Acórdão nº 002896/06.3BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 16 de Setembro de 2021

Magistrado ResponsávelCarlos de Castro Fernandes
Data da Resolução16 de Setembro de 2021
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência os Juízes Desembargadores que compõem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:* I – A.

e A.

(Recorrentes), melhor identificados nos autos, vieram interpor recurso contra a sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, pela qual se julgou improcedente a impugnação por aqueles deduzida contra as liquidações de imposto municipal de SISA e imposto sobre sucessões e doações e contra a correspetiva liquidação de juros compensatórios.

No presente recurso, os Recorrentes apresentam as seguintes conclusões: 1.

Conforme se depreende do relatório de correcções da análise interna (art. 62 RCPIT) a interposição da presente impugnação radica no facto da inspecção haver desconsiderado o conteúdo do orçamento apresentado em sede de direito de audição, consubstanciado na realização de obras e benfeitorias no imóvel.

  1. Com efeito, e em face da acção investigatória promovida pelos SIT concluir-se-ia pela inveracidade da realização das obras/benfeitorias por parte do A..

  2. Ora, com o devido respeito por opinião contrária, o facto da inspecção tributária não ter localizado qualquer factura representativa da prestação de serviços em que figurassem como destinatários os recorrentes, não significa que tais operações não tenham sido efetivamente realizadas – como o foram! 4.

    Com efeito, é do conhecimento público, a conduta recorrentemente observada de alguns empresários da construção civil de se subtraírem ao cumprimento dos seus deveres fiscais, nomeadamente os materializados na passagem de facturas e subsequente relevação contabilística dos respectivos proveitos.

  3. A acção inspectiva em apreço não foi tão profunda quanto o necessário tendo em vista os princípios da demanda da verdade material e do princípio do inquisitório.

  4. De facto, não se extrai do ponto 9 do relatório da inspeção tributária qualquer ilação no sentido da não realização das obras por parte do A. (o que foi confirmado em sede de audiência de discussão e julgamento pelo depoimento pela Sra. Inspectora Tributária).

  5. Quanto muito apenas se informa que o A. não passou factura, o que é qualitativamente bem diferente! 8.

    Assim e em abono da verdade a Inspecção Tributária apenas ficou na posse de informação relevante que aponta para incumprimento de deveres obrigacionais. Nada mais do que isto! 9.

    Fixada a realidade fáctica reputada relevante para reputada relevante para a modelação dos contornos do acto tributário litigado nos presentes autos, e, seguidamente, o alinhamento da contra argumentação aduzida pela ora recorrente estão reunidas as condições objectivas para formular, em jeito de conclusão, a seguinte preposição: E) Os códigos de SISA/SELO de acordo com o princípio da tipicidade fechada, tributam o enriquecimento patrimonial a título oneroso; F) Só em caso pontual expressamente tipificado é que o legislador derroga o supracitado princípio para consagrar factos/situações possíveis de tributação.

    São as presunções ficções júris tantum e iuris et júris expressamente consagradas no Código.

    1. Fora destas hipóteses residuais a sujeição a imposto de SISA só pode verificar-se, provada seja a realização do negócio translativo de imóvel.

    2. A liquidação deste imposto há-de recair sobre o preço por que os bens foram transmitidos.

  6. Ora, volvendo à conexão dos factos salvo da presente impugnação recolhe-se a certeza de que o preço ajustado na aquisição do imóvel de 94.771,60€ é o que reflecte fidedignamente a realidade do negócio.

  7. A realização de um segundo contrato de mútuo não altera em termos substantivos nenhum dos clausulados do negócio de compra e venda do imóvel.

  8. Este segundo mútuo, para obras, não pode nunca ser integrado no contexto em que foi integrado o primeiro (o de aquisição do imóvel) já que titula um negócio jurídico distinto do contrato de compra e venda.

  9. Assim, é inadmissível que o valor do segundo mútuo possa ser considerado como fazendo parte integrante do preço convencionado entre as partes. Logo, mal andou a Exma. Senhora Juiz a quo ao manter as liquidações impugnadas.

  10. É que na realidade, os impugnantes/recorrentes, celebraram dois negócios jurídicos bem distintos: iii. primeiro o da compra e venda; iv. segundo, o da empreitada; 15.

    A Sentença recorrida ao valorizar apenas o relatório da Inspecção tributária e ao validar os factos na forma como foram vertidos para o relatório, manifestou uma apreensão incorrecta da realidade tal qual ela se passou, motivo porque só poderá advir, em jeito de decisão final, o integral provimento do presente recurso.

  11. A sentença recorrida, tal como a decisão controvertida estão nitidamente inquinadas de deficit instrutório.

  12. Abrangem-se no princípio da legalidade formal todos os preceitos legais sobre os procedimentos de aplicação da lei tributária em que não sejam respeitadas as normas legais quanto à essencialidade dos actos da administração tributária ou do contribuinte e que impliquem para este, o imperfeito conhecimento do objecto e fundamento dos actos tributários ou o impedimento do exercício dos direitos do contribuinte. É o que correntemente se abrange no conceito legal de “preterição de formalidades legais” e quando ocorrida implica a nulidade ou anulabilidade do acto vicioso.

  13. Logo padecendo o acto tributário de falta de fundamentação expressa, deveria a douta sentença recorrida anular a liquidação impugnada por vício de lei, sob a forma de preterição de formalidade essencial.

  14. O presente procedimento de reclamação apresentado pelos recorrentes à AT tem data de 19 de Maio de 2005, após a notificação da AT datada de 02.05.2005, sendo que no decurso desse mesmo processo, foi em 13.11.2006 instaurada a impugnação judicial.

  15. A decisão recorrida foi proferida em 06.02.2020 e notificada aos recorrentes na pessoa do mandatário subscritor em 12.02.2020.

  16. Com a inequívoca agravante de a decisão ter sido proferida (salvo o devido respeito) por quem não instruiu os autos de impugnação, não dirigiu a audiência de discussão e julgamento nem acompanhou a produção da prova testemunhal e a sua interligação com a prova documental.

  17. O princípio da imediação traduz-se no contacto pessoal entre o juiz e as diversas fontes de prova, isto é, o princípio da imediação diz-nos que deve existir uma relação de contacto directo, pessoal, entre o julgador e as pessoas cujas declarações irá valorar, com as coisas e documentos que servirão para fundamentar a decisão da matéria de facto, permitindo-lhe que se aperceba de todos os factos pertinentes para a resolução do litígio e uma valoração da prova expurgada, pelo menos tendencialmente, dos factores de falseamento e erro que as transmissões de conhecimento podem envolver.

  18. O princípio da oralidade, que constitui matriz do nosso regime processual civil, reporta-se ao modo de produção da prova e significa que a prova produzida sob a égide deste princípio é a realizada oralmente.

  19. Do princípio da plenitude da assistência dos juízes - actualmente consagrado no artigo 605.º do Código de Processo Civil corolário dos princípios supra referidos, resulta que só podem intervir na decisão da matéria de facto os juízes que tenham assistido a todos os actos de instrução e discussão praticados na audiência final.

  20. Em sede de contencioso tributário o julgamento da matéria de facto e o julgamento de direito estiveram sempre (e permanecem até hoje) cometidos ao juiz que profere a sentença, não existindo a dicotomia que se verificava em processo civil (até à data de entrada em vigor do NCPC) entre a fase de audiência de julgamento (onde eram produzidas as provas para a determinação dos factos) e a fase da prolação da decisão (onde é feito o enquadramento jurídico dos factos determinados ao caso e afirmada a consequente decisão).

  21. Embora o poder de cognição do Tribunal Central sobre a matéria de facto não seja tão amplo que permita um julgamento ex novo de facto (está limitado aos concretos pontos de facto impugnados e deva respeitar a livre apreciação da prova do julgador, consagrada no n.º 3 do artigo 607.º do Código de Processo Civil, construída dialecticamente na base da imediação e da oralidade), o Tribunal de recurso pode e deve formar a sua própria convicção por referência à prova constante dos autos e, com base nela, determinar a alteração do julgamento de facto, designadamente se entender que a prova foi mal apreciada ou interpretada ou constatar a existência de outros elementos probatórios relevantes, invocados pelo recorrente na sua alegação, que não foram tidos em consideração pelo julgador de 1.ª instância.

  22. O que se requer! 28.

    “Como regra, directa ou indirectamente, é a partir do momento em que se verifica o facto tributário, que corre o prazo de prescrição. Dito de outro modo, o termo inicial (dies ad quo) no prazo de prescrição tem então como referência, com maior ou menor proximidade, a verificação do facto tributário. O legislador ao mandar atender ao facto constitutivo da obrigação tributária, remete-nos para a situação jurídica tributária preexistente à própria liquidação, e que lhe subjaz, a fim de podermos aferir se o que veio a ser declarado está ou não em conformidade.” – A Prescrição das Dívidas Tributárias, Rui Marques, Almedina 2018 p. 78.

    v. A notificação para o facto tributário foi efetuada pela AT ao ora recorrentes em 02.05.2005; vi. Ainda na vigência do n.º 2 do artigo 49.º da LGT (Dec. Lei 398/98), revogado pela Lei 53-A 2006 de 29 de Dezembro; vii. Sendo que nos termos do artigo 91.º da predita Lei 53-A 2006 de 29 de Dezembro, “A revogação do n.º 2 do artigo 49.º da LGT aplica-se a todos os prazos de prescrição em curso, objecto de interrupção, em qua ainda não tenha decorrido o período superior a um ano de paragem do processo por facto não imputável ao sujeito passivo”.

    viii. Ora de 02.05.2005 até 01.01.2007 (data da entrada em vigor da Lei 53-A 2006 de 29 de Dezembro, decorre um período superior a um ano e o que ocorreu nesse entretanto com o processo...

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