Acórdão nº 1469/13.9TBBNV.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 09 de Junho de 2022

Magistrado ResponsávelMANUEL BARGADO
Data da Resolução09 de Junho de 2022
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam na 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora I - RELATÓRIO “Ação A” [1] A…, também conhecida por (…), C.M.N., M.A.N., M.C.B., M.G.N., M.M.C., S.P.N., M.F.P., M.S.P., M.V.F., M.E.P., M.A.P.

e M.C.L.

, instauraram a presente ação declarativa, sob a forma de processo comum, contra P.F.

e C.F., pedindo que: - seja reconhecida a existência de uma servidão de passagem que onera o prédio dos réus a favor dos prédios dos autores, com 3 metros de largura, com início na Estrada (…) ou Rua (…), continuando no sentido Sul-Norte junto à estrema Nascente do prédio dos réus e atravessando os prédios de todos os autores; - os réus sejam condenados a remover todos os obstáculos colocados no leito da serventia e que impedem o normal exercício da servidão e a absterem-se de praticar atos que por qualquer forma possam perturbar o uso da mesma pelos autores; - os réus sejam condenados no pagamento de uma sanção pecuniária compulsória de € 500,00 por cada vez que impeçam ou dificultem a passagem dos autores pela servidão.

Alegaram, em síntese: - Aquando da celebração, em 6 de abril de 1973, de uma escritura de doação e divisão de coisa comum, e uma vez que alguns dos prédios resultantes dessa divisão, mormente os inscritos na matriz rústica com os artigos (…), (…), (…) e (…) da secção (…) da freguesia de (…), não possuíam acesso direto à via pública, foi por todos os intervenientes naquele ato constituída verbalmente uma servidão de passagem a pé e de carro, com 3 metros de largura e início na via pública, denominada Estrada (…) ou (…), continuando no sentido Sul-Norte junto à estrema Nascente do prédio dos réus e terminando na estrema Norte do mesmo.

- A servidão atravessa o prédio dos réus, bem como todos os prédios rústicos dos autores, constituindo o único acesso destes à via pública, e sempre foi usada de forma contínua e ininterrupta por autores e réus, e respetivos ante possuidores, à vista de toda a gente e na convicção de exercerem um direito de uso próprio, sem qualquer violência ou ocultação e sem oposição de quem quer que seja.

- Os autores sempre zelaram pela conservação da servidão, mantendo-a limpa e desobstruída, a fim de poder ser transitável por peões e veículos, como sempre foi.

- A servidão encontra-se nitidamente demarcada por trilhos e rodados de veículos, sinais reveladores de que a mesma tem vindo a ser utilizada desde a data da sua constituição e está demarcada na carta cadastral geométrica.

- Os primeiros autores, proprietários do prédio inscrito na matriz cadastral rústica sob o artigo (…) da secção (…F da freguesia de (…), celebraram, em 19 de Julho de 2011, no Cartório Notarial Privado de (…), uma escritura de justificação, por via da qual justificaram a posse, por usucapião, de uma servidão de passagem a pé e de carro, com início na via pública denominada Estrada (…) ou Rua (…), continuando no sentido Sul- Norte, junto à estrema Nascente do prédio serviente, com a largura de 3 metros e comprimento de 129,05 metros, terminando na estrema Norte do prédio serviente.

- Os réus foram devidamente notificados nos termos do artigo 99º do Código do Notariado, sem que tenham deduzido qualquer oposição à sua constituição por usucapião; - Pese embora a posse da servidão se encontre apenas justificada para os primeiros autores, a mesma abrange não só o prédio serviente na mencionada escritura, propriedade dos réus, mas também os prédios de todos os demais autores.

- A servidão sempre foi reconhecida pelos autores em benefício uns dos outros porque todos os seus prédios se encontram encravados, pelo que, se outro título não tivessem, sempre teriam adquirido a servidão por usucapião.

- Os réus têm vindo a praticar atos que estorvam o normal uso da servidão: na estrema Sul da serventia, que confronta com a via pública, mais concretamente na Estrada (…), atual Rua (…), procederam à edificação de pilares com vista a servirem de suporte à colocação de um portão, com o qual pretendem vedar a entrada dos autores na serventia; no leito da serventia procederam à colocação de duas lombas com acentuada elevação, as quais dificultam grandemente a circulação de veículos automóveis ligeiros e são suscetíveis de causar danos materiais nos veículos nos quais os autores se fazem transportar no acesso aos seus prédios; ainda no leito da servidão construíram um abrigo para colocação de garrafas de gás, estreitando nesta parte a servidão, edificaram um barracão em madeira no local onde antes existia uma árvore de fruto e colocaram uma cerca em madeira e pedras.

Os réus contestaram, excecionando a ineptidão da petição inicial por ininteligibilidade do pedido e contradição deste com a causa de pedir, e a ilegitimidade ativa, por não estarem na causa todos os proprietários dos terrenos. Invocaram também factos contrários próprios, uma vez que com a escritura de partilha e divisão foi constituído, em benefício da já falecida doadora (…), usufruto sobre todos os prédios que doou, sendo que era na qualidade de usufrutuária que tinha acesso à casa onde habitava quer pela Rua (…), quer pela Rua (…), pelo que os autores se querem aproveitar de uma situação que só aproveitava àquela, além de que é por mera tolerância que os autores passam pelo caminho.

Mais impugnaram os factos alegados na petição inicial e alegaram que, à exceção da autora M.A.P., todos os restantes autores não vivem nos prédios nem os cultivam, encontrando-se incultos e abandonados, pelo que, a ter existido qualquer servidão, a mesma se deve considerar extinta por desnecessidade e não uso.

Os réus deduziram ainda reconvenção, pedindo a aquisição dos prédios encravados pelo seu justo valor e terminaram invocando a existência de causa prejudicial por se encontrar pendente ação destinada a impugnar a escritura de justificação notarial, defendendo a suspensão do processo até ser proferida decisão naqueles autos.

Os autores replicaram, invocando a exceção de ineptidão do pedido reconvencional por manifesta incompatibilidade entre o pedido e a causa de pedir. Mais alegaram que sempre cultivaram os prédios, pelo que necessitam de aceder aos mesmos, e que a possibilidade de afastamento da servidão mediante aquisição dos prédios encravados tem de ser exercida antes da constituição da servidão por forma legal, além de que tal regime só é aplicável às servidões legais de passagem e não às que sejam constituídas por acordo, como sucedeu no caso dos autos.

Por despacho de 16 maio de 2014 foi ordenada a apensação ao processo n.º 1409/13tbbnv do processo n.º 1589/13.0tbbnv, passando este a ser identificado pelo n.º 1409/13tbbnv-B.

Por despacho de 8 de outubro de 2014 foi fixado ao processo n.º 1409/13tbbnv o valor de € 65.773,45 e ordenou-se o envio dos autos à Instância Central Cível de Santarém, por ser o tribunal competente.

Por despacho de 4 de dezembro de 2014 foram os autores convidados a suprir a preterição de litisconsórcio necessário ativo mediante a dedução de intervenção principal provocada.

Após documentação da morte da autora A… procedeu-se, por sentença de 26 de março de 2015, à habilitação dos seus herdeiros, C.M.N., M.A.N., M.C.B., M.G.N., M.M.C. e S.P.N., que passaram a ocupar o lugar daquela.

Por despacho de 21 de maio de 2015 foi admitida a intervenção principal provocada e ordenou-se a citação dos chamados, não tendo sido apresentado qualquer articulado.

Após citação edital da chamada (…) procedeu-se à citação do Ministério Público, não tendo sido apresentada qualquer contestação.

Por despacho de 3 de junho de 2019 foi indeferida a suspensão da causa por pendência de causa prejudicial e ordenou-se que as “Ações A e B” voltassem a ter tramitação separada, mas continuando apensadas.

Foi proferido despacho saneador julgando-se improcedentes as exceções invocadas, com subsequente identificação do objeto do litígio e enunciação dos temas da prova, sem reclamação.

“Ação B” P.F.

e C.F.

, instauraram ação de impugnação de escritura de justificação, com processo comum, contra: A..., M.M.C., M.G.N., M.A.N., M.C.B., S.P.N., C.M.N., (…) (1ºs réus), (…), (…) e (…) (2ºs réus), pedindo que: - se considere impugnada e se declare ineficaz e de nenhum efeito, para todos os efeitos legais, o facto justificado na escritura pública de justificação, lavrada no dia 19/07/2011, no Cartório e perante a Notária (…), de fls. 124 a fls. 128 do livro 89-A; - se declare ineficaz e de nenhum efeito tal escritura pública de justificação, por forma a que os réus não possam através dela registar quaisquer outros direitos; - se declare que sobre o prédio descrito na CRP de (…) sob o n.º (…) da freguesia de (…) não existe qualquer servidão de passagem de pé e de carro com início na via pública, denominada Estrada (…) ou Rua (…), continuando no sentido Sul-Norte, junto à estrema Nascente do prédio serviente, com a largura de 3 metros e comprimento de 129,5 metros, terminando na extrema Norte do prédio serviente, e a favor do prédio descrito sob o n.º (…) da mesma freguesia; - se declare que os primeiros réus não têm direito à servidão e que área da parcela justificada/servidão faz parte do prédio dos autores; - seja ordenado o cancelamento dos registos operados com base na escritura de justificação, nomeadamente a que corresponde à Ap. (…).

Alegaram, em resumo: - Ao contrário do que consta da referida escritura de justificação notarial, não existe qualquer servidão de passagem a pé e de carro que onere o prédio dos autores, não sendo verdade que, aquando da celebração, em 1973, de uma escritura de doação e partilha, tivesse sido verbalmente constituída tal servidão de passagem para dar acesso às parcelas de terreno resultantes dessa divisão.

- Não só existe erro na identificação da dimensão da servidão, como toda e qualquer passagem que fosse feita, nomeadamente pela ré A… e marido, pelo prédio dos autores resultava de mera autorização por questões de boa vizinhança.

- Não é verdade que os primeiros réus ou seus antecessores alguma vez tivessem exercido posse sobre a parte do...

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