Acórdão (extrato) n.º 261/2022

Data de publicação06 Maio 2022
Data16 Janeiro 2016
Número da edição88
SeçãoSerie II
ÓrgãoTribunal Constitucional
N.º 88 6 de maio de 2022 Pág. 291
Diário da República, 2.ª série
PARTE D
TRIBUNAL CONSTITUCIONAL
Acórdão (extrato) n.º 261/2022
Sumário: Decide, com referência à campanha eleitoral para a eleição dos deputados à Assem-
bleia Legislativa da Região Autónoma dos Açores realizada em 16 de outubro de 2016,
julgar parcialmente procedentes os recursos interpostos pelo CDS — Partido Popular
(CDS-PP) e pelo mandatário financeiro da campanha, da decisão de 31 de julho de
2020, da Entidade das Contas e Financiamentos Políticos.
Processo n.º 1040/20
Acordam, em Plenário, no Tribunal Constitucional
I — Relatório
1Por decisão de 3 de setembro de 2018, a Entidade das Contas e Financiamentos Po-
líticos (doravante, “ECFP”) julgou prestadas, com irregularidades, as contas apresentadas pelo
CDS — Partido Popular (CDS -PP), relativas à campanha eleitoral para a eleição, realizada em 16
de outubro de 2016, dos deputados para a Assembleia Legislativa da Região Autónoma dos Aço-
res — cf. artigos 27.º, n.º 4, da Lei n.º 19/2003, de 20 de Junho (Lei do Financiamento dos Partidos
Políticos e das Campanhas Eleitorais, doravante, “LFP”) e 43.º, n.º 1, da Lei Orgânica n.º 2/2005,
de 10 de Janeiro (Lei de Organização e Funcionamento da Entidade das Contas e Financiamentos
Políticos, doravante, “LEC”).
As irregularidades apuradas foram as seguintes:
a) Ações e meios não refletidos nas contas de campanha — subavaliação de despesas e
receitas, em violação do artigo 12.º da Lei n.º 19/2003, ex vi artigo 15.º n.º 1, do mesmo diploma;
b) Não disponibilização ao Tribunal Constitucional da prova do encerramento da conta bancária,
situação atentatória do artigo 15.º, n.º 3, da Lei n.º 19/2003;
c) Existência de movimentos na conta bancária sem reflexo direto nas contas da campanha e
movimento no mapa da despesa sem reflexo na conta bancária — receitas e despesas subavalia-
das/sobreavaliadas, situação atentatória do artigo 15.º, n.º 1, da Lei n.º 19/2003;
d) Existência de cedência de bens a título de empréstimo, com impossibilidade de conclusão
pela sua razoabilidade e valorização, situação atentatória do artigo 15.º, n.º 1, da Lei n.º 19/2003;
e) Consideração de despesas inelegíveis, em violação do disposto no artigo 19.º, n.º l, da Lei
n.º 19/2003;
f) Existência de despesas valorizadas abaixo do valor de mercado, em violação do disposto
no artigo 15.º, n.º 1, da Lei n.º 19/2003;
g) Inexistência ou existência com deficiência de suportes documentais de algumas despesas,
atentando contra o artigo 12.º, aplicável ex vi artigo 15.º, n.º 1, e contra o artigo 19.º, n.º 2, todos
da Lei n.º 19/2003;
h) Deficiência na apresentação dos elementos de prestação de contas e não apresentação
de todos os elementos, atentando contra o artigo 12.º, aplicável ex vi artigo 15.º, n.º 1, ambos da
Lei n.º 19/2003.
2 — Na sequência da referida decisão relativa à prestação das contas, a ECFP levantou dois
autos de notícia e instaurou os correspondentes processos de contraordenação, um contra o CDS-
-PP (Processo n.º 9/2019) e outro contra Pedro Gabriel Correia Nunes Teixeira Pinto, enquanto
mandatário financeiro da campanha em questão (Processo n.º 10/2019), tendo os arguidos sido
notificados, nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 44.º, n.os 1 e 2, da LEC e 50.º do
Regime Geral das Contraordenações (Decreto -Lei n.º 433/82, de 27 de outubro, doravante “RGCO”),
e tendo cada um deles apresentado a sua defesa.
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PARTE D
No âmbito dos referidos procedimentos contraordenacionais, a ECFP, aplicou as seguintes
sanções:
a) No processo n.º 9/2019, por decisão de 31 de julho de 2020, aplicou ao arguido CDS — Par-
tido Popular (CDS -PP), uma coima no valor de 13 (treze) SMN de 2008, perfazendo a quantia de
€ 5.538,00 (cinco mil quinhentos e trinta e oito euros), pela prática da contraordenação prevista e
punida pelo artigo 31.º, n.os 1 e 2, da LFP;
b) No processo n.º 10/2019, por decisão de 31 de julho de 2020, aplicou ao arguido Pedro
Gabriel Correia Nunes Teixeira Pinto, enquanto mandatário financeiro, uma coima no valor de 3
(três) SMN de 2008, perfazendo a quantia de €1.278,00 (mil duzentos e setenta e oito euros), pela
prática da contraordenação prevista e punida pelo artigo 31.º, n.º 1, da LFP.
3Inconformados, cada um dos arguidos impugnou a respetiva decisão sancionatória,
junto do Tribunal Constitucional, nos termos dos artigos 23.º e 46.º, n.º 2, da LEC, e do artigo 9.º,
alínea e), da LTC.
O arguido Pedro Gabriel Correia Nunes Teixeira Pinto fez assentar a impugnação nos seguin-
tes fundamentos:
«I — Excepção Peremptória
Da exceção de prescrição:
1 — Dispõe o artigo 27.º do RGCO que “o procedimento por contraordenação extingue -se por
efeito de prescrição logo que sobre a prática da contraordenação hajam decorrido [...] três anos,
quando se trate de contraordenação a que seja aplicável uma coima de montante máximo igual ou
superior a €2.493,99 e inferior a €49.879,79”.
2Ressalve -se que a matéria aqui em causa é atinente ao ano de 2016.
3Ou seja, entre os factos e o presente recurso passaram 4 (quatro) anos.
4Portanto, superior ao tempo indicado no preceito supramencionado.
5Assim, por factos que remontam a 2016, entendeu a ECFP aplicar ao Arguido uma coima
no valor de €1.278,00 (mil duzentos e setenta e oito euros).
6Ademais, os presentes autos têm origem na Deliberação da ECFP de 03 de Setembro
de 2018, relativo às contas da campanha à eleição para a Assembleia Legislativa da Região Au-
tónoma dos Açores, em 2016, como, aliás, se verifica através da leitura da origem do processo na
decisão da ECFP.
7Também aqui, entre a Decisão e a presente data, correram mais de 2 (dois) anos.
8Ora, salvo melhor opinião, tais factos, prescrição, constituem uma causa extintiva da
contraordenação aplicada ao Arguido, com efeito, é nosso entendimento que determinam a impro-
cedência total da decisão.
9 — Caso ainda assim não se entenda, o n.º 3 do artigo 28 do RGCO dispõe que “A prescrição
do procedimento tem sempre lugar quando, desde o seu início e ressalvado o tempo de suspensão,
tiver decorrido o prazo da prescrição acrescido de metade”.
10Com o devido respeito, o procedimento prescreveu em Outubro de 2020, precisamente
4 (quatro) anos após o seu início.
11O que significa, para todos os efeitos, que já decorreu o prazo máximo de prescrição e
que, desde já, se invoca.
12Atendendo a que a moldura penal abstrata aplicável à infração em causa é de coima de
€2.493,99 e inferior a €49.879,79, e que, no limite, seria este máximo de coima o valor atendível para
decidir da prescrição do procedimento, com o devido respeito, há que concluir que esta (prescrição)
já decorreu, por o máximo da coima abstrata ser afinal, no caso, inferior a €49.879,79 (e atenta
ainda a concreta operância de circunstâncias interruptivas e suspensivas da prescrição — art. 28.º,
n.º 1 — a), e) e d), n.º 3 e 27.º n.º 1 -a) e n.º 2 do RGCO.
13Pelo que, desde já, se invoca expressamente a prescrição do procedimento.
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PARTE D
II — Da Auditoria
14 — O procedimento de auditoria às Contas da Campanha Eleitoral para eleição para a As-
sembleia Legislativa da Região Autónoma dos Açores, em 2016, visou a observação do cumprimento
dos preceitos legais vigentes por parte do Partido, designadamente, a análise dos procedimentos
de controlo interno adotados pelo Mandatário Financeiro.
15Em respeito ao Artigo 25.º da Lei n.º 19/2003, de 20 de Junho, retificada pela Declara-
ção de Retificação n.º 17/2018, de 18 de Junho, pode, de facto, “A Entidade das A Entidade das
Contas e Financiamentos Políticos pode requisitar ou destacar técnicos qualificados de quaisquer
serviços públicos ou recorrer, mediante contrato, aos serviços de peritos ou técnicos qualificados
exteriores à Administração Pública, a pessoas de reconhecida experiência e conhecimentos em
matéria de atividade partidária e campanhas eleitorais, a empresas de auditoria ou a revisores
oficiais de contas”. [...].
16Nesse sentido, o relatório da ECFP teve por base as conclusões do trabalho realizado
pela Sociedade de Revisores de Contas ANA GOMES & CRISTINA DOUTOR, SROC, L.da
17Não questionando, de todo, a competência e experiência dos técnicos exteriores des-
tacados pela ECFP, não pode o Signatário deixar de levantar a questão no que respeita ao conhe-
cimento que estes detêm em matéria de atividade partidária e campanhas eleitorais.
18Sendo certo que, para todos os efeitos, desconhece.
19É certo que um Partido, cada vez mais, assume uma gestão profissional e empresarial
das suas contas, todavia, não podemos omitir ou deixar de considerar a essência e as diferentes
dinâmicas que distinguem um Partido de uma Empresa.
20Desde logo, em sentido contrário ao sector empresarial, “os Partidos concorrem para
a livre formação e o pluralismo de expressão da vontade popular e para a organização do poder
político” e apresenta como fins, entre outros, “contribuir para o esclarecimento plural e para o exer-
cício das liberdades e direitos políticos dos cidadãos”, “em geral, contribuir para a promoção dos
direitos e liberdades fundamentais e o desenvolvimento das instituições democráticas”, conforme
plasmado na Lei Orgânica n.º 2/2003, de 22 de Agosto, Lei dos Partidos Políticos.
21Portanto, assumem um posicionamento distinto e fins diferentes.
22Perante isto, a verdade é que o Signatário desconhece a experiência e o conhecimento
dos técnicos exteriores no que respeita à atividade e dinâmica partidária,
23Ademais, quer o Partido, quer o Signatário, não foram notificados pela ECFP da desig-
nação dos peritos/técnicos, nem, aliás, da existência de uma ordem de serviço, em que constasse
a: i) identificação dos técnicos responsáveis com competência para a prática de atos inspetivos;
ii) a credenciação dos peritos/técnicos; iii) carta -aviso com notificação prévia referente ao início do
procedimento; iv) atos materiais da auditoria.
24Pese embora a existência de um conjunto de e -mails remetidos pela Sociedade de Re-
visores Oficiais de Contas supramencionada ao Partido, que sugerem o início do procedimento, a
verdade é que nunca foi comunicada qualquer ordem de serviço ou ainda identificados os técnicos
responsáveis pela auditoria.
25Ao contrário do que era feito no passado, em que o Partido era convocado para uma
reunião e aí informado, quer da ordem de serviço da auditoria, quer dos peritos/técnicos respon-
sáveis pela mesma.
26Releve -se que a ordem de serviço e a credenciação dos peritos/técnicos são instru-
mentos fundamentais no que respeita à segurança e proteção jurídica dos destinatários, no caso,
do CDS -PP.
27Designadamente no que respeita à sensível matéria da proteção de dados e em concor-
dância com as orientações e Deliberações da Comissão Nacional de Proteção de Dados.
28Tanto mais que, a não ser exatamente assim, dá -se o caso de qualquer pessoa solicitar
o acesso às contas do Partido, bastando, para o efeito, comunicar que representa a ECFP.
29Ora, a inexistência de uma ordem de serviço, como a omissão da identificação dos
peritos/técnicos, podem concretizar, salvo melhor opinião, a nulidade e, consequentemente, a
ilegalidade de todo o processo de inspeção que deu origem ao processo de contraordenação aqui
levantado.

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