Acórdão nº 262/22.2JAPRT.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 03 de Maio de 2023

Magistrado ResponsávelJORGE LANGWEG
Data da Resolução03 de Maio de 2023
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo nº 262/22.2JAPRT.P1 Data do acórdão: 3 de Maio de 2023 Desembargador relator: Jorge M. Langweg Desembargadora 1ª adjunta: Maria Dolores da Silva e Sousa Desembargador 2º adjunto: Manuel Soares Origem:Tribunal Judicial da Comarca do Porto - Juízo Central Criminal de Vila do Conde Sumário: ……………………………….

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Acordam, em conferência, os juízes acima identificados do Tribunal da Relação do Porto Nos presentes autos acima identificados, em que figura como recorrente o arguido AA; I - RELATÓRIO1. No dia 6 de Dezembro de 2022 foi proferido o acórdão condenatório do arguido, depositado no mesmo dia, o qual terminou com o seguinte dispositivo: “Nestes termos, e ao abrigo das referidas disposições legais, os Juízes que compõem o Tribunal Colectivo julgam a acusação provada, parcialmente procedente, e em consequência decidem: 1- Absolver o arguido AA pela prática de um crime de homicídio qualificado, na forma tentada, previsto e punido pelo artº 131º, 132º, n.º 1 e 2 al. e), h) e j), com referência aos artºs 22º, nºs 1, al. b) e 23º, do Código Penal.

2- Condenar o arguido AA pela prática de um crime de homicídio, na forma tentada, previsto e punido pelo artº 131º, com referência aos artºs 22º, nºs 1, al. b) e 23º, do Código Penal, na pena de 3 (três) anos e 9 (nove) meses de prisão; 3- Arbitrar uma quantia de 10.000 (dez mil euros) a titulo de reparação à vitima BB, a ser paga pelo arguido; 4- Declarar o casaco de fato de treino nike e a t-shirt verde da primark perdidas a favor do Estado e determinar a destruição desses objectos; 5- Condenar o arguido ao pagamento das custas do processo, fixando-se a taxa de justiça no valor de 3 UC; 6- Determinar a recolha, após trânsito em julgado deste acórdão, de vestígios biológicos do arguido e a respectiva inserção na base de dados de perfis de ADN, nos termos do disposto no artº 8º, nº 2, da Lei nº 5/2008, de 12 de Fevereiro (na redacção conferida pela Lei nº 90/2017, de 22 de Agosto). (…)” 2. Inconformado com a sanção penal, o arguido interpôs recurso da decisão, terminando a motivação de recurso com a formulação das conclusões seguidamente reproduzidas[1]: «O recorrente, foi condenado nos presentes autos, pela prática, de um crime de homicídio, na forma tentada, previsto e punido pelo artº 131º, com referência aos artºs 22º, nºs 1, al. b) e 23º, do Código Penal, na pena de 3 (três) anos e 9 (nove) meses de prisão.

Considera o recorrente que mal andou o Tribunal a quo ao condena-lo em pena de prisão efetiva não tendo assim atendido e ponderado à confissão integral e sem reservas, que implica necessariamente demonstração de arrependimento e vontade de colaborar com a justiça por parte do arguido, o que o mesmo fez desde o primeiro momento.

Não ponderou ainda o Tribunal a quo devidamente o teor do relatório social, a ausência de antecedentes criminais revelador de que se tratou de um ato único e irrepetível na vida de um arguido ainda muito jovem.

Não foram ainda devidamente ponderadas pelo Tribunal a quo as circunstâncias concretas do crime praticado.

Considerando todos os elementos constantes dos autos acima referidos somos levados a crer que os mesmos permitiam que Tribunal a quo pudesse considerar como adequada uma pena suspensa na sua execução.

Abstratamente analisando qualquer situação, haverá sempre vantagem na ressocialização.

Mas, a esta consideração abstrata, terão necessariamente que existir elementos concretos que permitam concluir que o arguido, uma vez fora da prisão, tem um ambiente propício a que se afaste de ambientes, lugares e pessoas que o poderão levar, novamente, para a prática de atos da mesma natureza dos praticados.

Do relatório social e dos factos provados resulta o inequívoco apoio familiar, o projeto de vida laboral concreto e bem definido.

Resulta ainda dos factos provados as circunstâncias do crime praticado e que levou à condenação aliado ao facto de se tratar de um delinquente primário e que não evidenciam, apesar de tudo, um prognóstico completamente negativo relativamente à possibilidade da ainda integração deste jovem num mundo afastado do crime e externamente condizente com as regras sociais.

Na verdade, se, por um lado, a gravidade dos factos praticados são de molde a colocar algumas dúvidas quanto à possibilidade de integração na sociedade, por outro lado, o apoio familiar e a postura do arguido desde o primeiro momento subsequente à prática do crime de assunção dos seus atos bem como o pedido de desculpas sincero efetuado ao ofendido apresentam um relevante indício positivo no sentido da reintegração do recorrente ainda muito jovem.

Entendemos, pois, que não podemos simplesmente retirar da gravidade do crime praticado a impossibilidade de reintegração.

Na realidade, sempre que resulte algum dado que permita considerar que a aplicação de uma pena de prisão suspensa na sua execução trará vantagem para a ressocialização do delinquente, esta atenuação deve ser aplicada, sem que as exigências de prevenção geral por si só sejam de molde a afastar essa possibilidade.

Uma vez do seu registo criminal não constam outras condenações, não existem nos autos elementos que permitam concluir por uma carreira criminosa. Ou seja, tudo evidencia que se tratou de uma pluriocasionalidade, pelo que as exigências de prevenção especial se mostram significativas de modo a que seja aplicada uma pena de prisão suspensa na sua execução sendo a mesma ainda apta a salvaguardar as exigências de prevenção geral.

Trata-se, assim, de um arguido primário que, tendo em conta o apoio familiar que apresenta, nomeadamente, a possibilidade de poder retomar a vida afastando-se dos grupos de jovens que de algum modo determinaram o seu comportamento, e sabendo que se mostrou arrependido e apresentou algum juízo de auto-censura, considera-se que a simples ameaça da prisão realiza de forma adequada e suficiente as finalidades de punição.

Pelo que entende o recorrente, que o Acórdão recorrido deverá ser revogado no segmento decisório respeitante à pena efectiva, devendo a mesma ser suspensa na sua execução por, neste caso, tal se revelar adequado e preferível, sendo ainda comunitariamente suportável à luz da necessidade de tutela de bens jurídicos e da estabilização das expectativas comunitárias na validade da norma violada, assim se respeitando as normas dos artigos 43.º, 70.º, 71.º, n.º 1, 50, n.º 1 e 53.º, n.3, todos dos Código Penal.

Atenta a idade do arguido, a suspensão deve ser acompanhada de regime de prova nos termos do art. 53.º, n.º 3, do CP.

Princípios e disposições legais violadas ou incorretamente aplicadas: artigos 50.º, 52.º, 53.º, 54.º (…)” 3. O recurso foi liminarmente admitido no tribunal a quo, subindo nos próprios autos, com efeito suspensivo.

  1. O Ministério Público junto do tribunal da primeira instância pugnou, de forma fundamentada, pela improcedência do recurso, por carecer de fundamento legal: O tribunal a quo valorou adequadamente todas as circunstâncias relevantes para a determinação da pena do arguido.

    Para além das implicações resultantes da gravidade do crime apurado e do respectivo modo de execução, assim como da motivação do agente, não poderia deixar de se considerar, na ponderação da possibilidade da aplicação do regime da suspensão da execução da pena, as elevadíssimas exigências de prevenção, com especial enfoque nas necessidades de defesa do bem jurídico da vida humana.

    E, nesta medida, os factos apurados e o que os mesmos revelam quanto à personalidade do arguido, apontam para a existência de fortíssimas necessidades de prevenção geral, pois a aplicação de pena suspensa, considerando o primado da vida humana consagrado constitucionalmente, afrontaria fortemente princípios de certeza e efectividade das penas consagrados no nosso sistema jurídico-.penal e constitucional.

    Por seu lado, ainda que não ostente outras condenações, o que se apurou sobre as respectivas circunstâncias de vida não apontam para adequada inserção social e profissional, não dando quaisquer garantias relativamente a um comportamento futuro de acordo com o direito.

    É, assim, parecer do Ministério Público que todas as vertentes atendíveis, quer as respeitantes à avaliação da ilicitude e culpa dos factos apurados, quer às necessidades de prevenção, geral e especial, nomeadamente quanto à ausência de comportamento posterior tendente à reparação do mal cometido, no caso, impunham a aplicação de uma pena efectiva.

  2. O Ministério Público junto deste Tribunal[2] emitiu parecer, sufragando a posição já manifestada na primeira instância e acrescentando o seguinte: “(…) Tendo-se como adquirido que o objecto do recurso ora sob apreço contende, apenas e tão somente, com a questão de a pena de prisão em que o recorrente se mostra condenado dever, ou não, ser suspensa na respectiva execução1, importa, antes do mais, reter que (conforme também doutrinária e jurisprudencialmente se tem como adquirido), a suspensão da execução da pena de prisão não é meramente, ou apenas, facultativa, tratando-se antes de um poder-dever2, dependendo dos pressupostos formais e materiais estipulados na lei, assim dispondo o n.º 1 do artigo 50.º do Código Penal que “O tribunal suspende a execução da pena de prisão aplicada em medida não superior a cinco anos se, atendendo à personalidade do agente, às condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste, concluir que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição”.

    E mostrando-se, in casu, verificado o pressuposto formal da aplicação do instituto da suspensão da execução da pena de prisão – i. e., a circunstância de, em concreto, não ter sido aplicada (ao agente) pena de prisão superior a 5 (cinco) anos – impõe-se sublinhar que aquela mesma suspensão depende também de um pressuposto material, consubstanciado na exigência da verificação, pelo tribunal, de um prognóstico favorável relativamente ao comportamento do...

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