Acórdão nº 00448/09.5BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 10-03-2016

Data de Julgamento10 Março 2016
Número Acordão00448/09.5BEPRT
Ano2016
ÓrgãoTribunal Central Administrativo Norte
Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:
1. RELATÓRIO
“M..., Lda.”, devidamente identificada nos autos, inconformada veio interpor recurso jurisdicional da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, datada de 28-12-2012, que julgou improcedente a pretensão pela mesma deduzida na presente instância de IMPUGNAÇÃO relacionada com as liquidações adicionais de Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA) e respectivos de juros compensatórios, relativas aos meses de Janeiro a Junho de 2006, emitidas sob os nºs 08161971 no valor de € 244.024,47, nº 08161969 no valor de € 252.086,14, nº 08161967 no valor de €179.918,36, nº 08161965 no valor de €192.142,95, nº 08161963 no valor de €133.137,63, nº 08161961 no valor de €117.449,36, nº 08161964 no valor de €12.693,67, nº 08161972 no valor de €20.003,32, nº 08161962 no valor de €11.596,92, nº 08161966 no valor de €17.687,68, nº 08161970 no valor de €21.520,56, nº 08161968 no valor de €115.911,68, no montante global de € 1.218.172,74.

Formulou as respectivas alegações (cfr. fls. 698-737) no âmbito das quais enuncia as seguintes conclusões:
“(…)
Quanto à nulidade por falta de especificação dos fundamentos de facto:
A. A factualidade que consta da lista dos factos não provados é, em primeiro lugar, meramente tautológica e conclusiva: “a materialidade das operações/transacções subjacentes às facturas cujos custos foram desconsiderados pela Administração fiscal” não é um verdadeiro facto - não o pode ser para efeitos da Sentença que deveria ter sido proferida no presente processo -, porque se trata de uma mera conclusão, insusceptível de ser levada ao probatório, porque encerra em si mesma a própria sorte da lide.
B. Em segundo lugar, a especificação da matéria de facto não provada realizada pela Sentença recorrida é inadmissível por ser verdadeiramente inexistente: na verdade, existe uma contradição ostensiva entre, por um lado, a complexidade e extensão da factualidade que foi carreada para o processo, designadamente pela ora Recorrente, e que esta incluiu expressamente na sua petição inicial e nas alegações finais, e, por outro, o desleixo com que a Sentença a tratou.
C. Nas alegações finais, a Recorrente fez uma análise da prova produzida e concluiu pela demonstração de um conjunto vasto de factos que, apreciados de modo interligado, teriam a susceptibilidade de ter implicado que aos constantes do Relatório de Inspecção (todos relativos a entidades terceiras, lembre-se) não pudesse ser atribuída, como o foi pela AT, a natureza de “indícios” de que as facturas contabilizadas pela M... não titulam transacções reais. Assim sendo, perante a relevância dos factos aduzidos, que têm a capacidade de refutar os alegados “indícios” da AT, deveria a Sentença recorrida ter-lhes feito uma referência e dedicado uma apreciação expressas.
D. Se o Tribunal deu por integralmente provados os factos do Relatório, e se os tratou como “indícios” suficientes, então teria necessariamente de fazer constar do rol da matéria não provada os factos que a M... defendeu serem idóneos à demonstração do contrário, de que aquela natureza indiciária seria de afastar, explicando, com suficiente rigor, o porquê de os não ter considerado credíveis. Se o Tribunal achou que a matéria em causa não resultou provada, devia tê-lo dito claramente, assim como deveria ter desenvolvido circunstanciadamente as razões pelas quais ficou com essa convicção. O que não poderia ter feito foi – como fez – ter, pura e simplesmente, excluído dos autos essa matéria controvertida, sem justificar o valor ou o desvalor que lhe atribuiu, logo no momento processual em que esse esforço era devido.
E. A falta de especificação dos fundamentos de facto é uma nulidade prevista na alínea b) do n.º 1 do artigo 668º do CPC, bem como no n.º 1 do artigo 125º do CPC, sendo que para efeitos deste último a falta de descriminação da matéria de facto não provada é equiparada à falta de indicação da matéria de facto provada.
F. Posto que a decisão da matéria de facto, nomeadamente quanto aos factos não provados, é tautológica e insuficiente, nos termos sobreditos, ela acaba inexoravelmente por ser inadmissível também por resultar da ausência de exame crítico da prova – outro vício acerca do qual os Tribunais Superiores têm vindo a construir jurisprudência sólida.
G. Para além de excessivamente breve, a Sentença é nesta parte, em grande medida, inócua e, de novo, tautológica, podendo até dizer-se que em parte a “motivação” não revela, verdadeiramente, motivação alguma.
H. Por outro lado, todavia, o pouco que, do segmento em causa, se pode caracterizar, ainda que com dificuldade, como motivação da decisão da matéria de facto reduz-se a meras fórmulas vazias e genéricas, não podendo também ser considerada motivação suficiente.
I. Assim, deve concluir-se que o Tribunal, ao declarar quais os factos que julgou provados e os que entendeu não provados, não analisou criticamente uma parte grande e fundamental das provas ao seu dispor, nem especificou os fundamentos que foram decisivos para a convicção do julgador, conforme lhe é exigido pelos artigos 653º, 655º e 659º do CPC.
J. Por falta de especificação dos fundamentos de facto, a Sentença recorrida encontra-se ferida de nulidade, prevista no n.º 1 do artigo 125º do CPPT e na alínea b) do n.º 1 do artigo 668º do CPC, podendo ser anulada oficiosamente, ao abrigo do n.º 4 do artigo 712º do CPC.
Quanto ao erro no julgamento da matéria de direito:
K. O Tribunal recorrido faz uma interpretação errada do conteúdo do n.º 3 do artigo 19º do Código do IVA, o qual ao estabelecer que “não se pode deduzir o imposto resultante de operação simulada”, obriga a AT a recolher indícios sérios de que entre o contribuinte inspeccionado e os seus fornecedores de serviços ou bens houve um conluio simulatório.
L. Para que o n.º 3 do artigo 19º do Código do IVA se possa considerar correctamente aplicado, a AT deveria ter identificado, nas relações da Recorrente com os seus fornecedores, quer o intuito e o acordo simulatórios, quer o “animus nocendi” em desfavor do Estado.
M. No entanto, ao decidir como decidiu, a Sentença a quo sancionou a legalidade de actos de liquidação cuja fundamentação é, no tom e na natureza, simplesmente remissiva – não constituindo mais do que uma mera resenha de conclusões de outros Relatórios (como que um seu epílogo), relativos a outros sujeitos passivos, de cujo conteúdo completo a M... nunca teve conhecimento: a Sentença conformou-se com o facto de a AT não ter apresentado provas ou sequer indícios credíveis e circunstanciados do que aparentemente alega e que possam ser sustentadamente subsumidos ao conceito – a algum conceito – de simulação, limitando-se a expor o circuito comercial de determinadas mercadorias, a identificar a situação tributária irregular de alguns dos operadores que nele participam, a referir a alegada reiteração de um determinado tipo de fraude no sector em causa e a concluir, irresponsável e – diga-se – preguiçosamente, que toda e qualquer entidade envolvida nesse circuito faz parte de um conluio fraudulento.
N. De qualquer modo, ainda que todos aqueles supostos “indícios” se viessem a provar, daí não se poderia concluir pela inexistência de meios para celebrar com a Recorrente os negócios titulados nas facturas: nenhum desses indícios impede um operador de, obtendo as necessárias quantidades de mercadorias, munindo-se de um livro de facturas e abrindo uma conta bancária em nome do titular da factura, se deslocar às instalações de um outro revendedor, oferecer as mercadorias, acordar um preço e descontar o cheque usado como meio de pagamento (ou seja, não pode concluir-se, apenas por que se confirmam aqueles factos, que os fornecedores não estavam em condições de transaccionar as mercadorias).
O. Do acórdão do TCA-Norte de 01/03/2007, proferido no processo n.º 00027/00, que a Sentença mobiliza, não resulta que a falsidade de facturas possa sempre ser retirada, para efeitos da definição da situação fiscal de um determinado contribuinte que as recebeu, com base na actuação concreta e nos termos gerais da actividade do emitente: só assim será se dos indícios extraídos da esfera dos emitentes resultar directamente a simulação das operações declaradas e a participação do receptor das facturas num conluio fraudulento.
P. Enquanto no caso decidido pelo Acórdão do processo 00027/00 os indícios que dizem respeito ao emitente das facturas afectam directa e necessariamente a operação titulada pela factura desconsiderada pela AT (porque não é possível prestar serviços de “motoniveladora, pá carregadora, bulldozer D-5, giratória e retroescavadora” sem se possuir ou ter acesso a esses instrumentos), já quanto aos “indícios” mobilizados contra a M... nada disso acontece, porque se trata de considerações genéricas sobre os fornecedores (e, lembre-se, sobre os fornecedores desses fornecedores!) das quais não resulta com suficiente certeza (longe disso) a impossibilidade de as transacções declaradas terem ocorrido.
Q. Assim, o Acórdão do TCA-Norte de 01/03/2007 não só não vem em auxílio da Administração fiscal, como, isso sim, vem, a contrario sensu, reforçar a posição da M..., refutando o pressuposto da Sentença segundo o qual, na aplicação do n.º 3 do artigo 19º do Código do IVA, a AT se pode bastar com factos exclusivamente relativos aos fornecedores, que nada têm que os ligue ao sujeito passivo inspeccionado nem muito menos especificamente às operações concretas desconsideradas.
R. A situação em apreço é decisivamente semelhante à que subjaz ao Acórdão do TCA-Norte de 06/03/2008, proferido no âmbito do processo n.º 00104/01: também nesse processo se tratou de averiguar a legalidade de liquidações adicionais de IVA e juros compensatórios, emitidas a um sujeito passivo que tinha actividade no sector...

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