Acórdão nº 82/19.1T8STB.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 10 de Março de 2022

Magistrado ResponsávelMARIA JOÃO SOUSA E FARO
Data da Resolução10 de Março de 2022
EmissorTribunal da Relação de Évora
  1. RELATÓRIO 1. 321 CRÉDITO, INSTITUIÇÃO FINANCEIRA DE CRÉDITO S.A., intentou contra: 1º- – P.P.; 2.ª – N.C.P. e 3ª – A.S.P.

    acção declarativa com processo comum, pedindo que pela sua procedência; I) SEJA RECONHECIDO O DIREITO DE CRÉDITO DO AUTOR SOBRE O 1.º RÉU E A 2.ª RÉ, NO VALOR GLOBAL DE € 135.886,36 (CENTO E TRINTA E CINCO MIL, OITOCENTOS E OITENTA E SEIS EUROS E TRINTA E SEIS CÊNTIMOS), ACRESCIDO DE JUROS E RESPECTIVO IMPOSTO DE SELO ÀS TAXAS LEGAIS EM VIGOR, ATÉ EFECTIVO E INTEGRAL PAGAMENTO; II) SEJA CONDENADA A 3.ª RÉ A RESTITUIR, DE ACORDO COM O ART. 616.º N.º 1 DO CÓDIGO CIVIL, AO PATRIMÓNIO DO 1.ª RÉU E DA 2.ª RÉ O IMÓVEL QUE, MAIS À FRENTE, SE DESCREVE, APENAS EM GARANTIA DO CUMPRIMENTO DO DIREITO DE CRÉDITO RECONHECIDO AO AUTOR E REFERIDO SOB O N.º I) DESTE PEDIDO: - PRÉDIO URBANO, CORRESPONDENTE A EDIFÍCIO DE RÉSDO-CHÃO E 1.º ANDAR, PARA HABITAÇÃO, SITO NA QUINTA DA AMIZADE, DESCRITO NA CONSERVATÓRIA DO REGISTO PREDIAL DE SETÚBAL SOB O N.º (…), FREGUESIA DE GÂMBIA-PONTES-ALTO DA GUERRA E INSCRITO NA MATRIZ PREDIAL URBANA SOB O ART. (…).º; SUBSIDIARIAMENTE; - QUE SEJA DECLARADA A NULIDADE, POR SIMULAÇÃO ABSOLUTA, DA DOAÇÃO DO IMÓVEL DESCRITO NO ANTECEDENTE N.º II, RECONHECENDO-SE QUE PERTENCE AO 1.º E 2.º RÉUS.” Em fundamento da sua pretensão alegou que os dois primeiros réus deram aval a duas Livranças, emitidas em 16.08.2000, nos valores de: € 49.839,2 e € 35.769,24, com vencimento em 25/11/2004, subscritas pela sociedade “Ritmoconstrói – Sociedade de Construções, Lda., a favor do A, as quais titulam o montante de duas operações de financiamento que o autor concedeu à sociedade subscritora, no âmbito da atividade bancária a que se dedica, mais propriamente os contratos nºs 68068 e 68067.

    A sociedade subscritora foi dissolvida e a quantia mutuada não foi paga.

    Em 29 de Abril de 2005, foi instaurado o processo executivo nº 8509/05.3YYPRT, contra P.P. e N.C.P. e os avalistas F.M. e C.S., a que as ditas livranças serviram de título e que corre termos no Juízo de Execução do Porto.

    No âmbito do referido processo executivo não se logrou a penhora de imóveis, móveis materiais, ou saldos bancários. Em 14.03.2008 foram penhoradas as quotas dos réus P.P. e N.C.P. na sociedade “(…), Lda.”, cada uma com o valor nominal de € 28.000,00, mas que até à data ainda não foram vendidas.

    Entretanto, em 11 de Agosto de 2014, os primeiros réus doaram à 3ª ré, sua filha, com reserva a seu favor, do direito de uso e habitação simultâneo e vitalício, o prédio urbano correspondente a edifício de rés-do-chão e 1º andar, para habitação, sito na Quinta da Amizade, descrito na Conservatória do Registo Predial de Setúbal sob o n.º (…), com o intuito de o subtraírem à possibilidade de execução para pagamento da dívida, já que não quiseram transmitir qualquer direito de propriedade para a filha, nem esta o quis adquirir, visando a doação, apenas enganar os seus credores, em especial o autor, por ser o seu credor mais expressivo.

    Concluiu nos termos sobreditos.

    Os réus apresentaram contestação e não contestaram a existência do crédito. Apenas invocaram que a doação não teve a intenção de subtrair o bem doado aos credores ou que configurasse um negócio simulado, desde logo porque o direito de uso continua a ser seu e é passível de um arrendamento de montante de € 1.000,00 mensais, com o que se poderia assegurar o montante do débito, além de que possuem Mobiliário, veículos automóveis e as quotas da sociedade, que ascendem a 56.000€.

    Concluem dizendo que aquando da doação, por reporte à quantia garantida por hipoteca, estava em dívida € 90.671, 26, motivo por que a acção deve improceder.

    1. Realizou-se audiência final e, subsequentemente, foi proferida sentença que culminou com o seguinte dispositivo: “Em face do exposto, vistas as já indicadas normas jurídicas e os princípios expostos o tribunal julga: 1. Parcialmente procedente, por parcialmente provado, o pedido da A., e em consequência decide-se:

      1. Reconhecer o direito de crédito do A. sobre os réus, no montante de € 64.997,71, acrescido de juros de mora vencidos nos termos e à taxa anteriormente assinalados e bem assim do imposto de selo devido, bem como nos vincendos até integral pagamento.

      2. Declarar a ineficácia da doação da nua propriedade do prédio urbano, correspondente a edifício de rés-do-chão e 1º andar, para habitação, sito na Quinta da Amizade, lote (…), descrito na Conservatória do Registo Predial de Setúbal sob o n.º (…), freguesia de Gâmbia-Pontes-Alto da Guerra e inscrito na matriz predial urbana sob o artº (…), em relação ao A., pelo crédito acima referido”.

    2. É desta sentença que, desaprazidas, recorrem ambas as partes formulando na respectiva apelação as seguintes conclusões: 3.1. Os Réus: 1. A douta sentença encontra-se padecida de nulidade de omissão, por violação dos art.º 577.º , al. e), 578.º e art.º 595.º, n.º 3 ferindo-a nos termos do art.° 615°, n.° 1, alínea d), ambos do Código de Processo Civil, no que concerne à falta de pronúncia sobre questões que deveria apreciar.

    3. O presente recurso é interposto da douta sentença na parte que julgou a acção parcialmente procedente e, em consequência, condenou os Réus, ora Apelantes, “a) Reconhecer o direito de crédito do A. sobre os réus, (…); b) Declarar a ineficácia da doação da nua propriedade do prédio urbano, (...) em relação ao A., pelo crédito acima referido.” 3. A Autora, ora apelada peticiona na presente acção: a) Reconhecer o direito de crédito do A. sobre os réus, (…); b) Declarar a ineficácia da doação da nua propriedade do prédio urbano, (...) em relação ao A., pelo crédito acima referido.

    4. Contestada a Petição Inicial pelos Réus, não se conheceu dela arguição de excepção de ilegitimidade da Autora, ora Apelada.

    5. Realizada audiência prévia a 15.05.2020, consta de Ata Cfr.- Ref.ª90319068, o seguinte: “Após, a Mª Juiz advertiu o IM da A. da possibilidade de vir a considerar inexistir falta de interesse em agir para o pedido formulado sob o ponto 1 e concedeu a ambos os IM a possibilidade de usarem a ata, não só para se pronunciarem sobre a possibilidade anteriormente aventada, como para sublinharem qualquer outra questão que entendessem pertinente, tendo o Ilustre Mandatário da A. emitido pronúncia nos termos que ficaram gravados no SistemaHabilus Media Studio; já o Ilustre Mandatário dos RR. referiu que remetia para o já alegado nos articulados.

      Após a Mª Juiz deu nota de que iria reponderar o interesse de agir da A. para o primeiro pedido, à luz dos argumentos expendidos pelo respetivo mandatário e que f‌icaram devidamente registados.” 6. Do despacho saneador de 24.06.2020, Cfr- Ref.ª 90503906, com relevância para o presente recurso resulta o seguinte: “Inexistem questões prévias ou exceções1 que obstem ao conhecimento do mérito da causa. Com ressalva em rodapé “1 Embora inicialmente tivéssemos equacionado a falta de interesse processual da A, no que concerne ao pedido formulado em primeiro” 7. A falta de interesse em agir da Autora, foi suscitada of‌iciosamente em audiência prévia, todavia não foi concretamente apreciada em despacho saneador, por dele constar mera af‌irmação tabular de que “Inexistem questões prévias ou excepções que obstem ao conhecimento do mérito da causa.”, pelo que não forma caso julgado formal.

    6. Dispõe o art.º 595.º do Cód. Proc. Civil, N.º 1 O despacho saneador destina-se a: a) Conhecer das exceções dilatórias (…) face aos elementos constantes dos autos, deva apreciar of‌iciosamente; N.º 3 “No caso previsto na alínea a) do n.º 1, o despacho constitui, logo que transite, caso julgado formal quanto às questões concretamente apreciadas; 9. “A mera af‌irmação tabelar de que o tribunal é competente, as partes são legítimas e de que inexistem excepções ou nulidades de que o tribunal é competente, não constitui apreciação concreta da tais questões (art.º 510.º-3, 1.ºparte) e, daí, que não formem caso julgado” (Vid. STJ, de 3.05.2000; CJ/STJ. 2.ª– 41- Cfr. ponto 9, pág 701, Novo Cod. Proc. Civil Anotado, Abílio Neto, 3.ª Edição Revista e Ampliada, Maio 2015, Ediforum, Edições Jurídicas, Lda, Lisboa.

    7. A douta sentença no que confere à legitimidade da Autora não fora apreciada por af‌irmação tabular - “(…) foi proferido despacho saneador fora de audiência prévia, onde foi declarada a competência do Tribunal, em razão da nacionalidade, da matéria e da hierarquia, a inexistência de nulidades ou questões prévias e reconhecida a personalidade e capacidade judiciárias das partes, bem como a sua legitimidade.” 11.Ao não conhecer em sede de primeira instância, a legitimidade da Autora, ora Apelada, a douta sentença viola o disposto nos art.º art. 577.º , al. e), e 578.º e art.º 595.º, n.º 3, todos do Cód. de Proc. Civil, por se tratar de excepção dilatória do conhecimento of‌icioso.

    8. Não sendo conhecida em sede de primeira instância, e/ou sobre ela não tenha recaído caso julgado formal, a sentença do autos encontra-se, assim, ferida de nulidade por efeito do disposto na al. d) do n.º 1, do art.º 615.º do Cód. de Proc. Civil, no que concerne à omissão de pronuncia sobre questões que deveria apreciar.

    9. Os Apelantes impugnam e peticionam declaração de nulidade da decisão que julgou parcialmente procedente os pedidos da Autora, quanto a) Reconhecer o direito de crédito do A. sobre os réus, (…); e declarar a inef‌icácia da doação da nua propriedade do prédio urbano, (...) em relação ao A., pelo crédito acima referido.

    10. A ilegitimidade de alguma das partes, é nos termos do disposto no art.º 577.º al. e) do Cód de Proc. Civil, exceção dilatória. A Ilegitimidade de alguma das partes é no disposto do art.º 578.º do Cód. De Proc. Civil, do conhecimento of‌icioso.

    11. Sobre tal questão verte Ac. RC. De 10.2.2015: Proc. 446/11. dgsi.Net, “Tendo presente o aludido art.º 595.º, n.º 1, al a) e 3, do NCPC, bem como o facto da ilegitimidade ser uma exceção dilatória de conhecimento of‌icioso –art.º 577.º e), e 578.º do mesmo diploma legal – o fato da mesma não ter sido invocada na...

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