Acórdão nº 19/22.0PEPRT- M.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 09 de Maio de 2023

Magistrado ResponsávelPEDRO AFONSO LUCAS
Data da Resolução09 de Maio de 2023
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Proc. nº 19/22.0PEPRT–M.P1 Referência : 16872319 Tribunal de origem: Juízo de Instrução Criminal do Porto, Juiz 1 – Tribunal Judicial da Comarca do Porto * Nos termos do art. 417º/6/d) do Cód. de Processo Penal, passa a proferir–se decisão sumária.

Na verdade, entende-se que a solução relativa à questão suscitada pelo recurso interposto é objecto de entendimento jurisprudencial uniforme e reiterado.

*I. Enquadramento processual do recurso.

São as seguintes as incidências processuais relevantes para contextualizar a presente decisão : 1, Nos presentes autos, o Ministério Público deduziu acusação contra, além de outros, o arguido (ora recorrente) AA (imputando–lhe a prática, em concurso real e sempre em co–autoria, de um crime de roubo agravado na forma tentada, p. e p. pelas disposições conjugadas dos arts. 210º/1/2/b), 204º/2/f) g), 22º/1, 23º/2 e 73º/1, todos do Cód. Penal, e de um crime de roubo agravado desqualificado pelo valor, p. e p. pelas disposições conjugadas dos arts. 210º/1/2/b), 204º/2/g)/4, ambos do Cód. Penal) ; 2, Nomeadamente pelo mesmo arguido AA foi oportunamente requerida a abertura de instrução, e, efectivada tal fase processual, com debate instrutório, veio a ser exarada decisão instrutória, no âmbito da qual veio a ser proferida pronúncia cujo segmento decisório é o seguinte: «Assim e porque os autos continuam a fornecer indícios da prática pelos arguidos dos crimes referidos na acusação (nada se conhecendo quanto aos demais, por forçado disposto no artigo 307°, 4, do CPP) determino a PRONUNCIA de AA E BB, com os sinais dos autos, pelos factos e respetiva incriminação constantes da acusação, cujos termos, de acordo com o disposto no art. 307° do CPP, aqui considero como integralmente reproduzidos.

» ; 3, Notificado desta decisão instrutória de pronúncia, veio o arguido AA a apresentar nos autos, em 20/02/2023, requerimento nos seguintes termos : - «O aqui defensor do A. vem expor e requerer o seguinte, nos termos do art.º 309º n.º1 d CPP : 1º. Na douta decisão pública de acusação pelo MP em momento algum se refere à Lei do Cibercrime, Lei n." 109/2009, de 15 de Setembro.

  1. O aqui A., não é imputado na acusação qualquer crime - exclusivamente de catálogo _ previsto naquele diploma, em sede de disposições materiais penais.

    Nem pode, 3º. Ser utlizado para além de - vd., art.º 11 deste corpo legal - para além das normas materiais penais especialmente previstas nesta norma do art.º 11, n.º1 al. a).

  2. Nem o crime foi cometido por via informático - art.º 11, n.º1 al. b). Pelo menos na discrição da douta acusação pública.

  3. Pela alínea c) deste n.º do art.º 11 está desaplicado ex vi por causa do Ac. 268/2022 do TC - quanto aos metadados.

    Como aponta, 6º. O Ac. da Relação do Porto, n.º 5011/22.2JAPRT-A.Pl, de 07/12/2022, do Relator Pedro Vaz Pato, datado de, consultável in dgsi.pt: - Tendo o acórdão do Tribunal Constitucional declarado a inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, dos artigos 4º, 6º e 9º da Lei nº 32/2008, de 17 de julho (Lei relativa à conservação de dados gerados ou tratados no contexto de oferta de serviços de comunicações electrónicas), não podemos tentar tornear esse acórdão, "deixando entrar pela janela" aquilo a que ele "fechou a porta"; ou seja, não podemos recorrer a outras normas para obter o mesmo efeito que resultaria da aplicação das normas declaradas inconstitucionais sem que essas outras normas contenham aquelas garantias que faltam a estas e que levaram a essa declaração de inconstitucionalidade.

    II – Não é, por isso, legalmente possível recorrer para esse efeito aos regimes dos artigos 187.º e 189.º do Código de Processo Penal (relativo às comunicações em tempo real, não à conservação de dados de comunicações pretéritas), da Lei n. o 4172008, de 18 de agosto (relativo à protecção contractual no contexto das relações entre empresas fornecedoras de serviços de comunicações electrónicas e seus clientes, campo distinto do da investigação criminal) e da Lei nº 109/2009, de 15 de setembro (Lei do Cibercrime).

    III – Não podem os tribunais substituir-se ao legislador suprindo omissões de onde resultam graves inconvenientes para a investigação criminal.

    Continua este Aresto: As exigências em causa, que levam à declaração de inconstitucionalidade, são aplicáveis a todos os dados de tráfego. O mesmo deverá dizer-se, pelos mesmos motivos, da hipótese de aplicação do regime decorrente das Lei n.º 109/2009 de 15 de setembro (Lei do Cibercrime), regime que poderá ser considerado o regime geral em relação ao qual é especial o decorrente da Lei nº 32/2008, de 17 de julho (pode ver-se, neste sentido, o acórdão da Relação de Évora de 14 de julho de 2020, proc. a. o 9/20.8GAMTL-A.E1, relatado por Maria de Fátima Bernardes, in dgsi.pt). Afirma-se, a este respeito, também no já citado acórdão da Relação de Coimbra de 12 de outubro de 2022: «Desparecendo a especialidade, não nos é lícito recorrer à generalidade»; tal representaria «defraudar o espírito do legislador».

  4. Assim, o despacho de pronúncia é nulo nos termos do art.º 310° n.º1 do CPP pois acrescenta à acusação pública a aplicação da Lei do Cibercrime sem que tenha dado oportunidade de contraditório às partes no debate instrutório dessa sua intenção nem fundamenta qual a norma específica que aplica da Lei n.º 109/2009, de 15 de Setembro, sendo que esta Lei restrita a crimes de catálogo, e que pelo art.º 187º do CPP não poderia ser aplicado pois os crimes pelo qual o aqui A., veio acusado/pronunciado, já tinham sido alegadamente cometidos. Nem aplicou o art." 303° do CPP.

  5. Devendo ser decretada a nulidade do despacho de pronúncia.

    Questão de constitucionalidade 9º. O defensor do aqui A., informa o Tribunal que está a colocar de modo concreto, adequado e cristalino uma questão de interpretação normativa de dimensão constitucional ao Tribunal, requerendo pronúncia expressa ao Tribunal art." 205° da CRP.

    Assim, 10.º Recoloca-se a questão colocada no nosso requerimento de abertura de instrução: apenas com a novidade de ser também extensiva ao art.º 11º n.º1 als. a), b) e c) da Lei do Cibercrime Lei n," 109/2009, de 15 de Setembro – que se presume que seja a norma a aplicar - com remissão para as normas 11 ° a 17º da Lei n. 109/2009, artigo 18° e no 19° dessa Lei, e por fim o catálogo de crimes do n. 1 do artigo 187° do Código de Processo Penal, por remissão expressa da Lei 109/2009, como pressuposto de aplicação do regime processual contido nesse artigo 18° e no 19° dessa Lei para os crimes previstos na alo b) do artigo 18°.

    1. Declarar a inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, da norma constante do artigo 4.0 da Lei nº 3212008, de 17 de julho, conjugada com o artigo 6.º da mesma lei, por violação do disposto nos n.ºs 1 e 4 do artigo 35.º e do n." 1 do artigo 26.º, em conjugação com o n." 2 do artigo 18.º , todos da Constituição; b) Declarar a inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, da norma do artigo 9.0 da Lei nº) 32/2008, de 17 de julho, relativa à transmissão de dados armazenados às autoridades competentes para investigação, detecção e repressão de crimes graves, na parte em que não prevê uma notificação ao visado de que os dados conservados foram acedidos pelas autoridades de investigação criminal, a partir do momento em que tal comunicação não seja susceptível de comprometer as investigações nem a vida ou integridade física de terceiros, por violação do disposto no n." 1 do artigo 35.º e do n.º 1 do artigo 20.º, em conjugação com o n.º 2 do artigo 18.°, todos da Constituição.

    Estando referido Acórdão em vigor, sendo válido e eficaz na ordem jurídica portuguesa, com efeitos retroactivos.

    Porque no presente caso, há provas que foram obtidas através de uso de metadados ainda que com o fundamento da lei do cibercrime que se concretizaram em indícios que sustentaram a investigação durante o inquérito, o arguido em interrogatório negou a comissão do crime pelo qual vem acusado, logo inexistem provas indiciárias que possam sujeitar o mesmo a julgamento.

  6. Mormente como chegaram à identidade e residência do A.? 12º. De modo que, se requer a aplicação retroactiva in favoris do aqui arguido (pois as normas que agora deixaram de existir no ordenamento jurídico português deixaram de existir, e tiveram aplicação directa concreta no presente caso em inquérito) e uma decisão de não pronúncia pois inexistindo prova contra o arguido art.º 308º n.º1 última parte do CPP a decisão deverá ser de não pronúncia, visto que a probabilidade de absolvição é enorme face à total ausência de provas indiciárias.

  7. A efectiva comprovação do inquérito está feita no sentido de uma conclusão de que faltam provas válidas que sustentem uma acusação no sentido sujeitar o aqui arguido ao julgamento, e um juízo de prognose de maior probabilidade de condenação.

    Todavia, por mera cautela de mandato, Questão de dimensão interpretativa normativa constitucional, requerendo ao Tribunal pronúncia expressa sobre a mesma em despacho autónomo.

  8. Argui-se a inconstitucionalidade interpretativa com aplicação concreta e directa in cas«das normas supra citadas nos artsº 9° a 13 deste requerimento, devendo Vª Exa afastar a aplicação das mesmas – pois já não existem no ordenamento jurídico nacional em sede extensiva de interpretação – e retirar as devidas consequências legais, reformulando caso seja esse o caso a eventual ponderação e decisão nos presentes autos instrutórios .

  9. Devendo todas as provas proibidas serem retiradas do processo.

    4. Pela Juiz de Instrução foi determinado que os autos fossem com vista ao Ministério Público quanto ao requerimento apresentado, vindo nessa sequência o Ministério Público a propugnar pelo indeferimento do requerido, promovendo em conclusão nos seguintes termos: «Em face do exposto, sem prejuízo de se mostrar esgotado o poder jurisdicional do Tribunal para se pronunciar quanto a...

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