Acórdão nº 01186/07.9BEVIS de Tribunal Central Administrativo Norte, 25 de Novembro de 2021

Magistrado ResponsávelCarlos de Castro Fernandes
Data da Resolução25 de Novembro de 2021
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência os Juízes Desembargadores que compõem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: I – A.

(Recorrente), melhor identificado nos autos, veio interpor recurso contra a sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu, pela qual se julgou parcialmente improcedente a oposição por si deduzida no PEF n.º 27202001010102673 e respetivos apensos.

No presente recurso, o Recorrente formula as seguintes conclusões: 1ª.- O Tribunal a quo, ao ter considerado que o recorrente exerceu, de facto, a função de gerente, e que a insuficiência do património da executada originária lhe é imputável, procedeu a uma inadequada valoração da matéria de facto e, em consequência, a uma errada interpretação e aplicação da lei. Assim, 2ª.- Dando como provada a factualidade constante dos Pontos 2 e 7 do probatório, o Tribunal concluiu, indevidamente, que o ora recorrente exerceu, de facto, as funções de gerente. Para tanto, 3ª.- A douta decisão recorrida louva-se (Ponto 7 do probatório), além do mais, num depoimento/declaração escrita, prestado à margem dos presentes autos, perante dois funcionários da AT, sem o conhecimento e/ou presença do ora recorrente, após ter sido contactado telefonicamente por aqueles para comparecer no Serviço de Finanças, em clara violação dos princípios do contraditório (art.º 3º, nº 3, do C.P.C.) e da igualdade das partes (art.º 4º do C.P.C.). Na verdade, 4ª.- O Tribunal a quo, ao ter valorado o “depoimento escrito” de alguém que nem sequer foi arrolado como testemunha nos presentes autos, sem estarem verificados os requisitos do art.º 518º do C.P.C. e sem que o depoimento fosse prestado perante o Sr. Juiz, louvou-se num meio probatório ilegal (atento o modo como foi obtido), o qual veio a ser considerado essencial para a decisão de mérito da oposição à execução, deduzida pelo ora recorrente.

5ª.- Ao ter decidido com fundamento num depoimento de alguém que nem sequer foi arrolado nos presentes autos como testemunha, e em cuja ‘inquirição’ não foi observado o princípio do contraditório, o Tribunal violou o disposto nos artºs. 3º nº 3, 4º, 415º, 500º, 514º, 518º e 521º, todos do C.P.C. – ilegalidade que expressamente se invoca para os devidos e legais efeitos e que determina a nulidade de tal meio probatório, que do mesmo modo expressamente se invoca. Acresce que, 6ª.- A douta decisão recorrida, ao ter considerado que a circunstância de ter sido deliberado em assembleia-geral a atribuição ao recorrente de plenos poderes e de que bastaria a sua assinatura para obrigar a sociedade nos seus atos ou contratos (ponto 2. do probatório), evidencia que o mesmo é gerente de facto, peca por excesso. Na verdade, 7ª.- Apesar de a lei não definir em que é que se consubstanciam os poderes de gerência, dos artºs. 259º e 260º do C.S.C. decorre que serão típicos atos de gerência aqueles que se consubstanciam na representação da sociedade perante terceiros; aqueles através dos quais a sociedade fique juridicamente vinculada e que estejam de acordo com o objeto social.

8ª.- A gerência é o órgão da sociedade criado para lhe permitir atuar no comércio jurídico, criando, modificando, extinguindo relações jurídicas.

9ª.- À luz da responsabilidade subsidiária prevista no artº. 24º, nº 1, da L.G.T. (em qualquer das suas duas alíneas), a possibilidade de reversão não se basta com a gerência de direito, exigindo-se o exercício de facto da gerência.

10ª.

- O exercício efetivo do cargo de gerente é ou constitui um pressuposto da responsabilidade subsidiária. Sendo certo que, 11ª.

- É à AT, enquanto exequente, que competia demonstrar a verificação dos pressupostos que lhe permitissem reverter a execução fiscal contra o gerente da sociedade originariamente devedora e, entre eles, os respeitantes à existência da gestão de facto (artº. 342º, nº 1, do C.C. e artº. 74º, nº 1, da L.G.T.).

12ª.- Não consta do probatório qualquer concreto facto, ato, contrato ou negócio praticado pelo ora recorrente na qualidade de gerente da sociedade – o mesmo é dizer que a AT não logrou fazer prova de que o ora recorrente exerceu de facto e efetivamente a gerência da sociedade executada originária.

13ª.- Sendo pressuposto da responsabilidade subsidiária (independentemente do regime aplicável) o exercício de facto da gerência, cuja prova impende sobre a AT enquanto entidade que ordena a reversão (uma vez que lhe compete o ónus da prova dos pressupostos da responsabilidade subsidiária do gerente), deve contra si ser valorada a falta de prova sobre o efetivo exercício da gerência do revertido (artº. 414º do C.P.C.).

14ª.- Acresce que a prova da gerência de facto é pressuposto da aplicação, tanto da alínea a), como da alínea b), do artº. 24º da L.G.T.. Pelo que, 15ª.- Não tendo sido feita prova de qualquer concreto facto praticado pelo recorrente na qualidade de gerente, é irrelevante estabelecer a distinção entre o regime consagrado na alínea a) e b) do referido artº. 24º da L.G.T..

16ª.- Ao ter decidido de modo diverso e ao ter julgado improcedente a oposição, o Tribunal ‘a quo’ violou o disposto no artº. 24º, nº 1, als. a) e b), da L.G.T.; artº. 342º, nº 1, do C.C. e artº. 74º, nº 1, da L.G.T., além do artº. 414º do C.P.C. e dos artºs. 259º e 260º do C.S.C., os quais deverão ser interpretados nos termos preditos.

Sem prescindir e por mera cautela, 17ª.- Ao ter sido considerada pelo Tribunal a quo inútil a inquirição da testemunha arrolada pelo recorrente, privou-o da possibilidade de exercer o direito de defesa, designadamente, de provar que a insuficiência do património da devedora originária não lhe é imputável.

18ª.

- Deverá, em consequência, ser julgado procedente o presente recurso, revogando-se a douta decisão recorrida, e proferido douto acórdão que julgue procedente a oposição à execução.

A Recorrida, apesar de regularmente notificada para o efeito, não apresentou contra-alegações.

*A distinta Sra. Procuradora Geral Adjunta junto deste Tribunal elaborou parecer no sentido da improcedência do presente recurso (cf. fls. 135 a 139 autos – paginação do processo em suporte físico).

*Com a concordância dos MMs. Juízes Desembargadores Adjuntos, dispensam-se os vistos nos termos do art.º 657.º, n. º 4, do Código de Processo Civil ex vi art.º 281.º do CPPT, sendo o processo submetido à Conferência para julgamento.

-/- II - Matéria de facto indicada em 1.ª instância: 1.

Pelo contrato reduzido a escritura pública celebrada em 30/09/1997, A. e R., constituíram uma Sociedade por quotas, denominada M., Limitada, sendo que nos termos daquele contrato, a gerência pertence ao sócio A. , que ficou nomeado nos termos daquele contrato...

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