Acórdão nº 00388/11.8BEAVR de Tribunal Central Administrativo Norte, 13-10-2016

Data de Julgamento13 Outubro 2016
Número Acordão00388/11.8BEAVR
Ano2016
ÓrgãoTribunal Central Administrativo Norte
Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

I. Relatório

S…, S.A., NIPC 5…, com sede na Rua…, em Esmoriz, e o Excelentíssimo Representante da Fazenda Pública, interpuseram recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, proferida em 30/09/2013, que, na impugnação judicial deduzida contra as liquidações adicionais de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (IRC), relativo aos exercícios de 2005, 2006, 2007, 2008, derrama e respectivos juros compensatórios e juros moratórios, da qual resultou o montante global a pagar de € 3.292.390,82, julgou procedente o pedido relativo às liquidações de juros moratórios dos exercícios de 2005 e 2006, anulando-se consequentemente as mesmas, e improcedente o demais, mantendo as liquidações de IRC, respectivos juros compensatórios e derrama inalteradas na ordem jurídica.

A Recorrente S... terminou as suas alegações de recurso formulando as conclusões que se reproduzem de seguida:
1. “– Existe omissão na sentença, porquanto não emite consideração sobre a parte alegada, de que as Compras não são Custos (Gastos) do exercício, Art.º 125º do CPPT.
2. – Existe omissão na sentença, porquanto não emite consideração sobre a parte alegada, de que as “auto faturas” estão devidamente documentadas, Art.º 125º do CPPT.
3. – Não dá como provada a prova testemunhal indicada pela Recorrente, conforme, Art.º 119º do CPPT.
4. – Dá como provada a prova testemunhal, das testemunhas indicadas pela Autoridade Tributária, que não mediaram os factos, o que não pode ser, Art.º 119º do CPPT.
5. – Quanto ao facto dado como provado em d), pág. 105 a 112 da sentença, apenas pode ser lido, como um Processo de Inquérito, que corre os seus termos, em condições normais e nada mais.
6. – Deve ser alterado, dos factos não provados, para os factos provados, o ponto a), pois resultou provado a veracidade das operações/aquisições de mercadorias (vulgo sucatas) e serviços de transporte às sociedades, foram prestados.
7. – Por outro lado, o transcrito do relatório da inspeção pelo A..., na pág. 138 é contrário e contraditório, com o inscrito do testemunho nas pág. 116 a 117, tudo da sentença, pelo que o relatório da inspeção é falso e devem os factos dados como provados em e) ser alterados em conformidade.
8. – A douta sentença padece do vício de violação da lei ao não reconhecimento das compras documentadas por faturas dos fornecedores e nas auto faturas, em violação dos Art.º 23º e Art.º 45º (anterior Art.º 42º), n.º 1, g), ambos do CIRC.
9. – Existe vício de violação da lei do Art.º 23º do CIRC, ao concluir que as aquisições alegadamente realizadas pelos referidos fornecedores não traduzem operações reais e consequentemente não podem ser aceites fiscalmente.
10. – Estando em causa liquidações de IRC que têm por fundamento o não reconhecimento de custos declarados (compras) pela Recorrente, compete à Autoridade Tributária fazer prova de que estão verificados os pressupostos legais que legitimam a sua atuação.
11. – Tendo o juízo da Autoridade Tributária assentado na consideração de que as operações e o valor mencionado nas faturas em causa não correspondem à realidade, haverá de demonstrar a existência de indícios sérios de que as operações referidas nas faturas foram simuladas.
12. – A Recorrente demonstrou de modo sério e seguro, pelas testemunhas apresentadas, que os documentos sociais são verídicos.
13. – Não obstante, quanto à autofacturação, as faturas cumprem com as obrigações comerciais e fiscais.
14. – Contudo, na hipótese, de incumprimento das obrigações comerciais e fiscais, tal não levava a concluir na desconsideração dos gastos fiscais, Art.º 23º do CIRC.
15. – Depois, nenhum elemento existe que ligue a recorrente com a teia imaginada pela Autoridade Tributária e demais autoridades.
16. – Pelo que são ilegais as liquidações de IRC e respetivos Juros Compensatórios que se fundamentam na desconsideração das operações e do valor mencionados nas faturas e autofaturas, o que conduz à sua anulação.
17. – Existe vício de caducidade do direito à liquidação, cf. Art.º 45º, n.º 5 da LGT, na liquidação de IRC e Juros Compensatórios referentes ao exercício de 2005.
18. – Pois, somente a partir da data de 06.04.2011 é que a recorrente teve conhecimento da existência do referido processo n.º 39/08.8JAAVR, pelo que só a partir desta data se podia suspender os períodos de imposto que ainda estivessem em curso.
NESTES TERMOS,
Deve a decisão apreciar os vícios e erros alegados, com efeitos na anulação das liquidações impugnadas de IRC e Juros Compensatórios, para que assim se faça JUSTIÇA.”
****
A Recorrida Fazenda Pública não apresentou contra-alegações neste âmbito.

Por seu lado, a Recorrente Fazenda Pública finalizou as respectivas alegações com as seguintes conclusões:
I. “Visa o presente recurso reagir contra a douta sentença proferida nos autos em epígrafe, que julgou procedente a impugnação judicial deduzida por S..., S.A., na parte referente às liquidações de juros moratórios dos exercícios de 2005 e 2006, pretendendo a Fazenda Pública a sua revogação e substituição por decisão que considere tal impugnação totalmente improcedente.
II. O douto Tribunal recorrido considerou que – decorrendo as liquidações impugnadas de acções inspectivas – só após a notificação de tais liquidações ao contribuinte e só após o decurso do respectivo prazo de pagamento é que poderia haver lugar aos mencionados juros de mora.
III. Tal decisão não nos mereceria censura se os juros de mora impugnados decorressem das liquidações desencadeadas pela acção inspectiva, o que não é manifestamente o caso.
IV. Quanto aos juros de mora do ano de 2005, compulsando o teor do documento n.º 1 junto à PI, constatamos que tais juros se reportam ao não pagamento da autoliquidação, nos termos do então artigo 101.º do CIRC (actual artigo 109.º) e não, como alegou a impugnante e entendeu o douto Tribunal a quo, a juros do não pagamento da liquidação operada pelos Serviços de Inspecção.
V. Nem de outro modo poderia ser, atendendo ao diminuto valor dos juros em apreço (€ 191,97) quando comparado com o valor do IRC, apurado pela Inspecção, a pagar para aquele ano (€ 219.884,65).
VI. Idêntico raciocínio vale para os juros de mora do ano de 2006, os quais, como resulta do documento n.º 2 junto à PI, se reportam ao atraso no pagamento dos juros compensatórios que incidiram sobre os pagamentos por conta, nos termos dos então artigos 101.º e 99.º n.º 2 do CIRC (actuais artigo 109.º e 107.º, respectivamente),
VII. E não, como também alegou a impugnante e entendeu o douto Tribunal a quo, a juros do não pagamento da liquidação operada pelos Serviços Inspectivos.
VIII. Ademais, nem de outro modo poderia ser, atendendo ao diminuto valor dos juros em apreço (€ 22,56) quando comparado com o valor do IRC, apurado pela Inspecção, a pagar para aquele ano (€ 1.009.002,07).
IX. Em CONCLUSÃO, trata-se de juros de mora que não têm qualquer ligação com as correcções operadas em sede inspectiva, mas sim com falta de pagamento atempado, por parte da recorrida, quer da autoliquidação quer dos juros compensatórios relativos aos pagamentos por conta a que se encontrava obrigada.
X. Incorreu, assim, o douto Tribunal a quo em erro de julgamento de direito, tendo sido violados os artigos 101.º e 102.º do CIRC (redacção e numeração à data), bem como o n.º 1 do artigo 44.º da LGT.
Nestes termos e nos melhores de direito, deve o presente recurso ser considerado procedente, revogando-se a douta decisão por erro de julgamento de direito e substituindo-a por outra que considere a impugnação totalmente improcedente, assim se fazendo JUSTIÇA.”
****
A Recorrida S... não apresentou contra-alegações nesta sede.
****
O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido de dever ser negado provimento ao recurso da impugnante e concedido provimento ao recurso interposto pela Fazenda Pública.
****
Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
****
II - DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO – QUESTÕES A APRECIAR

Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente S..., estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, sendo que importa decidir se a sentença recorrida incorreu em nulidade, por omissão de pronúncia, e em erro de julgamento de facto e de direito ao considerar que as facturas emitidas pelas sociedades “Transportes E..., Lda., L..., Transportes Unipessoal, Lda., F..., Comércio de Sucatas e Reciclagens, Lda., Suc..., Comércio de Sucatas, Lda., Fernando, M..., Unipessoal, Lda.” não correspondem a transacções reais, e que não decorreu o prazo de caducidade da liquidação de IRC, relativa ao exercício de 2005.
Importa, ainda, decidir a questão colocada pela Recorrente Fazenda Pública, apreciando se as liquidações de juros de mora, relativos aos exercícios de 2005 e 2006, são devidas, uma vez que decorrem do não pagamento da autoliquidação e não das liquidações desencadeadas pela acção inspectiva.

III. Fundamentação

1. Matéria de facto

Da sentença prolatada em primeira instância, consta decisão da matéria de facto com o seguinte teor:
Factos provados
Com relevância para a decisão a proferir nos presentes autos, consideram-se provados os seguintes factos:

a) A Impugnante exerce a actividade de Comércio por Grosso de Minério, CAE 04672, (cfr. Relatório de Inspecção Tributária, a fls. 1 e SS do PA apenso aos presentes autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido).

b) No cumprimento das Ordens de Serviço n.º OI201001816/ OI201001097 OI201001098, os Serviços da Inspecção Tributária da Direcção de Finanças de Aveiro desencadearam um procedimento inspectivo à aqui Impugnante, com âmbito parcial, visando os exercícios de 2005, 2006, 2007 e 2008, tendo em resultado sido efetuados correcções...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT