Acórdão nº 00425/10.3BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 16 de Março de 2018

Magistrado ResponsávelRogério Paulo da Costa Martins
Data da Resolução16 de Março de 2018
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

EM NOME DO POVO Acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: JPM veio interpor o presente RECURSO JURISDICIONAL da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, de 14.04.2015, pela qual foi julgada improcedente a acção movida pelo ora Recorrente contra o Município de Vila Nova de Gaia e outros, absolvendo os demandados dos pedidos.

Invocou para tanto em síntese que houve preterição de prova relevante e, em consequência, omissão de matéria de facto provada com relevo; invoca ainda que a decisão recorrida ao julgar a acção improcedente, em vez de procedente, como devia, violou, por erro de interpretação e aplicação ao caso concreto, o disposto no artigo 64.º, n.º 7, alínea b) da Lei n.º 169/99, de 18.09, artigos 8.º, n.º 1 e 9.º, n.º 1, do Decret0o-Lei n.º 2/98, de 03.01, artigo 9.º, n.º 2, do Código da Estrada, artigos 483.º, 493.º, n.º 1, e 563º, do Código Civil, e artigos 7.º e 10º da Lei n.º 67/2007, de 31.12.

O Município demandado contra-alegou defendendo a manutenção da decisão recorrida.

As contra-alegações da Seguradora AP foram neste mesmo sentido.

A EPK também apresentou contra-alegações defendendo o acerto da decisão recorrida e, em qualquer caso, negando qualquer responsabilidade no evento danoso em apreço, dado ter apenas, no caso, uma relação contratual com a BRS, alheia ao objecto do litígio.

Finalmente, a BRS contra-alegou, defendendo o acerto da decisão recorrida e negando qualquer responsabilidade no acidente dos autos, pois actuou, defende, com diligência que lhe é exigida.

O Ministério Público neste Tribunal emitiu parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso.

*Foi elaborado pelo Relator e notificado às partes projecto de acórdão no sentido de ser concedido parcial provimento à acção, e, logo ao recurso.

O Recorrente veio pronunciar-se sobre este projecto, concordando no essencial com o mesmo.

O Município de Vila Nova de Gaia também se pronunciou, defendendo mais uma vez o acerto da decisão recorrida e chamando a atenção para o decidido no acórdão deste Tribunal Central Administrativo Norte de 18.03.2016, no processo 1690/09.1 PRT, no sentido de, num caso idêntico, haver repartição de culpas; esclareceu que a responsabilidade do Município, em apreço, estava à data transferida para a AP e não para a FLD.

A FLD veio também pronunciar-se alertando para o facto de ter assumido, no que para o caso interessa, a responsabilidade civil da BRS e não do Município.

Finalmente a AP pronunciou-se sobre o projecto de acórdão insurgindo-se contra o que entende ser a inversão das responsabilidades no caso concreto e citando o já referido acórdão Tribunal Central Administrativo Norte de 18.03.2016, no processo 1690/09.1 PRT.

O Ministério Público neste Tribunal manteve o seu anterior parecer.

*Cumpre, pois, decidir já que nada a tal obsta.

*I - São estas as conclusões das alegações que definem o objecto do presente recurso jurisdicional: I - O fundamento específico de recorribilidade do presente recurso prende-se com o n.º 1 do artigo 629.º do Código de Processo Civil, aplicável por força do artigo 140.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos.

II - A testemunha JPSBB, funcionário da interveniente "EPK" e com presença activa na monitorização do sistema de restrição do acesso ao centro histórico de Vila Nova de Gaia, e que tinha a listagem de acidentes, foi claro em afirmar que tinha conhecimento de terem ocorrido cento e vinte e tal acidentes nos primeiros quatro meses de funcionamento do sistema - cfr. o registo áudio do depoimento desta testemunha de 1:47:00 a 1:47:17.

III - Não há dúvida que, se não foram 130 acidentes, foram, pelo menos, mais de 120 aqueles que aconteceram nos primeiros 4 meses de funcionamento do sistema.

IV - O Tribunal de Primeira Instância, em vez de ter dado como não provada a ocorrência de 130 acidentes, devia ter respondido da seguinte forma: "Provado que no local do acidente se verificaram mais de 120 acidentes".

V - Com este número de acidentes, a culpa era dos automobilistas? O problema não estava na sinalética existente no local nem num eventual defeito de funcionamento do sistema. O sistema funcionava tal como tinha sido idealizado. O problema estava no modo do seu funcionamento.

VI - Só com a alteração introduzida pela ré " BRS ", com a concordância do Município Réu, referida na alínea V) dos factos provados, isto é, só quando o pilarete passou a não subir ou a inverter o seu movimento ascensional quando um veículo era detectado pelo primeiro sensor, é que os acidentes acabaram ou diminuíram drasticamente.

VII - Esta alteração associada à modificação da composição do pilarete que, de ferro ou aço, passou a ser constituído por um material mais leve que se desloca quando for empurrado, foram as duas grandes medidas que vieram solucionar os graves problemas que o sistema implementado estava a causar junto dos munícipes e que causou ao Autor.

VIII - Por mais sinais que a Câmara colocasse nunca iriam terminar os danos provocados pelo pilarete.

IX - O relatório subscrito pela testemunha ARASM (ou ARD, como surge nesse documento), engenheira civil da Câmara, junto na audiência de julgamento pelo Réu Município, datado de 10.02.2009 e referente ao assunto "Sinistros ocorridos no acesso condicionado ao Centro Histórico - freguesia de Santa Marinha" -, é elucidativo da tentativa da Câmara de encontrar o sinal certo para o problema.

X - Uma dessas tentativas consistiu em, depois do acidente dos autos ter acontecido, substituir a placa inócua e completamente supérflua de "não avance com o sinal vermelho" por outra em que se alerta para "perigo de colisão". Mas colisão com o quê? De onde vem o perigo? De cima, dos lados, de baixo? Em que é que ele consiste? Quem se deparasse com o sinal "perigo de colisão" continuava sem perceber que o que a Câmara queria dizer era que se continuasse viagem podia ser embatido por um tubo de aço proveniente do subsolo.

XI - O Réu Município e/ou a Ré "BRS" não encontraram nem idealizaram um sinal que resolvesse o problema dos acidentes com o pilarete. Isto não é relevante? Não é significativo? XII - A única forma de evitar os acidentes era introduzir uma simples e pequena alteração informática e que consistia no sistema automático passar a dar ordens ao pilarete para não subir ou para descer quando houvesse um veículo junto ao primeiro sensor, colocado antes do totem. Mas era tanta a vontade do Município em não abandonar o castigo aos munícipes, que resistiu até onde pôde.

XIII - No fundo, o que acontecia era que mal um veículo passasse pelo terceiro sensor, que se situava 20 a 30 cm depois do pilarete, atento o sentido do tráfego, o cilindro começava o seu movimento inexorável de subida, sem que nada o detivesse. O Autor, que seguia atrás de um desses veículos, e que desconhecia a existência de tal objecto escamoteado no solo, foi implacavelmente agredido - porque de uma agressão se trata - quando o objecto subiu energicamente, perfurando o veículo por baixo do motor e criando o pânico nos seus ocupantes. Bastava que o sistema tivesse sido concebido no sentido de não deixar subir o pilarete enquanto fosse detectada a presença de um veículo junto do primeiro sensor, para que o acidente não tivesse acontecido.

XIII - O Município não tem o direito de destruir o património de uma pessoa e de colocar em causa a saúde e a integridade física dos cidadãos só porque ocorre uma contra-ordenação estradal.

XIV - Os danos sofridos pelo Autor são absolutamente desproporcionais em relação à infracção cometida.

XV - Foram precisos mais de 120 acidentes para que os Réus introduzissem uma "elevação segura" do pilarete. Ora, têm que ser responsabilizados por terem reagido demasiado tarde.

XVI - Existe na sentença em crise uma excessiva importância dada aos sinais de trânsito, sobretudo, ao sinal de trânsito de proibido virar à esquerda, colocado na Avenida D..., por onde o Autor passou antes de virar para a Rua C... Mas não há nexo de causalidade adequada entre a violação dos sinais e o acidente.

XVII - Conforme ensina Vaz Serra, o agente só responde pelos resultados, para cuja produção a sua conduta era adequada, e não por aqueles que tal conduta, de acordo com a sua natureza geral e o curso normal das coisas, não era apta para produzir e que só se produziram em virtude de uma circunstância extraordinária.

XVIII - É certo que poderá existir um nexo de causalidade natural ou físico porque se o Autor não tivesse virado à esquerda o acidente não teria acontecido. Mas não existe um nexo de causalidade adequada, porque não é suposto que o desrespeito de um sinal de trânsito provoque a colisão de um pilarete contra um veículo, sobretudo quando nenhum dos sinais avisa da existência do cilindro escamoteado no solo e da sua subida iminente, contra, aliás, a permissão dada pela luz amarela semafórica.

XIX - É preciso notar ainda que a proibição de virar à esquerda, para a Rua C..., existente na Avenida D…, não era uma proibição absoluta, nem podia ser porque a Rua C… apenas tem um sentido de marcha que é precisamente o proveniente da Avenida D… em direcção a sul.

XX - O sinal C11b indicativo de proibido virar à esquerda, continha uma placa que excepcionava os veículos autorizados - cfr. o relatório da Eng.ª AR e as fotografias juntas aos autos na audiência de julgamento.

XXI - Mas essa exceção não correspondia à realidade. Com efeito, o sistema estava pensado para também permitir que pessoas não autorizadas previamente e, portanto, não detentoras do identificador "Via Verde", pudessem obter a autorização junto do totem ou intercomunicador, solicitando-a ao operador de serviço. Assim sendo, um utente não autorizado e que pretendesse solicitar a autorização ao operador, e que, portanto, desconhecia se a mesma lhe ia ser dada ou não, tinha que entrar "não autorizado" na Rua C….

XXII - Só depois de percorrer os metros que distanciam a entrada controlada na Rua C…, da...

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