Acórdão nº 183/18.3GBALM.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 22 de Março de 2023

Magistrado ResponsávelALICE SANTOS
Data da Resolução22 de Março de 2023
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

* … O Ministério Público deduziu acusação, em processo comum e com intervenção do Tribunal Singular, contra AA, filho de BB e CC, nascido a .../.../1963, natural da freguesia ..., concelho ... casado, ..., residente na ..., ..., ... imputando-lhe a prática, em autoria material e na forma consumada, de: - 1 (um) crime de burla qualificada, previsto e punido pelo artigo 217.º, n.º 1 e 218.º, n.º 2, alínea a), por referência ao artigo 202.º, alínea b), todos do Código Penal, contra os ofendidos DD, EE, FF, GG e HH.

Após a alteração da qualificação jurídica, comunicada, o arguido passou a ser acusado da prática de: - 2 (dois) crimes de burla qualificada, previstos e punidos pelo artigo 217.º, n.º 1 e 218.º, n.º 1, por referência ao artigo 202.º, alínea a), todos do Código Penal, um contra o ofendido DD e o outro contra os ofendidos EE e GG.

Após a realização de audiência de discussão e julgamento foi proferida sentença que julgou procedente a acusação pública e em consequência decidiu: 1. Absolver o arguido AA pela prática de um crime de burla qualificada, previsto e punido pelo artigo 217.º, n.º 1 e 218.º, n.º 2, alínea a), por referência ao artigo 202.º, alínea b), todos do Código Penal, contra os ofendidos DD, EE, FF, GG e HH.

2. Condenar o arguido AA da prática, em autoria material, e na forma consumada de um crime de burla qualificada, previsto e punido pelo artigo 217.º, n.º 1 e 218.º, n.º 1, por referência ao artigo 202.º, alínea a), todos do Código Penal, contra o ofendido GG, na pena de 280 (duzentos e oitenta) dias, de multa, à taxa diária de 7,00 € (sete euros).

3. Condenar o arguido AA da prática, em autoria material, e na forma consumada de um crime de burla qualificada, previsto e punido pelo artigo 217.º, n.º 1 e 218.º, n.º 1, por referência ao artigo 202.º, alínea a), todos do Código Penal, contra os ofendidos EE e DD, na pena de 280 (duzentos e oitenta) dias, de multa, à taxa diária de 7,00 € (sete euros).

4. Operar o cúmulo jurídico das penas parcelares aplicada em 2) e 3) … 6. Julgar procedente por provado o pedido de indemnização cível deduzido por GG … * Desta sentença interpôs recurso o arguido, AA, sendo do seguinte teor as conclusões, formuladas na motivação do recurso: … 4º Produzida a prova foi reaberta a 14 de Julho de 2022 a audiência por forma a comunicar ao arguido as alterações à acusação proferida nos NUIPC 118/19.... e NUIPC 2/20...., tendo sido proferido o seguinte despacho: «Mais se comunica a seguinte alteração substancial dos factos: Em data concretamente não apurada, mas seguramente antes do dia 10 de Janeiro de 2019, HH, após se deslocar até ao stand de automóveis denominado “A... Lda”, adquiriu ao arguido AA a viatura ligeira de mercadorias, de marca ..., ... L..0 e matrícula ..-..-SV, pelo valor de €8.000 (oito mil euros).

O ofendido HH procedeu ao registo da propriedade do veículo de matrícula ..-..-SV em seu nome.

Posteriormente, e ainda na posse do veículo automóvel de matrícula ..-..-SV o ofendido HH detectou problemas mecânicos na referida viatura, altura em que se deslocou ao stand de automóveis denominado “A... Lda”, e procedeu à devolução da mesma ao arguido AA para que este solucionasse as avarias.

No dia 10 de Janeiro de 2019, após se deslocar até ao stand de automóveis denominado “A... Lda”, o ofendido GG, adquiriu ao arguido AA a viatura ligeira de mercadorias, de marca ..., ... L..0 e matrícula ..-..-SV, pelo valor de €9.000 (nove mil euros), propriedade de HH.

O ofendido HH não recebeu a viatura de matrícula ..-..-SV, por si adquirida, tal como prometido pelo arguido, nem em alternativa o pagamento efectuado para aquirição da viatura ligeira de mercadorias, de marca ..., ... L..0 e matrícula ..-..-SV, suportando o prejuízo de €8.000 (oito mil euros).

O arguido nunca entregou o valor recebido pela venda do referido veículo ao seu legítimo proprietário.

Pelo contrário, integrou aquele montante no seu património, sabendo que o mesmo não lhe pertencia e que a viatura que lhe havia sido entregue se destinada a ser reparada e devolvida ao seu legítimo proprietário.

Agiu, pois, com o propósito de integrar o referido montante na sua esfera patrimonial, o que logrou conseguir, sem o conhecimento e consentimento do legítimo proprietário do veículo ..-..-SV, bem sabendo que aquele veículo e montante não lhes pertencia e que aquela conduta era contrária à lei e criminalmente punível.

A conduta revelou-se livre, deliberada e consciente, tendo o arguido agido sempre de acordo com o plano traçado de se apropriar de uma quantia que sabia não lhe pertencer proveniente da venda do L ..0.

O arguido cometeu, pelo exposto, na forma consumada e em autoria material, um crime de abuso de confiança, previsto e punível nos termos do artigo 205º, nºs 1 e 4, al. a), com referência ao artigo 202º, al. a), do Código Penal.

5º O arguido opôs-se a esta alteração substancial dos factos.

6º Os factos a que nos referimos no artº 4º das presentes conclusões, são totalmente autónomos e independentes dos demais factos julgados nos presentes autos e fundamentariam um crime diverso daqueles que foram objecto dos presentes autos, 7º Pelo que atendendo ao disposto no artº 359º do CPP, e por forma a evitar o efeito da autoridade do caso julgado, o tribunal não podia pronunciar sobre os mesmos, razão pela qual deverá ser eliminado os pontos 30 a 32 e 39 dos factos assentes na sentença recorrida.

Sem conceder 8º Por ser manifesto que os factos considerados demonstrado e acolhidos nos pontos 2 a 9 e 11, 42 a 45 dos factos assentes da sentença ora recorrido são indefinidos, genéricos, abstractos, conclusivos, obscuros e imprecisos não só quanto ao tempo lugar e modo, mas também quanto ao real contexto, número, circunstâncias envolventes, etc., deverão os mesmos ser eliminados atendendo ao disposto no artº 129 nº 1 do CPP.

9º Ou deverá a sentença, nessa parte ser considerada nula nos termos do artº 374 nº 2 do CPP, nulidade que se alega para os devidos efeitos legais.

… 15º … 16º Porque o número de crimes determina-se nos termos do artº 30 do CP pelo número de vezes que o mesmo tipo de crime for preenchido pela conduta do agente, porque os factos envolvendo o EE são distintos dos factos envolvendo o DD, quer em termos de negocio (aquele pretendia vender e este pretendia comprar), quer em termos de tempo (Aquele entregou a sua viatura em Setembro de 2017, e este comprou e foi-lhe entregue a viatura em Fevereiro de 2018), quer em termos de partes envolvidas (aquele fez negocio apenas e tão só com os B..., e este fez negocio apenas e tão só com o arguido e/ ou stand A...), quer em termos de localização, porque não foi estabelecido qualquer ligação ou nexo de causalidade entre um negocio e o outro, 17º Deve-se ter por preenchido, pelo menos em abstracto a pratica de dois crimes de burla, na sua forma simples atendendo a que o alegado prejuízo patrimonial do DD ascendia a € 5000,00 , e o prejuízo patrimonial do EE ascendia a € 3000,00 18º Ora resulta dos autos que o EE, não apresentou queixa e o DD apenas a apresentou em 6.12.2018 quando os factos reportar-se-iam a 12 de Fevereiro de 2018, estando já prescrito nessa altura o seu direito de queixa nos termos do artº 115º do CP.

19º A falta da queixa relativamente aos factos descritos na acusação pública e particular, dentro do prazo a que alude o citado artigo 115º, nº 1, do Código Penal, enquanto pressuposto de procedibilidade, obsta ao conhecimento do mérito da causa, pelo que deverão ser arquivados os processos /crimes referentes aos pseudo ofendidos EE e DD Acresce que 20º Nos termos conjugados dos artºs 218 nº 4 e 206 nº 1 ambos do CP deverá extinguir-se a responsabilidade criminal do arguido relativamente as situações envolvendo o EE e o DD por ter havido reparação integral dos seus alegados prejuízos sem dano ilegítimo de terceiro em momento anterior ao inicio da audiência de discussão e julgamento da causa, presumindo-se ter havido concordância dos ofendidos e do arguido, uma vez que estes não deduziram sequer pedido civil.

21º Contudo, caso não se entenda existir concordância tácita dos ofendidos, e caso se entenda ser necessária uma concordância expressa dos mesmos, por se entender serem efectivamente ofendidos, porque não lhes foi perguntado sobre a sua concordância quanto a extinção do procedimento criminal contra o arguido, e porque tal prejudica gravemente o arguido verifica-se nulidade do procedimento, devendo ser reenviado o processo para 1ª instância por forma a recolher, ou não a concordância dos pseudo ofendidos EE e DD, quanto à extinção do procedimento criminal … ***** O recurso foi admitido para subir imediatamente, nos próprios autos, com efeito suspensivo.

Respondeu o Digno Procurador Adjunto, manifestando-se pela improcedência do recurso.

Nesta instância o Exmº Procurador-Geral Adjunto emitiu douto parecer no qual se manifesta, pela improcedência do recurso.

… Da discussão da causa resultaram provados os factos seguintes constantes da decisão: 1. O arguido AA, conhecido também por “...”, é um dos sócios-gerentes da empresa denominada “A... Lda”, com sede na Av. ..., ..., ..., e dedica-se, com escopo lucrativo, à venda de veículos automóveis novos e usados.

2. O arguido AA engendrou um esquema de acordo com o qual, sob a aparência de ser o responsável por uma empresa de venda de veículos automóveis novos e usados, obteria um elevado benefício económico injustificado, alcançado com a venda fraudulenta daqueles bens junto de alguns clientes que o contactassem.

3. Assim, em execução de tal desígnio, desde pelo menos o mês de Setembro de 2017 até, pelo menos, 20 de Novembro de 2019, o arguido AA, através de promessas de venda de veículos automóveis aos respectivos proprietários, colocava à venda, sob condição, no seu stand de automóveis denominado “A... Lda”, veículos automóveis usados pertencentes a terceiros, prometendo a esses o pagamento do preço acordado pela respectiva viatura após a concretização da venda.

4. Na posse...

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