Acórdão nº 01368/23.6BEBRG de Tribunal Central Administrativo Norte, 08-02-2024

Data de Julgamento08 Fevereiro 2024
Ano2024
Número Acordão01368/23.6BEBRG
ÓrgãoTribunal Central Administrativo Norte - (TAF de Braga)
Acordam em conferência os Juízes da Subsecção de execução fiscal e de recursos contraordenacionais da Secção do Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:


1. RELATÓRIO
1.1. «AA», devidamente identificado nos autos, vem recorrer da sentença proferida em 24.09.2023 no Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, pela qual foi julgada parcialmente improcedente a reclamação contra o ato de penhora de saldo de conta bancária, praticado pelo Serviço de Finanças ..., no âmbito dos processos executivos nº ...35, ...10, ...67 e apensos (..............858, ...98, ...46, ...45, ...88, ...40, ...60, ...29, ..............858, ...75, ...99, ...34, ...00, ...68, ...42), ...96, ...11 e ...81.
1.2. O Recorrente terminou as suas alegações formulando as seguintes conclusões:
«I. A reclamação efetuada funda-se na lesão ilegal de direitos do reclamante após a realização de uma penhora sobre o saldo das contas bancárias de que é titular, tendo a mesma sido efetuada sem o que reclamante tenha sido notificado para exercer o seu direito de defesa.
II. A devedora originária nunca foi notificada do despacho para audição e apresentação de defesa, nem da aplicação das coimas, pugnando ainda pela prescrição das dívidas e extinção dos processos à ordem dos quais foi demandada a penhora.
III. Para se aferir da legalidade do ato de penhora, importa saber se a dívida é devida, pelo que urge perscrutar todas as fases que culminaram na Reclamação em apreço.
IV. Não se pode aceitar que o devedor subsidiário não se possa insurgir contra a lesão dos seus direitos, quando esta lesão ocorreu por inércia da Administração Tributária, nomeadamente, antes de operar o instituto da reversão fiscal.
V. Se a prescrição ocorre, por hipótese, em momento anterior à penhora, constitui-se fundamento bastante para a anulação desse ato, pelo que a penhora apenas poderá ser feita pelo montante, em princípio, devido.
VI. Sem a apreciação dos fundamentos invocados, não é possível avaliar a licitude da penhora ao devedor subsidiário, aqui Recorrente, pelo que este pugnou pela procedência da sua reclamação e, em consequência, pela declaração da ilegalidade do ato de reversão, pela prescrição dos processos executivos, pela anulação do ato de penhora e, em consequência, pela extinção dos presentes processos de execução.
VII. A agressividade do ato de reversão exige a verificação de cautelas por parte da Administração Tributária, já que aquele visa a cobrança de dívidas a um particular que não é o devedor primário.
VIII. O recorrente apontou as falhas nas notificações direcionadas à devedora originária, no seguimento das quais foram originadas decisões que, também pela ausência de comunicação, não foram, no momento oportuno, postas em crise.
IX. A reclamação dos atos do órgão da execução fiscal é o meio adequado para a defesa de direitos e interesses legítimos quando o ato decisório produza efeitos irrecuperáveis, e por isso, não se pode considerar a enumeração do artigo 278º, nº3 CPPT em termos absolutos, sob pena de inconstitucionalidade.
X. Não se pode falar verdadeiramente em trânsito em julgado, porquanto o que se pretende aqui sindicar é a lesão de direitos do devedor subsidiário, enquanto substituto da devedora originária.
XI. Também decorre do nº2 do artigo 103º da LGT que é garantido aos interessados o direito de reclamação para o juiz da execução fiscal dos atos materialmente administrativos praticados por órgãos da AT.
XII. A AT não logrou provar que as comunicações hajam chegado à esfera de cognoscibilidade da devedora. – Cfr. Acórdão do TCAN de 03.02.2022, Proc. nº 01171/12.9BEPRT, disponível em www.dgsi.pt. – e que esta escolheu não apresentar defesa.
XIII. Não se cumprindo os trâmites legalmente exigidos para onerar o responsável subsidiário, então, será de anular o ato de reversão, as penhoras efetuadas e, em última instância, os processos de execução.
XIV. A prova documental junta pela AT é insuficiente para assegurar que as comunicações chegaram ao conhecimento do devedor subsidiário, provando-se, apenas, que algumas delas foram apresentadas a registo nos CTT, sendo que, qualquer referência aos processos em apreço, é manuscrita.
XV. No que respeita aos processos que tiveram origem em contraordenações, o acórdão para Uniformização de Jurisprudência do STJ, nº2/2012, publicado no DR I Série de 12.04.2012, decidiu que “a mera instauração pelo Ministério Público de execução patrimonial contra o condenado em pena de multa, para obtenção do respectivo pagamento, não constitui causa de interrupção da prescrição da pena prevista no art. 126º, n.º 1, al. a) do C.P.
XVI. O cômputo do prazo de prescrição inicia-se com a data da prática da infração. O nº1 do artigo 21º do RGIT refere que “O procedimento criminal por crime tributário extingue-se, por efeito de prescrição, logo que sobre a sua prática sejam decorridos cinco anos.” (sublinhado nosso)
XVII. Sem deixar de considerar o período de suspensão, que vigorou entre 09.03.2020 e 03.06.2020 e, mais tarde, entre 22.01.2021 e 06.04.2021, no total de 161 dias, constata-se que as dívidas referentes aos processos executivos com os números ..858, ...46, ...88, ...60, se encontram, de todo o modo, prescritas.
XVIII. Relativamente aos processos executivos com os números ...10 e ...35 originados por dívidas de IVA referente ao ano de 2012, importa igualmente referir que, não sendo possível opor qualquer efeito ao responsável subsidiário, uma vez que nem a sociedade devedora originária nem o responsável subsidiário foram notificados, estas dívidas encontram-se, prescritas.
XIX. Quando uma situação se revela potencialmente lesiva dos direitos e interesses dos contribuintes – como um ato de penhora ilegal - legitima-se a Reclamação nos termos dos artigos 276º a 278º do CPPT, acautelando os princípios elementares subjacentes ao direito tributário.
XX. Assim, deverá a decisão em apreço ser substituída por outra que admitindo a Reclamação dos atos do órgão da execução fiscal, face aos pedidos formulados, determine a anulação das penhoras e dos despachos de reversão e a extinção dos processos de execução contra o Reclamante.

TERMOS EM QUE,
admitindo e concedendo provimento ao presente recurso, farão V.ªs. Exas a habitual e sempre esperada
J U S T I Ç A!».

1.3. A Recorrida não apresentou contra-alegações.


1.4. A DMMP junto deste TCAN teve vista dos autos e emitiu parecer no sentido de que o recurso não merece provimento.
*
Dispensados os vistos legais, nos termos do artigo 36º, nº 2, do CPTA, cumpre apreciar e decidir, pois que a tanto nada obsta.
*

2. DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO – QUESTÕES A APRECIAR
Uma vez que o objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das alegações do Recorrente, cumpre apreciar e decidir se a sentença recorrida enferma de erro de julgamento quanto à não apreciação diversas questões [atinentes a eventuais ilegalidades relativas ao não cumprimento do direito de audição prévia ou de falta de fundamentação do despacho de reversão (por ocorrer erro na forma de processo), bem como as relativas à prescrição dos procedimentos de contraordenação, falta de notificação para a audição/apresentação de defesa e falta de notificação dos despachos de aplicação de coimas à sociedade devedora originária, por estarem cobertas pelo trânsito em julgado da(s) respetiva(s) decisão(ões) de aplicação de coima] e quanto à prescrição das dívidas em cobrança coerciva nas execuções fiscais nº ..............858, ...46, ...88, ...60 e nº ...10 e ...35.

3. FUNDAMENTAÇÃO
3.1. DE FACTO
3.1.1. Factualidade assente em 1ª instância
A decisão recorrida contém a seguinte fundamentação de facto:
«Com relevância para a decisão a proferir, consideram-se provados os seguintes factos:
1) O processo executivo n.º ...35 foi instaurado contra a sociedade devedora originária, com vista à cobrança do IVA, dos períodos 201204 a 201206 (cfr. 512106 Petição Inicial 006879520 Documentos da PI 10.07.2023 19:53:18, pág. 1 a 3).
2) Em 26-02-2014 foi proferido despacho de reversão do processo executivo n.º ...35, em nome do reclamante (cfr. 512106 Petição Inicial 006879520 Documentos da PI 10.07.2023 19:53:18, pág. 10).
3) Em 26-02-2014 foi elaborado o ofício ...89, em nome do reclamante, pela qual se levou ao respetivo conhecimento do teor do despacho de reversão do processo executivo n.º ...35 (cfr. 512106 Petição Inicial 006879520 Documentos da PI 10.07.2023 19:53:18, pág. 12).
4) Em 20-02-2014 o ofício ...89 foi enviado ao reclamante, através carta registada com aviso de receção n.º RM .............7 8 PT, endereçada para a Rua ..., ... ... (cfr. 512106 Petição Inicial 006879520 Documentos da PI 10.07.2023 19:53:18, pág. 12 a 16).
5) Em 22-02-2014 o distribuidor postal deixou aviso de levantamento da carta registada n.º RM .............7 8 PT, com fundamento no facto de o reclamante não ter atendido (cfr. 512106 Petição Inicial ...20 Documentos da PI 10.07.2023 19:53:18, pág. 17 e 18).
6) Em 12-03-2014 a carta registada n.º RM .............7 8 PT foi devolvida ao Serviço de Finanças com fundamento no facto de não ter sido reclamada (cfr. 512106 Petição Inicial 006879520 Documentos da PI 10.07.2023 19:53:18, pág. 18).
7) Em 17-04-2014 o Serviço de Finanças elaborou o ofício ...22, dirigido ao reclamante, com o seguinte teor:
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
(cfr. 512106 Petição Inicial 006879520 Documentos da PI 10.07.2023 19:53:18, pág. 21).
8) O ofício ...22 foi enviado ao reclamante através da carta registada RM ..........3 4 PT, que foi enviada para a Rua ... ..., ... ..., ... e depositada no respetivo recetáculo postal em 22-04-2014 (cfr. 512106 Petição Inicial 006879520 Documentos da PI 10.07.2023 19:53:18, pág. 19 e 20).
9) O processo executivo n.º ...10 foi instaurado contra a sociedade devedora originária, com vista à cobrança do IVA, dos períodos...

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