Acórdão nº 122/20.1GCCLD.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 22 de Março de 2023

Magistrado ResponsávelMARIA JOSÉ GUERRA
Data da Resolução22 de Março de 2023
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

* … I- RELATÓRIO 1. … foi o arguido AA sujeito a julgamento, mediante a acusação contra o mesmo deduzida pelo MºPº na qual se lhe imputava a prática, em autoria material, na forma consumada e em concurso real, de: - um crime de falsas declarações, p. e p. pelo disposto no art. 348.º-A, n.º 1 do CP; - um crime de falsificação de documentos, p. e p. pelo disposto no art. 256.º, n.º 1, al. d) com referência ao art. 255.º, al. a), todos do CP.

- um crime de violação de proibições, imposições ou interdições p. e p. pelo disposto no art. 353.º do CP.

* 2. Designada data para a audiência de julgamento, foi pelo ilustre mandatário do arguido pedida a palava no início da mesma [sessão realizada no dia 7.02.2022], e, no uso dela ditou o mesmo para a acta o seguinte, que se transcreve: “Parece-nos que o crime de falsificação de documento pelo qual o arguido vem acusado, já foi julgado pelos mesmos factos no âmbito do processo 289/20...., tal como se poderá verificar no processo.” Concedida a palavra à Digna Magistrada do M.ºP.º no uso da mesma disse … “Tendo em consideração o alegado pelo arguido e uma vez que de facto é do meu conhecimento funcional que o arguido foi já julgado por factos senão iguais, pelo menos idênticos promovo que se solicite certidão da acusação e da sentença bem como do auto de noticia que deu origem ao inquérito onde o arguido foi condenado em falsificação para se observar se existe violação ou não do principio ne bis in idem.” Tendo, de seguida, a Mm.ª Juiz proferido o seguinte despacho, que igualmente se transcreve: “Tendo em conta o que vem invocado pelo arguido de que os factos da presente acusação verifica-se que consta o averbamento pela prática do crime de falsificação de documento no âmbito do processo 289/20.... que corre termos neste juizo local criminal - J1, o arguido vem invocar que os factos ue constam da acusação, ou pelo menos, parte deles foram já objecto de apreciação no âmbito desse mesmo processo, pelo que, determino que se solicite ao mesmo o envio das peças processuais que o M.ºP.º promoveu e ainda que os autos me sejam presentes para consulta, considerando que a análise concreta da matéria acusatória e da decisão proferida naqueles autos deverá ser efectuada previamente ao inicio da produção de prova nos presentes autos, pelo que, decido não dar inicio à audiência de julgamento, determinando que por ora seja solicitada a remessa de certidão e apresentando aqueles autos para minha consulta após o que se decidirá tendo em conta o que da referida consulta resultar.

Não se designa por ora nova data para realização da audiência de julgamento o que posteriormente se designará data para o efeito.” * 3. Por despacho proferido em 2 de Março de 2022, que constitui a Refª Citius 99396566, foi proferido nos autos os seguinte despacho, que que se transcreve: “Consigno que consultei o processo n.º 289/20.....

No âmbito daqueles autos, o arguido foi acusado, julgado e condenado pela prática de um crime de falsificação de documento, p. e p. pelo art.º 256.º, n.º 1, al. d), do Código Penal, pelos exatos factos a que respeitam os pontos 1 a 8 do d. despacho de acusação proferido nos presentes autos.

Ocorre, porém, que no âmbito do processo n.º 289/20...., tais factos foram apenas qualificados, do ponto de vista jurídico, como um crime de falsificação de documentos, ao passo que, nos presentes autos, os factos foram ainda qualificados, adicionalmente, como um crime de falsidade de declaração, p. e p. pelo art.º 348.º-A, n.º 1, do Código Penal.

Não obstante a qualificação jurídica, constata-se que os factos são exatamente os mesmos e, sobre estes foi já proferida decisão, transitada em julgado.

Tal determina a verificação da existência de uma repetição de causas, tendo sido deduzida nova acusação por factos sobre os quais já recaiu decisão judicial anterior.

Verifica-se, assim, uma situação de ne bis in idem, facto que tem de ser oficiosamente declarado, sob pena de violação da garantia constitucional que impede a dupla ocorrência de julgados.

Nesta conformidade e atento o exposto, por verificação desta circunstância, determino o prosseguimento dos autos apenas para apreciação da factualidade que integra os pontos 9 a 11 do d. despacho de acusação, dando-se por não escritos os demais.

…“ * 4. Prosseguindo a audiência de julgamento na data para o efeito designada, veio a ser proferida sentença, em 23 de junho de 2022, na qual se decidiu condenar o arguido pela prática de um crime de violação de proibições, ilícito p. e p. pelo art.º 353.º, do C.P., na pena de 60 (sessenta) dias de multa, à taxa diária de 5,50€ (cinco euros e cinquenta cêntimos).

* 5. Inconformado com a decisão, recorreu o arguido, formulando no termo da motivação as seguintes conclusões, que se transcrevem: “CONCLUSÕES I. O Arguido nos presentes autos, vem acusado da prática, como autor material, na forma consumada e, em concurso efetivo, de um crime de falsas declarações, p. e p. pelo disposto no art. 348º -A, nº 1 do Código Penal, de um crime de falsificação de documentos, p. e p. pelo disposto no art. 256º, n.º 1, al. d), com referência ao art. 255º, alínea a), todos do Código Penal e de um crime de violação de proibições, imposições ou interdições p. e p. pelo disposto no art. 353º do Código Penal.

… III. Na audiência de discussão e julgamento que decorreu no dia 26 de maio de 2022, a Meritíssima Juíza do Tribunal a quo decidiu julgar o Arguido pela prática do crime de violação de proibições, imposições ou interdições, p. e p. pelo disposto no art. 353º do Código Penal, referindo que o mesmo já fora acusado, julgado e condenado pela prática de um crime de falsificação de documentos p. e p. pelo art. 256º, n.º 1, al. d) do Código Penal, pelos exatos factos a que respeitam os pontos 1 a 8 do despacho de acusação, mencionando que nos presentes autos tais factos ainda foram qualificados adicionalmente, como um crime de falsidade de declarações, p. e p. pelo art. 348º -A, nº 1 do Código Penal, factos que são exatamente os mesmos sobre quais já fora proferida decisão transitada em julgado e verificando-se apenas e quanto a estes a repetição de causas.

  1. Determinando a Meritíssima Juíza do tribunal a quo o prosseguimento para julgamento do Arguido pela prática de crime de violação de proibições, imposições ou interdições p. e p. pelo art. 353º do C.P., e atenta a douta acusação pública que acusa o Arguido da autoria material, na forma consumada e, em concurso efetivo, da prática de um crime de falsas declarações, p. e p. pelo art. 348º -A, nº 1 do C.P., um crime de falsificação de documentos, p. e p. pelo art. 256º, n.º 1, al. d), com referência ao art. 255º, al. a), todos do C.P. e um crime de violação de proibições, p. e p. pelo art. 353º do C.P., isto é, um cúmulo de três crimes, dos quais dois foram declarados caso julgado, suscita-nos a dúvida se a referida decisão de prosseguimento para julgamento do Arguido pela prática do crime de violação de proibições, p. e p. pelo art. 353º do C.P., não coloca em causa o principio ne bis in idem.

  2. Com o devido respeito, se o Arguido não foi julgado e condenado pela prática do crime de violação de proibições, imposições ou interdições p. e p. pelo art. 353º do Código Penal, no processo nº 289/20...., o que só poderá dever-se a um lapso da acusação, o tribunal a quo não pode vir depois remediar esse lapso.

  3. De acordo com o princípio ne bis in idem, um arguido não pode ser julgado mais de uma vez pelos factos de que foi acusado.

  4. A exceção de caso julgado materializa o disposto...

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