Acórdão nº 00411/6.8BEVIS de Tribunal Central Administrativo Norte, 08 de Fevereiro de 2013

Magistrado ResponsávelJosé Augusto Araújo Veloso
Data da Resolução08 de Fevereiro de 2013
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, os Juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: Relatório RR(…) – residente na rua Frei José da Purificação, nº2, 4º andar esquerdo, Setúbal – interpõe recurso jurisdicional da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto [TAF] - 17.06.2011 - que decidiu julgar improcedente a acção administrativa comum que intentou contra a EP - Estradas de Portugal, EPE, a qual foi absolvida do pedido - a sentença recorrida culmina a dita acção administrativa comum em que o ora recorrente, em nome próprio e em representação do seu filho menor FR(…), pede ao TAF que condene a ora recorrida «EP - Estradas de Portugal» a pagar-lhe a quantia global de 340.000,00€ acrescida «de juros legais vincendos até efectivo pagamento».

Conclui assim as suas alegações: 1- Cumpre ao recorrente referir que este pleito assentou no incumprimento por parte da recorrida das suas responsabilidades de conservar, de sinalizar e de zelar pela segurança dos utentes no troço referente ao antigo acesso de ligação ao IP3, Soutulho, Vila Chã de Sá, Viseu [EN2 - Viseu sentido Norte/Sul - IP5 - IP3]; 2- Não colocando o recorrente em dúvida a sinalização existente nesse troço rodoviário, pelo mesmo foi sempre referido enquanto causa do sinistro a existência de areia/gravilha na via, que terá provocado o despiste; 3- Aliada a sujidade da estrada com a perigosidade do local, gerou-se uma combinação fatal que determinou o sinistro com as consequências trágicas em apreço nos presentes autos; 4- O fundamental da posição do recorrente é alicerçado nos depoimentos das testemunhas AF(…) [ouvido a 07.01.2010, às 11H53 e 49 segundos] e de RM(…) que prestou declarações no mesmo dia [ouvido às 14H42 e 41 segundos]; 5- A primeira testemunha em causa [Cabo da GNR AF(…)] que relativa e objectivamente em referência ao acidente objecto dos presentes autos, ocorrido em 13.08.2003, pelas 19H40, apensa se recorda de que nada se recorda… 6- A testemunha A(…) no seu depoimento insiste por várias vezes que se escreveu algo no auto da ocorrência foi o que se passou e pouco acrescenta em concreto sobre o sinistro; 7- Sobre o troço rodoviário em análise, a testemunha lembrou-se bem da quantidade de acidentes aí existentes por despistes e que numa só vez foram “3 ou 4”; 8- Salientou, igualmente, que a situação já não se verificava pelo próprio desaparecimento do traçado em causa; 9- Com relevância para a posição do recorrente foram as explicações dadas pela testemunha sobre as sujidades que se encontravam na via; 10- Ao ser confrontado com as fotografias do local, a testemunha A(…) reconheceu-o e apontou as manchas castanhas existentes como sendo “areia que se vai soltando dos camiões”; 11- Instada a explicar como eram limpos esses detritos que caíam para a via, a testemunha referiu que “o vento vai empurrando, os carros vão puxando para fora”; 12- A testemunha RM(…) [responsável da recorrida pela sinalização e segurança do troço em causa] confirmou a “passagem de muitos camiões de transporte, de brita, de areia […], caía sempre qualquer coisa, era normal ir sendo limpo pela passagem de automóveis… os próprios carros com a deslocação do ar, vão passando, vão limpando”; 13- Ficou, assim, demonstrado que o afirmado pelo recorrente tinha uma razão de ser, dado que era normal os camiões de transporte largarem carga para a via ao darem a curva naquele local de estrada; 14- Como era resolvido pela recorrida o problema da sujidade da via? Os próprios veículos que vinham a seguir, iam passando e iam limpando… no entanto, 15- No auto da ocorrência, lavrado pelo Cabo da GNR supra referido, refere-se a limpeza do pavimento; 16- Entre a informação do sinistro, a deslocação ao local, o acompanhamento das vitimas, a avaliação da situação, atendendo às regras da experiência comum decorreu, certamente, entre 45 minutos a 1 hora; 17- Não tendo sido encerrado o tráfico rodoviário, face às explicações conferidas pelas testemunhas sobre a limpeza, qualquer areia/gravilha que estivesse no pavimento teria desaparecido face à derrapagem da viatura sinistrada e a passagem do trânsito subsequente ao acidente; Pelo que… 18- A resposta ao artigo 4º da Base Instrutória teria de ser positiva, perante uma análise ponderada dos elementos informativos produzidos em sede de prova; 19- Quanto ao facto do troço em análise poder ser considerado “publicamente” como um dos “pontos negros” das estradas de Portugal, o tribunal a quo demonstrou alguma incongruência na sua resposta; Dado que… 20- A denominação “ponto negro” é alvo de diferentes classificações, umas oficiais e outras mais sociológicas e profiláticas como referiu em sede de audiência de discussão e julgamento, a testemunha MR(…) e reconhecida na fundamentação da resposta do TAF à matéria quesitada; 21- Atendendo à perigosidade do troço, reconhecida pelo tribunal a quo aos despistes que resultaram em acidentes com mortos e feridos, a resposta ao artigo 16º da Base Instrutória teria de ser positiva, com a ressalva da denominação oficial da então Direcção-Geral de Viação; 22- Relativamente às obras de correcção do troço, atenta a sua perigosidade [artigo 18º da Base Instrutória], o tribunal a quo teria de reconhecer a sua inexistência actual pela alteração introduzida pela A25 e respectivos acessos; 23- Se o troço rodoviário em causa fosse o mais adequado não teria sido, certamente, alterado pelo novo traçado introduzido pela A25; 24- Em relação ao suposto excesso de velocidade do recorrente no momento do acidente, a matéria julgada provada [artigo 26º da Base Instrutória] teria tido algum tipo de influência no sucedido? 25- Conforme consta dos autos, o processo-crime existente contra o recorrente foi arquivado sem dedução de qualquer tipo de acusação pública contra o mesmo, situação que não seria possível com a detecção de excesso de velocidade; 26- Nada diz o tribunal a quo sobre a “NORMA DO TRAÇADO” aplicável às estradas nacionais que refere a velocidade específica de um condutor como aquela pode ser obtida em segurança em qualquer elemento do traçado, analisado isoladamente e que não pode diferir mais de 20Ks/hora da velocidade base fixada [www.forma-te.com/.../5292-norma-tracado-junta-autonoma-de-estradas.html]; 27- Se o troço em causa não aguentava uma diferença kilométrica de 10Kms/h ou até de 15Kms/h conforme surge agora na douta sentença em recurso, face ao marcado e ao praticado, a recorrida está a reconhecer a sua culpabilidade no acidente por violação da própria “NORMA DO TRAÇADO” supra invocado; 28- Em termos factuais, o tribunal a quo considerou a matéria quesitada no artigo 9º da Base Instrutória como sendo conclusiva e como tal não provada; 29- Salvo o devido respeito, atenta a relevância em termos indemnizatórios, o quesito deveria ter merecido uma resposta positiva atentos os factos provados no artigo 6º da Base Instrutória, sendo expectável uma esperança de vida activa até aos 65 anos; 30- Qualquer indemnização a ser atribuída deveria ter em conta a referida realidade; 31- A posição do recorrente encontra substância na prova documental constante dos autos e nos referidos depoimentos das testemunhas não familiares [dado que a credibilidade daquelas foi desmerecida pelo tribunal a quo] AF(…) e RM(…); 35- Com relevância para a decisão a formular, o tribunal a quo não apreciou correctamente os factos julgados provados sob o nº26º e a matéria dos artigos 4º, 9º, 16º, e 18º da Base Instrutória julgada não provada, violando-se o teor dos artigos 341º, 342º nº1, 483º, 490º, e 493º, todos do CC, 2º e 4º do DL nº48.051 de 21.11.67.

Termina pedindo a revogação da sentença recorrida bem como a sua substituição por decisão que consagre a posição por ele aqui defendida.

A entidade recorrida [ora designada «EP - Estradas de Portugal, SA»] contra-alegou, e concluiu assim: 1- A douta sentença recorrida não merece qualquer censura, fez correcta interpretação da lei e consequente aplicação desta aos factos, devendo por isso ser integralmente mantida, aderindo-se na íntegra ao seu teor; 2- Dá-se por integralmente reproduzida toda a matéria de facto dada como assente na sentença recorrida; 3- Dos factos apurados, resulta não estarem preenchidos os pressupostos necessários ao tipo legal da responsabilidade civil extracontratual, no que à recorrida diz respeito; 4- Nomeadamente por falta de nexo de causalidade - não ficou provada de qualquer forma a existência de areia ou gravilha no local onde aconteceu o acidente - tese que apenas surgiu na petição inicial; 5- Ao caso vertente aplica-se o DL nº48.051 de 21.11.67, designadamente o disposto nos artigos 2º e 4º, os quais apresentam como pressupostos, no essencial, de acordo com a jurisprudência do STA, os estatuídos na lei civil, ou seja no artigo 483º e seguintes do Código Civil na parte que dispõe que só há responsabilidade civil no caso de se verificarem, cumulativamente, os seguintes pressupostos: o facto; a ilicitude; a culpa; o dano e por último o nexo de causalidade [artigo 563º do CC que a consagrou na formulação negativa de Ennecerus-Lehman]; 6- Ninguém presente no local referiu a existência de areia ou gravilha, pretendendo o recorrente ora fazer uso de um documento junto à contestação como documento 1, para fazer crer que existia sujidade no pavimento à data do acidente [ver folha 15 do recurso], esquecendo, seguramente, que tais fotogramas se destinavam a ilustrar o local bem como a sinalização nele existente, sendo as mesmas de 28.11.2002, isto é quase um ano antes da eclosão do acidente; 7- Verifica-se que o autor tão pouco mencionou há quanto tempo estaria esta areia ou gravilha local, ou qual a sua quantidade, o que deveria ter obrigado a que os serviços da ré agissem de qualquer forma, procedendo à sua limpeza e/ou sinalização; 8- O autor pai [condutor], nem nas declarações prestadas à GNR à data do acidente se lembrou de revelar que o despiste se havia...

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