Acórdão nº 00573/15.3BECBR de Tribunal Central Administrativo Norte, 19 de Junho de 2020

Magistrado ResponsávelHelena Ribeiro
Data da Resolução19 de Junho de 2020
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam os juízes desembargadores do Tribunal Central Administrativo Norte: I-RELATÓRIO 1.1. I., S.A.

, com sede na Quinta (…), (…), intentou a presente ação administrativa comum contra o Ministério da Solidariedade, Emprego e Segurança Social, pedindo a condenação do Réu a pagar-lhe a quantia de 1. 612. 173,02 €.

Alegou, para tanto, em síntese, que lhe assiste o direito a ser indemnizada segundo o regime da responsabilidade civil extracontratual do Estado e demais entidades públicas consagrado na Lei nº 67/2007, de 31 de dezembro, pelos danos de diversas natureza e espécie, que sofreu, causados por uma atuação que imputa ao Centro Distrital de Segurança Social de (...), ocorrida a partir de janeiro de 2003.

1.2.

Citado, o Réu excecionou a sua ilegitimidade, alegando, em síntese, que o Instituto da Segurança Social IP ( I.S.S., I.P.), a quem a atuação que é causa de pedir se imputa, ser um Instituto Público, criado por lei, sobre o qual tem uma relação de mera superintendência, pelo que ele, Réu, não é sequer parte na relação material controvertida.

1.3.

A Autora replicou, sustentando a legitimidade do Ministério, por ser aquele de que é dependente o I.S.S., I.P., requerendo, sem conceder, que se assim se não entender seja admitida a “intervenção” desse Instituto, a seu pedido.

1.4.

Dispensou-se a realização de audiência prévia para discussão da invocada exceção dilatória, considerando que o Autor já teve oportunidade de se pronunciar nos termos do artigo 592º, nº 1, alª b) do NCPC.

1.5.

Proferiu-se despacho saneador-sentença que julgou procedente a exceção da prescrição constando do mesmo a seguinte parte dispositiva: «Pelo exposto, em suma, com fundamento na falta de personalidade judiciária do Réu Ministério e na insusceptibilidade de sua supressão, dada a Ilegitimidade que sempre teria o Estado, abstenho-me de conhecer do objecto do pedido e absolvo o mesmo Réu da Instância.

Custas pelos Autores: artºs 527º do CPC e 6º e tabela I do RCJ.» 1.6.

Inconformada com o assim decidido, a Autora interpôs o presente recurso de apelação, em que formula as seguintes conclusões: «1.

O presente recurso vem interposto de sentença que "com fundamento na falta de personalidade judiciária do Réu Ministério e na insusceptibilidade de sua supressão, dada a ilegitimidade que sempre teria o Estado".

  1. Os atos administrativos em crise foram praticados pelo Centro Distrital de Segurança Social de (...).

  2. E, a verdade é que, o Centro Distrital de Segurança Social de (...) é uma pessoa colectiva, dotada de autonomia administrativa e financeira, autónoma da administração central, fazendo parte da administração indirecta do Estado e na dependência do Governo, nomeadamente do Ministério da Solidariedade, Emprego e Segurança Social.

  3. Assim, e considerando o disposto no o artigo 10º n.º 2 do CPTA, o Ministério da Solidariedade, Emprego e Segurança Social é a pessoa dotada de legitimidade passiva na presente acção.

  4. O certo é que, o recorrido é parte legítima sempre que, tomando em consideração os termos em que o pedido é formulado pela recorrente, o recorrido possa sofrer um prejuízo em caso de procedência da acção, sendo que o recorrido é o titular do interesse relevante, para efeitos de legitimidade, da relação controvertida tal como é configurada pela recorrente.

  5. Contrariamente ao referido pela douta sentença, o Estado tem legitimidade processual - veja-se o douto Acórdão proferido pelo Tribunal Central Administrativo Norte a 28.02.2014, no processo n.º 01788/09.9BEBRG.

  6. Daqui se conclui que os ministérios têm personalidade judiciária, ou seja, são susceptíveis de serem partes.

  7. Em face do exposto, a douta decisão judicial recorrida, ao julgar procedente a exceção dilatória de ilegitimidade passiva violou ou deu errada interpretação, salvo o devido respeito, ao disposto no art. 10.º, n.ºs 1 e 2 do CPTA.

    Subsidiariamente e por mera cautela de patrocínio, invoca-se 9.

    Considerando o invocado pela douta sentença recorrida "Percorrida toda a PI verifica-se que nenhuns acto ou omissão invocados como causa de pedir são imputados, pelo próprio Autor, ao Governo ou ao Ministério, se não ao ISS, ao Centro Distrital da Segurança Social de Coimbra, ou à "Segurança Social', deveria, salvo o devido respeito por douto entendimento contrário, a recorrente ter sido convidada a aperfeiçoar a PI quanto à identificação do R. — veja-se o douto Acórdão proferido pelo Tribunal Central Administrativo Norte, a 23.01.2015, no processo n.º 00442/13.1BEPNF.

  8. Em face do exposto, e subsidiariamente, caso se entenda que o R., ora recorrido, é parte ilegítima, sempre dever-se-ia revogar a douta sentença proferida, e a mesma ser substituída por despacho que declare nula a citação já efetuada e convide a recorrente ao aperfeiçoamento da petição, quanto à identificação da entidade pública demandada, seguindo-se os demais termos do processo.

    Nestes termos e nos melhores de direito, deve o presente recurso ser julgado procedente por provado, com as demais consequências legais.» 1.7.

    O Réu não contra-alegou.

    1.8.

    Notificado nos termos e para os efeitos do disposto no art. 146º, n.º 1 do CPTA, o Ministério Público, emitiu parecer pugnando pela improcedência do recurso e pela confirmação da sentença.

    1.9.

    Prescindindo-se dos vistos legais mas com envio prévio do projeto de acórdão aos juízes desembargadores adjuntos, foi o processo submetido à conferência para julgamento.

    *II- DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO.

    2.1.

    Conforme jurisprudência firmada, o objeto de recurso é delimitado pelas conclusões da alegação da apelante, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso – cfr. artigos 144.º, n.º 2 e 146.º, n.º4 do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), 608.º, n.º2, 635.º, nºs 4 e 5 e 639.º, nºs 1 e 2, do CPC ex vi artigos 1.º e 140.º do CPT.

    Acresce que por força do artigo 149.º do CPTA, o tribunal ad quem, no âmbito do recurso de apelação, não se queda por cassar a sentença recorrida, conquanto ainda que a declare nula, decide “sempre o objeto da causa, conhecendo de facto e de direito”.

    2.2.

    Assentes nas enunciadas premissas, as questões que se encontram submetidas à apreciação do tribunal ad quem resumem-se a saber se a decisão recorrida enferma de erro de julgamento de direito por ter julgado verificada a falta de personalidade judiciária do Ministério e a inerente ilegitimidade passiva, violando o disposto no art.º 10.º, n.ºs 1 e 2 do CPTA.

    *III- FUNDAMENTAÇÃO A. DE FACTO 3.1.

    A 1ª Instância julgou provados os seguintes factos relevantes para conhecer da exceção: «1 A 15 de Junho de 2015 o Autor deu entrada à petição inicial que consta de fs. 1 a 103 (SITAF), cujo teor aqui se dá por reproduzido.

    2 O Autor indica, na presente ação, como único Réu o Ministério do Emprego, da Solidariedade e da Segurança Social.

    »**III.B.DE DIREITO 3.2.

    A apelante não se conforma com o despacho saneador- sentença por via do qual o Tribunal a quo julgou verificada a exceção da falta de personalidade judiciária do apelado Ministério da Solidariedade, Emprego e Segurança Social e a insusceptibilidade da sua supressão, dada a ilegitimidade que sempre teria do Estado para intervir em substituição daquele nos presentes autos, e em consequência, absolveu o apelado da instância.

    b.1. Do erro de julgamento quanto à absolvição da instância da entidade demandada.

    3.3.

    A apelante embora admita que os atos administrativos em crise na presente ação foram praticados pelo Centro Distrital de Segurança Social de (...), que afirma ser uma pessoa coletiva, dotada de autonomia administrativa e financeira, autónoma da administração central, mas porque faz parte da administração indireta do Estado e atua na dependência do Governo, nomeadamente do Ministério da Solidariedade, Emprego e Segurança Social, em seu entender, e considerando o disposto no o artigo 10º n.º 2 do CPTA, o Ministério da Solidariedade, Emprego e Segurança Social, contrariamente ao que foi decidido, é a pessoa dotada de legitimidade passiva na presente ação.

    Ademais, tomando em consideração os termos em que o pedido é formulado, adianta que o apelado pode sofrer um prejuízo em caso de procedência da ação, pelo que, é o titular do interesse relevante, para efeitos de legitimidade, da relação controvertida tal como é configurada pela apelante.

    Quanto ao Estado, sustenta que tem legitimidade processual e aponta o Acórdão proferido pelo Tribunal Central Administrativo Norte a 28.02.2014, no processo n.º 01788/09.9BEBRG para estribar essa sua conclusão.

    A seu ver, diferentemente do que foi julgado pelo Meretissímo juiz a quo, os ministérios têm personalidade judiciária, pelo que são suscetíveis de serem partes, razão pela qual o Tribunal a quo, ao julgar procedente a exceção dilatória de ilegitimidade passiva, violou ou deu errada interpretação ao disposto no art.º 10.º, n.ºs 1 e 2 do CPTA.

    Mas sem razão.

    3.4.

    Vejamos antes de mais, a fundamentação em que assentou a decisão da 1.ª Instância para julgar verificada a exceção da falta de personalidade judiciária da entidade demandada na presente ação e a sua ilegitimidade ativa, e que foi a seguinte: «Importa começar por dizer que para os efeitos da efectivação da responsabilidade civil extracontratual do Estado não têm os ministérios personalidade judiciária, pelo que demandado nas correspondentes acções administrativas comuns têm de ser o Estado tout court, representados pelo MP. Esta interpretação restritiva do teor literal do artigo 10º nº 2 do CPTA é consensual entre a doutrina e a jurisprudência desde o início da vigência do diploma (cf. quanto à doutrina, a anotação ao artigo 10º do CPTA no “Comentário” ao CPTA, de Aroso de Almeida) e claramente pressuposta no nº 2 do artigo 11º deste código.

    Significa isto que, a montante da questão da ilegitimidade, se suscita a da falta de capacidade judiciária do Ministério.

    Esta falta de capacidade judiciária do Ministério demandado já...

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