Acórdão nº 438/19.0T8MMN.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 30 de Junho de 2022
Magistrado Responsável | ISABEL DE MATOS PEIXOTO IMAGINÁRIO |
Data da Resolução | 30 de Junho de 2022 |
Emissor | Tribunal da Relação de Évora |
Acordam no Tribunal da Relação de Évora I – As Partes e o Litígio Recorrente / Autora: (…), Sociedade Agrícola, SA.
Recorrida / Ré: (…), Sociedade de Investimento Imobiliário, Lda.
Trata-se de uma ação declarativa de condenação no âmbito da qual a Autora peticionou que a Ré seja condenada a corrigir os defeitos detetados na obra por si realizada ou, caso não cumpra tal obrigação no prazo designado, que seja condenada a pagar o custo da reparação dos defeitos.
Alegou, para tanto, que a Ré realizou obras de construção no âmbito da remodelação da adega. Veio a verificar-se que, nos paramentos junto ao teto do pavilhão de engarrafamento da adega construído de raiz pela Ré, surgiu uma fenda, a qual percorre todo o perímetro do mesmo e se situa a cerca de 30 a 40 cm abaixo da cobertura, é visível tanto no interior como no exterior do edifício; tal fenda constitui um defeito construtivo da responsabilidade da Ré, que se recusa efetuar a reparação.
Em sede de contestação, a Ré, reconhecendo a existência da fenda, invoca que não se trata de defeito, mas de decorrência do desgaste normal dos materiais em consequência da utilização do edifício, atento o decurso do tempo e a falta de manutenção do edifício. A obra foi executada segundo as boas técnicas construtivas, pelo que conclui não ser possível imputar o surgimento da fissura a defeitos de construção.
II – O Objeto do Recurso Decorridos os trâmites processuais legalmente previstos, foi proferida sentença julgando a ação totalmente improcedente.
Inconformada, a Autora apresentou-se a recorrer, pugnando pela revogação da decisão recorrida, a substituir por outra que condene a Recorrida no pedido. Concluiu a alegação de recurso nos seguintes termos: « I. Conclui-se que a Recorrente peticiona nos autos a condenação da Ré a Reconhecer existência dos defeitos de construção que descreve na P.I. (Fenda que percorre todo o perímetro do edifício situada a cerca de 30, 40 cm do teto, visível tanto no interior como no exterior do edifício) e a corrigir tal defeito num prazo razoável, o qual deve ser fixado em dois meses.
II. Em alternativa pede a Autora que caso a Ré não proceda a correção do defeito no prazo fixado para o efeito seja condenada a pagar o custo de reparação do mesmo no valor que se vier a apurar em execução de sentença.
III. No desenvolvimento da sua atividade construção Civil a Recorrida dedicou-se à construção de uma obra propriedade da Autora, denominada “Remodelação de Adega” constante do processo de Obras …/91 da Câmara Municipal de Montemor-o-Novo.
IV. Após terminadas as obras de construção, mais concretamente em data imprecisa do mês de março de 2018, verificou a Autora que nos paramentos junto ao teto do pavilhão de engarrafamento da adega, construído de raiz pela Ré, surgiu uma fenda, a qual percorre todo o perímetro do mesmo e se situa a cerca de 30 a 40 cm abaixo da cobertura e é visível tanto no interior como no exterior do edifício criando a convicção de que o teto de cobertura se irá destacar do edifício.
V. A mencionada fenda constitui um defeito construtivo da responsabilidade da Ré.
VI. A Ré reconheceu a existência da fenda.
VII. Foi fixado pelo tribunal a quo o seguinte objeto do litígio: VIII. “- Decidir se deve proceder o pedido da Autora, ou seja, a condenação da Ré.
IX. - Saber se a obra em causa nos autos apresenta defeitos; X. - Saber quem é ou são dos responsáveis pelos mesmos; XI. - Saber quem os deve corrigir/reparar e em que medida.
XII. - Saber se está em causa o desgaste normal proveniente da utilização dos materiais no decurso do tempo ou falta de manutenção do edifício”.
XIII. Consta ainda da fundamentação da sentença serem as seguintes as questões a resolver: XIV. “- Saber se em março/2018, nos paramentos junto ao teto do pavilhão desengarrafamento da adega, construído de raiz pela Ré surgiu uma fenda, a qual percorre todo o perímetro do mesmo; XV. - Saber se tal fenda se situa a cerca de 30 a 40 cm abaixo da cobertura e é visível tanto no interior como no exterior do edifício criando a convicção de que o teto de cobertura se irá destacar do edifício.
XVI. - Saber se a fenda foi originada/se deve a um defeito de construção; XVII. - Saber se está em causa o desgaste normal proveniente da utilização dos materiais no decurso do tempo por falta de manutenção do edifício; XVIII. - Apurar qual o valor da reparação da referida fenda.
XIX. Tendo sido realizada perícia e audiência de julgamento, foram considerados provados, com relevância para o objeto do presente recurso os seguintes factos: XX. “1 . No desenvolvimento da sua atividade de construção Civil a Ré dedicou-se à construção de uma obra propriedade da Autora, denominada “Remodelação de Adega” constante do processo de Obras …/91 da Câmara Municipal de Montemor-o-Novo.
XXI. (Na douta sentença encontra-se omisso o n.º 2 dos factos provados já que a numeração passa de 1 para 3).
XXII. 3. Em data imprecisa do mês de março de 2018 verificou a Autora que nos paramentos junto ao teto do pavilhão de engarrafamento da adega, construído de raiz pela Ré surgiu uma fenda, a qual percorre todo o perímetro do mesmo.
XXIII. 4. Tal fenda situa-se a cerca de 30 a 40 cm abaixo da cobertura e é visível tanto no interior como no exterior do edifício.
XXIV. 7. Até à presente data não procedeu a Ré à correção de tal situação.
XXV. 8. Para a reparação da fenda melhor supra descrita será necessária uma quantia não inferior a € 7.500,00.
XXVI. 9. A Ré é uma sociedade comercial por quotas que tem por objeto: compra e venda de imóveis, indústria de construção civil, incluindo urbanização de terrenos, comércio de materiais e equipamentos para construção.
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10.No exercício da sua atividade a Ré celebrou com a Autora, três contratos de empreitada distintos, em momentos temporais distintos, com valores e objeto distintos, embora todos referentes ao processo de obras n.º …/91 da Câmara Municipal de Montemor-o-Novo para “Remodelação de Adega”:
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Em 19 de Julho de 2013, as partes celebraram um contrato de empreitada para remodelação do pavilhão da Linha de Engarrafamento e eletricidade, tendo como objeto os trabalhos e demais intervenções que estão indicados na Proposta de Orçamento anexo ao contrato como “Anexo I”, pelo preço global de € 135.532,62, que respeitava € 120.532,62 à execução da linha de engarrafamento e os restantes € 15.000,00 à eletricidade da linha de engarrafamento, acrescido de IVA. Como trabalhos a realizar constam da proposta de orçamento os seguintes: XXVIII. “Revestimentos e acabamentos XXIX. Paredes exteriores: XXX. Execução de salpico, emboços e rebocos em paredes exteriores, com argamassa de areia fina, incluindo aplicação de redes nos cantos, arestas, zonas de transição de materiais e roços, para rebocar pintura.
XXXI. Paredes interiores: XXXII. Execução de reboco interior em paredes, incluindo aplicação de redes nos cantos, arestas e zonas de transição de materiais e roços e todos os trabalhos inerentes.
XXXIII. Pinturas: XXXIV. Pintura de paredes exteriores a tinta de água branca da cin ou robialac ou equivalente, sendo de membrana flexível.
XXXV. Execução de pintura com tinta de água branca, em todas as paredes e tetos interiores, de acordo com as condições técnicas de pintura” (…).
XXXVI. 10. O referido pavilhão de engarrafamento foi entregue à Autora e entrou em laboração em novembro de 2013 e as restantes empreitadas apenas ficaram concluídas meses depois.
XXXVII. “11. A obra foi executada e os materiais aplicados segundo as boas técnicas construtivas”.
XXXVIII. 12. A obra está sujeita a comportamentos normais face ao tempo, ao arejamento ou falta dele, aos movimentos telúricos e à matéria de que é composta, bem como, ao uso menos cuidado ou omissão de atos de conservação por parte da Autora.
XXXIX. Foi, contudo, dado como não provado e bem que a fenda fosse consequência resultante do desgaste normal proveniente da utilização da obra/dos materiais, do decurso do tempo e da falta de manutenção do edifício vide al c) dos factos não provados.
XL. 21. Do relatório pericial realizado no âmbito dos presentes autos consta o seguinte: XLI. “- Confirma-se a existência de fendas longitudinais visíveis nos paramentos interiores e exteriores a cerca de 30 a 40 cm abaixo da cobertura do edifício, em grande parte do perímetro do edifício, nos paramentos exteriores percorre praticamente a totalidade do perímetro, nos paramentos interiores é menos visível, sendo mais gravoso nas zonas onde as vigas metálicas da cobertura assentam na estrutura de betão.
XLII. O aparecimento da fenda, tendo em conta os locais onde surge parece estar relacionado com fenómenos de retração e dilatação dos materiais pois parece em zona de juntas de trabalhos em que os materiais apresentam coeficientes de dilatação diferentes. A fenda, no caso presente, surge na transição entre dois tipos de materiais de construção diferentes, na ligação entre uma parede em alvenaria e uma viga em betão armado e ainda na ligação da viga metálica com a viga em betão armado. Com o tempo e por falta de tratamento das juntas de trabalho, os materiais “mexem” e acaba por surgir fendilhação.
XLIII. - Era possível ao empreiteiro prever o surgimento das patologias ao longo da execução da obra? O aparecimento de fissuração e fendas são das patologias que mais frequentemente ocorrem na construção. No entanto, há cuidados que se podem ter durante a execução dos trabalhos, respeitando as boas regras de construção e ainda privilegiara utilização de materiais de construção adequados à utilização que vai ser dada à construção, para mitigar a ocorrência deste tipo de fenómenos.
XLIV. - A mencionada fenda pode ter tido como causa/ origem ou contributo alguma das seguintes situações? XLV. Condições climatéricas: este fator contribui para o aparecimento de fendas nomeadamente as oscilações de temperatura que provocam a retração e dilatação dos materiais de construção, no entanto os processos construtivos devem incorporar materiais de...
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