Acórdão nº 00032/08.0BEVIS de Tribunal Central Administrativo Norte, 11-01-2024

Data de Julgamento11 Janeiro 2024
Ano2024
Número Acordão00032/08.0BEVIS
ÓrgãoTribunal Central Administrativo Norte
Acordam em conferência os Juízes Desembargadores que compõem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

I - Relatório
«AA», NIF ...10, residente no Lugar ..., 44 ... ... e outros apresentaram o presente recurso de apelação relativamente à sentença proferida no Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu em 8/2/2017, pela qual foi julgada improcedente a sua impugnação das liquidações oficiosas de IVA dos anos de 2004 a 2005, no montante global de € 3 372,70 €.

As alegações de recurso dos Recorrentes terminam com as seguintes conclusões:
«EM CONCLUSÃO:
1) A sentença não deu como provado o depoimento das testemunhas apresentadas pelos recorrentes, quando o devia ter feito, cf. Art.° 115°, 118° e 119° do CPPT e Art.° 392° do C. Civil.
2) Existe erro de apreciação na sentença, quando diz que as facturas em causa não obedeceram aos requisitos exigidos no Art.° 35° do CIVA, concretamente não constava o NIF correcto do fornecedor dos bens (pág. 14), quando de facto, não constava o NIF correcto da adquirente.
3) Pelo que a sentença erra e deve ser substituída por outra.
4) Contudo, pelo Ofício-Circulado n.° 30030, de 15.12.2000, da DSIVA, foi transmitido que quanto ao NIF do adquirente dos bens ou destinatário dos serviços, quando este se trata de um empresário em nome individual, a fazer constar das facturas ou documentos equivalentes, o mesmo deverá ser, desde já, o da pessoa singular atribuído pelo Ministério das Finanças, sugerindo-se que estes alertem desse facto os respectivos fornecedores de bens ou prestadores de serviços.
5) Não obstante, a alínea a), do n.° 5, do Art.° 35° do CIVA (actual Art.° 36°), impõe a obrigação das facturas mencionarem a identificação fiscal dos sujeitos passivos, mas não comete explicitamente ao adquirente a obrigação de controlar se essa identificação é ou não verdadeira, cf. Acórdão do STA, Proc. 076/11, de 14.12.2011,2a Secção.
6) Ademais, o Art.° 72° do CIVA, na redacção dada à data dos factos (Actual Art.° 79°) não menciona o número de identificação fiscal entre os elementos da factura cuja falta ou inexactidão responsabiliza o adquirente, em solidariedade com o transmitente, pelo pagamento do imposto.
7) No caso dos autos, apenas se constata que o fornecedor mencionou o número da adquirente, empresária em nome individual atribuído pelo Registo Nacional de Pessoas Colectivas, nos termos do DL n.° 42/89, de 03/02 (o número começado por 8) e não o número atribuído pela AT, nos termos do DL n.° 463/79, de 30/11 (o número começado por 1), mas não impede a eliminação da dedução do IVA.
8) Por outro lado, deve ser dado como provado que os bens constantes das facturas emitidas pelo fornecedor “[SCom01...], Lda.”, foram efectivamente transmitidas por este à recorrente, cf. Anexos 1 e 2 do relatório da inspecção.
9) Não obstante, a AT ao concluir pelo não cumprimento dos requisitos formais previstos no n.° 5, do Art.° 35°, do CIVA, só pelo simples facto de nas facturas constar um NIF inválido da recorrente, não pode recusar o direito à dedução do IVA se a AT tiver ao seu dispor elementos que permitem comprovar o preenchimento dos requisitos substanciais das operações a que as facturas se reportam.
10) Neste sentido, o recente Acórdão do Tribunal de Justiça da União Europeia, no processo C-516/14, de 15.09.2016, no qual se dá prioridade à substância e não à forma.
11) Pelo que existe vício de violação aos Art.° 19° e 35°, ambos do CIVA.
12) Deve ser dado como provado que os filhos e o marido da recorrente utilizavam os computadores portáteis, ao serviço da recorrente, para o norte do território nacional para encontros de negócios e angariação de clientes, conforme ficou demonstrado pela prova testemunhal.
13) Acresce, a demonstrar tal factualidade, que existem documentos (carteira de clientes) que provam que os filhos e o marido da recorrente se deslocaram para encontros de negócios e angariação de clientes fora do estabelecimento.
14 O que num nexo de causa-efeitos deduz, a utilização dos computadores portáteis, ao serviço da recorrente, para o norte do território nacional para encontros de negócios e angariação de clientes.
15) Pelo que nesta parte, o IVA suportado na aquisição dos computadores em causa devem ser dadas como provadas, cf. Art.° 115° do CPPT.
16) Bem como devia ter dado como provado, que a sociedade utilizava os recursos da sociedade “[SCom02...]” no exercício da sua actividade empresarial, nomeadamente instalações, água e electricidade e a gerente.
17) Pelo que nesta parte, os gastos e o respectivo IVA, com os serviços prestados devem ser dados como provados, cf. Art.° 115° do CPPT.
18) Assim, a dedução do IVA cabe na alçada do Art.° 20° do CIVA, pelo que nas liquidações recorridas existe vício de violação da lei.
19) Estando em causa liquidações de IVA que têm por fundamento a não dedução do IVA suportado pela recorrente, compete à AT fazer prova de que estão verificados os pressupostos legais que legitimam a sua actuação.
20) Tendo o juízo da AT assentado na consideração de que as operações e o valor mencionado nas facturas em causa não correspondem à realidade, haverá de demonstrar a existência de indícios sérios de que as operações referidas nas facturas foram simuladas e que os computadores portáteis adquiridos não se encontram afetos à atividade da recorrente e ainda de que não existiram subcontratos.
21 A recorrente demonstrou de modo sério e seguro, pelas testemunhas apresentadas, que os documentos sociais são verídicos.
22) Pelo que deve ser decretada, sem mais, a anulação das liquidações recorridas.
Nestes termos;
Deve a douta decisão recorrida ser revogada e substituída por outra que aprecie os vícios e erros alegados, com efeitos na anulação das liquidações recorridas e com todas as consequências legais, para que assim se faça JUSTIÇA.


Notificada, a Recorrida não respondeu à alegação.

O Digno Magistrado do Ministério Público neste Tribunal apresentou douto parecer no sentido da improcedência do recurso, redutível aos seguintes excertos:
«(…)
(…) nesta sede recursiva, os Recorrentes vêm imputar à douta sentença em crise erro de julgamento, (i) quer no que tange à matéria de facto apurada por errada selecção e valoração da prova produzida (ii) quer, ainda, no que concerne à ilegalidade das liquidações por as facturas emitidas pela sociedade [SCom01...], Lda.. não terem sido passadas na forma legal, com violação do disposto nos artigos 19°, n° 2 e 35°, n°5, ambos do CIVA,
Por indevida dedução de IVA na aquisição de dois computadores portáteis, por não se encontrarem afectos à respectiva actividade, com violação do artigo 20°, n° 1, alínea a), do CIVA, 
Por as facturas emitidas pela sociedade [SCom02...], Lda. não titularem operações reais e por falta de fundamentação.
Ora, constitui entendimento uniforme e pacífico da doutrina e da jurisprudência que o âmbito do recurso se encontra delimitado pelas conclusões extraídas da motivação, pelo Recorrente, não podendo o tribunal ad quem conhecer de matéria que nelas não tenha sido versada, com a única ressalva dos casos do seu conhecimento oficioso, de harmonia com as disposições conjugadas dos artigos 282°, n° s 5 a 7 do CPPT e 635°, n° 4 do CPC, na redacção que lhe foi dada pela Lei n° 41/2013, de 26 de Julho, aqui aplicável ex. vi do artigo 281° do CPPT.
Cumpre-nos, pois, emitir parecer, o que faremos de imediato.
ERRO DE JULGAMENTO DA MATÉRIA DE FACTO
Entendem os Recorrentes, quanto à decisão da matéria de facto que o tribunal a quo efectuou uma errada selecção e apreciação de todos os elementos de prova, ao desconsiderar a prova testemunhal e documental por si oferecida, a qual, no seu entendimento, era suficiente para que fossem considerados provados os factos constantes das Conclusões 1 a 21 das Alegações de Recurso, insertas a fls. 155 a 157 do processo fiscal
Vejamos se lhes assiste razão.
Quanto à factualidade há que referir que, por um lado, é um dado adquirido e insofismável que a trave-mestra da valoração da prova testemunhal assenta nos princípios da livre apreciação, da oralidade e da imediação e daí que, em bom rigor, o tribunal ad quem não possa sindicá-la na globalidade.
Além disso, conforme foi firmado pelo Supremo Tribunal de Justiça, “O recurso em matéria de facto («quando o recorrente impugne a decisão proferida sobre a matéria de facto») não pressupõe uma reapreciação pelo tribunal de recurso do complexo dos elementos de prova produzidos e que serviram de fundamento à decisão recorrida), Mas apenas uma reapreciação sobre a razoabilidade da convicção formada pelo tribunal a quo relativamente à decisão sobre «os pontos de facto» que o recorrente considere incorrectamente julgados, na base da avaliação das provas que, na indicação do recorrente, imponham «decisão diversa» da recorrida " (cf. Acórdão do STJ, de 10 de Janeiro de 2007, no processo n° 06P3518, disponível, tal como os que infra se citarão, em www.dgsi.pt; sublinhado nosso).
Ora, no caso vertente, a convicção extraída da prova testemunhal indicada pelos Recorrentes não se nos afigura irrazoável, infundamentada ou arbitrária, de molde a justificar ou, talvez, impor, a censura deste tribunal ad quem.
Poderá argumentar-se que tal prova é bastante e supre qualquer deficiência revelada pela prova documental, tanto mais que no processo judicial tributário são permitidos todos os meios de prova - vigorando plenamente o princípio da livre admissibilidade dos meios de prova (cf. art.° 115.°, n.° 1, do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT)) - e que no caso não se exige qualquer especial meio de prova, designadamente a prova documental.
No entanto, no que concerne a esta prova, hã que realçar que se a decisão do julgador estiver devidamente fundamentada e for uma das soluções plausíveis, segundo as regras da lógica, da ciência e da experiência, ela será inatacável, visto ser...

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