Acórdão nº 00345/10.1BEAVR de Tribunal Central Administrativo Norte, 19 de Dezembro de 2019

Magistrado ResponsávelPaulo Ferreira de Magalhães
Data da Resolução19 de Dezembro de 2019
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: I - RELATÓRIO P., S.A.

, com sede no (...), em …, inconformada, veio interpor recurso jurisdicional da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro, datada de 22 de janeiro de 2015, pela qual julgou improcedente a pretensão por si deduzida contra as liquidações de IMT e juros compensatórios, no valor global de €4.980,95 €, que lhe foram comunicadas através do ofício n.º 2999, de 09/12/2009, relativas à aquisição do prédio n.º 1472 inscrito na matriz predial rústica da freguesia de (...), e posteriormente tributado como urbano, e que, consequentemente, manteve as liquidações impugnadas.

No âmbito das Alegações por si apresentadas [Cfr. fls. 193 a 201 dos autos em suporte físico], elencou a final as conclusões que ora se reproduzem: “CONCLUSÕES: 1ª.- Ao contrário do doutamente decidido, o acto da AT que determinou a(s) liquidação(ões) adicional(ais) de IMT que se impugnou(aram), está inquinado do vício de falta de fundamentação.

  1. - Com efeito, o relatório da AT é completamente omisso, não explicitando os factos e/ou razões que a levaram a desclassificar os prédios rústicos adquiridos pela recorrente, e a classificá-los como urbanos.

  2. - Diversamente do que consta da douta decisão recorrida, a recorrente não descortinou, no relatório da AT, as razões que a levaram a desclassificar e a posteriormente classificar como urbanos os terrenos por si adquiridos.

  3. - A falta de fundamentação acarreta a nulidade do acto, que expressamente se invoca para os devidos e legais efeitos.

    Sem prescindir.

  4. - A douta decisão, ao ter dado como provada a factualidade constante dos pontos 10 e 14 do probatório, incorreu em erro de julgamento. Aliás, 6ª.- Desconhece a recorrente quais os elementos probatórios em que se louvou a douta decisão recorrida para dar como provada tal factualidade. Sendo certo que 7ª.- Não existe qualquer plano de urbanização aprovado para a área em que se localizam os terrenos adquiridos pela ora impugnante, como resulta do Doc. nº 2 anexo, recentemente emitido pela Câmara Municipal de (...). Sendo que, 8ª.- A necessidade de junção de tal documento decorre do julgamento proferido na 1ª instância (artº. 651º, nº 1, do C.P.C.), documento, esse, que determina, por si só, a alteração da matéria de facto, relativamente ao ponto impugnado.

  5. - A douta decisão recorrida incorreu em manifesto lapso, ao ter feito consignar que nos terrenos da consignante foi construído o novo Estádio de (...) e outras infraestruturas, dado que os mesmos estão implantados a terrenos pertencentes a outra entidade.

  6. - A douta decisão recorrida incorreu em erro de julgamento, ao ter dado como provada a factualidade constante do ponto 14 do probatório, pois a recorrente apresentou “reclamação” de cada uma das notificações das avaliações dos terrenos.

  7. - Deverá, pois, ser alterada a decisão da matéria de facto constante dos pontos 10 e 14, declarando-se, respetivamente, não existir qualquer plano de urbanização aprovado para os terrenos adquiridos pela impugnante/recorrente, e que esta reclamou de todas as notificações das avaliações realizadas pela A.T..

  8. - A douta decisão recorrida incorreu em erro de interpretação e aplicação da lei, ao ter considerado que a A.T. não violou a lei, ao ter desclassificado os terrenos rústicos da recorrente, classificando-os como urbanos. Com efeito, 13ª.- Tal desclassificação e subsequente classificação radicaram exclusivamente na circunstância de, em algumas das escrituras de aquisição, ter ficado consignado que os mesmos se destinavam a construção.

  9. - Porém, ao contrário do decidido, nos referidos terrenos, além de não existir qualquer construção, também não existe qualquer plano de urbanização aprovado que permita o licenciamento ou autorização para construção dos equipamentos, infra-estruturas ou qualquer outro tipo de obras.

  10. - Para além do P.D.M. de (...), não existe qualquer outro plano de urbanização para a área em que se localizam os terrenos da recorrente e, existindo, apenas o P.D.M. não é possível realizar qualquer tipo de operação de loteamento ou obras de construção ou de urbanização. Aliás, 16ª.- Como consta do teor da Circular nº 1/2000, de 23 de Março, a AT estava vinculada ao que nela se consignava, ou seja: “Os prédios rústicos inscritos nas matrizes respectivas, incluídos posteriormente em zonas urbanizáveis pelos PDM’s, antes da aprovação e entrada em vigor dos respectivos Planos de Pormenor, devem continuar como rústicos, atenta a ineficácia jurídica dos respectivos PDM’s antes da sua regulamentação” (negrito e sublinhado nossos).

  11. - Acresce ainda que, como decorre dos autos, os terrenos da recorrente estavam originariamente inscritos nas respectivas matrizes prediais rústicas e a AT desclassificou-os de rústicos e classificou-os como urbanos apenas pela circunstância, como se referiu supra, de, em algumas escrituras, se ter feito consignar que os mesmos se destinariam a construção. Ora, 18ª.- O art.º 3º do CIMI estabelece uma definição positiva de prédio rústico, assumindo natureza meramente residual a classificação dos restantes prédios (urbanos e mistos – ver art.º 4º a 6º do CIMI).

  12. - Na classificação de um prédio como rústico relevam duas ordens de critérios: a localização, e o destino económico.

  13. - Sendo que, no que respeita à localização, a referência relevante centra-se na situação do prédio – dentro, ou fora de aglomerados urbanos –, e no que respeita ao destino económico, o prédio não deve ser classificado como terreno para construção, deve estar afecto ou ter como utilização normal a produção de rendimentos agrícolas, ou, não tendo afectação agrícola, não se encontre construído ou disponha apenas de edifícios ou construções meramente acessórias sem autonomia económica e de reduzido valor.

  14. - No caso dos prédios referidos nos autos, em parte alguma do probatório consta que os prédios se localizam em qualquer aglomerado urbano; pelo contrário, os referidos prédios estão situados fora de um aglomerado urbano. E, 22ª.- Apesar dos terrenos adquiridos pela impugnante não estarem de momento a ter uma utilização geradora de rendimentos agrícolas (tal como estes são considerados para efeitos de IRS), tal não é decisivo para que os mesmos não possam qualificar-se como “rústicos”. Com efeito, 23ª.- Se a não afectação a uma utilização geradora de rendimentos agrícolas, em princípio, poderia levar à desclassificação dos ditos prédios como rústicos, tal desclassificação é impedida pelo disposto na al. b) do nº 1 do artº. 3º do CIMI, que dispõe que os terrenos situados fora de um aglomerado urbano também são classificados como prédios rústicos desde que, não tendo a afectação indicada na alínea anterior (isto é, desde não tendo afectação geradora de rendimentos agrícolas), não se encontrem construídos ou disponham apenas de edifícios ou construções de carácter acessório, sem autonomia económica ou de reduzido valor.

  15. - Ora, é exactamente o que ocorre no caso dos autos, dado que nos terrenos não há qualquer construção, não é admissível qualquer tipo de construção, nem existe aprovado qualquer plano de urbanização (ao contrário do que a douta decisão recorrida inculca).

  16. - Como decorre da interpretação articulada das als. a) e b) do nº 1 do artº. 3º do CIMI, sendo certo que a mera não afectação ou não destinação normal a uma utilização geradora de rendimentos agrícolas não basta para “desclassificar” o prédio como rústico e classificá-lo como urbano, antes se exigindo que, nos casos em que não tenha tal afectação, o prédio não se encontre construído ou disponha apenas de edifícios ou construções de carácter acessório, é então de concluir que, estando os prédios dos autos classificados como prédios rústicos e não se verificando as circunstâncias referidas na al. b) do nº 1 do artº. 3º do CIMI, não poderá essa classificação ser alterada (para prédios urbanos) pelo simples facto de nos documentos de aquisição se ter consignado que alguns deles se destinariam à construção (como conclui a AT e que mereceu o acolhimento da douta decisão recorrida), não obstante não estarem construídos nem ser possível efectuar qualquer construção nos referidos prédios.

  17. - Ao decidir de modo diverso, a douta decisão recorrida procedeu a uma errada interpretação e aplicação dos artºs. 3º, 4º, 5º e 6º do CIMI, que deverão ser interpretados nos termos preditos, devendo em consequência ser revogada a douta decisão recorrida e, consequentemente, ser anulada a liquidação impugnada.

    NESTES TERMOS, DEVE O PRESENTE RECURSO SER RECEBIDO, JULGADO PROCEDENTE POR PROVADO E, POR VIA DISSO, SER PROFERIDO DOUTO ACÓRDÃO QUE, REVOGANDO A TAMBÉM DOUTA DECISÃO RECORRIDA, DECLARE ANULADA A LIQUIDAÇÃO IMPUGNADA.

    ASSIM DECIDINDO V. Exªs. FARÃO JUSTIÇA “** A Recorrida Autoridade Tributária e Aduaneira não apresentou Contra alegações.

    ** O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso e confirmada a Sentença recorrida.

    ***Colhidos os vistos das Ex.mas Senhoras Juízas Desembargadoras Adjuntas, vem o processo submetido à Conferência para julgamento.

    **II - DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, cujo objecto do recurso está delimitado pelas conclusões das respectivas Alegações - Cfr. artigos 608.º, n.º 2, 635.º, n.ºs 4 e 5, todos do Código de Processo Civil (CPC), ex vi artigo 2.º, alínea e) e artigo 281.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT) –, e que se centram em saber se a Sentença recorrida incorreu em erro de julgamento de facto e de direito, por inadequada valoração da matéria de facto, ao ter decidido que o acto de liquidação de IMT não padecia de vício de forma, por falta de fundamentação [ao considerar que o acto de liquidação do IMT estava devidamente fundamentado], nem de violação de lei, por erro sobre os pressupostos na qualificação...

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