Acórdão nº 00454/14.8BECBR de Tribunal Central Administrativo Norte, 23 de Novembro de 2018

Magistrado ResponsávelLuís Migueis Garcia
Data da Resolução23 de Novembro de 2018
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Ministério da Administração Interna (Praça do Comércio, Ala Oriental, 1149-018 – Lisboa) interpõe recurso jurisdicional de decisão do TAF de Coimbra, que julgou procedente acção administrativa especial intentada por FBN (Lugar M…, 3130-534 – S.....

), anulando decisão punitiva disciplinar, por prescrição.

*O recorrente remata as suas alegações de recurso com as seguintes conclusões: I) Há um princípio vigente no ordenamento jurídico português - fixado no Código Penal cfr. artigo 121º, nº 3), no próprio Estatuto Disciplinar de 2008 (cfr. artigo 6º, n°s. 1 e 6) e, depois, na Lei Geral de Trabalho em Funções Públicas, de 2014 (cfr. artigo 178°, nºs. 1 e 5) e no atual Regulamento de Disciplina da GNR, alterado pela Lei n° 66/2014 (cfr. artigo 46°, n°s. 1 e 7) - acerca da prescrição dos procedimentos: a prescrição do procedimento disciplinar terá sempre lugar quando, desde o seu início, e ressalvado o tempo de suspensão, tiver decorrido o prazo normal da prescrição acrescido de metade.

II) O artigo 55° do RD/PSP, datado de 1990, apresenta efetivamente umna lacuna em matéria de prescritibilidade do procedimento administrativo; III) O artigo 66º do RD/PSP indica como "direito subsidiário" o "estatuto discpiinar vigente para os funcionários e agentes da administração central”, que correspondeu, a partir de 1 de janeiro de 2009, ao Estatuto Disciplinar de 2008 e, a partir de 2014, à Lei Geral de Trabalho em Funções Públicas; IV) O estatuto disciplinar subsidiário tem uma norma sobre prescritibilidade do procedimento: a norma do artigo 6°, n° 6, do Estatuto Disciplinar de 2008 e norma do artigo 178°, n° 5 da Lei Geral de Trabalho em Funções Públicas; V) A integração da lacuna do artigo 55° do RD/PSP não se cumpre mediante uma operação de copiar/colar a norma do artigo 6°, n° 6 (e 178°, n° 5) do estatuto disciplinar subsidiário; VI) A norma do artigo 6°, n° 6 (e 178°, n° 5) do estatuto disciplinar subsidiário está corretíssima quando inserida no seu próprio contexto: estabelece com a norma do artigo 6°, n° 1 (e 178°, n° 1) o princípio vigente no ordenamento jurídico português, que é referido na Conclusão 1); VII) Mas a mesma norma já não estabelece o referido princípio quando conjugada com a norma do artigo 55°, n° 1, do RD/PSP; VIII) Significa que não é essa norma aquela que, nos termos do artigo 10° do Código Civil, se mostra adequada a integrar a lacuna detetada no artigo 55° do RD/PSP. E qual é ela, então? IX É a norma que estabeleça com a norma do artigo 55°, n° 1, do RD/PSP o princípio atrás enunciado. Concretizando, X) É uma norma idêntica à que é prevista no artigo 46°, n° 7, do RD/GNR, alterado pela Lei n° 66/2014.

XI) Significa que o prazo de prescição do procedimento disciplinar na PSP é de quatro anos e meio.

XII) Por outro lado, a "decisão final" que marca o termo do prazo de prescrição, é a "decisão" tratada no artigo 88° do RD/PSP, que, acrescente-se, corresponde à "decisão" do artigo 55° do ED de 2008 e à "decisão final" do artigo 105° do RD/GNR.

*O recorrido não contra-alegou.

*O Exmº Procurador-Geral Adjunto, notificado para efeitos do art.º 146º do CPTA, não deu parecer.

*Dispensando vistos, cumpre decidir.

Os factos, que a decisão recorrida deu como provados: 1. Em 5.12.2007, deu entrada nas instalações da Direcção Nacional da PSP missiva subscrita por ASF e MIVSF à qual se juntou: - Despacho da Digna Magistrada do Ministério Público de S....., de data ignota, com o seguinte teor: «Valido a constituição como arguido de FBN efectuada nestes serviços do Ministério Público (…) - Relato de ASF dirigido ao Director da PJ de Coimbra, donde se retira o seguinte: (…) Vem participar criminalmente contra (…) FBN (…) O que faz nos termos e fundamentos seguintes: 1º No mês de Maio de 2007, em dia que o denunciante não consegue precisar, o ora denunciado FBN e a sua esposa AN, deslocaram-se à residência do ora denunciante com o objectivo de receberem uma suposta dívida no valor de mil euros.

  1. Dívida que, segundo o denunciado, a Firma V&F Lda, na qual a esposa do denunciante detinha uma participação social supostamente teria para com a esposa do denunciado há já 3 anos enquanto ex-trabalhadora daquela.

  2. O ora denunciante explicou então que não era sócio nem gerente da referida firma mas que era apenas familiar dos sócios da mesma e que, portanto, embora desconhecendo se a dívida existiria ou não ou até mesmo se a mesma já teria prescrito, nada tinha a ver com a mesma.

  3. Perante esta explicação o ora denunciado, aparentemente, aceitou-a, no entanto, alguns dias depois telefonou ao ora denunciante ameaçando este de que, se não pagasse a referida dívida, iria recorrer à solução de cobrança de dívidas difíceis, podendo, o ora denunciante, receber uma visita nesse sentido.

  4. Tal desiderato veio a confirmar-se em 16/06/07, quando o segundo denunciado se fez transportar no seu veículo de matrícula RB-xx-xx, até à habitação do denunciante, transportando um outro indivíduo que se veio a apurar ser o denunciado ASSN.

  5. O ora denunciando, AN, ao chegar junto da habitação do denunciante, recebeu instruções do denunciado FN, no sentido de abordar o denunciante por forma a tentar receber, fosse de que forma fosse, a quantia já mencionada, posto o que o denunciado FN se afastou cerca de duzentos metros, aguardando pelo resultado da investida do mencionado An….

  6. Este último deslocou-se então à habitação do denunciante e falou com a esposa do mesmo a perguntar pelo denunciante, tendo sido informado que vinha cobrar duas dívidas, uma da senhora AN e outra da senhora LG, também esta uma ex-funcionária da mencionada firma.

  7. Assim, ao ser informado que o denunciante não se encontrava em casa, o denunciado An… deixou a promessa de que viria mais tarde tendo tal acontecido no dia 21/06/07 pelas 15h45m.

  8. Com efeito, nesta data o denunciante ao ser confrontado com esta situação e temendo pela sua, assim como da sua esposa, integridade física, bom nome e saúde, solicitou o auxílio dos agentes da posto da GNR de S....., tendo os mesmos procedido à identificação do denunciado AN, que até então era desconhecido do denunciante.

  9. Na altura em que estava a ser efectuada a identificação do denunciado pelo agente da GNR, Sr M…, o ora denunciado, FN, surgiu descontrolado e sugeriu que se identificasse também o agente identificador.

  10. Após este episódio, o ora denunciante, começou a receber ameaças para o seu telefone fixo, sendo que a última foi feita no dia 26/06/07 às 00h30m nos seguintes termos: "se não pagas, estás fodido pois tens a rede montada, és um caloteiro! Vou-te foder a ti e à tua família, nem que para isso tenha que te matar!".

    (…) Ao actuar da forma descrita os denunciados tinham o propósito de coagir, ameaçar e injuriar o denunciante de forma adequada a provocar-lhe medo e inquietação e a prejudicar a sua liberdade de determinação, bem como ofender a sua honra e consideração imputando-lhe factos de modo nenhum verdadeiros. Sendo que um dos denunciados, FN, sendo agente de autoridade abusou dos seus poderes, pretendendo causar prejuízo a outra pessoa.

    (…)» - Exposição dirigida aos serviços do Ministério Público de S....., com o seguinte teor: «No passado dia 31 de Julho de 2007, cerca das 18hl5m, (…) os arguidos, após estacionarem a viatura onde se deslocavam dirigiram-se a pé à referida habitação, tendo em voz alta começado a apelidar a esposa do denunciante e referindo-se a estes como “vigaristas paguem o que me devem”, sendo certo que nada lhe é devido por aqueles.

    Já no dia 14 de Agosto de 2007, durante a manhã, o denunciante enquanto caminhava pela rua e junto à agência do BES na Vila de S....., o denunciante que o arguido F… vinha na sua direcção conduzindo o seu veículo, pelo que e tendo-o imobilizado na via aberto a porta e tendo saído perguntou-lhe em voz alta, para quem quiser ouvir. “Ó vigarista quando é que me pagas? Deixa estar que de uma maneira ou de outra vais pagar-me".

    (…)».

    - Queixa-crime dirigida aos mesmos serviços, com o seguinte conteúdo: «(…) no passado dia 23 de Outubro o arguido FB, em frente à habitação do assistente dirigindo-se a este de dentro do interior da viatura em que se deslocava vociferando e gesticulando ostensivamente na direcção do assistente proferiu as seguintes expressões: "Caloteiro, quando me pagas o que me deves?".

  11. Novamente no dia 5 de Novembro o arguido FB dirigiu-se ao assistente em frente ao Lar da Santa Casa da Misericórdia de S....., sito na Av. B… e deslocando-se o mesmo na sua viatura, após imobilização da mesma, proferiu "Então quando é que me pagas ó caloteiro?".».

    2. Em 20.12.2007, foi exarado, no ofício, de 6.12.2007, do Gabinete de Deontologia e Disciplina da Direcção Nacional da PSP, pelo Comandante Distrital da PSP de Leiria, o seguinte despacho: «Ao NDP, Subcomi. A…, para processo disciplinar»; 3. Ao referido processo disciplinar foi atribuído o número único de processo 2007LRA00039DIS; 4. Em 27.12.2007, no referido processo disciplinar, foi lavrado pelo Subcomissário JFA o auto com o seguinte teor: «ABERTURA DE PROCESSO DISCIPLINAR (…) autuo o despacho do Ex.mo Comandante, datado de 20-12-2006, exarado no ofício 2007GDD04462 do Gabinete de Deontologia e Disciplina da D PSP que acompanhou uma exposição subscrita por ASF e sua esposa MIVSF, (…) à qual fazem juntar documentação duma queixa crime que foi apresentada nos Serviços do Ministério Público de S....., na qual acusavam entre outras pessoas, o Chefe M/1...54, FBN, deste proferir injúrias e ameaças às suas pessoas e a exigir-lhes o pagamento de um dívida no valor de 1000,00€ e de ainda no dia 21-06-07 fazer transportar na sua viatura até à residência do queixoso um outro indivíduo no sentido deste fazer a devida cobrança, dando-se assim início ao presente processo disciplinar a fim de apurar os factos e eventuais responsabilidades que possam caber ao referido chefe.

    (…)»; 5. Em 3.1.2008, pelas 9h, o A. assinou a certidão com o seguinte conteúdo: «CERTIDÃO (DISCIPLINAR, nup2007LRA00039DIS)...

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