Acórdão nº 1849/21.6T8PTM.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 13 de Outubro de 2022
Magistrado Responsável | MÁRIO BRANCO COELHO |
Data da Resolução | 13 de Outubro de 2022 |
Emissor | Tribunal da Relação de Évora |
Acordam os Juízes da Secção Social do Tribunal da Relação de Évora: No Juízo do Trabalho de Portimão, À... – Empreendimentos Turísticos, Lda.
, demandou AA, alegando que esta foi sua trabalhadora até que, em Junho de 2021, comunicou a resolução do contrato de trabalho com fundamento em comportamento culposo da empregadora. Porém, porque a empregadora entende que as causas invocadas são falsas e vexatórias, formula os seguintes pedidos: a) ser decretada a ilicitude da resolução do contrato de trabalho, por inexistência de justa causa; b) condenada a trabalhadora em indemnização por resolução ilícita de contrato de trabalho, no valor global de € 5.400,00, acrescida de juros; e, c) condenada também em compensação por danos não patrimoniais, em valor não inferior a € 2.500,00.
Na respectiva contestação, a trabalhadora argumenta que ocorreu justa causa na resolução do contrato de trabalho e formula o seguinte pedido reconvencional: a) ser reconhecida a justa causa da resolução do contrato de trabalho; b) condenada a entidade empregadora a pagar à trabalhadora uma indemnização equivalente a 30 dias de retribuição base por cada ano completo ou fracção de antiguidade, calculada em € 20.690,80; c) condenada a entidade empregadora a pagar também a quantia de € 25.754,22, a título de férias, proporcionais do trabalho prestado em 2021, 15 dias de salário do mês de Junho de 2021, e folgas e feriados trabalhados nos anos de 2016, 2017, 2018, 2019, 2020 e 2021.
Por despacho proferido nos autos e transitado em julgado, foi determinada a apensação do Proc. n.º 1937/21.9T8PTM, que a trabalhadora havia, por seu turno, intentado contra a entidade empregadora, ali tendo formulado pedido idêntico ao que apresentou posteriormente na reconvenção no processo principal.
Na contestação apresentada na acção apensada, a entidade empregadora também formulou pedido reconvencional, de condenação da trabalhadora em indemnização por inexistência de justa causa de resolução, bem como compensação pelos danos não patrimoniais produzidos, em várias expressões e trechos da peça processual, a ambos os sócios-gerentes e à empregadora, no valor de € 12.000,00.
No saneador foi decidido, em decisões também não impugnadas: - não admitir a al. c) do pedido reconvencional deduzido no processo principal pela trabalhadora; - não admitir o pedido reconvencional deduzido na acção apensada pela empregadora; - relativamente às als. a) e b) do pedido reconvencional deduzido pela trabalhadora na acção principal, julgar procedente a excepção de litispendência por tais pedidos já terem sido formulados na acção apensada, devendo a totalidade da pretensão formulada pela trabalhadora nessa acção ser apreciada a final; - julgar improcedente a excepção de prescrição invocada pela empregadora na contestação que ofereceu na acção apensada.
Realizado julgamento, a sentença decidiu: a) julgar totalmente improcedente o pedido formulado pela empregadora na acção principal, dele absolvendo a trabalhadora; b) julgar parcialmente procedente o pedido deduzido pela trabalhadora na acção apensada, declarando licitamente resolvido o contrato de trabalho, por justa causa; c) condenar a entidade empregadora (Ré na acção apensa) a pagar à trabalhadora a quantia líquida de € 20.690,80 a título de indemnização; e, d) condenar a entidade empregadora (Ré na acção apensa) na quantia ilíquida de € 4.808,78 a título de retribuições em falta, a que acrescem os montantes ilíquidos devidos a título de folgas trabalhadas entre 2016 e 2021 e cuja fixação se relegou para incidente de liquidação (tudo com o limite peticionado a este título de € 25.754,22).
Inconformada, a entidade empregadora recorre, apresentando conclusões que, infelizmente, não são um modelo de clareza e capacidade de síntese dos fundamentos pelos quais pede a alteração da decisão, como imposto pelo art. 639.º n.º 1 do Código de Processo Civil.
E como este tribunal não está obrigado a reproduzir acriticamente tais conclusões, devendo apreciar, isso sim, as questões suscitadas no recurso, aqui se identificam as mesmas: - A sentença é nula por não justificar cabalmente os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão de não considerar a existência de uma resolução sem justa causa da relação laboral, atento o facto de a “causa justificadora” ter ocorrido há mais de 30 dias.
- A fundamentação de facto e de direito envolve notória contradição, ambiguidade e obscuridade, pois o comportamento da trabalhadora face a alterações às funções e horário de trabalho e a resolução do contrato de trabalho envolve uma sequência temporal de mais de um ano.
- Ocorreu aceitação das alterações às funções e horário de trabalho, dado não existir resolução no prazo de 30 dias, e abuso de direito, na modalidade de “venire contra factum proprium”, por a trabalhadora ter, com a sua conduta laboral, contrariado, posteriormente, o que escreveu na carta de resolução.
- O valor mensal da retribuição incluía duodécimos dos subsídios de férias e de Natal, ocorrendo contradição entre os pontos 1.6. e 1.7. (factos provados) com a al. a) dos factos não provados.
- Ocorre litispendência entre o pedido reconvencional formulado na acção principal e a acção apensada.
- A concessão de indemnização à Ré ocorreu, por via da apensação, em manifesto abuso de direito, atentando contra a proibição de litispendência.
- Nos pontos 1.20.1 a 1.20.6 dos factos provados a sentença identifica vários créditos laborais, conhecendo de questões de que não podia tomar conhecimento.
- Quanto ao facto 1.7, inexiste qualquer documento que comprove uma remuneração mensal de € 1.034,54, sendo que o recibo integrou os duodécimos dos subsídios de férias e de Natal.
- Quanto ao facto 1.14, ninguém disse que ouviu a sócia da Autora proferir tais expressões.
- Apenas poderia ter sido dado provado que «Após essa recusa, existiu uma troca de palavras entre a ré AA e BB, gerente da autora À... – EMPREENDIMENTOS TURÍSTICOS, Lda.», atendendo às declarações de parte de BB e de CC, e ao testemunho de DD.
- Os factos das alíneas a), c), d), e), f), g), h) encontram-se indevidamente dados como não provados, quando deveriam ter sido dados todos como provados.
- O facto da al. a) deveria ser dado como provado por integração dos duodécimos dos subsídios de férias e de Natal na massa salarial mensal.
- O facto da al. c) deveria ser dado como provado, pois o julgador deveria ter questionado se «todos os empregados da Autora, com a mesma categoria da Ré», foram ou não obrigados a limpar as casas de banho e a higienizar, todos os equipamentos, mormente em função das exigências da COV1D-19.
- O facto da al. d) deveria ser dado como provado, pois os factos dos pontos 1.6., 1.9., 1.12 e 1.15, implicou um ajustamento dos horários, com acordo dos trabalhadores implicados.
- O facto da al. e) aparenta estar em contradição com o conteúdo dos factos provados 1.2, 1.4. (copeira ou outras compatíveis com a sua qualificação).
- Quanto aos factos das als. f) a h), era necessário que o Tribunal levasse em linha de conta que a trabalhadora tinha, com uma das sócias-gerentes uma relação de proximidade, já que tinha sido fiadora num crédito pessoal, de tal modo que a imputação de afirmações, por parte de urna trabalhadora, que não são verdadeiras, que revelariam, no caso, uma baixeza de carácter e de xenofobia relativamente a cidadãos estrangeiros é de molde a causar grande mágoa e tristeza, tanto mais que o estabelecimento comercial goza de boa reputação na região, assim como os seus proprietários.
- Quanto ao facto provado do ponto 1.9, o acordo proposto pelo sócio-gerente da A. previa que a antiguidade de todos os trabalhadores seria salvaguardada e que o pagamento das indemnizações/compensações devidas pela antiguidade dos funcionários estava garantida.
- Este ponto deveria ter a seguinte redacção: «1.9 Em data não apurada de Junho de 2020, a autora À... – Empreendimentos Turísticos, Lda., confrontou a ré AA e outros trabalhadores com um documento para assinar com o objectivo de os mesmos aceitarem a cessação do contrato de trabalho durante os meses de Inverno, assegurando o pagamento da indemnização por antiguidade (aquando da venda do Estabelecimento Comercial), com vista à celebração de outro contrato de trabalho a partir de Março do ano seguinte.» - Quanto aos factos provados dos pontos 1.11 e 1.12, foi referido pelos sócios-gerentes da A. e pela grande maioria dos funcionários que a trabalhadora AA sempre fez parte da equipa que assegurava a limpeza das casas de banho.
- Os depoimentos contraditórios a este respeito são das testemunhas EE, DD e FF, os quais, apesar de terem horário semelhante ao da Trabalhadora AA, abandonavam o estabelecimento comercial antes da limpeza das casas de banho, já que a mesma era efectuada no final do serviço de jantar.
- Da prova testemunhal produzida e das declarações de parte dos sócios-gerentes da A. resulta, de forma inequívoca, que a trabalhadora AA sempre fez parte da equipa que fazia a limpeza das casas de banho.
- Assim, a redacção destes pontos deveria ser a seguinte: «1.11 A sócia gerente da autora À... – Empreendimentos Turísticos. Lda. informou a autora que continuaria a limpar as casas de banho dos clientes, como até então tinha feito», e «1.12 A ré AA recusou-se a limpar as casas de banho dos clientes de forma ilegítima e sem apresentar qualquer tipo de justificação».
- A entidade patronal não incorreu em qualquer violação do disposto no artigo 127.º, n.º 1, al. a), do Código do Trabalho, pois sempre tratou a trabalhadora com respeito, urbanidade e probidade, sendo aliás apelidada de trabalhadora favorita da Sócia-Gerente BB e tendo beneficiado de um tratamento preferencial.
- A sócia-gerente GG nunca proferiu as expressões que lhe são imputadas.
- Quanto à alteração do horário de trabalho da trabalhadora, insere-se nos poderes de direcção e organização da entidade empregadora a faculdade de alterar unilateralmente e mesmo sem a anuência do...
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