Acórdão nº 03072/14.7BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 18 de Outubro de 2019

Magistrado ResponsávelMaria Fernanda Antunes Aparício Duarte Brandão
Data da Resolução18 de Outubro de 2019
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, na secção de contencioso administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: RELATÓRIO M. A. P. D. instaurou acção administrativa especial de pretensão conexa com acto administrativo contra a Comissão para o Acompanhamento dos Auxiliares de Justiça, H. M. M. L. e V. J. de V. R. R. C., pedindo a declaração de nulidade do acto administrativo consubstanciado no despacho nº 52/2014, de 07/08/2014, proferido pela Directora da Comissão de Disciplina dos Auxiliares de Justiça, que decidiu aplicar-lhe a pena disciplinar de expulsão, no âmbito do procedimento disciplinar nº 5/2013 e, consequentemente, a declaração de nulidade de outros actos administrativos praticados no âmbito do mesmo procedimento disciplinar, bem como a reintegração nas suas funções, o desbloqueio das suas contas bancárias, a publicitação da sentença e o ressarcimento dos danos patrimoniais e não patrimoniais sofridos.

Por decisão proferida pelo TAF do Porto foram julgadas improcedentes as excepções invocadas pelos Réus.

Desta vem interposto recurso.

Alegando, os Réus concluíram: 1. O presente recurso é apresentado ao abrigo da conjugação entre o disposto no art.º 142.º do CPTA e 644.º, n.º 1, al. b, 1.ª parte, do CPC, por remissão do art.º 1.º daquele Código, pois ao julgar improcedente a invocada exceção da caducidade, o despacho saneador apreciou o mérito da ação.

  1. De acordo com o previsto no art.º 8.º n.º 2 da Lei 77/2013, de 20 de novembro, o direito de impugnação do ato mostra-se caducado.

  2. A caducidade do direito de ação constitui exceção perentória, que obsta ao prosseguimento do processo.

  3. A “aplicação analógica do princípio da retroactividade da lei punitiva processual mais favorável ao arguido em procedimento disciplinar” é inaplicável ao caso, por não ter existido qualquer alteração legislativa entre a data de início da contagem do prazo para impugnação e data da entrada em juízo da ação.

  4. O A. qualificou a presente ação como ação especial, de impugnação de atos administrativos, visando impugnar o despacho sancionatório; todavia muitos dos pedidos em nada se coadunam com tal pretensão, ultrapassando-a, pois nada têm que ver com o referido despacho sancionatório.

  5. Como diz o A. no art.º 1.º - “Constitui objecto da presente ação, o “Despacho n.º 52/2014 da Diretora da Comissão de Disciplina dos Auxiliares de Justiça”, de 07AGO14”, e, como diz no art.º 2.º “Cuja nulidade se pretende ver declarada” e, acrescenta o A. no art.º 3.º, e “De todos os actos ao mesmo conducentes”, e no 4.º “A partir de 14 de Maio de 2014, pela 1ª Ré, a CAAJ e pelo Presidente e Vogal do seu órgão de gestão, os aqui, 2º e 3º Réus”.

  6. Mas que atos são estes que o A. pretende ver declarados nulos? Nenhum, ao que conste da p.i., ou seja, a A. não identifica qualquer ato praticado por este órgão de gestão (1.º Réu), ou pelo seu Presidente e/ou Vogal (2.º e 3.º Réus), conducente ou não conducente ao despacho sancionatório, ato que não foi praticado por nenhum destes Réus, que possa ser objeto de tal declaração de nulidade.

  7. Por tal razão, inexiste causa de pedir para os pedidos identificados por a.2, C e F do petitório, causa de ineptidão parcial da petição (art.ºs 186.º/2/b do CPC, ex vi art.º 1.º do CPTA, e 89.º/1/a do CPTA.

  8. Ao contrário do decidido, os referidos pedidos não são “uma decorrência do pedido de anulação do despacho final sancionatório”, nem tal decorre do despacho em recurso.

  9. O que o A. pretende é a nulidade dos atos que integram o procedimento disciplinar com base na invocada inexistência de um órgão que nada tem que ver com tal procedimento e responsabilizar membros desse órgão que nenhum ato praticaram.

  10. Ora, para tais pedidos, falta “ato praticado” para que possa proceder qualquer pedido de nulidade.

  11. A contradição entre o pedido e a causa de pedir é causa de ineptidão da petição, nos termos do art.º 186.º/2/b do CPC, ex vi art.º 1.º do CPTA, e 89.º/1/a do CPTA, sendo nulo todo o processo, normas que se mostram violados com a decisão em recurso.

  12. A decidida cumulação, ainda que aparente, de pedidos contraria as regras de cumulação de pedidos contidas no art.º 4.º do CPTA, o que sempre a impediria, norma que se mostra violada com a decisão em recurso.

  13. A pretendida cumulação não preenche os requisitos da al. a) do n.º 1 do art.º 4.º, pois não há uma única causa de pedir, nem a da al. b) pois a apreciação da inexistência de um órgão ou a responsabilidade de membros deste não decorre dos mesmos factos ou da aplicação das mesmas regras respeitantes ao ato sancionatório, não praticado por nenhum destes.

  14. Os 2.º e 3.º Réus não são autores de tal ato sancionatório, pois não nenhum deles é a “Directora da Comissão de Disciplina dos Auxiliares de Justiça”, nem sequer membro de tal órgão, nem de qualquer outro cujos atos estejam em causa nestes autos, pelo que não se entende o alcance do pedido de que sejam condenados a indemnizar o A., nos montantes que vierem a ser fixados em liquidação de sentença.

  15. Os Réus não são igualmente autores de qualquer ato conducente àquele, fazendo o A. uma enorme confusão, para que arrasta o decisor, entre os membros do Grupo de Gestão das CPEE – órgão que praticou atos referidos na p.i., por exemplo no art.º 94.º - e os Réus, que são apenas membros do órgão de gestão da CAAJ.

  16. Os 2.º e 3.º Réus são, pois, parte ilegítima nos presentes autos, o que constitui exceção dilatória, nos termos do art.º 89.º/1/b do CPTA, não tendo interesse em agir, o que constitui exceção dilatória inominada, com absolvição dos RR. do pedido.

  17. Por estar em causa um ato de uma pessoa coletiva de direito público, os titulares dos seus órgãos apenas podem ser responsáveis pelos danos que resultem de ações ou omissões ilícitas, por eles cometidas com dolo ou com diligência e zelo manifestamente inferiores àqueles a que se encontravam obrigados em razão do cargo (art.º 8.º da Lei n.º 67/2007, de 31/12).

  18. Mas o A. não invoca factos que possam preencher qualquer dos requisitos de que a lei faz depender a responsabilidade de titulares de órgãos, pelo que nunca poderá ocorrer qualquer condenação dos RR., nestes autos ou em execução do que nestes viesse a ser decidido.

  19. Falta, pois, causa de pedir a tal pedido, o que constitui nova causa de ineptidão da petição inicial, nos termos do art.º 186.º/2/a do CPC e art.º 89.º/1/a do CPTA, que se mostram violados com a decisão em recurso.

Termos em que deve o presente recurso merecer provimento, anulando-se a decisão recorrida e substituindo-o por outra que julgue procedentes as invocadas exceções, com as devidas consequências legais.

O Autor juntou contra-alegações, sem conclusões, finalizando assim: De tudo o que alegado foi, forçoso é de concluir que, nada a há a reparar na decisão proferida pela Senhora Juiz, no que concerne à improcedência das excepções invocadas pelos R.R., ora Recorrentes.

O Despacho Saneador é, na sua plenitude, objectivo e incisivo, demonstrando de forma clara a falta de razão dos aqui Recorrentes.

Por isso, o recurso a que ora se responde, na esteira do decidido pelo Tribunal recorrido, deverá ser julgado totalmente improcedente.

Termos em que deve improceder o recurso dos Recorrentes com todas as legais consequências, assim se fazendo JUSTIÇA! Argumentou ainda com a intempestividade do recurso.

O Ministério Público, notificado nos termos e para os efeitos contidos no art.º 146º/1 do CPTA, não emitiu parecer.

Cumpre apreciar e decidir.

FUNDAMENTOS Está posto em crise o despacho saneador que ostenta este discurso fundamentador: Na contestação, os demandados invocaram a ineptidão da petição inicial, em três perspectivas: a primeira, relativa à falta de causa de pedir que sustente o pedido de declaração de nulidade dos actos praticados a partir de 15/05/2014, por não ter sido identificado nenhum acto em concreto, praticado pela 1.ª demandada; a segunda, relativa à divergência entre a causa de pedir e os pedidos formulados nas alíneas A) a F) da petição inicial, por a causa de pedir se reportar ao despacho sancionatório e os referidos pedidos a ultrapassarem largamente; a terceira, relativa à falta de causa de pedir correspondente ao pedido de condenação ao pagamento de uma indemnização pelos danos causados, pelos demandados, ao autor.

Entende o autor que tal excepção não se verifica, em nenhuma das apontadas vertentes, porquanto os demandados apresentaram contestação por impugnação, tendo compreendido a causa de pedir em toda a sua extensão, no pedido formulado sob a alínea A) da petição inicial, o autor pede a declaração de nulidade da acusação e da decisão, os pedidos efectuados sob as alíneas D) e E) da petição inicial, são uma decorrência/consequência do pedido formulado na predita alínea A), estando intimamente relacionado com o mesmo, por serem uma decorrência directa, necessária e adequada da nulidade do despacho sancionatório.

Por a sua eventual procedência conduzir à excepção dilatória de nulidade de todo o processado (artigo 89.º, n.º 1, alínea a) e 4 e 8 do CPTA) e, consequentemente, à absolvição da instância (artigo 88.º, n.º 4 do CPTA), obstando ao conhecimento do mérito da causa, cumpre conhecê-la de imediato.

Assim, Diz-se inepta a petição inicial quando, além do mais, lhe falte ou seja ininteligível a indicação do pedido ou da causa de pedir ou quando o pedido esteja em contradição com a causa de pedir (artigo 186.º, n.º 2 alíneas a) e b) do CPC, respectivamente).

A causa de pedir é o facto jurídico de que emerge a pretensão do autor ou, por outras palavras, “o facto concreto que serve de fundamento ao efeito jurídico pretendido” (neste sentido, Antunes Varela, Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, “Manual de Processo Civil”, 2.ª edição revista e actualizada, Coimbra Editora, 1985...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT