Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo n.º 6/2017

Data de publicação26 Setembro 2017
SectionSerie I
ÓrgãoSupremo Tribunal Administrativo

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo n.º 6/2017

Acórdão do STA de 08-06-2017, no Processo n.º 1469/16 - Pleno da 1.ª Secção

Acordam em conferência no Pleno da Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo:

1 - Relatório

1.1 - A..., inconformado com o acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul [TCA/S], datado de 05.05.2016, que no âmbito de reclamação deduzida por B... contra aquele e o Município de Santa Cruz, impugnando o despacho do juiz do TAF/Funchal de não admissão do recurso jurisdicional interposto na ação administrativa especial do despacho saneador [no qual se julgou procedente exceção de ilegitimidade ativa do A./Reclamante e absolveu da instância os referidos demandados], manteve o despacho do ali Relator, proferido em 09.02.2015, que havia revogado e admitido aquele recurso, veio interpor recurso para uniformização de jurisprudência nos termos do art. 152.º do CPTA, apresentando o seguinte quadro conclusivo que se reproduz [cf. fls. 03 e segs. - paginação processo suporte físico tal como as referências posteriores a paginação salvo expressa indicação em contrário]:

"...

1 - Ao considerar que do despacho saneador que, julgando procedente exceção de ilegitimidade processual ativa, absolveu os demandados da instância cabe recurso e não reclamação para a conferência, o Acórdão recorrido faz errada interpretação do art. 87.º do CPTA, já que este preceito não autoriza qualquer diferenciação de regime face às restantes decisões do juiz relator.

2 - Assim como viola claramente o disposto no art. 27.º, n.º 2 do CPTA do qual resulta uma regra aplicável a todas as decisões proferidas pelo juiz relator, seja em que fase processual for.

3 - Regra essa que impõe a reclamação para a conferência como meio de impugnação das decisões singulares proferidas pelo relator e não o recurso de apelação.

4 - Deverá, pois, este Venerando STA, anular o Acórdão recorrido, substituindo-o por decisão uniformizadora de jurisprudência no sentido de que no âmbito da redação do CPTA na versão anterior ao DL n.º 214-G/2015, em sede de ação administrativa especial de valor superior à alçada do Tribunal Administrativo de Círculo do despacho saneador cabe reclamação para a conferência, nos termos do art. 27.º, n.º 2, do CPTA e não recurso de apelação ...".

1.2 - Devidamente notificados os recorridos não vieram produzir contra-alegações [cf. fls. 18 e segs.].

1.3 - A Digna Magistrada do Ministério Público (MP) junto deste Tribunal notificada nos termos e para efeitos do disposto no art. 146.º do CPTA não emitiu qualquer pronúncia [cf. fls. 84 e segs.].

1.4 - Dispensados os vistos legais cumpre apreciar e decidir.

2 - Fundamentação

2.1 - Dos Pressupostos de Admissão do Recurso e Sua Verificação

Os recursos para uniformização da jurisprudência destinam-se a obter decisão que fixe a orientação jurisprudencial nos casos em que se verifiquem cumulativamente os seguintes pressupostos: i) existência de decisões contraditórias entre acórdãos do STA ou deste e do TCA ou entre acórdãos do TCA; ii) contraditoriedade decisória "sobre a mesma questão fundamental de direito"; iii) verificação do trânsito em julgado, quer do acórdão recorrido, quer do acórdão fundamento [trânsito em julgado cuja existência se presume - cf. art. 688.º, n.º 2, do CPC/2013 ex vi do art. 140.º do CPTA - na redação anterior à introduzida pelo DL n.º 214-G/2015, de 02.10 - redação essa a que se reportarão todas as demais citações de normativos daquele Código sem expressa referência em contrário] e o recurso se mostrar deduzido no prazo de 30 dias contado do trânsito do acórdão recorrido; iv) não conformidade da orientação perfilhada no acórdão impugnado com a jurisprudência mais recentemente consolidada do STA [cf. art. 152.º, n.os 1, 2 e 3, do CPTA].

E no que diz respeito aos elementos caracterizadores do pressuposto da "mesma questão fundamental de direito" sobre a qual deverá existir contradição decisória valem aquilo que eram os critérios acolhidos pela jurisprudência fixada ainda no domínio da LPTA.

Assim: i) os quadros normativos [sejam eles substantivos ou processuais] e as realidades factuais subjacentes àquelas decisões devem ser substancialmente idênticos e, por isso, quando essa contradição tenha decorrido de divergente interpretação jurídica; ii) a oposição tem de decorrer de decisões expressas e não de julgamentos implícitos; iii) só releva a oposição entre decisões e não entre a decisão de um e os fundamentos de outro [cf., entre outros e nos mais recentes, Acs. do Pleno desta Secção de 16.12.2015 - Procs. n.os 01011/15 e 0517/14, de 18.02.2016 - Proc. n.º 0581/11, de 21.04.2016 - Proc. n.º 0698/15, de 19.05.2016 - Proc. n.º 01430/15, de 16.06.2016 - Proc. n.º 0201/16, de 26.01.2017 - Proc. n.º 0970/16, e de 23.02.2017 - Proc. n.º 01268/16 todos consultáveis in: «www.dgsi.pt/jsta» - sítio a que se reportarão também todas as demais citações de acórdãos do Tribunal sem expressa referência em contrário].

Vejamos, no caso em apreço, do seu preenchimento.

Sustenta-se no presente recurso para uniformização de jurisprudência que o acórdão recorrido proferido pelo «TCA/S» e que o acórdão fundamento deste Supremo de 25.11.2015 [Proc. n.º 0733/15] decidiram de forma oposta, no contexto do mesmo quadro factual e jurídico, aquilo que, no âmbito de ação administrativa especial com valor superior à alçada do tribunal administrativo de círculo, constitui o meio adequado de impugnação do despacho saneador que nela viesse a ser proferido, ou seja, se a via do recurso jurisdicional de apelação [propugnada pelo acórdão recorrido], ou se a via da necessária e prévia reclamação para a conferência [afirmada no acórdão fundamento].

No acórdão recorrido, proferido no quadro de reclamação do despacho do juiz do TAF/Funchal que não havia admitido o recurso jurisdicional interposto na ação administrativa especial do despacho saneador nela prolatado, sustentou-se que o meio adequado de impugnação seria o recurso jurisdicional de apelação e, nessa medida, revogou o despacho que não o havia admitido.

Por sua vez, no acórdão fundamento, proferido no quadro igualmente de ação administrativa especial de valor superior à alçada de tribunal administrativo de círculo e em sede de recurso de revista interposto de acórdão do TCA/Norte [que não conheceu de recurso deduzido de despacho saneador que na mesma havia sido proferido por entender que tal decisão era impugnável mediante reclamação para a conferência], sustentou-se que este acórdão não padecia do erro de julgamento que lhe foi assacado, porquanto, efetivamente, o meio adequado para impugnar aquela decisão era não a via do recurso jurisdicional, mas, ao invés, a da reclamação para a conferência.

Presentes os termos das pronúncias jurisdicionais postas em confronto e analisados os autos impõe-se concluir pelo preenchimento, in casu, dos pressupostos exigidos para a admissão do recurso sub specie, porquanto, para além da tempestividade do recurso e do facto de estarmos perante decisões transitadas em julgado [dado as mesmas não se mostrarem já suscetíveis de recurso ordinário ou de reclamação - cf. art. 628.º do CPC/2013 - ex vi dos arts. 01.º e 140.º ambos do CPTA] [cf., ainda, quanto ao acórdão recorrido o teor de fls. 02, 12/16 dos autos e da certidão junta aos mesmos a fls. 47/83], estamos perante pronúncias jurisdicionais contraditórias quanto à "mesma questão fundamental de direito" já que, de um ponto de vista jurídico-normativo e tendo na base situações litigiosas análogas ou equiparáveis, as mesmas expressam interpretações divergentes do mesmo regime normativo [cf. arts. 27.º do CPTA, e 40.º, n.º 3, do ETAF - igualmente na redação anterior à introduzida pelo DL n.º 214-G/2015 - redação essa a que se reportarão todas as demais citações de normativos daquele Estatuto sem expressa referência em contrário], existindo um claro conflito jurisprudencial expresso na contradição das soluções neles firmadas.

Preenchidos que se mostram os pressupostos exigidos pelo art. 152.º do CPTA para a admissão do recurso impõe-se, assim, passar ao seu conhecimento.

2.2 - Do Mérito do Recurso

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