Acórdão nº 00446/09.9BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 27-10-2021
Data de Julgamento | 27 Outubro 2021 |
Número Acordão | 00446/09.9BEPRT |
Ano | 2021 |
Órgão | Tribunal Central Administrativo Norte |
Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:
1. RELATÓRIO
A Recorrente, Autoridade Tributária e Aduaneira, interpôs recurso da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto que julgou procedente a impugnação judicial instaurada por A., Lda., melhor identificada nos autos, que impugnou judicialmente as liquidações de IRC e juros compensatórios do ano de 2005.
A Recorrente formulou nas respetivas alegações as seguintes conclusões que se reproduzem:
“(…)
A. Vem o presente recurso interposto da sentença que julgou procedente a impugnação deduzida contra a liquidação adicional de IRC do exercício de 2005, no que se refere às correcções efectuadas pela AT, relativas aos encargos relevados na contabilidade como custo do exercício, mas que consubstanciam despesas não documentadas,
B. A douta decisão recorrida incorreu em erro de valoração da matéria de facto, já que errou no juízo sobre quais os factos que se devem considerar provados com base nos documentos existentes no processo e na prova testemunhal produzida, valorando erradamente tal prova e infringindo assim o estabelecido nos art°s 508º-A, n°1, alínea e), 511º e 659° do Código de Processo Civil (CPC),
C. Porquanto concluiu que “Feita a prova de que efectivamente as vendas foram realizadas e, como tal, efectivamente ocorreram aqueles custos os mesmos têm de ser considerados” e que, desta forma, assiste razão a impugnante quando pugna pela ilegalidade da liquidação por não se considerar os custos que comprovadamente realizou para o exercício da sua actividade”.
D. A douta sentença sob recurso padece ainda de erro na aplicação do direito, porque não procedeu ao enquadramento da matéria de facto provada nos autos no disposto na alínea g) do n° 1 do art° 42° do CIRC, na medida em que considera ter sido feita “prova de que efectivamente as vendas foram realizadas”.
E. Resulta do conspecto dos elementos juntos aos autos que efectivamente não foi feita prova pela impetrante de quem foram os fornecedores das operações em crise, tituladas por documento interno.
F. Ora, para que as despesas suportadas pelos sujeitos passivos relevem como custos fiscais, devem estar devidamente documentadas, como resulta do art. 41°, n°1, alínea h), do CIRC, ou seja, devem estar comprovadas por documento externo que respeite as formalidades impostas pelo art. 35°, n° 5, do Código da IVA (CIVA), disposição legal que deve considerar-se aplicável a todo o ordenamento jurídico-tributário.
G. Não obstante, caso as despesas estejam insuficientemente documentadas, admite-se ainda que o contribuinte comprove o respectivo custo, como lho impõe o art. 23° do CIRC, pela demonstração de que as operações se realizaram efectivamente e do montante do gasto, para o que será necessário identificar devidamente os fornecedores, sem o que persiste a dúvida sobre a efectividade das operações.
H. Compete então ao contribuinte demonstrar inequivocamente, a realidade da operação – aquela operação e aquele fornecedor.
I. Ora, in casu, tal não se verificou pois, não obstante não estar em causa a materialidade das operações, o certo é que a impetrante não logrou identificar os respectivos fornecedores.
J. Não o entendeu assim o Tribunal a quo.
K. A convicção do Tribunal baseou-se na prova apresentada pela impugnante, nomeadamente no depoimento das testemunhas por si arroladas, desvalorizando a prova documental constituída pelo Relatório da Inspecção e documentos que o sustentam em sede de procedimento administrativo e a autorizar a conclusão a extraída e interpretando erradamente o que resultou desses mesmos depoimentos
L. Ora, tendo em conta os limites materiais impostos à prova testemunhal, esta não é meio idóneo para contrariar a eficácia da prova assente em suportes documentais e lançamentos que não tenha sido descredibilizada e, por isso, se mostre revestida de eficácia probatória plena – cf. art°s 392° e 393°, n° 2 do CC.
M. Nesta matéria a actuação da AT bastou-se com a prova legal, prova esta fundada na documentação constante da contabilidade da impetrante, ora recorrida e dos elementos e esclarecimentos que por esta foram disponibilizados no decurso da acção inspectiva quando instada para tal.
N. Destarte, procedeu correctamente às correcções que deram origem às liquidações controvertidas, as quais não enfermam de qualquer ilegalidade.
O. Pelo que deve a mesma manter-se na ordem jurídica, porquanto não enferma do vício que lhe assacou a douta sentença recorrida.
P. Em conclusão, não se verificando o vício sentenciado, a douta sentença padece de erro de valoração da matéria de facto e de erro de aplicação do direito, devendo considerar-se válidos os actos tributários de liquidação controvertidos e, como tal, manter-se na ordem jurídica.
Q. Pois, decidindo como decidiu, incorreu a douta sentença em erro de julgamento em matéria de facto e de direito, violando por isso as disposições legais enumeradas designadamente as constantes do CC e do CPC aplicáveis supletivamente por força do art. 2º do CPPT, bem como da alínea g) do nº 1 do art. 42° do CIRC.
Nestes termos,
Deve ser dado provimento ao presente recurso revogando-se a douta decisão recorrida, com as legais consequências. (…)”
A Recorrida contra alegou e formulou as seguintes conclusões:
a) Em primeiro lugar cabe dizer que sobre a questão levantada (erro de julgamento em matéria de facto), a recorrente não deu satisfação à exigência constante deste normativo, art.° 685-B do CPC
b) pois se limitou a fazer uma referência genérica aos depoimentos das testemunhas e a documentos constantes dos autos, sem especificar e concretizar o que quer que seja, pelo que a impugnação suscitada deverá ser rejeitada.
c) Sendo que não se mostra evidente nenhum erro, obscuridade, deficiência ou contradição na apreciação da prova em que o tribunal se consubstanciou, que permita proceder a qualquer alteração da matéria de facto.
d) Assim, face à não constatação de nenhum erro manifesto, vigora o princípio da livre apreciação da prova
SEM CEDER
e) Sendo que nenhuma censura nos merece a sentença colocada em crise pela recorrente.
f) A doutrina majoritária e a jurisprudência que os custos podem ser comprovados por qualquer documento, mesmo interno e por qualquer outro meio de prova, nomeadamente a testemunhal.
g) Assim, a falta de documento externo pode ser suprida por outros meios de prova que demonstrem de fama inequívoca a justeza do lançamento efectuado.
h) Ao lado do documento interno, a impugnante/recorrida demonstrou a existência e principais características da transacção.
i) Tendo carreado outros meios de prova, a saber: testemunhas, documentos auxiliares (como os mapas de aquisição que comunicava à PSP local) e fez clara e demonstrativa explanação da sua contabilidade e materialidade das compras.
j) Também a própria AT veio confirmar a materialidade das operações através do depoimento da testemunha M..
k) Portanto a AT confirma que a impugnante adquiriu aqueles materiais, vulgo sucata, e que os incorporou na sua actividade (fundição).
1) Logo a AT comprovou e atesta a indispensabilidade daqueles custos para a realização dos proveitos.
m) Perante esta factualidade, compete ao juiz aquilatar sobre o preenchimento da prova.
n) No caso dos presentes autos, a sentença considera estar feita a prova de que as vendas à impugnante foram realizadas, e como tal efectivamente ocorreram aqueles custos e que os mesmos se revelaram indispensáveis à realização de proveitos.
o) Certo é que um custo não documentado (ou incompleto/indevidamente documentado) assume efeitos fiscais se o contribuinte provar, por quaisquer meios ao seu dispor, a efectividade da operação e o montante do gasto.
p) Não houve pois qualquer erro de valoração da matéria de facto, porquanto os factos provados resultam dos documentos e prova testemunhal arrolada.
q) Tão pouco existiu erro na aplicação do direito, pois esteve bem o tribunal " a quo" quando considera ter sido feita "...as transacções documentadas e tituladas pelo montante de 106.044,00 euros, foram efectivamente efectuadas"
r) A prova testemunhal não contraria a prova documental, ela vem complementar e sustentar de forma inequívoca (no nosso caso) a veracidade das operações subjacentes aos documentos internos.
s) Sendo que a recorrente ao invocar a...
1. RELATÓRIO
A Recorrente, Autoridade Tributária e Aduaneira, interpôs recurso da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto que julgou procedente a impugnação judicial instaurada por A., Lda., melhor identificada nos autos, que impugnou judicialmente as liquidações de IRC e juros compensatórios do ano de 2005.
A Recorrente formulou nas respetivas alegações as seguintes conclusões que se reproduzem:
“(…)
A. Vem o presente recurso interposto da sentença que julgou procedente a impugnação deduzida contra a liquidação adicional de IRC do exercício de 2005, no que se refere às correcções efectuadas pela AT, relativas aos encargos relevados na contabilidade como custo do exercício, mas que consubstanciam despesas não documentadas,
B. A douta decisão recorrida incorreu em erro de valoração da matéria de facto, já que errou no juízo sobre quais os factos que se devem considerar provados com base nos documentos existentes no processo e na prova testemunhal produzida, valorando erradamente tal prova e infringindo assim o estabelecido nos art°s 508º-A, n°1, alínea e), 511º e 659° do Código de Processo Civil (CPC),
C. Porquanto concluiu que “Feita a prova de que efectivamente as vendas foram realizadas e, como tal, efectivamente ocorreram aqueles custos os mesmos têm de ser considerados” e que, desta forma, assiste razão a impugnante quando pugna pela ilegalidade da liquidação por não se considerar os custos que comprovadamente realizou para o exercício da sua actividade”.
D. A douta sentença sob recurso padece ainda de erro na aplicação do direito, porque não procedeu ao enquadramento da matéria de facto provada nos autos no disposto na alínea g) do n° 1 do art° 42° do CIRC, na medida em que considera ter sido feita “prova de que efectivamente as vendas foram realizadas”.
E. Resulta do conspecto dos elementos juntos aos autos que efectivamente não foi feita prova pela impetrante de quem foram os fornecedores das operações em crise, tituladas por documento interno.
F. Ora, para que as despesas suportadas pelos sujeitos passivos relevem como custos fiscais, devem estar devidamente documentadas, como resulta do art. 41°, n°1, alínea h), do CIRC, ou seja, devem estar comprovadas por documento externo que respeite as formalidades impostas pelo art. 35°, n° 5, do Código da IVA (CIVA), disposição legal que deve considerar-se aplicável a todo o ordenamento jurídico-tributário.
G. Não obstante, caso as despesas estejam insuficientemente documentadas, admite-se ainda que o contribuinte comprove o respectivo custo, como lho impõe o art. 23° do CIRC, pela demonstração de que as operações se realizaram efectivamente e do montante do gasto, para o que será necessário identificar devidamente os fornecedores, sem o que persiste a dúvida sobre a efectividade das operações.
H. Compete então ao contribuinte demonstrar inequivocamente, a realidade da operação – aquela operação e aquele fornecedor.
I. Ora, in casu, tal não se verificou pois, não obstante não estar em causa a materialidade das operações, o certo é que a impetrante não logrou identificar os respectivos fornecedores.
J. Não o entendeu assim o Tribunal a quo.
K. A convicção do Tribunal baseou-se na prova apresentada pela impugnante, nomeadamente no depoimento das testemunhas por si arroladas, desvalorizando a prova documental constituída pelo Relatório da Inspecção e documentos que o sustentam em sede de procedimento administrativo e a autorizar a conclusão a extraída e interpretando erradamente o que resultou desses mesmos depoimentos
L. Ora, tendo em conta os limites materiais impostos à prova testemunhal, esta não é meio idóneo para contrariar a eficácia da prova assente em suportes documentais e lançamentos que não tenha sido descredibilizada e, por isso, se mostre revestida de eficácia probatória plena – cf. art°s 392° e 393°, n° 2 do CC.
M. Nesta matéria a actuação da AT bastou-se com a prova legal, prova esta fundada na documentação constante da contabilidade da impetrante, ora recorrida e dos elementos e esclarecimentos que por esta foram disponibilizados no decurso da acção inspectiva quando instada para tal.
N. Destarte, procedeu correctamente às correcções que deram origem às liquidações controvertidas, as quais não enfermam de qualquer ilegalidade.
O. Pelo que deve a mesma manter-se na ordem jurídica, porquanto não enferma do vício que lhe assacou a douta sentença recorrida.
P. Em conclusão, não se verificando o vício sentenciado, a douta sentença padece de erro de valoração da matéria de facto e de erro de aplicação do direito, devendo considerar-se válidos os actos tributários de liquidação controvertidos e, como tal, manter-se na ordem jurídica.
Q. Pois, decidindo como decidiu, incorreu a douta sentença em erro de julgamento em matéria de facto e de direito, violando por isso as disposições legais enumeradas designadamente as constantes do CC e do CPC aplicáveis supletivamente por força do art. 2º do CPPT, bem como da alínea g) do nº 1 do art. 42° do CIRC.
Nestes termos,
Deve ser dado provimento ao presente recurso revogando-se a douta decisão recorrida, com as legais consequências. (…)”
A Recorrida contra alegou e formulou as seguintes conclusões:
a) Em primeiro lugar cabe dizer que sobre a questão levantada (erro de julgamento em matéria de facto), a recorrente não deu satisfação à exigência constante deste normativo, art.° 685-B do CPC
b) pois se limitou a fazer uma referência genérica aos depoimentos das testemunhas e a documentos constantes dos autos, sem especificar e concretizar o que quer que seja, pelo que a impugnação suscitada deverá ser rejeitada.
c) Sendo que não se mostra evidente nenhum erro, obscuridade, deficiência ou contradição na apreciação da prova em que o tribunal se consubstanciou, que permita proceder a qualquer alteração da matéria de facto.
d) Assim, face à não constatação de nenhum erro manifesto, vigora o princípio da livre apreciação da prova
SEM CEDER
e) Sendo que nenhuma censura nos merece a sentença colocada em crise pela recorrente.
f) A doutrina majoritária e a jurisprudência que os custos podem ser comprovados por qualquer documento, mesmo interno e por qualquer outro meio de prova, nomeadamente a testemunhal.
g) Assim, a falta de documento externo pode ser suprida por outros meios de prova que demonstrem de fama inequívoca a justeza do lançamento efectuado.
h) Ao lado do documento interno, a impugnante/recorrida demonstrou a existência e principais características da transacção.
i) Tendo carreado outros meios de prova, a saber: testemunhas, documentos auxiliares (como os mapas de aquisição que comunicava à PSP local) e fez clara e demonstrativa explanação da sua contabilidade e materialidade das compras.
j) Também a própria AT veio confirmar a materialidade das operações através do depoimento da testemunha M..
k) Portanto a AT confirma que a impugnante adquiriu aqueles materiais, vulgo sucata, e que os incorporou na sua actividade (fundição).
1) Logo a AT comprovou e atesta a indispensabilidade daqueles custos para a realização dos proveitos.
m) Perante esta factualidade, compete ao juiz aquilatar sobre o preenchimento da prova.
n) No caso dos presentes autos, a sentença considera estar feita a prova de que as vendas à impugnante foram realizadas, e como tal efectivamente ocorreram aqueles custos e que os mesmos se revelaram indispensáveis à realização de proveitos.
o) Certo é que um custo não documentado (ou incompleto/indevidamente documentado) assume efeitos fiscais se o contribuinte provar, por quaisquer meios ao seu dispor, a efectividade da operação e o montante do gasto.
p) Não houve pois qualquer erro de valoração da matéria de facto, porquanto os factos provados resultam dos documentos e prova testemunhal arrolada.
q) Tão pouco existiu erro na aplicação do direito, pois esteve bem o tribunal " a quo" quando considera ter sido feita "...as transacções documentadas e tituladas pelo montante de 106.044,00 euros, foram efectivamente efectuadas"
r) A prova testemunhal não contraria a prova documental, ela vem complementar e sustentar de forma inequívoca (no nosso caso) a veracidade das operações subjacentes aos documentos internos.
s) Sendo que a recorrente ao invocar a...
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