Acórdão nº 2020/19.2T9FAR.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 22 de Fevereiro de 2022

Magistrado ResponsávelJOSÉ SIMÃO
Data da Resolução22 de Fevereiro de 2022
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam, em Conferência, os Juízes que compõem a 1ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora: I – Relatório Nos presentes autos de inquérito, o Ministério Público deduziu acusação contra o arguido, IS, imputando-lhe a prática de um crime de violação da obrigação de alimentos, p. e p. no artº 250º nºs 1 a 4 do C.Penal

Remetidos os autos a julgamento, pela Mma Juiz foi proferido despacho em que por falta de legitimidade do Ministério Público para a promoção do presente procedimento criminal declarou extinto o procedimento criminal, nos termos dos artºs 250º nº 5 do C. Penal e 49º do CPPenal e determinou o arquivamento dos autos

Inconformado, o Ministério Público recorreu tendo extraído da motivação as seguintes conclusões: “1. Recorre-se da decisão proferida pela Mmª Juiz a quo, na parte em que, após ter entendido que o Ministério Público não tinha legitimidade para a ação penal, por falta de queixa por parte da respetiva titular, decide pelo arquivamento dos autos

2 - A apreciação e decisão sobre a falta de legitimidade do Ministério Público para a ação penal consiste numa questão prévia que obsta ao conhecimento do mérito da causa, nos termos do disposto no art. 311°, nº1, do C.P.P.; 3 - Tal decisão forma apenas caso julgado formal, e não conhece do mérito da acusação (não tendo o processo chegado à fase de julgamento), nada obstando à reformulação de nova acusação; 4 - Tanto mais estando em causa a prática de um crime de violação de alimentos, p. e p. pelo art. 250°, do C.P., que consiste num crime de execução permanente, que só se consuma quando cessa o incumprimento da dita obrigação; 5 - Ao decidir o arquivamento dos autos, nos termos em que o fez, violou a Mma Juiz a quo o princípio da titularidade da ação penal pelo Ministério Público, ínsito no art. 263°, do C.P.P., o que expressamente se argui, nos termos e para os efeitos do disposto no art. 412°, nº2, aI. a), do C.P.P.; 6 - Requerendo-se, assim, que se determine a revogação da decisão proferida, na parte em que determina o arquivamento, e a sua substituição por outra que determine a devolução dos autos ao Ministério Público, enquanto titular da ação penal”. O arguido não respondeu ao recurso

Nesta Relação, a Exma. Procuradora-Geral Adjunta emitiu o seu douto parecer, tendo referido no mesmo, para além do mais que “… não há que discutir se o crime persiste ou não, mas apenas a legitimidade processual evidenciada para a acção penal em causa! E se for o caso de o Ministério Público entender que o crime persiste no tempo deverá instaurar outro inquérito munido da competente queixa; depois o que poderá discutir-se é o que fica ou não abrangido pela temporalidade da queixa e pelo caso julgado formal do despacho proferido nos presentes autos pelo tribunal a quo

Termos em que entendo que não assiste razão ao ilustre magistrado do Ministério Público em primeira instância, devendo ser confirmado o despacho judicial recorrido”

Observou-se o disposto no art. 417º nº 2 do CPPenal, o arguido não respondeu

Procedeu-se a exame preliminar

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir

II- Fundamentação O teor da decisão recorrida datada de 23-05-2021 é o seguinte: Registe e autue como processo comum, com intervenção do tribunal singular

O tribunal é competente em razão da nacionalidade, matéria e hierarquia Questão prévia: da (falta de) legitimidade do Ministério Público para a promoção dos autos O arguido IS vem acusado da prática, em autoria material, de um crime de violação da obrigação de alimentos, p. e p. pelo art. 250.°, 1,2,3 e 4, do Código Penal. Nos termos do preceituado no nº 5 do art. 250.° do Código Penal, o crime de violação da obrigação de alimentos reveste natureza semipública estando, pois, o procedimento criminal dependente da apresentação de queixa. Dispõe o art. 113.°, 1, do Código Penal que "quando o procedimento criminal depender de queixa, tem legitimidade para apresentá-la, salvo disposição em contrário, o ofendido, considerando-se como tal o titular dos interesses que a lei especialmente quis proteger com a incriminação". Por seu turno e no que ora releva, nos termos do n. ° 4 do mesmo preceito legal, "se o ofendido for menor de 16 anos ou não possuir discernimento para entender o alcance e o significado do exercício do direito de queixa, este pertence ao representante legal e, na sua falta, às pessoas indicadas sucessivamente nas alíneas do n." 2, aplicando-se o disposto no número anterior". Nos termos do art. 49.°, 1, do Código de Processo Penal, "quando o procedimento criminal depender de queixa, do ofendido ou de outras pessoas, é necessário que essas pessoas deem conhecimento do facto ao Ministério Público, para que este promova o processo", sendo que, para este efeito, "considera-se feita ao Ministério Público a queixa dirigida a qualquer entidade que tenha a obrigação legal de a transmitir àquele" (n." 2). E, "a queixa pode ser apresentada pelo titular do direito respetivo, por mandatário judicial ou por mandatário munido de poderes especiais", como se dispõe no n° 3 do mesmo artigo. "A efectivação da queixa não está sujeita a quaisquer formalidades legalmente impostas - cfr. artigo 246, nº 1 do CPP que, embora mencionando a «denúncia», engloba esta, a queixa e a participação - podendo ser feita por toda e qualquer forma que dê a perceber a intenção inequívoca do titular de que tenha lugar procedimento criminal por um certo facto, não se tomando necessário sequer que a queixa seja como tal designada, tomando-se apenas indispensável que o queixoso revele indubitavelmente a sua vontade de que tenha lugar o procedimento criminal contra o agente pelos factos que descreve ou menciona – assim, Figueiredo Dias, DIREITO PENAL PORTUGUÊS, As Consequências Jurídicas do Crime, Aequitas - Editorial , 1993, pág. 675; no mesmo sentido, Ac. R de Lisboa de 18/02/2003, Proc. n° 0084955; Ac. R do Porto de 27/10/2010, Prac. n° 989/05.3TASTS.P1 e Acs. R de Coimbra de 18/01/2012, Prac. n° 45/10.2GDCVL.C1 e de 06/03/2013, Proc. n° 763/09.8T3AVR-A.C2, disponíveis em www.dgsipt" - cfr. o Acórdão do...

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