Acórdão nº 00278/17.0BEMDL de Tribunal Central Administrativo Norte, 02 de Março de 2018

Magistrado ResponsávelLuís Migueis Garcia
Data da Resolução02 de Março de 2018
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência os juízes deste Tribunal Central Administrativo Norte, Secção do Contencioso Administrativo: MABS (R. ….., nº 5, 5000-051 Torre de Moncorvo), interpõe recurso jurisdicional de despacho que dispensou produção de prova e sentença proferida pelo TAF de Mirandela, em processo cautelar intentado contra o IFAP – Instituto de Financiamento da Agricultura e Pescas, I. P.

(R. Castilho, 45-51, 1269-163 Lisboa), em que foi julgada “a presente acção improcedente, e, consequentemente, indefiro as providências cautelares requeridas nos presentes autos”.

*Conclui o recorrente: 1ª O recorrente não concorda com o douto despacho e a douta sentença recorrida, porquanto se considera que o Tribunal recorrido realizou uma menos correta interpretação e aplicação do direito ao caso concreto.

  1. De facto, considera, por despacho, o Exmo. Sr. Juiz do Tribunal a quo, que os autos cautelares dispõem dos elementos necessários à apreciação da causa, nos termos do artigo 118º, números 3 e 5 do CPTA. Todavia, o recorrente não concorda, nem se conforma, com este despacho, na medida em que nele se fez errada apreciação dos factos e igualmente errada interpretação e aplicação do artigo 118º, números 3 e 5 do CPTA, que se mostra, assim, violado.

  1. O recorrente, na sua p.i., requereu a produção de meios de prova, e fê-lo pois o recorrente invocou no seu requerimento inicial factos concretos tendentes a demonstrar os prejuízos resultantes dos actos cuja suspensão de eficácia requereu, nomeadamente os elencados nos artigos 152º a 189º do requerimento inicial.

  2. E o que é facto é que a prova desses prejuízos era, como é, imprescindível para se proceder à análise do requisito do “periculum in mora”, traduzido no fundado receio da constituição de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação previsto na alínea b) do nº 1 do artigo 120º do CPTA, que tem de se verificar cumulativamente com o “fumus boni iuris”.

  3. O requerente alegou e determinou os prejuízos, pretendendo prová-los, designadamente através da produção de prova testemunhal.

  4. No entanto, tal prova enunciada e a cargo do requerente, foi inviabilizada pelo próprio Tribunal “a quo” ao indeferir a produção de prova, e designadamente a produção de prova testemunhal, o que determinou, a final, que não se tivesse conseguido estabelecer, em concreto, se estavam verificados, ou não, os prejuízos de difícil reparação invocados pelo requerente.

  5. Ou seja, o Tribunal a quo, em primeiro lugar recusa a produção de prova, e depois vem dizer que o A. não demonstrou os factos.

  6. E, mais se diga que, ao contrário do entendimento constante do despacho recorrido e que visou justificar a desnecessidade da produção de prova, os documentos não eram de todo suficientes como prova dos danos alegados.

  7. Ademais, a prova por documentos pode ser feita em qualquer altura do processo, desde que se respeite o vertido no artigo 423º do C.P.C, ex vi art.º 1º do CPTA, até porque existem diversos documentos cuja apresentação não é possível oferecer com o articulado.

  8. Nestes termos, ao dispensar a produção de prova quando esta se mostrava indispensável à correta apreciação dos requisitos da providência cautelar requerida, o despacho recorrido fez uma errada interpretação e aplicação do artigo 118º, números 3 e 5 do CPTA, impondo-se a respetiva anulação e a baixa dos autos ao TAF de Mirandela para aí se proceder à produção de prova, nomeadamente com a inquirição das testemunhas arroladas pelo requerente.

  9. Pois, como referem Mário Aroso de Almeida e Carlos Fernandes Cadilha, no “Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos”, em anotação ao artigo 118º do CPTA: “[…] todos os meios de prova legítimos são, pois, admissíveis…”.

  10. Neste sentido já se pronunciou o TCA Norte, no seu dou Aresto no Proc. nº 276/11.8BEVIS, 2 Sec. do Cont. Tribut., de 12.01.2012, tal como infra se transcreve: “O Tribunal a quo só poderia ter dispensado a produção da prova testemunhal se tivesse concluído que ela era manifestamente impertinente inútil ou desnecessária”.

  11. A inquirição das testemunhas arroladas pelo recorrente revestia-se de extrema relevância para a descoberta da verdade material e consequentemente para a boa decisão da causa, na medida em que os elementos carreados pelas partes para os autos se mostram insuficientes à prolação de uma decisão.

  12. O Tribunal a quo não poderia dispensar a produção de prova testemunhal e decidir a insuficiência de prova dos factos alegados atento o disposto no nº 1 do art. 367º do CPC, aplicável por força do art.º 1º do CPTA, que confere ao juiz o poder de ordenar oficiosamente as diligências probatórias que considerar necessárias ao apuramento dos pressupostos de decretamento das providências cautelares requeridas. É este o poder que está, aliás, vertido no nº 3 do art. 118º do CPTA.

  13. O poder discricionário que é concedido ao julgador cautelar pelo artigo 118º, nº3, do CPTA, não poderá ser um poder discricionário tout court, sendo antes um poder-dever, isto é, um poder que está vinculado à exigência da busca da verdade material e ao respeito pelo princípio da tutela jurisdicional efectiva.

  14. Assim, o TAF, ao ter proferido decisão sem permitir ao recorrente demonstrar a veracidade das afirmações produzidas em sede de requerimento inicial, violou o direito à tutela jurisdicional efetiva, previsto no artigo 2º do CPTA.

  15. E, sem prescindir, o requerente cumpriu os artigos 114º, nº3 alínea g) do CPTA, pois formulou e especificou os fundamentos do pedido, oferecendo prova sumária da respetiva existência; o recorrente invocou o direito, fez prova dos factos e requereu a produção de prova; o recorrente respeitou o artigo 342º do Código Civil.

  16. O recorrente não esqueceu o seu ónus de articulação e de prova dos «factos concretos» que permitam e legitimem o julgador cautelar a realizar o «juízo de ponderação de interesses e danos» que é previsto e exigido.

  17. Face ao exposto, o recorrente entende que a recusa da produção de prova e a recusa de inquirição das testemunhas por si arroladas acarreta a violação do disposto no artigo 118º, nº3, do CPTA, e implica a anulação da sentença recorrida (Cfr. Acórdão do TCA Sul de 15.09.2011, Rº07957/11).

  18. Até porque, tal como entendido no Ac. do TCA Sul, Proc. n.º 10394/13, CA2º Juízo, de 24.10.2013, disponível em www.dgsi.pt: “Na verdade, não pode o Tribunal a quo prescindir de prova testemunhal e julgar não verificado o requisito do periculum in mora com base no facto de o mesmo não resultar provado”.

  19. A dispensa da prova influiu na boa decisão da causa incorrendo a sentença recorrida na violação do disposto no art.º 2º, nº 3, 114º, nº3 alínea g), e art. 118º do CPTA, e ainda na violação dos artigos 367º do CPC e 342º do Código Civil 22º Devendo, em consequência, ser julgado procedente o presente recurso, também nesta parte, revogando-se assim o despacho recorrido.

    Sem prescindir, 23º O recorrente discorda igualmente da sentença recorrida, por considerar que esta incorre em deficiente interpretação e aplicação do direito ao caso concreto.

  20. In casu, o recorrente também alegou estarem preenchidos os critérios de concessão da providência estipulados na 2ª parte do artigo 120º, nº 1, b) do C.P.T.A., e tudo, de acordo com a factualidade vertida em 181º a 206º da p.i..

  21. Mas o tribunal a quo, entendeu ter-se “por inverificado o periculum in mora…”.

  22. O recorrente não alcança a razão pela qual entendeu o Tribunal "a quo" não ter sido demonstrado o "periculum in mora", quando ele próprio dispensou a produção de prova ao abrigo do n.º 3 do artigo 118º do CPTA.

  23. Particularmente, no caso de o Tribunal considerar que os elementos juntos com o requerimento inicial da providência cautelar não eram suficientes para demonstrar a existência de "periculum in mora", o que não se concede, então sempre teria de lançar mão da prova testemunhal que foi oportunamente indicada pelo recorrente nesse mesmo requerimento.

  24. Não é possível que o Tribunal dispense as...

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