Acórdão nº 00658/11.5BECBR de Tribunal Central Administrativo Norte, 19-02-2016
Data de Julgamento | 19 Fevereiro 2016 |
Número Acordão | 00658/11.5BECBR |
Ano | 2016 |
Órgão | Tribunal Central Administrativo Norte |
1. Relatório
JMRC e PNEUS NR, LDA., interpõem recurso jurisdicional do acórdão do TAF de Coimbra que julgou improcedente a ação administrativa especial que os Recorrentes intentaram contra o MUNICÍPIO DE CANTANHEDE e o MINISTÉRIO DA AGRICULTURA, DO MAR, DO AMBIENTE E DO ORDENAMENTO DO TERRITÓRIO, com vista à anulação dos atos identificados nos autos e à condenação à prática do ato autorizativo, com referência a pedido de licenciamento de ampliação e alteração de utilização de garagem em edificação sita em “Espaço florestal/Áreas florestais preferenciais, com servidão administrativa de REN – Área de Infiltração Máxima”.
Os Recorrentes apresentaram alegações, onde concluem nos seguintes termos, que delimitam o objeto do recurso:
1- O 1.º recorrente é dono de terreno localizado em Queixada da Raposa, freguesia de T..., concelho de C..., com a área total e real de 1394 m², inscrito na matriz predial rústica sob o art. 2....º, confrontando de nascente com a EN 109.
2- Neste terreno existe edificação na qual, sucessivamente, o 1.º recorrente e a 2.ª recorrente, vêm exercendo há mais de 20 anos a atividade de comércio e montagem de pneus e acessórios para automóveis.
3- Não obstante a alteração ao uso e mesmo construção acrescida não ter sido precedida do necessário licenciamento ou autorização camarária, certo é que há mais de vinte anos que vem sendo exercida a atividade comercial no imóvel do 1.º recorrente, primeiro por este e depois pela 2.ª recorrente, sem que com a mesma se prejudicasse o espaço de reserva ecológica no qual se encontra inserida a construção urbana em causa.
4- Mantêm os recorrentes o entendimento de que a pré-decisão favorável (com condicionantes que, obviamente, seriam cumpridas) do D.U. da C.M. de C... é relevante e indiciadora da razão que assiste àqueles, não podendo, sem mais, vir agora o 1.º recorrido escudando-se no parecer do 2.º recorrido - através da CCDR-C notificar o 1.º recorrente de uma decisão em sentido completamente oposto ao que seguia indiciariamente o processo.
5- Foi criada junto dos recorrentes uma real expectativa de poder vir a ser deferida a informação prévia que fora requerida, o que acarreta consequências.
6- O D.L. n.º 166/2008 de 22/08 veio a “transferir” para os Municípios a delimitação das áreas de REN nos concelhos, o P.D.M. de C... foi aprovado em 1994, teve algumas alterações em 1997, e encontra-se a ser objeto de revisão e em consulta pública desde 2008.
7- O atual P.D.M. não se encontra de acordo com a realidade concreta e presente em todo o concelho.
8- A CCDR-C ultrapassou os prazos nos quais deveria ter prestado o seu parecer, concluindo-se por consequência pela existência de deferimento tácito.
9- A resposta, informação do 2.º recorrido ocorre bem após o prazo de 20 dias indicado na lei, havendo que ter-se por deferida a pretensão do 1.º recorrente.
10- O 1.º recorrente ter adquirido direitos de exploração do imóvel, e por consequência, de legalização das obras efetuadas e do uso a que foi o prédio destinado, uma vez que há mais de vinte anos que vem sendo afeto a semelhante atividade, com o conhecimento de todos, inclusive do 1.º recorrido, encontrando-se junto a estrada nacional em local com muitas construções, nem todas habitacionais, junto à via de circulação, e sem causar qualquer dano estético, de circulação, ou prejuízo ambiental.
11- A interpretação correta que deveria ter sido realizada quanto aos normativos aplicáveis ao caso, nomeadamente o Regime Jurídico da Reserva Ecológica Nacional.
12- A sentença recorrida deveria ter realizado essa interpretação, por forma a que concluísse do mesmo modo que os aqui recorrentes.
13- Estas as razões de direito que sempre acarretam a anulação do ato impugnado, diversamente do que entendeu e interpretou a sentença recorrida.
14- O princípio da proporcionalidade acarreta que a lesão sofrida pelos recorrente fosse proporcional e justa em relação ao benefício alcançado para o interesse público – o que não ocorreu, nem ocorre.
*
O Recorrido MINISTÉRIO DO AMBIENTE contra-alegou, pugnando pela improcedência do recurso, mas sem apresentar conclusões e, subsidiariamente, para o caso de o recurso proceder, impugnando a matéria de facto dado como provada no ponto n.º 3 (primeiro n.º 3) dos factos assentes.
*
O Recorrido MUNICÍPIO não contra-alegou.
O presente recurso foi inicialmente interposto como recurso per saltum para o Supremo Tribunal Administrativo que, por decisão de fls. 287, considerou não verificados os respetivos pressupostos e ordenou a remessa dos autos a este TCAN.
O Ministério Público emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso, salientando, além do mais, que não se verifica a invoca violação do princípio da proporcionalidade e demais princípios constitucionais, uma vez que não há qualquer expectativa legítima dos Recorrentes que pudesse ser tutelada e os atos impugnados são atos de conteúdo vinculado.
***
2. Factos
A decisão recorrida deu como assentes os seguintes factos:
1) O 1º A. é dono de um terreno localizado em Queixada da Raposa, freguesia ele T..., Concelho de C..., o qual tem a área total e real de 1394 m" e confronta com a Estrada Nacional 109, inscrito na matriz predial rústica ela freguesia indicada sob o art. 2....0 - Cfr. doc. 2 da PI.
2) Este terreno está inserido em espaço florestal com servidão administrativa de REN – Área de Infiltração Máxima, de acordo com as plantas de ordenamento e de condicionantes do PDM do concelho de C..., ratificado pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 118/94, de 29 de Novembro, com alterações ratificadas pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 56/97 in DR I série B de 1/4/97;
3) No mesmo terreno existe uma edificação onde, sucessivamente, o 1º Autor e o 2º Autor, têm vindo a exercer há mais de 20 anos a atividade de comércio e montagem de pneus e acessórios para automóveis.
3) (sic) Esta edificação, entretanto clandestinamente ampliada, foi inicialmente e apenas licenciada para servir de garagem para um veículo pesado e de arrumo de alfaias e produtos agrícolas.
4) Considerando a irregularidade daquela outra utilização o 1.º A em 29/4/2010 apresentou Pedido de Informação Prévia (PIP) junto do Réu Município, acerca da alteração do uso do imóvel para comércio e a montagem de pneus e acessórios de automóveis, bem como do subsequente licenciamento da ampliação sobredita.
5) Tal como o 1º A referiu na memória descritiva e justificativa com que instruiu tal pedido, já antes a CCDRC-C emitira, “numa primeira análise, parecer desfavorável por falta de enquadramento da atividade no atual Plano Diretor Municipal de C..., não cumprindo com o ponto ii) da alínea g) do Item I do Anexo I da Portaria nº 1356/2008 de 28 de Novembro”. Cf. PA do município, doravante PA 1, fls. 21;
6) Em 19/05/2010, sobre informação do DU - DGU de 17/05/2010 foi exarado despacho nos seguintes termos: “notifique-se da emissão de parecer favorável com as condicionantes apontadas na informação técnica”, que foi notificado ao requerente – fls. 30 a 32 do PA 1;
7) Nessa informação constava que “(…) a parcela de terreno está inserida em espaço florestal com servidão administrativa de REN – Área de Infiltração Máxima, de acordo com as plantas de ordenamento e de condicionantes do PDM”; que “face ao facto do requerente desenvolver a atividade no local há mais de 20 anos, entende-se que a operação urbanística pode ser enquadrada ao abrigo do art. 27º do regulamento do PDM (…), sendo portanto permitidas alterações e ampliações da área de construção licenciada, sendo certo que o uso existente não está interdito em espaços florestais, nos termos do art. 10º do regulamento do PDM”, admitindo-se “a possibilidade de alteração do uso e da ampliação da área licenciada em 20%, caso a CCDRC autorize a operação urbanística em causa, nos termos dos arts. 20º e 23º do Decreto-Lei nº 166/2008, de 22 de Agosto, devendo ainda ser cumpridas as seguintes condições (…)”, consignando-se, a final, que a autorização da CCDRC “pode ser requerida diretamente na entidade ou instruir o processo no município (…)” – fls. 30 e 31 do PA 1.
8) Em 08/07/2010, deu entrada na Câmara Municipal o ofício da CCDR-C, datado de 05/07/2010, emanado do PA da CCDR, doravante PA 2, relativo “à legalização de ampliação de construção para comércio e montagem de pneus e acessórios auto”, dirigido ao requerente e com conhecimento à Câmara Municipal de C..., a considerar que, “embora tenham sido apresentados novos elementos para apreciação do processo, a pretensão continua a não reunir condições para ser autorizada” pela CCDR-C, no âmbito do RJREN. Fls. 34 e 35 do PA 1.
9) Em 21/09/2010 foi emitida a informação 192/2010, da Divisão Jurídica da Câmara Municipal, em que, considerando que “a CCDR-C, por ofício de 5/7/2010 manifestou a sua oposição a tal pretensão, com os fundamentos constantes do ofício supra citado”, se entendeu que, “tendo em conta o disposto naqueles preceitos legais (…), e dada a natureza vinculativa dessa autorização, deve ser indeferido o pedido do requerente e arquivado processo”, propondo-se a notificação do...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO