Acórdão nº 7487/20.3T8PRT.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 27 de Abril de 2023

Magistrado ResponsávelVIEIRA E CUNHA
Data da Resolução27 de Abril de 2023
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça Razão do Recurso AA e mulher BB, CC, DD, por si e na qualidade de cabeça de casal e herdeira de EE, falecido em .../.../2019, FF, na qualidade de herdeira de EE, GG e HH, propuseram a presente acção, com processo declarativo e forma comum, contra José Donas, Ldª.

Peticionam seja a ré condenada a despejar imediatamente o arrendado identificado no art.º 1.º da petição inicial, fazendo a sua entrega aos AA., completamente livre de pessoas e coisas.

Alegam que a ré arrendatária não deu cumprimento ao contrato de arrendamento do locado, uma vez que pagou em mora as rendas dos meses de Agosto de 2016 (paga a 11 de Julho), Outubro de 2016 (paga a 12 de Setembro), Dezembro de 2016 (paga a 11 de Novembro), Janeiro de 2017 (paga a 13 de Dezembro), Fevereiro de 2017 (paga a 11 de Janeiro), Março de 2017 (paga a 13 de Fevereiro), Abril de 2017 (paga a 13 de Março), Maio de 2017 (paga a 13 de Abril) e Junho de 2017 (paga a 12 de Maio), o que determinou que os AA. deliberassem proceder à resolução do contrato, o que foi feito pela sua procuradora “G..., Lda.”, com poderes para esse efeito.

A Ré, a título de questão prévia, peticionou a declaração de extinção da instância por impossibilidade originária da lide (art. 277.º al. e) do CPC), em face da suspensão das acções de despejo até à cessação da situação excepcional de prevenção, contenção, mitigação e tratamento da infecção epidemiológica por SARS-CoV2 e da doença Covid 19 e face ao estatuído no nº 11 do art. 7.º da lei nº 1-A/2020 de 19/03/2020 alterada pela Lei nº 4-A/2020 de 06 Abril e lei nº 16/2020 de 29.05.2020.

Por excepção, invocou falta de interesse em agir, ilegitimidade activa e ineptidão da petição inicial; a caducidade do direito de resolução do contrato de arrendamento objecto dos presentes autos; a não resolução do contrato de arrendamento por falta de comunicação à arrendatária nos termos gerais; a falta de fundamento da resolução do contrato de arrendamento – mora no pagamento das rendas (art. 1083.º, n.º 4 do CCiv); a violação do princípio da boa-fé e abuso de direito por parte dos senhorios; e a caducidade do direito de resolução (art. 1085.º do CC).

As Decisões Judiciais A sentença proferida em 1.ª instância decidiu julgar a acção improcedente, por ter considerado caducado o direito que os autores se apresentaram a exercer.

Tendo os Autores recorrido de apelação, a decisão recorrida foi revogada e substituída por outra que julgou provada e procedente a acção de despejo, condenando a ré a despejar imediatamente o locado, entregando-o aos AA. completamente livre de pessoas e bens.

A Revista A Ré interpõe agora recurso de revista.

Formula as seguintes conclusões de recurso: 1. O tribunal da Relação pronunciou-se sobre questão que não foi objecto de apreciação e decisão pela 1ª instância.

  1. No caso, independentemente do valor da causa e da sucumbência, como se trata de uma acção em que se discuta a cessação do contrato de arrendamento, o recurso é sempre admissível (cfr. nº 3 al.a) do art. 639.º do CPC).

  2. Considerar que o acórdão proferido pela Relação, não admite recurso, por não se mostrarem preenchidos os pressupostos legais do art. 629.º do CPC, numa situação em que esta decide, pela 1º vez uma questão, viola a norma constante do art. 639.º do CPC e o direito da efectiva concretização do duplo grau de jurisdição.

  3. Uma interpretação em sentido diverso do propugnado, é inconstitucional, porque viola a lei, o principio do acesso ao direito, e à tutela jurisdicional efetiva – principio constitucional consagrado no artigo 20º/5, CRP, e ainda, e também, o principio da igualdade das partes ( art. 13.º da CRP).

  4. O valor da causa há-de representar a utilidade económica imediata que pela acção se pretende obter.

  5. O valor indicado pelos Autores e fixado à acção assentou no pressuposto de se tratar de uma acção de despejo, e daí o critério legal constante do nº 1 do art. 298.º do CPC.

  6. O entendimento agora sufragado não se subsume ao critério especial do art. 298.º nº1 do CPC antes sim ao do art. 297.º n.º 1, do CPC.

  7. Critério legal que tem que prevalecer na determinação do valor da causa.

  8. O enquadramento jurídico agora realizado com consequência directa sobre o decidido, impõe alteração, superveniente, do valor da causa.

  9. Que há-de corresponder, atenta à norma legal aplicável, à entrega do locado, e por isso ao valor patrimonial do arrendado, o qual é de € 121.990,00.

  10. Valor que deve ser atribuído à causa.

  11. Por verificados os pressupostos legais, deve o presente recurso ser admitido, pretendendo, a recorrente, por meio deste, a revogação do decidido, no Acordão proferido, em tempo recorde, pela Relação do Porto, em 14.12.2022.

  12. A decisão proferida pelo Tribunal da Relação do Porto é nula porque viola o art. 640.º do CPC.

  13. Das conclusões de recurso apresentadas, é possível afirmar que os Recorrentes não deram cumprimento ao fixado no n.º 1 e nº 2 al.a) do referido artigo 640.º do CPC.

  14. Não tendo a recorrente dado cumprimento ao ónus processual fixado no art. 640º do CPC não podia a Relação ter conhecido da apelação, no tocante à impugnação da decisão sobre a matéria de facto, pois que, e como é, também, entendimento pacifico na jurisprudência, não há neste caso, lugar ao despacho de convite ao aperfeiçoamento.

  15. A decisão recorrida viola ainda o art. 662.º do CPC.

  16. O uso, pela Relação, dos poderes de alteração da decisão da 1ª instância, sobre a matéria de facto, só deve ser feito quando seja possível, com a necessária segurança, concluir pela existência de erro notório de apreciação dos concretos pontos de facto impugnados.

  17. Se a prova produzida não impuser decisão diversa, porque a decisão do facto em primeira instância é racional, lógica e possível, e portanto, está correctamente motivada, uma diferente convicção que a Relação possa formar após a análise da prova produzida, não permite alterar a matéria de facto, nos termos do n.º 1 do art. 662.º do CPC.

  18. Dentro das limitações que já foram assinaladas não podia o Tribunal da relação ter modificado a matéria de fato, como fez, tendo, por isso e dessa forma, extravasado os limites dos poderes que lhe são conferidos pela norma constante do art. 662.º do CPC.

  19. A sentença apreciou a prova produzida de modo adequado e crítico, operação que conduziu ao elenco dos factos provados e não provados.

  20. O princípio da livre apreciação da prova, como meio de descoberta da verdade, apenas subordinado à razão e à lógica foi perante a todo o exposto, inequivocamente, usado para além do que é consentido pelas regras da experiência comum de vida, fundando, assim, uma conclusão inaceitável.

  21. Não se alcança, como é que dos depoimentos, de per si ou conjugados com a prova documental, contrariam a conclusão factual do Tribunal de 1ª instância ou sequer indiciam no sentido propugnado pelos recorrentes e aceite pelo Tribunal recorrido.

  22. Em caso de dúvida, e ainda que tenha o Tribunal recorrido considerado que os depoimentos foram contraditórios e que a prova produzida foi frágil, o que não se aceita, ainda assim, devia prevalecer a decisão proferida pela primeira instância, em observância aos princípios da imediação, da oralidade e da livre apreciação da prova.

  23. As regras de experiência enquanto auxílio do julgador e em que se ancorou a decisão do Tribunal da Relação foram deficientemente aplicadas e consideradas não logrando alcançar o pretendido, carecendo de sustentação a alteração da matéria de facto por este levada a cabo.

  24. Não resulta do acórdão recorrido qualquer elemento idóneo que possa abalar a livre convicção do tribunal de 1ª instância quanto aos fundamentos da decisão sobre a matéria de facto, 26. A possibilidade de alterar a matéria de facto fixada na primeira instância, pela mera análise da prova produzida, apenas pode ser efectuada quando essa prova imponha decisão diversa, o que não sucede quando o tribunal ad quem, ouvida essa prova, propende antes para uma diferente convicção, contudo não imposta...

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