundidas de partes representativas do capital social da sociedade beneficiária.

10. O segundo momento, ou seja, a atribuição aos sócios de partes representativas do capital social da outra sociedade, apenas não será exigido nos casos em que uma sociedade detém a outra sociedade em 100%.

11. No caso concreto a sociedade beneficiária nunca teve qualquer participação no capital da sociedade cindida. A sociedade C………… não teve, nem nunca teve qualquer participação social da impugnante, sociedade A………… SGPS.

12. No caso em apreço, entendemos que, salvo melhor entendimento, o regime da neutralidade fiscal nunca poderia ser aplicado.

Requereu a revogação da sentença recorrida, substituindo-a por outra que julgue a impugnação totalmente improcedente.

A recorrida, A…………, S.A., considerando que deve ser integralmente mantida a sentença recorrida, apresentou contra-alegações que culminam com as seguintes conclusões:

A. A atribuição de acções da sociedade incorporante aos sócios da sociedade cindida tem, nas operações de cisão e fusão, uma função essencialmente garantística, visando assegurar aos sócios das sociedades fundidas ou cindidas a manutenção do valor do seu património na sequência da extinção ou do destaque patrimonial por estas sofrido. Ou seja, os sócios têm direito, para efeitos de estabelecimento de uma relação de troca justa e razoável, a receber da sociedade incorporante aquilo que perdem na sociedade cindida.

B. Portanto, tal pressuposto serve um propósito próprio do direito das sociedades, e não do regime da neutralidade fiscal das operações de reorganização empresarial. Neste sentido, apenas é legítima uma interpretação do regime de neutralidade que, nunca perdendo de vista a sua teleologia, assume a conclusão evidente de que a não verificação de um elemento da hipótese normativa que se encontra ao serviço de um interesse externo àquele regime não preclude, naturalmente, a aplicação do mesmo.

C. É que, aliás, por outro lado, a atribuição de acções da sociedade incorporante aos accionistas da sociedade contribuidora de nada serve quando justamente não estão em causa os interesses que a justificam - quando não é necessário, não é útil ou é impossível (por lei ou por natureza) estabelecer qualquer razão de troca.

D. Uma situação deste tipo verifica-se quando a razão de troca se afigura inútil em virtude de ser o mesmo o (único) sócio da sociedade contribuidora e da sociedade incorporante ou beneficiária (é o que acontece no caso subjacente ao Acórdão do Pleno deste Tribunal proferido no âmbito do recurso n.º 0865/11, citado e seguido de perto pela Sentença recorrida).

E. Ora, não sendo uma situação exactamente igual à do Acórdão do recurso n.º 0865/11, a verdade é que também na situação dos presentes autos não só se encontram verificados todos os requisitos específicos do regime da neutralidade das operações de reestruturação societária como a atribuição de acções da sociedade beneficiária aos accionistas da cindida é um requisito cuja verificação, para além de não essencial à aplicação daquele regime, não é sequer necessária, tendo em conta a conformação concreta da operação.

F. É verdade que, à primeira vista, estamos perante uma situação que suscita a necessidade de se assegurar a justiça e razoabilidade na relação de troca através da atribuição de acções da sociedade incorporante aos accionistas da sociedade contribuidora: existia uma pluralidade de sócios (dois) – a A………… SGPS e D………… –, que participavam no capital da sociedade cindida – a B………… – em percentagens distintas – 60% e 40%, respectivamente. No entanto, em bom rigor, essa necessidade não se verifica verdadeiramente.

G. Desde logo, quanto à accionista A………… SGPS, jamais esta poderia emitir acções em favor dela própria, por causa da expressa interdição legal do nº 3 do artigo 104º do CSC (entrave que visa evitar uma “duplicação fictícia do património da sociedade incorporante” ou obstar a uma emissão inútil de acções próprias).

H. Por outro lado, quanto à accionista D…………, convém sublinhar que, no caso dos autos, tal como resulta da factualidade dada como provada, se estabeleceu uma relação de troca global que atendeu aos efeitos combinados de duas cisões unificadas num só projecto, tendo cada um dos accionistas da Recorrente ficado na mesma situação em que estaria na eventualidade de se terem autonomizado formalmente as operações. Se ficcionássemos que somente a primeira cisão havia ocorrido, jamais D………… aceitaria não receber acções da Impugnante, porque estaria a perder património sem qualquer contrapartida. Todavia, no contexto em que se insere a primeira cisão-fusão (da B………… na A………… SGPS), que se caracteriza pela realização simultânea de uma cisão da própria incorporante de valor muito superior à primeira, essa atribuição de acções não só perde todo o sentido e utilidade como não cobra qualquer relevo na perspectiva do diferimento de eventuais mais-valias potenciais das partes detidas por D………… no capital da B………….

I. Ou seja, uma vez que aquela accionista detinha uma participação directa de 40% na B…………, teria direito a receber em acções da A………… SGPS o valor correspondente, mas essa emissão de capital seria sempre momentânea, posto que a reorganização culminaria sempre na extinção de participações de D………… no capital desta última, com a contrapartida de a SGPS por si detida, a C………… SGPS, receber as participações não industriais do Grupo (E…………, F………… e B…………).

J. Portanto, em resumo, a atribuição de acções de nada serviria e em nada alteraria a situação fiscal das sociedades cm causa e de D…………, quer porque as mesmas seriam extintas aquando da consequente cisão da A………… SGPS, quer porque os resultados fiscais subsequentes a apurar por D………… na venda de acções da C………… SGPS em nada se alterariam com tal atribuição.

K. A exigência da atribuição de acções no caso vertente é, portanto, contrária à lei: a (primeira) cisão só não desencadeou uma emissão de acções imediata porque a mesma seria proibida numa parte e inútil noutra, mas pode bem dizer-se que desencadeou uma emissão de acções mediata – a da C………… SGPS –, estabelecida com base numa relação de troca comum e cujo valor foi influenciado positivamente pela circunstância de D………… nada ter recebido em razão da incorporação das acções G………… na A………… SGPS.

L. De qualquer modo, apesar de a matéria controvertida no presente recurso se cingir à questão de saber se, em abstracto e em concreto, a atribuição de acções da sociedade incorporante aos sócios da sociedade contribuidora constitui ou não um requisito de verificação necessária à legalidade da aplicação do regime da neutralidade fiscal das reorganizações empresariais, a verdade é que, mesmo que a AT tivesse razão nesse debate, sempre as liquidações impugnadas seriam ilegais em virtude das consequências totalmente absurdas que foram retiradas quanto à qualificação do facto patrimonial em causa e ao apuramento do quantum da matéria tributável: ao contrário do que a AT defende, não existiu na situação em apreço qualquer variação patrimonial positiva gratuita.

Foi emitido parecer pelo Magistrado do Ministério Público no sentido da confirmação da sentença recorrida.

A recorrida considerou provados os seguintes factos:

1. Os Serviços de Inspeção Tributária efetuaram uma ação de fiscalização à Impugnante, tendo sido concluída em 12.06.2009. (fls.4 a 20 do P.A.);

2. Através do ofício nº 8406148, datado de...

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