Acórdão nº 03047/13.3BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 15 de Dezembro de 2017

Magistrado ResponsávelAlexandra Alendouro
Data da Resolução15 de Dezembro de 2017
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, os Juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:*I – RELATÓRIO JLMSC interpôs recurso da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto que julgou improcedente a acção administrativa comum, sob a forma ordinária, por si proposta contra o Estado Português, representado pelo Ministério Público, visando a condenação deste no pagamento de indemnização, a título de danos não patrimoniais, na quantia de €12 500,00 por violação do direito a uma decisão em prazo razoável.

*Nas alegações do recurso, o Recorrente concluiu o seguinte: I - Como resulta da própria sentença, os autos no âmbito dos quais é suscitada a demora na administração da justiça, o processo n.º 608/06.0SMPRT, demoraram cerca de 5 anos e meio, sendo certo que, esses autos correspondem a um processo de relativa simplicidade jurídica.

II - Inequivocamente estamos perante uma situação de “funcionamento anormal do serviço”.

III - A decisão em prazo razoável foi claramente desrespeitada, pois a duração destes autos foi praticamente do dobro do considerado como sendo razoável.

IV - A decisão a quo tenta imputar o atraso no decurso do processo ao comportamento processual do ora Recorrente.

V - Todavia com tal não se pode concordar, pois não foi o ora Recorrente responsável por atrasos relacionados com a necessidade de insistência para que surgisse um relatório de pedopsiquiatria; por atrasos na nomeação de defensores oficiosos; pela substituição de defensores oficiosos do ora Recorrente; pela distância temporal entre o despacho de designação da audiência de julgamento e as datas em que estas se realizariam, cerca de um ano depois; pela existência de uma nulidade de uma decisão instrutória por desrespeito de formalismos processuais.

VI - Assim como não pode ser responsabilizado o Recorrente pelos sucessivos pedidos de escusa de defensores oficiosos.

VII - O comportamento processual do ora Recorrente não extravasou aquilo que é razoável e normal nestas circunstâncias, não tendo suscitado um conjunto de incidentes que, por si, atrasassem o processo.

VIII - O Recorrente não tinha interesse em protelar o decurso deste processo, pois não tinha qualquer conveniência nisso. Antes pelo contrário, pois esse era uma das circunstâncias que o impedia de, atendendo ao processo de incumprimento das responsabilidades parentais, poder estar com os seus filhos.

IX - Veja-se, a este título, o disposto no ponto 137) da sentença e a influência negativa que este processo tinha no regime de visitas aos filhos.

X - A ilicitude, no âmbito dos presentes autos, consubstancia-se na violação do direito do Recorrente a uma decisão judicial num prazo razoável. Esse direito é consagrado constitucionalmente, no n.º 4 do art.º 20.º da Constituição da República Portuguesa (CRP), assim como tem previsão no n.º 1 do art.º 6.º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem (CEDH).

XI - A sua violação é sancionada pelas disposições conjugadas do nº 3 do art.º 7.º e no n.º 2 do art.º 9, bem como do art.º 12.º do Regime de Responsabilidade Civil Extracontratual do Estado e Demais Entidades Públicas, aprovado pela Lei 67/2007, de 31 de Dezembro, XII - Sendo que o aludido art.º 12 faz mesmo uma menção especial “aos danos ilicitamente causados pela administração da justiça, designadamente por violação do direito a uma decisão judicial em prazo razoável”.

XIII - Face ao que vem dito, não se concorda com a conclusão formulada na sentença a quo, e, analisado o processado, registou-se uma efectiva inércia judicial, bem como se verificou um atraso indesculpável na tramitação do processo imputável à máquina da justiça e, por isso, gerador de responsabilidade civil do Estado.

XIV - Não se pode igualmente concordar com a sentença quando afirma não existir um nexo de causalidade entre os danos invocados e a demora no processo 608/06.0SMPRT.

XV - O Tribunal a quo concluiu, erradamente, que “a restrição das visitas entre o A. e os seus filhos, resultou sempre de sucessivas decisões do Tribunal de Família e Menores, alicerçadas em pareceres técnicos de psicólogos e técnicos de Segurança Social.”.

XVI - Todavia, na elaboração dos ditos pareceres técnicos que fundamentavam as sentenças, o facto de o ora Recorrente ser arguido, e particularmente no processo em causa (n.º 608/06.0SMPRT) de alegados maus-tratos aos menores seus filhos, tal circunstância condicionava os aludidos pareceres dos técnicos, como é evidente.

XVII - Portanto, facilmente se conclui, ao contrário do que fez a sentença ora recorrida, que o demorado desfecho do processo n.º 608/06.0SMPRT contribuiu para restringir o convívio com os seus filhos ao ora Recorrente, influenciando decisivamente a tramitação do processo de incumprimento das responsabilidades parentais que corria termos sob o número 497/06.5TMPRT-B, na Secção do 1.9 Juízo do Tribunal de Família e Menores do Porto.

XVIII - Aliás, veja-se, novamente, o ponto 137) dos factos dados como provados na sentença, onde os menores explicitaram, segundo um relatório da Psicóloga, de 5-12-2011, que a renúncia a todos os processos, por parte do seu pai representava a singular condição para a continuidade das visitas.

XIX - Dessa forma, verifica-se que existe um nexo causal entre o facto considerado ilícito, o atraso na justiça no processo 608/06.0SMPRT, e o dano sofrido pelo ora Recorrente, ao ver restringido o contacto com os seus filhos.

XX - A decisão ora recorrida violou o n.º 4 do artigo 20.º; o art.º 22.º; e o n.º 4, do art.º 268.º da Constituição da República Portuguesa (CRP), assim como tem o n.º 1 do art.º 6.º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem (CEDH), assim como as disposições conjugadas do n.º 3 do art.º 7.º e no n.º 2 do art.º 9º, bem como do art.º 12.º do Regime de Responsabilidade Civil Extracontratual do Estado e Demais Entidades Públicas, aprovado Lei 67/2007, de 31 de Dezembro.

XXI - Face ao exposto, e ao contrário do que é vertido na sentença, verifica-se a existência de ilicitude, verifica-se o nexo de causalidade entre os factos e os danos, pelo que estão preenchidos os pressupostos de que depende a responsabilidade civil do Estado, pelo que a acção deveria ser considerada totalmente procedente, ao arrepio daquilo que foi a decisão do Tribunal a quo, devendo ser revogada a sentença ora recorrida.”.

*O Recorrido Estado alegou, formulando as seguintes conclusões: 1.

É impossível fixar previamente um prazo razoável para todos os processos, e mesmo para cada tipo de processo, pelo que, só perante cada caso concreto, e considerando os concretos circunstancialismos em causa, se pode concluir pela verificação (ou não) da violação do direito à justiça em prazo razoável; 2.

A mera inobservância de um prazo processual fixado na lei para a prolação de um despacho ou da sentença, não acarreta, por si só e sem mais, a violação de tal direito e, consequentemente, pode não ser qualificado como ilícito e culposo, pois preceitos legais que estabelecem os prazos para a prática, no processo, dos atos de magistrados e funcionários são normas disciplinadoras da atividade processual; 3.

Assim, a violação do direito a uma decisão num prazo razoável só pode gerar a obrigação de indemnizar se as circunstâncias concretas do caso ditarem que ela podia ter sido alcançada num prazo inferior ao que efetivamente foi e que tal só aconteceu por incúria ou negligência dos operadores judiciários; 4.

Atenta a factualidade assente, verifica-se que não ocorreu, «in casu», a propalada violação do direito a uma decisão em prazo razoável em relação ao Autor, não se verificando, portanto, o requisito da ilicitude (nem da culpa), pois, 4.1 – A duração quer do processo criminal quer do processo de incumprimento das responsabilidades parentais não decorreu de qualquer atuação censurável do Ministério Público e/ou do Juiz, nem dos funcionários, por qualquer indevida gestão processual, inexistindo qualquer inércia judicial; 4.2 – E embora o Recorrente indique a distância temporal entre o despacho de designação da audiência de julgamento e as datas designadas como uma das razões fundamentais da delonga processual, mais uma vez esquece factos fundamentais como mormente os seus inúmeros requerimentos, o não ter colaborado na elaboração do relatório social que, por isso não foi emitido pela DGRS, os referidos sucessivos pedidos de escusa/de substituição de seus defensores nomeados, bem como que dez dias antes da audiência de julgamento marcada para 30.01.2012 requereu que esta fosse dada sem efeito e que lhe fosse nomeado novo defensor, dando conta de que corriam termos processos em que era queixoso e arguido o marido da sua ex-mulher; 4.3 – A antedita pretensão do ora A. mais não é que uma manifestação direta inequívoca de «o interesse em protelar o decurso deste processo-crime; ou, por outras palavras, tal manifestação de vontade mais não é que a expressão de que o processo deveria durar mais que o que já tinha durado; 4.4 – Mostra-se-nos abusivo, que o A. querendo para proveito próprio o protelamento do decurso do mencionado processo criminal venha agora dizer que o processo durou mais que o razoável, bem como, por outro lado, que tenha considerado na pendência do processo que o mesmo era complexo para agora vir, enfim, dizer que a complexidade não era assim tanta; 4.5 - O Processo-crime tornou-se de facto, complexo, quer porque ao mesmo foram apensados mais quatro processos, que demandaram diligência complementares quer pelos inúmeros requerimentos apresentados no processo pelo arguido, uns à revelia do defensor, outros impertinentes, pela junção de documentos sem qualquer interesse para a decisão, e ainda pelas sucessivas substituições/pedidos de escusa de patronos nomeados.

4.6 - O A. ultrapassou o normal exercício do seu direito de suscitar incidentes, contribuindo de modo essencial para o tempo de duração do processo; 4.7 - Por sua vez, o incidente de incumprimento das responsabilidades parentais teve um decurso...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT