Acórdão nº 00622/07.9BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 19-04-2013

Data de Julgamento19 Abril 2013
Número Acordão00622/07.9BEPRT
Ano2013
ÓrgãoTribunal Central Administrativo Norte
Acordam, em conferência, os Juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:
Relatório
SAC(...) residente na rua Júlio Dantas, nº430, Porto – interpõe recurso jurisdicional do acórdão proferido pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto [TAF] em 15.07.2011 – que absolveu o réu Ministério da Educação [ME] dos pedidos que contra ele formulou - este acórdão recorrido culmina acção administrativa especial [AAE] em que a ora recorrente demanda o ME pedindo ao TAF do Porto a anulação do despacho de 11.11.2006 do Secretário de Estado da Educação [SEE] que indeferiu o recurso hierárquico interposto do despacho de 25.07.2006 da Directora Regional de Educação do Norte [DREN] que não autorizou a sua requisição para exercer funções na Faculdade de Farmácia da Universidade do Porto [FFUP], e a condenação do ME a pagar-lhe a quantia de 10.000,00€ a título de reparação dos prejuízos que lhe foram causados pelo acto impugnado.
Conclui assim as suas alegações:
1- A recorrente não podia prever que – depois de 27 anos lectivos consecutivos na Faculdade de Farmácia, mantendo-se os pressupostos que haviam determinado, inicialmente, a sua requisição [isto é, falta de pessoal habilitado no quadro da FF e excesso – aliás, notório – de pessoal docente no ensino secundário] – perante a vontade expressa daquela Faculdade e concordância do estabelecimento de origem, a proposta de mobilidade que subscreveu viesse a ser indeferida;
2- Na verdade, a recorrente sabia que, a favor do deferimento da pretensão, estavam:
– O seu interesse pessoal;
– O interesse [público] da Faculdade de Farmácia;
– O interesse [público] da Escola de origem e dos alunos que a frequentavam, dado que o necessário desfasamento da recorrente, provocado por 27 anos de ausência, quer quanto a conteúdos programáticos, quer quanto a métodos de ensino, faziam dela [apesar de conceituada docente no ensino universitário] uma professora do ensino secundário com graves lacunas;
3- O facto de a decisão impugnada não ter sido proferida dentro dos limites temporais fixados sob o artigo 65º, nº1, do DL nº20/2006, de 31.01, e o ponto 3, alínea f), do Despacho nº8641/2006, só podiam reforçar, ainda mais, a convicção da recorrente no sentido de que nada mudaria, relativamente aos anos anteriores;
4- Nas circunstâncias concretas do caso, o indeferimento do pedido de mobilidade é violador do princípio da tutela da confiança;
5- A fundamentação do acto impugnado [e do acto por ele confirmado] é manifestamente incongruente, porque, de todo em todo, não se aplica à situação da recorrente;
6- Em primeiro lugar, o regresso da recorrente [a cerca de três anos da aposentação] a uma escola em que nunca exerceu funções, de facto, e que não necessitava dela [ver parecer aposto na proposta de mobilidade] não traria a estabilidade invocada naquela suposta fundamentação;
7- Em segundo lugar, a recorrente, longe de pertencer ao grupo dos «docentes mais experientes» que ali se invoca, tinha apenas cinco anos de experiência no ensino secundário, dos quais somente dois como professora efectiva [nºs2, 3 e 5 da MFP];
8- Finalmente, não é perceptível a razão por que só as funções respeitantes à formação profissional de professores são consideradas relevantes para o deferimento da proposta de mobilidade, quando a Lei [artigo 67º do Estatuto da Carreira dos Educadores de Infância e dos Professores dos Ensinos Básico e Secundário, aludido no douto acórdão] não estabelece essa restrição;
9- Acresce que, como se invocou, a fundamentação genérica acolhida não tomou em conta, minimamente, as circunstâncias concretas do caso e, por conseguinte, não revelou as razões, de facto e de direito, por que a Administração decidiu como decidiu;
10- A informação/proposta que baseou o acto impugnado apenas pode servir de fundamentação a este acto, e não ao de indeferimento do pedido de mobilidade, que lhe é anterior;
11- E, ao contrário do defendido na decisão que se discute, não é aceitável uma fundamentação anterior, quando se trate de «orientações administrativas anteriores» que não estejam fundamentadas, de facto e de direito, nem sejam demonstradamente aplicáveis ao acto que pretenda motivar-se nelas;
12- Mostram-se, assim, ofendidos, por erradas interpretação e aplicação, os preceitos dos artigos 124º, nº1 alíneas a) c) d), e 125º, nº2, do CPA;
13- Configura uma visão demasiado distanciada da realidade a asserção, constante do acórdão recorrido, de que «a autora leccionou durante largos anos no ensino superior, com um grau de exigência ao nível de conhecimentos muito maior do que o do ensino secundário, pelo que não se vê de que forma é que o seu regresso a esse grau de ensino pode acarretar para ela um custo tão elevado e desproporcionado»;
14- Efectivamente, a questão não é, claramente, a do nível científico de conhecimentos, mas [1] de familiaridade com os conteúdos programáticos, [2] dos métodos de ensino, [3] do modo de relacionamento com alunos de nível etário completamente diferente e [4] do reduzidíssimo tempo para adaptação a uma realidade completamente nova;
15- Por isso mesmo, aliás, a recorrente teve a reacção que teve, retratada sob os nºs 24 a 29 da MFP – semelhante à que sentiria o destinatário médio do acto, nas mesmas circunstâncias;
16- Não podem, pois, subsistir dúvidas de que também o princípio da proporcionalidade foi ofendido pelo acto impugnado;
17- Finalmente, ocorre ofensa do princípio da justiça, traduzida, no caso vertente, na imposição à recorrente de «um sacrifício infundado e desnecessário» [para usar a expressão de Santos Botelho e outros, Código do Procedimento Administrativo Anotado e Comentado, 2ª edição, Coimbra, Almedina, 2002, página 94], dado que o interesse público não só não foi protegido como, pelo contrário, foi fortemente posto em causa pelo acto impugnado;
18- Nem é invocável, aqui, a discricionariedade técnica da Administração, porquanto nada [nenhum princípio, nenhuma norma, nenhum direito, nenhum interesse público atendível, por pouco relevante que fosse...], nada, repetimos, tornava necessária ou, sequer, aconselhável a conduta da Administração;
19- Assinala-se, ainda, que também as já mencionadas violações dos princípios da proporcionalidade e da confiança se traduzem, também, na ofensa do princípio da justiça, de que são corolários;
20- Se é verdade que os preceitos do artigo 65º, nº1, do DL nº20/2006, e do ponto 3 alínea f) do Despacho nº8641/2006, se destinam, essencialmente, a «assegurar o bom e regular funcionamento das escolas», a verdade é que esse não é o seu único efeito;
21- Declarar que os funcionários ou trabalhadores afectados pelo deferimento ou indeferimento da proposta de mobilidade não podem deduzir pretensão alguma com base no incumprimento, pela Administração, dos prazos estabelecidos [isto é, afirmar que eles não têm, na matéria, direitos ou interesses legalmente protegidos] é vê-los como objectos da relação jurídica e não como sujeitos, que efectivamente são, duma relação jurídica poligonal;
22- Assim sendo, como inequivocamente é, a ultrapassagem dos prazos definidos [estabelecidos, também, no interesse dos trabalhadores], pode ser fonte de responsabilidade civil, caso se demonstre, como se demonstrou abundantemente [nºs21 a 29 da MFP] que dali emergiu um dano que merece a tutela do Direito;
23- Não pode, por outro lado, subscrever-se a tese de que a autora/recorrente poderia ter concorrido às colocações que mais lhe conviessem durante todo o período em que esteve requisitada, por ofensiva, uma vez mais, do princípio da confiança;
24- A recorrente não tinha, de facto, o menor motivo para supor que, depois de 27 anos consecutivos e tão perto da aposentação, iria alguma vez voltar ao ensino secundário;
25- Para além disso – e não menos importante – é certo também que, se a Administração tivesse cumprido os aludidos prazos de decisão, ela poderia ter concorrido, ainda no ano lectivo em causa, e, previsivelmente, obter colocação mais vantajosa, atento, nomeadamente, o seu tempo de serviço;
27- Devia, por tudo, o TAF ter julgado procedente o pedido indemnizatório deduzido, e não o tendo feito, violou o disposto sob o artigo 2º, nº1, do DL nº48.051.
Termina pedindo a revogação do acórdão recorrido e a procedência total da AAE, ou seja, do pedido declaratório e do pedido condenatório.
O recorrido ME contra-alegou, mas sem formular quaisquer conclusões.
O Ministério Público não se pronunciou [artigo 146º, nº1, do CPTA].
De Facto
São os seguintes os factos considerados provados no acórdão recorrido:
1- A autora concluiu a licenciatura em Matemática [ramo educacional] pela Faculdade de Ciências da Universidade do Porto, em 30.06.1976;
2- Foi Professora Eventual [1974/75 e 1975/76] e Professora Agregada [1976/77], na Escola Secundária AH(…), no Porto;
3- Foi Professora Efectiva na Escola Secundária de ST(…) [1977/78], na Escola Secundária de F(…) [1978/79], na Escola Secundária de G(…) [1979/80] e na Escola Secundária de M(…) [1980/81];
4- A autora é Professora Efectiva na Escola de CR(…), no Porto, desde 1981/82;
5- A autora esteve requisitada, ininterruptamente, desde 1979/80, até ao final do ano lectivo de 2005/2006, para o exercício, em exclusividade, de funções docentes na Faculdade de Farmácia da Universidade do Porto;
6- A autora assumiu, ali, funções como Assistente, em Setembro de 1979, requisitada por um período de 3 anos, em regime de exclusividade;
7- Findo o período de 3 anos, a autora foi requisitada por mais um triénio para as mesmas funções, após o que passou a ser requisitada anualmente;
8- A autora cursou e concluiu, em Setembro de 1999, a Licenciatura em Ciências Farmacêuticas pela Faculdade de Farmácia da Universidade do Porto;
9- A autora subscreveu, em 06.04.2006, a proposta de mobilidade para o ano lectivo de 2006/07, junta aos autos a folha 36, cujo teor...

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