Acórdão nº 00455/20.7BECBR de Tribunal Central Administrativo Norte, 11 de Fevereiro de 2021

Magistrado ResponsávelTiago Miranda
Data da Resolução11 de Fevereiro de 2021
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência os Juízes Desembargadores que compõem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:* Relatório P.

, NIF contribuinte fiscal n.° (…) interpôs o presente recurso de apelação relativamente à sentença proferida no Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra, que, no em epígrafe identificado Processo de Reclamação de Actos do Órgão de Execução (artigos 276º e sgs do CPPT), na qual pede a anulação da ordem de penhora emitida no processo de execução fiscal nº 0744202001003372 e apensos, julgou o TAF de Coimbra incompetente em razão da nacionalidade.

Remata a sua alegação com as seguintes conclusões: 1.O presente recurso vem interposto da douta sentença proferida em 1ª Instância, pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra, que se julgou internacionalmente incompetente para conhecer da prescrição da dívida exequenda, referente a dívidas de IRS e contribuições sociais de 2008 e 2009, no valor global de € 80.227,61 (oitenta mil, duzentos e vinte e sete euros e sessenta e um cêntimos), que tem por base um título executivo uniforme relativo a créditos abrangidos pela Directiva 2010/24/UE.

  1. Não concordando, nem se conformando com a douta sentença, interpõe o presente recurso porquanto, face aos factos e ao direito aplicável, deveria o douto Tribunal a quo conhecido da prescrição uma vez que, tal conhecimento é oficioso, à luz do definido no art.º 175º do Código de Processo e Procedimento Tributário (doravante CPPT).

  2. Salvo o devido respeito, que é muito, a douta sentença da qual ora se recorre encontra-se ferida de várias nulidades.

  3. Na origem dos presentes autos está uma reclamação deduzida junto do Serviço de Finanças de Figueira da Foz-1, da ordem de penhora, comunicada pela entidade empregadora, ao ora recorrente, que vem no seguimento de processo de execução instaurado pelo mesmo Serviço, para cobrança de dívidas ao Estado Francês de IRS e contribuições sociais dos anos de 2008 e 2009, no valor global de 80.227,61€, no seguimento de pedido de cobrança da visada dívida pela DSRI – Comissão Interministerial de Assistência Mútua em Matéria de Cobrança de Créditos.

  4. Tendo por referência a matéria dada como provada nos presentes autos, não se compreende o porquê da fundamentação aduzida pelo douto Tribunal a quo, na sentença da qual ora se recorre, discorrer sobre um caso que ocorreu com as autoridades fiscais alemãs, uma vez que, o caso que nos ocupa prende-se, única e exclusivamente, com as finanças francesas.

  5. A fundamentação aduzida pelo Tribunal a quo refere-se a um outro qualquer caso concreto, que não os dos presentes autos pois, vastas vezes é feita referência ao ora recorrente, como oponente, sendo certo que na origem do presente processo encontra-se uma reclamação e não uma oposição.

  6. Acrescentar que, apenas com a presente peça processual irá ser interposto recurso, não podendo, à data em que foi proferida a sentença, ser denominado de recorrente.

  7. A Mmª. Juiz do Tribunal do qual se recorre, alude, ainda, ao modo como naquele caso foi efectuada a notificação ao sujeito passivo, leia-se “citado por carta registada com aviso de recepção datada de 04/04/2006”, todavia, o mesmo não sucedeu in casu, conforme foi demonstrado e dado como provado no ponto 4 da matéria de facto dada como provada.

  8. Não se compreendendo em que acervo documental possa a Mm.ª Juiz do Tribunal a quo ter sustentado a sua fundamentação, uma vez que a mesma em nada se relaciona com o presente caso.

  9. Por outro lado, refere-se ao Serviço de Finanças de Mangualde como o órgão que instaurou o processo de execução mas, também como resulta dos factos dados como provados, no ponto 3, foi o Serviço de Finanças da Figueira da Foz-1, no âmbito do PEF n.º 0744202001003372 e não no do PEF nº 25502006090001009, conforme ali referido, que o fez.

  10. Refere, ainda, a douta decisão em crise, que tal PEF foi instaurado com base “em certidões de dívida provenientes das autoridades fiscais da Alemanha”, remetendo para o documento de citação, no entanto, a autoridade fiscal que solicitou a cooperação do Serviço de Finanças da Figueira da Foz, foi a autoridade fiscal francesa, como, aliás, se depreende da mera observação do título executivo uniforme relativo aos créditos abrangidos pela Directiva 2010/24/EU, emitido em 24.08.2018 e já junto aos autos.

  11. Prosseguindo na leitura da fundamentação da sentença proferido pelo Tribunal a quo, é feita uma sumula das alegadas “questões que o ora recorrente suscita na sua oposição”, contudo, as únicas questões suscitadas na reclamação que deu origem aos presentes autos foram a do desconhecimento do despacho que está na origem da penhora efectuada, conforme prevê o disposto no art.° 150°, n.° 2 do CPPT, porquanto, não foi apresentado qualquer documento ou referência a justificar essa decisão, nem tão pouco, qualquer texto fundamentador do acto praticado, requerendo a respectiva notificação, tendo em conta o disposto no art.º 77 da LGT e, bem assim, a questão da prescrição da dívida exequenda e acréscimos.

  12. Daí a estranheza com que o ora recorrente recepcionou a sentença da qual ora se recorre pois, não é feita referência aos dados e aos factos concretos do caso que nos ocupa, sendo feita, constantemente referência a um outro caso, a um outro serviço de finanças, a uma outra autoridade fiscal, outro PEF.

  13. É feita, ainda, referência ao facto “da prescrição da dívida exequenda e de caducidade do direito de liquidação do Tributo terão de ser resolvidas por atenção às normas substantivas Alemãs”, pelo que, o ora recorrente, desconhece que normas substantivas devem ser aplicadas para a resolução do seu diferendo.

  14. Adiante, e na preparação da douta decisão, foram formuladas duas questões por parte do Tribunal a quo e novamente é notória a confusão entre o caso concreto e o caso ali relatado.

  15. A verdade é que, a fundamentação da sentença proferida, funda-se e redunda sempre numa questão com as finanças alemãs e não francesas, não podendo aplicar-se, sem mais, ao caso concreto, sendo tal confusão visível e notória em toda a fundamentação da douta sentença proferida.

  16. Mais à frente, é feita referência ao Estado alemão, ao Serviço de Finanças de Torres Vedras, ao TAF de Leiria, não se compreendendo onde começa e onde termina a transcrição da decisão citada e não se compreendendo, também, a relação entre os casos assinalados e o presente caso.

  17. Face ao exposto, é por demais evidente a obscuridade em que se traduz tal sentença, uma vez que, não há semelhança com o caso concreto, desconhecendo o ora recorrente se a solução a aplicar, quando a dívida é proveniente das autoridades fiscais alemãs, é igual à solução a aplicar quando se trate das autoridades fiscais francesas.

  18. Ora, tendo o novo C. P. Civil (aprovado pela Lei nº 41/2013) eliminado a disposição relativa ao pedido de aclaração da sentença com fundamento em alguma obscuridade ou ambiguidade, passou, simultaneamente, a integrar as causas de nulidade da sentença enunciadas no artº 615º nº 1 do CPC novo, sob a alínea c), a ocorrência de “(…) alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível”.

  19. Decorrendo ainda do disposto no nº 4 daquele artº 615º, do C. P. Civil que tal nulidade, só pode ser arguida “(…) perante o tribunal que proferiu a sentença se esta não admitir recurso ordinário, podendo o recurso, no caso contrário, ter como fundamento qualquer dessas nulidades”.

  20. É o que se verifica no presente caso, pelo que, face ao exposto, mostra-se a douta sentença aqui em escrutínio, ferida da nulidade a que alude o disposto no artº 615º nº 1, alínea c), do C. P. Civil, aqui aplicável "ex vi" do disposto no artº 2º, alínea e), do CPPT, nulidade essa que expressamente se deixa arguida para todos os devidos e legais efeitos e consequências.

  21. Acresce que, ainda que o douto Tribunal "a quo" se não pronunciou, como deveria quanto à questão, também suscitada, do desconhecimento, por parte do recorrente, do despacho que está na origem da penhora efectuada, conforme prevê o disposto no art.° 150°, n.º 2 do CPPT, porquanto, não foi apresentado qualquer documento ou referência a justificar essa decisão, nem tão pouco, qualquer texto fundamentador do acto praticado, em violação do disposto no art.º 77 da LGT.

  22. Sendo esta uma questão que se reveste de essencialidade, tendo em conta as consequências da violação dos normativos acima enunciados, a não pronúncia por parte do Tribunal "a quo", fere, igualmente, a douta decisão em recurso de nulidade por omissão de pronúncia, nos termos do disposto no artº 615º nº 1, alínea d), do C. P. Civil, aqui aplicável, como se disse já, "ex vi" do disposto no artº 2º, alínea e), do CPPT, nulidade essa que também se deixa arguida para os devidos e legais efeitos e consequências.

  23. No modesto entendimento do ora recorrente, a aplicação da legislação referida na douta sentença, nomeadamente, o n.º 2, do art.º 11º do DL n.º 263/2012, de 20.12, é inconstitucional.

  24. Com efeito, o DL n.º 263/2012, de 20.12 foi o diploma que transpôs para a ordem jurídica interna a Directiva n.º 2010/24/EU, do Conselho, de 16.03.2010, relativa à assistência mútua em matéria de cobrança de créditos respeitantes a impostos, direitos e outras medidas.

  25. Da leitura do mencionado preceito conclui-se que a citação para deduzir oposição à execução, bem como, a ordem de penhora efectuadas pelo Serviço de Finanças da Figueira da Foz-1, por interromperem o prazo de prescrição da dívida exequenda, produzem o mesmo efeito no Estado-Membro requerente, ou seja, França, desde que esteja previsto o efeito correspondente nas disposições legislativas em vigor neste último Estado.

  26. Posto isto, importa, por um lado, perceber se efectivamente, os actos diligenciados pelo Serviço de Finanças da Figueira da Foz-1, tiveram efeitos jurídicos na esfera contributiva do ora recorrente, em França e, por outro lado, até que ponto é que o normativo enunciado não colide com os princípios constitucionalmente...

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