Acórdão nº 00325/18.9BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 20 de Setembro de 2018

Magistrado ResponsávelPedro Vergueiro
Data da Resolução20 de Setembro de 2018
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: 1.

RELATÓRIO A Excelentíssima Representante da Fazenda Pública, devidamente identificada nos autos, inconformada, veio interpor recurso jurisdicional da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, datada de 15-06-2018, que julgou procedente a pretensão deduzida por FJSPC no âmbito da presente RECLAMAÇÃO relacionada com o despacho do Director da Alfândega de S..., de 26-01-2018 proferido no PEF nº 3204201501221981 nos termos do qual foi desatendido o pedido de suspensão da execução e de dispensa de prestação de garantia.

*Formulou nas respectivas alegações (cfr. fls. 106-110), as seguintes conclusões que se reproduzem: “ (…) A. Face ao disposto nos artigos 28.º n.º 3 do CIVA e 52.º, n.º 4 da LGT, conclui-se que a suspensão da execução instaurada para cobrança coerciva da dívida correspondente ocorre nos casos previstos na legislação comunitária, no caso, o artigo 244.º do CAC.

  1. O referido preceito legal estipula que “A interposição de recurso não tem efeito suspensivo da execução da decisão contestada. Todavia, as autoridades aduaneiras suspenderão, total ou parcialmente, a execução dessa decisão sempre que tenham motivos fundamentados para pôr em dúvida a conformidade da decisão contestada com a legislação aduaneira ou que seja de recear um prejuízo irreparável para o interessado. (…)” (sublinhado nosso) C.

    No que concerne à irreparabilidade dos prejuízos, tem sido entendimento unânime da nossa doutrina e jurisprudência que só devem ser considerados irreparáveis os prejuízos ou danos cuja extensão não possa ser avaliada pecuniariamente, sendo certo que esses prejuízos terão de ser directos e consequência da execução do acto que se reclama, e ainda que a dificuldade de reparação dos danos se deve avaliar segundo um juízo de probabilidade, sempre no estrito respeito pelos limites da invocação do interessado.

    D.

    “No que respeita ao prejuízo irreparável, compete ao executado fazer prova da existência de uma situação de dano no desenvolvimento da sua actividade, como resultado dos encargos financeiros impostos pela prestação da garantia. Este dano deve ser especialmente grave, pondo geralmente em causa a continuidade da actividade económica do executado (…)” - cfr. José Maria Fernandes Pires e Outros, in “Lei Geral Tributária Comentada e Anotada”, 2015, Almedina. (sublinhado nosso) E.

    Assim, apenas haverá lugar à dispensa da prestação de garantia quando esta possa causar ao executado prejuízos que impeçam o retorno ao status quo ante.

    F.

    Ora, da leitura do n.º 4 do art.º 52º da LGT resulta que, só em circunstâncias muito excepcionais é que a suspensão da execução é conseguida sem prestação de garantia, em virtude de o executado dela poder ser isento.

    G.

    Assim, atentos os requisitos legais, bem se compreende que a prova de verificação dos pressupostos que permitam a dispensa de prestação de garantia se deva fazer, prima facie, com recurso à prova documental, por ser este tipo de prova aquele que melhor se coaduna com a demonstração imposta por lei.

    H.

    Para além disso, o nº 3 do art.º 170º do CPPT refere expressamente que o pedido de dispensa de garantia deve ser instruído com a prova documental necessária para a apreciação da pretensão.

    I.

    Veja-se, a propósito, o douto Acórdão do TCA Sul, processo 00348/04, 07.12.2004.

    J.

    Ora, in casu, pela consulta dos documentos n.ºs 7 a 11 da p.i. apresentados pelo ora reclamante, ao contrário do entendimento do Tribunal a quo, conclui-se que os mesmos não são susceptíveis (e, muito menos “sobejamente”) de demonstrar e provar o “prejuízo irreparável”, pressuposto essencial de que depende a decisão de suspensão da execução com dispensa de prestação de garantia, uma vez que, K.

    tais documentos - apresentados com suposta intenção de prova dos custos que importariam para o reclamante as comissões cobradas por diversas instituições bancárias - consistem em meros “prints” recolhidos dos sites dessas mesmas instituições bancárias, L.

    e, portanto, sem qualquer valor probatório para os presentes autos.

    M.

    Destarte, entende a Fazenda Pública que o acto reclamado, porque legal, deverá manter-se no ordenamento jurídico-tributário.

    N.

    Assim, decidindo da forma como decidiu, a douta sentença recorrida enferma de ERRO DE JULGAMENTO DE DIREITO E DE FACTO.

    Termos em que, Deve ser concedido provimento ao presente recurso jurisdicional com as legais consequências.”*O Recorrido FJSPC apresentou contra-alegações, onde formula as seguintes conclusões: “(…) A) - O que está em causa no recurso da sentença que ordenou a suspensão da execução com dispensa de garantia, é um pedido de suspensão da cobrança coerciva de IVA liquidado pela Alfândega de S..., com dispensa de prestação de garantia, submetido pelo Recorrido junto desta autoridade aduaneira nos termos e com base nos fundamentos previstos no artigo 244.º do CAC e que, por ausência de decisão desta Alfândega, foi renovado junto o órgão de execução fiscal no âmbito da execução fiscal n.º 3204201501221981.

  2. - Depois de diversas peripécias, acabou por ser devolvida à Alfândega de S... a competência para se pronunciar sobre tal pedido, o que esta fez proferindo despacho de «Indefiro o pedido de dispensa de garantia (...).», que constitui a decisão reclamada nestes autos.

  3. - Sucede que o Recorrido invocou como fundamentos do pedido de suspensão as duas situações previstas no 2.º parágrafo do artigo 244.º do CAC, a saber: (i) existência de motivo fundamentado para pôr em dúvida a conformidade da decisão contestada com a legislação aduaneira - a prescrição da obrigação de pagamento por parte do Recorrido, em face do decurso do prazo de caducidade de três anos previsto no artigo 221.º, n.º 3 do CAC - e, (ii) receio manifesto de a execução da decisão causar prejuízo irreparável.

  4. - Concomitantemente, o Recorrido requereu nos termos do 3.º parágrafo do mesmo artigo 244.º do CAC fosse dispensado de constituir garantia por ser manifesta a carência de meios económicos para garantir o valor de € 887.401,88, impossibilidade essa revelada pela manifesta e absoluta insuficiência de bens penhoráveis.

  5. - O despacho reclamado do Diretor da Alfândega de S...

    não decidiu sobre a suspensão da cobrança - 2.º parágrafo do artigo 244.º do CAC - e ignorando em absoluto o disposto no 3.º parágrafo do artigo 244.º do CAC, indeferiu o pedido de dispensa de constituição de garantia, mas com fundamentação na doutrina do Ofício Circulado da AT n.º 60077 de 29-07-2010 e jurisprudência desenvolvidas internamente a propósito da interpretação do artigo 52.º n.º 4 da LGT.

  6. - É, pois, manifesto haver erro nos pressupostos de direito em que a decisão reclamada de indeferimento assentou, ao considerar que não estar demonstrado e provado o requisito de verificação de «prejuízo irreparável», uma vez que o 3.º parágrafo do artigo 244.º do CAC a ele não faz referência como requisito de dispensa da prestação de garantia.

  7. - No mesmo erro persiste a Recorrente, uma vez que é apenas a circunstância de a exigência da constituição de garantia poder suscitar «por forca da situação do devedor, graves dificuldades de natureza económica ou social» que releva para tal garantia dever ser dispensada, e já não qualquer ideia de irreparabilidade dos prejuízos que impeçam o retorno ao status quo ante.

  8. - Com efeito, apenas neste âmbito - «a situação do devedor, graves dificuldades de natureza económica ou social» - é que pode relevar o estatuído no artigo 52.º n.º 4 da LGT - «(...) manifesta falta de meios económicos revelada pela insuficiência de bens penhoráveis para o pagamento da dívida exequenda e acrescido».

  9. - Na realidade, o Recorrido não é desprovido de meios; do que o Recorrido carece é dos meios económicos para garantir o valor de € 887.401,88, falta essa revelada pela manifesta e absoluta insuficiência de bens penhoráveis, e é apenas da prestação de tal garantia que ao abrigo da lei pretende ver-se dispensado.

  10. - Como resulta da supra transcrita jurisprudência do TJUE, «a condição relativa à existência de um prejuízo irreparável deve considerar-se preenchida», bastando que «o prejuízo dependa da ocorrência de um conjunto de fatores que seja previsível com um grau de probabilidade suficiente».

  11. – Igualmente, no entendimento do STA igualmente supra citado, a simples circunstância de ter sido invocada pelo Recorrido no seu pedido de suspensão de cobrança a prescrição da dívida - «considerando que o pagamento de uma dívida prescrita não pode fundamentar a devolução ou repetição do indevido (…) geraria uma situação de facto consumado quanto à satisfação de uma dívida que a ora recorrida tem por prescrita. (…) E a possível procedência da pretensão formulada no processo principal (anulação dos actos de execução da garantia em contrário da verificação da prescrição da dívida garantida) não permitiria reconstituir a situação que existiria na hipótese de a pretensão da ora recorrida dever ter sido objecto de deferimento (…).» legitima «o fundado receio de uma lesão irreparável».

  12. - Como decidido já pelo TJUE, embora seja à autoridade aduaneira que compete a decisão de suspender a execução do ato impugnado, tal não inibe o tribunal a quo de ordenar a suspensão da cobrança com dispensa de prestação de garantia nos termos e com os fundamentos do artigo 244.º do CAC, tal como requerido pelo ora Recorrido, pelo que nenhuma censura, quer quanto à matéria de facto, quer quanto ao direitos aplicado, merece a decisão recorrida.

    Termos em que deverá julgado improcedente o presente recurso e mantida integralmente sentença recorrida.”*O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu o parecer de fls. 138-140 dos autos, no sentido da improcedência do recurso.

    *Sem vistos, por se tratar de processo classificado de urgente, vem o processo à Conferência para julgamento.

    1. DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela...

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