Acórdão nº 0144/05 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 29-03-2006

Data de Julgamento29 Março 2006
Número Acordão0144/05
Ano2006
ÓrgãoSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)
Acordam, na Secção do Contencioso Administrativo, do Supremo Tribunal Administrativo:

1. A..., inspector tributário, melhor identificado nos autos, interpôs no Tribunal Central Administrativo (TCA) recurso contencioso do despacho, de 9.5.03, do Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais (SEAF), que indeferiu o recurso hierárquico do despacho, de 29.10.02, do Director Geral dos Impostos, pelo qual foi imposta aquele funcionário a pena disciplinar de multa, no valor de € 250,00.
A fundamentar o recurso contencioso, o recorrente invocou a existência de prescrição do procedimento disciplinar, violação do direito de audiência do arguido, falta de fundamentação do acto punitivo impugnado, erro nos respectivos pressupostos de facto e de direito, e violação dos princípios da participação dos cidadãos nas decisões da Administração, da proporcionalidade e “in dubio pro reo”.
Por acórdão de fl. 149 a 160, dos autos, o TCA decidiu conceder provimento ao recurso contencioso, anulando o acto impugnado, com fundamento na existência das invocadas prescrição do procedimento disciplinar e nulidade, por falta de audiência.
Inconformado com essa decisão, dela veio interpor recurso o SEAF, tendo apresentado alegação (fls. 218 a 224), com as seguintes conclusões:
1. O douto acórdão recorrido padece de erro na apreciação da matéria de facto.
2. A decisão de instauração de procedimento disciplinar a A... está consubstanciada no despacho do Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, de 18 de Outubro de 2001.
3. Foi esse despacho do Secretário de Estado que interrompeu o prazo de prescrição fixado no nº 2 do artigo 4° do ED.
4. Ou seja, contrariamente ao entendido na decisão judicial recorrida, não é a data de 20-12-2001, mas antes a de 18-10-2001, a relevante para efeitos de interrupção da prescrição do procedimento disciplinar (artigo 4° do ED).
5. Acresce que, contrariamente ao referido no Acórdão recorrido, o prazo previsto no nº 2 do artigo 4° do ED, no caso em apreço, só se começa a contar em 24-9-2001.
6. De onde decorre que o Acórdão recorrido decidiu mal pois que não se verificou a prescrição do procedimento disciplinar.
7. O douto acórdão recorrido padece de erro na apreciação da matéria de direito, pois que foram respeitados os direitos de defesa e de audiência do arguido.
8. O douto acórdão recorrido faz uma interpretação incorrecta quer do nº 1 do artigo 42°, quer do nº 4 do artigo 59° do ED.
9. Não deve o Douto Acórdão recorrido ser mantido, pois que procede a uma incorrecta interpretação e aplicação da lei aos factos.
Termos em que, e com o douto suprimento de V. Ex.as., deve o presente Recurso Jurisdicional ser julgado procedente, com todas as consequências legais.
O recorrido apresentou contra-alegação (fl. 181 a 185, dos autos), com as seguintes conclusões:
a) sem prejuízo dos demais vícios que foram invocados, ao conhecer dos dois vícios objecto do presente recurso, o Acórdão recorrido fez uma correcta e cabal integração do direito aplicável aos factos revelados nos autos,
b) não tendo o Acórdão violado qualquer preceito legal ou efectuado uma errada apreciação dos factos apurados.
Termos em que, com o douto suprimento de Vossas Excelências, deve o presente recurso ser julgado improcedente por não provado, confirmando-se o Acórdão recorrido, com as legais consequências, por ser de
JUSTIÇA!
Neste Supremo Tribunal, o Ex.mo Magistrado do Ministério Público emitiu, a fls. 191/192, dos autos, o seguinte parecer:
Vem o presente recurso jurisdicional interposto do acórdão do TCA que anulou o acto contenciosamente recorrido com fundamento em prescrição do procedimento disciplinar e em falta de audiência.
Tal como defende a entidade recorrente, parece-nos que o acórdão recorrido errou ao considerar prescrito o procedimento disciplinar.
A decisão de instaurar procedimento disciplinar foi proferida pelo Senhor Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, no exercício de poderes delegados, e, consta do despacho dessa entidade de 2001.10.18 (de fls. 91 a 102 do processo instrutor) – cf., especialmente, fls. 101 deste processo.
É a esta data que, a nosso ver, se deverá atender, para efeitos de instauração do procedimento disciplinar.
O despacho do Senhor Director-Geral dos Impostos de 2001.12.20, no que concerne ao recorrente contencioso, apenas deu cumprimento à decisão contida nesse acto do Senhor Secretário de Estado, designando para a instrução do processo disciplinar a técnica jurista principal Dr.ª ....
Assim, ainda que se considere como início do prazo prescricional a data de 2001.08.23 – defendida como tal pelo acórdão e contestada pela entidade recorrente – não foi excedido o prazo de três meses a que alude o art.º 4°, n° 2, do ED.
Vejamos, agora, se ocorreu falta de audiência do arguido, tal como entendeu o acórdão recorrido.
Parece-nos que o acto punitivo se deverá manter anulado pelas razões apontadas pelo acórdão no tocante a esta parte.
Não contém a acusação uma indicação dos factos concretos que integram as infracções imputadas ao arguido e das circunstâncias em que ocorreram.
Da acusação não consta em que circunstâncias permitiram o arguido a entrega de soluções dos testes aos candidatos, bem como a troca de informações e soluções das provas: se o presenciou e nada fez que obstasse a tal, ou, se o não presenciou por se ter ausentado dos locais em causa, onde devia estar presente no exercício de funções de que havia sido incumbido.
A própria acusação refere (no artigo 3°) que ao arguido incumbia, além das funções de vigilância nos corredores, o apoio às salas onde estavam a decorrer as provas. Ora, se as funções do arguido estavam repartidas entre os corredores e as salas será sempre possível inferir que o arguido se encontrava no exercício das suas funções noutro local que não aquele, ou aqueles, onde ocorreram aqueles factos.
Em suma, parece-nos que ocorreu vício de falta de audiência do arguido em artigos de acusação tal como entendeu o acórdão impugnado, devendo, por essa via, manter-se a anulação do acto contenciosamente recorrido.
Em razão do exposto, emitimos parecer no sentido de que deverá ser negado provimento ao recurso jurisdicional, embora por razões não totalmente coincidentes com aquelas em que o acórdão recorrido se fundou.
Colhidos os vistos legais, vêm os autos à conferência.
Cumpre decidir.
2. A sentença recorrida baseou-se na seguinte matéria de facto:
1 - Por despacho do Ministro das Finanças de 30/1/01 foi instaurado processo de inquérito ao aqui recorrente, que deu origem ao Processo de inquérito n° 2001/12/58/C1/322.
2 - Em 19/7/01 foi elaborado o Relatório Final 993/CRT/2001 do referido Inquérito junto de fls. 5 a 70 do V. I do instrutor e aqui dado por rep.
3- Por despacho n° 39, de 23/8/01, o SEAF solicitou ao DGI que se pronunciasse e tomasse posição sobre cada uma das conclusões e propostas constantes e formuladas nos pontos 5 e 6 do relatório 993/CRT/2001 elaborado pela IGF no âmbito do inquérito n° 2001/12/58/C1/322 (fls. 79 e 80 do p. a.).
4- Em 3/9/01 o Director Geral emite parecer junto de fls. 80 a 90 do p.a. aqui dado por rep.
5- Em 24/9/01 o SEAF profere sobre aquele relatório o seguinte despacho: " Visto com apreço o trabalho desenvolvido pelo EGF no presente inquérito."
6- Em 20/12/01 é nomeada instrutora de processo disciplinar contra o aqui recorrente a Dr.ª ....
7- Em...

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