Acórdão nº 00014/19.7BEMDL de Tribunal Central Administrativo Norte, 12 de Julho de 2019

Magistrado ResponsávelHelena Canelas
Data da Resolução12 de Julho de 2019
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: I. RELATÓRIO TATC (devidamente identificado nos autos) instaurou no Tribunal Administrativo e Fiscal de Mirandela processo cautelar contra o Instituto de Financiamento da Agricultura e Pescas, I.P.

no qual requereu a decretação de providência cautelar de suspensão de eficácia dos seguintes atos: - i) da decisão notificada em 29/11/2018, que determinou a não atribuição de efeito suspensivo ao processo (vertida no Doc. nº 1 que juntou com o RI).

- ii) da decisão da Entidade Requerida de 04/10/2018, que determinou a resolução unilateral do contrato de financiamento n.º 02038014/0 e a reposição do montante pago, no valor de 38.869,95 € acrescido de juros à taxa legal em vigor (vertida no Doc. nº 2 que juntou com o RI).

Por despacho da Mmª Juíza a quo, que antecedeu imediatamente a sentença datada de 15/04/2019, foi indeferida a produção de prova testemunhal, por declarações de parte e por inspeção ao local que tinha sido requerida pelo Requerente no Requerimento Inicial da providência cautelar, e considerado que os autos dispunham de todos os elementos necessários à decisão a proferir. E pronunciando-se na sentença quanto ao mérito da pretensão cautelar, indeferiu-a por falta de verificação do requisito do periculum in mora, abstendo-se de conhecer, por prejudicada, a verificação dos demais requisitos legais necessários para a decretação da providência.

Inconformado, o requerente interpôs o presente recurso de apelação, que dirige quer quanto ao despacho que indeferiu a produção de prova, quer quanto à sentença, formulando as seguintes conclusões, nos seguintes termos: 1ª O recorrente não concorda com o douto despacho e a douta sentença recorrida, porquanto se considera que o Tribunal recorrido realizou uma menos correcta interpretação e aplicação do direito ao caso concreto.

  1. De facto, considera, por despacho, o Exmo. Sr. Juiz do Tribunal a quo, que os autos cautelares dispõem dos elementos necessários à apreciação da causa, nos termos do artigo 118°, números 3 e 5 do CPTA. Todavia, o recorrente não concorda, nem se conforma, com este despacho, na medida em que nele se fez errada apreciação dos factos e igualmente errada interpretação e aplicação do artigo 118°, números 3 e 5 do CPTA, que se mostra, assim, violado.

  2. O recorrente, na sua p.i., requereu a produção de meios de prova, e fê-lo pois o recorrente invocou no seu requerimento inicial factos concretos tendentes a demonstrar os prejuízos resultantes dos actos cuja suspensão de eficácia requereu, nomeadamente os elencados nos artigos 152° a 189° do requerimento inicial.

  3. E o que é facto é que a prova desses prejuízos era, como é, imprescindível para se proceder à análise do requisito do "periculum in mora", traduzido no fundado receio da constituição de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação previsto na alínea b) do n° 1 do artigo 120° do CPTA, que tem de se verificar cumulativamente com o "fumus boni iuris".

  4. O requerente alegou e determinou os prejuízos, pretendendo prová-los, designadamente através da produção de prova testemunhal e através de declarações de parte.

  5. No entanto, tal prova enunciada e a cargo do requerente, foi inviabilizada pelo próprio Tribunal "a quo" ao indeferir a produção de prova, e designadamente a produção de prova testemunhal, o que determinou, a final, que não se tivesse conseguido estabelecer, em concreto, se estavam verificados, ou não, os prejuízos de difícil reparação invocados pelo requerente.

  6. Ou seja, o Tribunal a quo, em primeiro lugar recusa a produção de prova, e depois vem dizer que o A. não demonstrou os factos.

  7. E, mais se diga que, ao contrário do entendimento constante do despacho recorrido e que visou justificar a desnecessidade da produção de prova, os documentos não eram de todo suficientes como prova dos danos alegados.

  8. Ademais, a prova por documentos pode ser feita em qualquer altura do processo, desde que se respeite o vertido no artigo 423° do C.P.C, ex vi art.° 1° do CPTA, até porque existem diversos documentos cuja apresentação não é possível oferecer com o articulado.

  9. Nestes termos, ao dispensar a produção de prova quando esta se mostrava indispensável à correta apreciação dos requisitos da providência cautelar requerida, o despacho recorrido fez uma errada interpretação e aplicação do artigo 118°, números 3 e 5 do CPTA, impondo-se a respetiva anulação e a baixa dos autos ao TAF de Mirandela para aí se proceder à produção de prova, nomeadamente com a inquirição das testemunhas arroladas pelo requerente.

  10. Pois, como referem Mário Aroso de Almeida e Carlos Fernandes Cadilha, no "Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos", em anotação ao artigo 118° do CPTA: " [ ...] todos os meios de prova legítimos são, pois, admissíveis ...".

  11. Neste sentido já se pronunciou o TCA Norte, no seu dou Aresto no Proc. n° 276/11.8BEV1S, 2 Sec. do Cont. Tribut., de 12.01.2012, tal como infra se transcreve: "O Tribunal a quo só poderia ter dispensado a produção da prova testemunhal se tivesse concluído que ela era manifestamente impertinente inútil ou desnecessária".

  12. A produção de prova por declarações de parte e a inquirição das testemunhas arroladas pelo recorrente revestia-se de extrema relevância para a descoberta da verdade material e consequentemente para a boa decisão da causa, na medida em que os elementos carreados pelas partes para os autos se mostram insuficientes à prolação de uma decisão.

  13. O Tribunal a quo não poderia dispensar a produção de prova testemunhal e decidir a insuficiência de prova dos factos alegados atento o disposto no n° 1 do art. 367° do CPC, aplicável por força do art.° 1° do CPTA, que confere ao juiz o poder de ordenar oficiosamente as diligências probatórias que considerar necessárias ao apuramento dos pressupostos de decretamento das providências cautelares requeridas. É este o poder que está, aliás, vertido no n° 3 do art. 118° do CPTA.

  14. O poder discricionário que é concedido ao julgador cautelar pelo artigo 118°, n° 3, do CPTA, não poderá ser um poder discricionário tout court, sendo antes um poder-dever, isto é, um poder que está vinculado à exigência da busca da verdade material e ao respeito pelo princípio da tutela jurisdicional efectiva.

  15. Assim, o TM', ao ter proferido decisão sem permitir ao recorrente demonstrar a veracidade das afirmações produzidas em sede de requerimento inicial, violou o direito à tutela jurisdicional efetiva, previsto no artigo 2° do CPTA.

  16. E, sem prescindir, o requerente cumpriu os artigos 114', n° 3 alínea g) do CPTA, pois formulou e especificou os fundamentos do pedido, oferecendo prova sumária da respetiva existência; o recorrente invocou o direito, fez prova dos factos e requereu a produção de prova; o recorrente respeitou o artigo 342° do Código Civil.

  17. O recorrente não esqueceu o seu ónus de articulação e de prova dos «factos concretos» que permitam e legitimem o julgador cautelar a realizar o «juízo de ponderação de interesses e danos» que é previsto e exigido.

  18. Face ao exposto, o recorrente entende que a recusa da produção de prova e a recusa de inquirição das testemunhas por si arroladas acarreta a violação do disposto no artigo 118°, n° 3, do CPTA, e implica a anulação da sentença recorrida (Cfr. Acórdão do TCA Sul de 15.09.2011, R°07957/11).

  19. Até porque, tal como entendido no Ac. do TCA Sul, Proc. n.° 10394/13, CA2° Juizo, de 24.10.2013, disponível em www.dgsi.pt: "Na verdade, não pode o Tribunal a quo prescindir de prova testemunhal e julgar não verificado o requisito do periculum in mora com base no facto de o mesmo não resultar provado".

  20. A dispensa da prova influiu na boa decisão da causa incorrendo a sentença recorrida na violação do disposto no art.° 2°, n° 3, 114°, n°3 alínea g), e art. 118° do CPTA, e ainda na violação dos artigos 367° do CPC e 342° do Código Civil 22ª Devendo, em consequência, ser julgado procedente o presente recurso, também nesta parte, revogando-se assim o despacho recorrido.

    Sem prescindir, 23ª O recorrente discorda igualmente da sentença recorrida, por considerar que esta incorre em deficiente interpretação e aplicação do direito ao caso concreto.

  21. In casu, o recorrente também alegou estarem preenchidos os critérios de concessão da providência estipulados na r parte do artigo 120°, n° 1, b) do C.P.T.A., e tudo, de acordo com a factualidade vertida em 181° a 206° da p.i..

  22. Mas o tribunal a quo, entendeu ter-se "por inverificado o periculum in mora...".

  23. O recorrente não alcança a razão pela qual entendeu o Tribunal "a quo" não ter sido demonstrado o "periculum in mora", quando ele próprio dispensou a produção de prova ao abrigo do n.° 3 do artigo 118° do CPTA.

  24. Particularmente, no caso de o Tribunal considerar que os elementos juntos com o requerimento inicial da providência cautelar não eram suficientes para demonstrar a existência de "periculum in mora", o que não se concede, então sempre teria de lançar mão da prova por declarações de parte e da prova testemunhal que foi oportunamente indicada pelo recorrente nesse mesmo requerimento.

  25. Não é possível que o Tribunal dispense a audição da parte e as testemunhas oportunamente indicadas pelo recorrente e depois indefira a providência cautelar, faltando a produção de prova sobre os factos efetivamente invocados e relativamente aos quais a parte e as testemunhas estariam habilitadas para testemunhar, enfermando a sentença do Tribunal "a quo" de manifesta deficiência instrutória, não fazendo uso adequado do disposto no n° 3 do artigo 118° do CPTA. (Neste sentido Acórdão do TCA Sul, Processo 10105/13, de 11-07¬2013).

  26. O recorrente indicou as suas declarações de parte, para além da prova testemunhal, sendo que através delas podia o tribunal a quo entender qual a situação de liquidez do recorrente, qual a identificação dos subsídios que declarou fiscalmente (e aqui...

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