Acórdão nº 00481/06.9BEBRG de Tribunal Central Administrativo Norte, 13-05-2021

Data de Julgamento13 Maio 2021
Número Acordão00481/06.9BEBRG
Ano2021
ÓrgãoTribunal Central Administrativo Norte
Acordam em conferência os Juízes Desembargadores que compõem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:
*

I - Relatório

C., LDA., NIPC (…), com sede em Rua (…), interpôs recurso de apelação relativamente à sentença proferida em 27 de Dezembro de 2010 no Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, que julgou improcedente a impugnação judicial por si movida contra a liquidação oficiosa do IRC de 2001 e respectivos juros compensatórios, consequente a correcções técnicas da matéria tributável, no valor, a pagar, de 275 005,06 € .

As alegações de recurso terminam com as seguintes conclusões:

«CONCLUSÕES
1. O Tribunal a quo fez uma errada apreciação da matéria de facto colocada à sua apreciação, devendo o Tribunal ad quem decidir no sentido de que o custo suportado (685.874,11€) consubstancia um custo para efeitos do artigo 23.º do CIRC, na versão de 2001.
2. Impõe-se que seja reapreciada a prova testemunhal e a prova documental.
3. Além disso, a sentença é nula, nos termos do artigo 668.º/1/b) do CPC, porquanto não se encontram especificados os fundamentos de facto que justificam a decisão tomada, o que se argúi.
4. O tribunal recorrido devia ter considerado como assente o seguinte facto: que a Recorrente mantinha contratos de agência com o agente C. desde 1997, o que se requer que seja aditado.
5. A Recorrente suportou um custo de €685.847,11 com o pagamento de uma indemnização ao agente C., que desenvolvia a actividade de angariação de clientela, no âmbito do objecto social da Recorrente, que é o que basta para que fique demonstrado que o custo esteve directamente relacionado com a actividade do sujeito passivo.
6. Porque a Recorrente poderia passar a actuar directamente nos mercados em que o agente tinha angariado clientes e em mercados em que, até então, aquele agente beneficiava do exclusivo, a Recorrente chegou à conclusão que seria economicamente mais vantajoso pôr fim aos contratos, pagando-lhe uma indemnização pelo trabalho desenvolvido, e tendo em conta que as vendas seriam ainda influenciadas pelo trabalho do agente até 2002.
7. Por isso, e dentro do regime legal que regula os contratos de agência, Recorrente e comissionista acordaram no pagamento de uma indemnização pela clientela angariada e pela qual este deixaria de receber comissões das vendas.
8. Estando demonstrado que o custo ocorreu e que o mesmo foi vantajoso para a estrutura de custos e estratégia empresarial, tem de se aceitar que se encontra demonstrado que o mesmo se subsume ao conceito de «indispensabilidade de custos no interesse da empresa», pois que o mesmo foi contraído no interesse da empresa, integrando, em abstracto e em concreto, o conjunto de actos que visam o lucro da empresa.
9. O pagamento da indemnização de clientela, ainda que fraccionada, preenche a cláusula geral do n.º1 do artigo 23.º do CIRC, por dever ser tida como necessária, útil, conveniente e prudente para a manutenção da fonte produtora e realização dos proveitos da Recorrente.
10. A douta decisão recorrida violou, nomeadamente, o disposto nos arts. 668.º/1/b) do CPC e 32º/1 do CIRC.

Notificada, a AT não respondeu à alegação

A Digna Magistrada do Ministério Público neste Tribunal apresentou douto parecer no sentido da improcedência do recurso, de se transcreve o essencial:
«Parece-nos que o recurso não merece provimento.
I. Falta de fundamentação do julgado.
Nesta sede a recorrente sustenta que a sentença é nula por falta de especificação dos fundamentos de facto justificativos da decisão tomada. Mas sem razão.
A matéria de facto assente no probatório demonstra que o julgador, de entre a factualidade alegada pelas partes, registou como provada aquela que considerou como relevante para a decisão das questões jurídicas colocadas pelas partes.
Se da instrução do processo resultam provados outros factos relevantes para a concludência ou inconcludência do pedido, equaciona-se insuficiência da matéria de facto, mas não o vício de falta de fundamentação da sentença.
A propósito do julgamento da matéria de facto apenas se registou (face às alegações da recorrente) o reparo de haver um facto provado e não levado ao probatório, e que é o que vem referido na conclusão 4, do seguinte teor: A recorrente mantinha contratos de agência com o agente C. desde 1997.
Sobre esta questão - se se justifica ou não que o tribunal “ad quem“ amplie a matéria de facto - nos pronunciaremos na epígrafe seguinte.
II. Insuficiência da matéria de facto assente para a decisão da causa. 
Nesta parte a recorrente defende dever aditar-se ao probatório o facto constante da conclusão 4.
Aqui pensamos ter inteira razão.
Este facto tem interesse para dirimir a causa, sendo certo que o próprio relatório de fiscalização o refere como verdadeiro, quando diz “ter a impugnante pago comissões ao mesmo comissionista em 1997. Pelo exposto não nos parece que haja reservas a que o tribunal “ad quem” proceda à ampliação da matéria de facto no mencionado sentido.
III. Erro de julgamento de direito sobre a questão da indispensabilidade dos custos contabilizados e não aceites pela AT.
Respeitante a este erro de julgamento a recorrente sustenta ter havido erro na valoração jurídica da matéria de facto, impondo-se que o tribunal “ad quem“ decida constituir o custo suportado ( e desconsiderado nas correcções aritméticas ), como integrante nos custos dedutíveis previstos no art. 23.° do CIRC.
Mas agora, salvo melhor opinião, sem razão.
Não se pode esquecer que em sede de avaliação de indispensabilidade de custos para a obtenção de proveitos, cabe ao contribuinte, fundamentadamente, considerá-los como necessários para os proveitos, até porque é a ele contribuinte que cabe definir as estratégias empresarias próprias.
O que equivale a dizer que a indispensabilidade dos custos tem de ser fundamentada pelo contribuinte, de forma a poder concluir-se serem necessários para a prossecução da estratégia empresarial que definiu.
In casu, não há a mínima fundamentação para que o montante indemnizatório contabilizado se perspectivasse como necessário à angariação de clientela por parte do agente comissionista, já que, como resultará do probatório após a ampliação da matéria de facto, desde 1997 prosseguia a actividade de angariação de clientela a favor da impugnante, sem que alguma vez tivesse sido exigida a fixação de indemnização por causa de eventual rescisão contratual do contrato de agência. E se contratualização houve para agora introduzir a cláusula de rescisão que ora nos ocupa, não se mostra que o agente comissionista alguma vez a tivesse exigido, acrescendo que o regime jurídico do contrato de agência, além de não a exigir, quantifica-a, caso as partes decidam fixá-la, em montante muito inferior ao que no caso concreto foi contabilizada pela impugnante. Tudo leva a concluir, então, estarmos na presença de uma despesa sem a mínima justificação empresarial, e mais do que isso, absurda, porque contraída em desconformidade com as mais elementares regras da gestão empresarial, já que o escopo desta é a obtenção do maior lucro possível.
Ou seja, estamos na presença de custos incorridos, não para a prossecução da actividade empresarial da impugnante, mas sim para outros interesses alheios àquela.
Faltando, em face do exposto, o requisito da indispensabilidade do mencionado custo, não tem o mesmo qualquer relevância para constituir custo dedutível com enquadramento no art. 23.° do CIRC.
Bem andou, por conseguinte, a AT ao desconsiderá-lo para efectuar as correcções aritméticas, não sendo passível de qualquer censura a sentença que dessa forma concluiu.»

Dispensados os vistos, nos termos do artigo 657º nº 4 do CPC, cumpre apreciar e decidir.


II- Âmbito do recurso e questões a decidir

Conforme jurisprudência pacífica, o âmbito do recurso é delimitado pelo objecto das conclusões das alegações.

Assim, as questões submetidas à apreciação deste tribunal de recurso as seguintes:

1ª: Questão
Padece, a sentença recorrida, de nulidade por falta de fundamentação, nos termos do artigo 668º nº 1 alª b), actual 615º, do CPC, porque não especifica os fundamentos de facto da decisão?

2ª questão
Errou, a Mª Juiz a qua no julgamento em matéria de facto e de direito, ao decidir que os custos incorridos com a indemnização por perda de clientela, consequente da cessação do contrato de agência, acordada e paga, em 2001, ao agente C., não revestiam características de indispensabilidade para a manutenção da fonte produtora e, por isso, não eram dedutíveis aos proveitos obtidos nesse exercício, para determinação da matéria colectável, nos termos do artigo 23º nº 1 do CIRC?

III – Apreciação do Recurso

Da decisão recorrida convém transcrever, antes de mais, a enunciação dos factos provados e não...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT