Acórdão nº 1162/18.6T8PNF.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 08 de Maio de 2023

Magistrado ResponsávelNELSON FERNANDES
Data da Resolução08 de Maio de 2023
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Apelação / processo n.º 1162/18.6T8PNF.P1 Tribunal Judicial da Comarca do Porto Este, Juízo do Trabalho de Penafiel - Juiz 3 Autor: AA Ré: A..., S.A. - Sucursal em Portugal ______ Nélson Fernandes (relator) Teresa Sá Lopes António Luís Carvalhão ___________________________ Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto: I – Relatório 1.

Nos presentes autos de processo especial por acidente de trabalho, decorrida a fase conciliatória sem que se tenha logrado acordo, veio AA dar início à fase contenciosa, apresentando petição inicial, peticionando a condenação da Ré, B... - Companhia de Seguros, S.A.” (atualmente “A..., S.A. - Sucursal em Portugal), no seguinte: “a) Deverá a Ré companhia de seguros ser condenada a reconhecer a incapacidade permanente para o trabalho do Autor, de 14,5%, e em consequência ser condenada a pagar ao aqui Autor indemnização a título de IPP no montante de 13.852.04€ (treze mil oitocentos e cinquenta e dois euros e quatro cêntimos). b) Deverá a Ré companhia de seguros ser condenada a reconhecer o período de incapacidade temporária e absoluta do Autor de 24.04.2017 a 30.06.2017, bem como a pagar a título de indemnização por essa incapacidade o montante de 1.198.41€ (mil cento e noventa e oito euros e quarenta e um cêntimos. c) Mais se requer a condenação da Ré seguradora a pagar ao Autor os juros de mora a contar sobre a quantia diária de cada uma das indemnizações nos termos supra explanados, desde a data a que se reporta cada uma dessas quantias diárias, à taxa de 4% ao ano até integral e efectivo pagamento. d) Deverá a Ré companhia de seguros ser condenada a pagar ao Autor sinistrado a quantia de 40.00 Euros (quarenta euros) relativa a deslocações obrigatórias ao gabinete médico-legal de Penafiel e a este Tribunal; e) Deverá também a Ré companhia de seguros ser condenada a pagar ao Autor sinistrado a quantia de 375.00€ (trezentos e setenta e cinco euros), relativos a quantias despendidas com exames médicos e consultas, por conta do acidente descrito nos autos; f) Também deverá as Ré ser condenada no pagamento dos juros de mora à taxa legal em vigor vencidos e vincendos desde a citação das mesmas, sobre as quantias atrás peticionadas e, os que virão ainda a peticionar, tudo até integral e efectivo pagamento.” Alegou, em síntese: trabalha, desde 2002, por conta e sob as ordens e direção da sociedade “C..., Ld.ª”; foi vítima de um acidente de trabalho, em ..., na estação de serviço de ..., na A1, no dia 24.04.2017, pelas 07:30 horas, quando se encontrava a trabalhar sob ordens, direção e fiscalização de tal sociedade, para a qual trabalhava com a categoria de pintor/servente na área da construção civil; a referida sociedade, por contrato de seguro titulado pela apólice nº ..., havia transferido a responsabilidade por acidente de trabalho para a R.; o acidente ocorreu quando seguia em viagem para o trabalho, para a zona de Lisboa, em transporte coletivo cedido pela aludida sociedade e, após ter saído da carrinha, em paragem de descanso na área de serviço, caiu e feriu-se na cabeça, do que resultou uma ferida de 4 cm, na região temporal direita e TCE; ficou, como consequência direta do acidente, com as seguintes sequelas: no crânio, cicatriz na região temporal direita, no couro cabeludo, impercetível, medindo 4 cm de comprimento; e síndrome comocional pós-traumático e epilepsia pós-traumática (sequelas de TCE); foi-lhe fixada a IPP em 14,5%; resultou para si ITA de 24.04.2017 a 30.06.2017; deslocou-se ao Gabinete Médico-Legal de Penafiel e ao Tribunal de Trabalho de Penafiel, tendo tido despesas nessas deslocações no montante de € 40,00; em consequência quer da tentativa de não conciliação por parte da R. quer pela falta de assunção de assistência, efetuou exames médicos e consultas para apurar o seu estado de saúde, pagando à sua custa tais meios de diagnóstico, num total de € 375,00, designadamente por deslocações a consultas médicas no dia 02.05.2017, na Clínica ..., consulta de ORL, cujo custo foi suportado por si no valor de € 55,00, a realização de um exame designado como audiograma tonal e timpanograma com reflexos, em 12.05.2017, no valor de € 45,00, a realização de uma ortopantomografia no valor de € 15,00 no dia 19.05.2017, consulta de ORL na Clínica ... no dia 22.05.2017, no valor de € 55,00 e, ainda, a realização de exame crânio-encefálico na Clínica 1... no dia 26.09.2017, no valor de € 205,00.

Apresentou a Ré contestação, que concluiu no sentido de que a ação deve ser julgada improcedente, por não provada e, em consequência, ser absolvida de todos os pedidos contra si formulados pelo Autor, declarando-se expressamente que este não sofreu qualquer acidente de trabalho.

Mais uma vez em síntese, invocou que o Autor desmaiou / desfaleceu, resultando evidente que o desmaio/desfalecimento não foi provocado nem teve a sua origem em qualquer acontecimento externo e imprevisto, antes tendo tido a sua génese numa doença natural e, como tal, que não estamos perante qualquer acidente de trabalho.

Citado, deduziu o Instituto da Segurança Social, I.P., pedido de reembolso, no qual peticionou deve a Demandada ser condenada a pagar-lhe a quantia de €730,30, acrescida de juros de mora à taxa legal.

Respondeu a Ré a tal pedido, pugnando pela sua improcedência.

Notificado da contestação, o Autor apresentou processado, no qual aduziu, para além do mais, que a sua queda é um acidente de trabalho, uma vez que há uma aparente perda dos sentidos involuntária e, mesmo que tal queda ao solo tenha sido consequência de um desmaio, esse tem que considerar-se súbito, imprevisto e involuntário, consubstanciando um acidente de trabalho.

Por despacho proferido, foi decidido que tal processado “irá ser considerada como a resposta à exceção perentória da descaracterização do acidente de trabalho arguida pela R. na contestação, com o que fica precludida a possibilidade de o A. no início da audiência final (voltar a) responder a tal exceção.”.

Proferido despacho saneador, fixou-se de seguida a matéria de facto assente, identificando-se ainda o objeto do litígio e enunciando-se os temas da prova.

Ordenando-se o desdobramento do processo, no respetivo apenso veio a ser proferida decisão final de fixação de incapacidade.

Realizada a audiência de julgamento, foi proferida sentença, de cujo dispositivo consta: “Nos termos e com os fundamentos suprarreferidos, decido julgar a presente ação improcedente e, em consequência, absolvo a R. de todo o peticionado quer pelo A. quer pelo interveniente.

Fixo o valor da causa em € 15.465,45 - cfr. artºs 1º, nºs 1 e 2, alínea a), do C.P.T., 297º, nºs 1 e 2, 299º, nº 1, 305º, nº 4, e 306º, nº 1, todos do C.P.C., e 120º, do C.P.T..

Custas pelo A., sem prejuízo do benefício de apoio judiciário de que o mesmo goza - cfr. artºs 1º, nºs 1 e 2, alínea a), do C.P.T., e 527º, nºs 1 e 2, do C.P.C..

* Registe e notifique.” 2.

Apresentou o Autor requerimento de interposição de recurso, finalizando as suas alegações com as conclusões seguintes: i.

Nos termos do disposto no art.º 607.º do CPC, e por sua vez o art.º 615.º, n.º 1 al. b) do CPC, aplicável por força do art.º 1.º, n.º 2 al. a) do CPT que, “É nula a sentença quando: b) Não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão;” ii.

Cumpre ainda referir que de acordo com os dispositivos consagrados na Constituição da República Portuguesa, mais propriamente o art.º 205.º, n.º 1 as decisões dos Tribunais que não sejam de mero expediente são fundamentas na forma prevista na lei.

iii.

Ora, como a sentença em mérito não é de mero expediente, porquanto deveria a mesma ter sido devidamente fundamentada nos termos do dispostos nos artigos 615.º, n.º 1 al. b) do CPC e art.º 205.º, n.º 1 da CRP.

iv.

Violou assim o Tribunal recorrido as n.º 615.º, n.º 1 al. b) do CPC, normas ínsitas nos artigos 615.º, n.º 1 al. b) do CPC e art.º 205.º, n.º 1 da CRP, o que fere a sentença de nulidade. Pelo que nos termos dos artigos supra citados a sentença é nula, o que aqui expressamente se invoca.

v.

O presente recurso é interposto da sentença proferida nos autos a qual considerou em suma, que o Autor não sofreu qualquer acidente e muito menos um acidente de trabalho.

vi.

Esta considerou que o Autor, aqui Recorrente não conseguiu provar a existência de um acidente de trabalho.

vii. Contudo, a factualidade foi incorrectamente julgada, dado que a prova produzida nos autos impunha decisão diversa da recorrida.

viii. Porquanto, o art.º 607.º, n.º 5 do Código de Processo Civil, consagra o princípio da livre apreciação da prova, não se encontrando o julgador sujeito às regras rígidas da prova tarifada, o que não significa que a actividade de valoração da prova seja arbitrária, pois está vinculada à busca da verdade, sendo limitada pelas regras da experiência comum e por algumas restrições legais. Tal princípio concede ao julgador uma margem de discricionariedade na formação do seu juízo de valoração, mas que deverá ser capaz de fundamentar de modo lógico e racional.

ix. Porém, nessa tarefa de apreciação da prova, é manifesta a diferença entre a 1.ª instancia e o tribunal de recurso, beneficiando aquela da imediação e da oralidade e estando este limitado à prova documental e ao registo de declarações e depoimentos.

x. A ausência de imediação determina que o tribunal de 2.ª instancia, no recurso da matéria de facto, só possa alterar o decidido pela 1.ª instancia se as provas indicadas pelo recorrente impuserem decisão diversa da proferida, como corre no caso dos presentes autos.

xi. Ora, art. 8.º, nº 1 da Lei n.º 98/2009, de 4/9, (LAT) contém a definição genérica de acidente de trabalho, dispondo que “é acidente de trabalho aquele que se verifique no local e no tempo do trabalho e produza directa ou indirectamente lesão corporal, perturbação funcional ou doença de que resulte redução na capacidade de trabalho ou de ganho ou a morte”.

xii. Ou seja, como tem apontado a nossa jurisprudência, para que se reconheça um...

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