Acórdão nº 48/20.9GBCTB.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 22 de Fevereiro de 2023
Magistrado Responsável | JORGE JACOB, POR VENCIMENTO |
Data da Resolução | 22 de Fevereiro de 2023 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Acordam em conferência no Tribunal da Relação de Coimbra: I – RELATÓRIO: … o arguido AA … foi condenado, como autor de um crime contra a preservação da fauna e das espécies cinegéticas, p. e p. pelo art. 30.º, n.º 1, e 6.º, n.º 1, al. c), da Lei 173/99, de 21/09 (Lei da Caça – LC), com referência aos art. 78.º e 90.º do DL 202/2004, de 18/08 (Regulamento da Lei de Bases Gerais da Caça - RLC) … Inconformado, recorre o arguido retirando da motivação do recurso as seguintes conclusões: … II – O tribunal recorrido fez uma incorreta apreciação da prova produzida em sede de audiência de julgamento.
… VI – Tendo o recorrente no seu depoimento, declarado de forma precisa que não foi ele quem colocou a armadilha, o tribunal recorrido, ao não valorar como verdadeiro o seu depoimento, incorreu numa incorrecta apreciação do depoimento do recorrente.
VII – O tribunal a quo baseou unicamente a sua decisão no depoimento da testemunha apresentada pela acusação pública, militar da GNR.
VIII – O qual "relatou que no local e à data dos factos, o arguido admitiu que aquela armadilha era dele e foi por si colocada".
… XII – Perante a discrepância nos depoimentos … caberia ao tribunal a quo, munir-se de outras provas que confirmassem a versão da acusação nos termos do artigo 32.º, n.º 5, da Constituição da República Portuguesa [CR], violando assim o princípio in dubio pro reo, consagrado também constitucionalmente no n.º 2 do mesmo diploma.
… XIV – Norma violada, artigo 32°, n.º 2, da CR.
O M.P. respondeu, pugnando pela improcedência do recurso … Nesta instância, o Exmº Procurador-Geral Adjunto pronunciou-se também pela improcedência do recurso.
… … no caso vertente as questões a conhecer se cingem ao seguinte: - Verificação da ocorrência de erro de julgamento no âmbito da impugnação ampla da matéria de facto; - Necessidade de ponderação do princípio in dubio pro reo; - Verificação do preenchimento do tipo legal de crime imputado ao arguido.
II – FUNDAMENTAÇÃO: O tribunal a quo considerou provados os seguintes factos: 1. Em data não concretamente apurada, mas anterior a 29 de novembro de 2020, o arguido AA, armou uma armadilha de ferro com corrente, espigão e cordel azul, na quinta denominada por ..., em ..., destinada a capturar os animais que por ali passassem, como raposas.
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Nas referidas circunstâncias de tempo, modo e lugar, foi apanhada na referida armadilha de ferro, próximo das 14 horas, do dia 29.11.2020, uma raposa macho da espécie Vulpes vulpes … … 6. O arguido é reformado da GNR.
… 12. No certificado de registo criminal do arguido consta uma condenação, no âmbito do processo comum, n.º 20/19...., pela prática de um crime de ameaça, por factos praticados em 09.2019, por decisão de 22.06.2021, transitada em julgado em 07.09.2021, na pena de 60 dias de multa, à taxa diária de € 7,00, já extinta.
… A matéria de facto foi motivada nos seguintes termos: … Louvou o tribunal a sua convicção no depoimento da testemunha BB, militar da GNR que, à data dos factos, se deslocou ao local.
Esta testemunha apresentou um depoimento espontâneo, seguro, objectivo e imparcial, designadamente quando relatou que, no local e à data dos factos, o arguido admitiu que aquela armadilha era dele e foi por si colocada.
A testemunha relatou o que viu e ouviu de forma circunstanciada, de forma segura, sem revelar hesitações e mantendo a mesma versão dos factos ao longo das várias perguntas que lhe foram dirigidas pelas diferentes instâncias.
… As declarações do arguido apresentaram-se titubeantes e incoerentes.
O arguido confirmou que, à data dos factos, esteve no local, no entanto, justificou o facto de se ter ausentado porque os militares da GNR lhe deram essa indicação e lhe disseram que iria ter problemas, acrescentou, ainda, o arguido que apenas se limitou a obedecer às ordens que lhe deram.
Ora, não pode o tribunal esquecer que estamos perante um agente que é reformado da GNR, como tal, não se afigura minimamente credível, nem lógico, que tenha sido alertado para eventuais problemas com a justiça mas, no entanto, utilizando como desculpa o facto de “ser pessoa obediente”, ter ido embora, não querendo saber do assunto, quando, segundo o próprio, nada tinha que ver com a armadilha.
Por outro lado, ressaltou ao tribunal a grande preocupação e constante referência que o arguido fez ao facto dos seus animais serem atacados por cães vadios.
Esta preocupação coincide com o relato que a testemunha BB fez, no sentido de que o arguido admitiu que utilizou a armadilha por causa dos cães vadios.
Acresce que a testemunha BB, para conseguir individualizar a armadinha, indicou ao arguido que a mesma tinha um baraço azul pendurado, e foi nesta sequência que o arguido admitiu a prática dos factos.
Quanto ao depoimento das testemunhas CC e DD, embora se tenha revelado sincero, pouco acrescentou na descoberta da verdade, uma vez que se limitaram a afirmar conclusões e juízos de valor … … Apreciando e decidindo: Aligeirando considerações relativamente ao modo como vem impugnada a matéria de facto assente, nomeadamente, no que concerne aos factos nºs 1, 3, 4 e 5 … No entanto, fundamentalmente, o recorrente pretende contrapor e fazer prevalecer as declarações que prestou em audiência sobre o testemunho prestado pelo militar da GNR na mesma ocasião … constituindo apenas e tão-só um ataque ao modo como o tribunal recorrido formou a sua convicção, valorizando o depoimento da testemunha e considerando desprovidas de crédito as declarações do arguido.
Está em causa a afirmação do princípio da livre convicção, com assento no art. 127º do CPP, tendo a convicção evidenciada pelo tribunal resultado da contraposição às declarações do...
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