Acórdão nº 2448/17.2T8PTM.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 07 de Novembro de 2019
Magistrado Responsável | FLORBELA MOREIRA LANÇA |
Data da Resolução | 07 de Novembro de 2019 |
Emissor | Tribunal da Relação de Évora |
ACORDAM NA 1.ª SECÇÃO CÍVEL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE ÉVORA I.
Relatório BB intentou a presente acção declarativa de condenação em processo comum, contra CC, pedindo que se declare que a A., com a conduta do R. sofreu um prejuízo de € 799.000,00, condenando-se o R. a pagar essa quantia à A. acrescida de juros, à taxa legal, desde a citação.
Alega para o efeito, e em síntese, que A. e R. contraíram casamento sem convenção antenupcial em 12.10.1994, tendo o R., no final do ano de 2014, se ausentado da casa onde viviam, nunca mais tendo regressado, nem tendo a A. notícias suas, encontrando-se a correr termos acção de divórcio.
Mais alega que o R.
, em 18.03.2014, transferiu de conta da CGD, de que a A. também é titular, a quantia de € 1.500.000,00 para uma conta do Barclays Bank, quantia essa que tem origem em conta da sociedade por quotas DD, Ld.ª, onde A. e R. têm iguais quotas nominais, sendo que aquela quantia foi transferida da conta da sociedade para a conta de A. e R. a título de suprimentos feitos por ambos, resultantes da venda de outra sociedade anónima, concluindo tratar-se de dinheiro comum do casal.
Mais alega que o R.
, em 16.10.2015, transferiu de uma conta do BPI, titulada unicamente pelo R., para uma conta na Fundación EE, a quantia de € 98.000,00, alegando que também se trata de dinheiro comum, pois era proveniente da venda das ditas acções da sociedade anónima.
Aduz que ficou privada de quantia correspondente a metade do valor das referidas transferências, que lhe cabia enquanto bem comum do casal, sendo esse o seu prejuízo, ou seja, o dano causado. Mais alega que o R. agiu sempre com consciência do que fazia e com propósito de prejudicar a A., retirando-lhe o dinheiro que lhe pertencia.
O R. citado, contestou, aceitando alguma da factualidade alegada pela A., designadamente quanto ao casamento e não existência de convenção antenupcial, as transferências, a origem das quantias que se encontravam depositadas nas contas originárias e objecto de transferências pelo R., impugnando no mais o alegado pela A., negando que desviou o dinheiro e menos de forma intencional. Mais alega que era o R. quem geria os recursos das empresas, figurando a A., por vezes, como mera gerente de direito. Alega ainda que todo o dinheiro foi ganho com iniciativa e trabalho do R., cabendo-lhe, por isso, a administração do mesmo, alegando ainda que tudo foi feito com o conhecimento e consentimento da A..
Findos os articulados, foi proferido despacho a dispensar a realização da audiência prévia. Fixou-se o valor da acção, foi proferido despacho saneador tabelar, identificou-se o objecto do litígio e enunciaram-se os temas da prova, corrigidos na sequência de reclamação da A.
Realizada audiência final foi proferida sentença, que, julgando a acção improcedente por não provada, absolveu o réu do pedido.
A A. não se conformando com a sentença prolatada dela interpôs recurso, apresentando alegações e formulando as seguintes conclusões: “
-
Deve ser dado como provado o facto constante do art.30 da p.i. onde consta: a.1) – “O R. agiu sempre com a consciência do que fazia e com o propósito de prejudicar a A. retirando-lhe o dinheiro que lhe pertencia”.
Bem como, o art.29º: a.2) - “O dinheiro que a A. ficou privada corresponde ao dano provocado”.
-
Estes factos devem ser dados como provados tendo em conta a restante matéria dada como provada e as regras da experiência comum; c) Todo o dinheiro transferido tem origem no recebimento do preço da venda de acções da sociedade “FF S.A” onde A. e R. receberam valor igual de € 3.737.000,00.
-
Esse dinheiro constitui um bem comum do casal tendo em conta a confissão do R. constante Art. 1º da Contestação onde é declarado que corresponde à verdade o alegado no art.25º e 27º da douta p.i..
-
Bem como a presunção decorrente do art.1725º do CC.
-
O dinheiro em causa resulta da venda, feita em 2007, de acções da sociedade “FF S.A” onde a A. recebeu € 3.737.000,00; g) Essas acções só poderiam ser uma de duas coisas ! Ou um bem comum do casal, como a A. alega, ou um bem próprio da A..
-
O que nunca seria era bem próprio do R., porque foi a A. quem vendeu e foi a A. quem recebeu o preço, conforme está alegado e provado.
-
Sendo bem comum ou bem próprio da A. merecem a mesma tutela do direito face ao disposto no art.1681º nº1 do CC.
-
Metade do valor das transferência corresponde ao prejuízo da A., e, por sua vez, ao dano causado pelo R..
-
Encontram-se assim preenchidos os requisitos da responsabilidade civil, ou seja, o R. com as transferêncisa de dinheiro para o estrangeiro, prejudicou a A. nesses montantes, tendo-o feito com essa intenção.
-
Violou assim a sentença recorrida o disposto no art.1681º nº1 do CC.
Nestes termos, deve ser revogada a sentença recorrida, e, em sua substituição, ser proferida uma outra que condene o R. no pedido constante da p.i..
Assim, será feita a costumada JUSTIÇA” Foi apresentada resposta às alegações, pugnando pela confirmação da sentença recorrida.
Foram providenciados os vistos e nada obstando ao conhecimento do mérito do recurso, cumpre apreciar e decidir.
II.
Objecto do Recurso Delimitado o objecto do recurso pelas conclusões, salvas as questões cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras e as que sejam de conhecimento oficioso (art.º 608.º, n.º 2, 609.º, 635.º, n.º 4, 639.º e 663.º, n.º 2 do CPC), importa conhecer as seguintes questões: (i) Da impugnação da matéria de facto; (ii) se da conduta do R. resulta para este a obrigação de indemnizar por danos provocados à autora.
-
Fundamentação 1.
De Facto Na sentença recorrida foram julgados: Provados os seguintes factos: 1. A. e R. casaram em 12 de Outubro de 1994, sem convenção antenunpcial.
-
Já viviam como marido e mulher, havia 10 anos.
-
Instalaram a sede da sua vida familiar numa casa sita em A…, freguesia da Guia, concelho de Albufeira, inscrito na matriz sob o art.nº ….
-
Em finais de 2014 o R. ausentou-se de casa.
-
Nunca mais tendo lá tendo regressado.
-
E, segundo consta, estará, desde essa data, em país estrangeiro.
-
Nunca mais tendo dirigido uma palavra à A..
-
Nunca mais a A. teve notícias suas, 9. Nem por terceiros.
-
Em 19.10.2017 corria termos acção de divórcio no Tribunal da Família e Menores de Portimão-J1- autos nº1228/17.0T8PTM.
-
No dia 18 de Março de 2014, o R. transferiu da conta nº …, da Caixa Geral de Depósitos, de que a A. também é titular, a importância de € 1.500.000,00 para a conta com o nº … do Banco BARCPTPL – Barclays, 12. A quantia referida em 11. já foi transferida da nº … do Banco BARCPTPL – Barclays, para uma conta no estrangeiro 13. A verba referida em 11. tem origem na conta da sociedade “GG LDA”, 14. A sociedade referida em 13. tem o capital social de € 450.0000,00, no qual a A. tem uma quota no valor nominal de € 225.000,00 e o R. quota de igual valor.
-
A dita verba de € 1.500,000,00 referida em 11. foi transferida da conta da sociedade para a conta da A. e R. referida em 11. a título de reembolso de suprimentos.
-
Os suprimentos referidos em 15. foram feitos pelos dois – A. e R. -, 17. Com dinheiro que receberam, em 2007, da venda da sociedade “FF S.A”, cujo preço ascendeu a mais de €7.474,000,00, recebendo a A. € 3.737.000,00 e o R. igual montante.
-
Em 16 de Outubro de 2015, o R. transferiu para a conta nº … FUNDACION EE, no Panamá, a importância de €98.000,00, da conta que tinha no Banco BPI com o nº ….
-
O dinheiro referido em 18. tinha origem na venda das ditas acções da “FF S.A”.
-
A A. não assinava contratos.
E Não Provados:
-
-
O R. é o único titular da conta referida em 11..
-
O R. causou à A. um dano correspondente à parte que cabia à A. nas quantias referidas em 11. e 18. sendo esse o seu prejuízo.
-
O R. agiu sempre com consciência do que fazia e com o propósito de prejudicar a A..
-
A A. não tinha qualquer interferência na actividade empresarial dirigida pelo R.; e) A A. figurava nas sociedades com mero papel decorativo, por tolerância do R., sem interferência nas decisões do R. no que se referia a aplicação dos recursos financeiros e aos investimentos a realizar.
-
Foi sempre o R. que invariavelmente e de forma exclusiva decidia como aplicar os recursos financeiros das empresas que criava e decidia a forma de aplicação do dinheiro e os investimentos a fazer quer ele fosse das empresas quer mesmo se existisse qualquer poupança que por força de lei fosse considerada comum.
-
A A. de facto não exercia a gerência das sociedades em que figurava como gerente na certidão comercial, nem passava cheques, negociava a compra de activos móveis ou imóveis, contratava pessoal, h) Era o R. quem ordenava os pagamentos e concretizava e realizava todas as operações.
-
O nome da A. figurava somente para que em situações esporádicas, em que o R. estivesse impossibilitado...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO