Acórdão nº 1929/15.7T8TMR.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 31 de Janeiro de 2019

Magistrado ResponsávelFRANCISCO XAVIER
Data da Resolução31 de Janeiro de 2019
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acórdão da 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora I – Relatório1. BB instaurou contra a sociedade CC, LDA.

, acção de processo comum, pedindo que se profira sentença “que produza os efeitos da declaração negocial em falta, ou seja, que se declare que a Ré vende ao Autor, pelo preço de 25.000,00€, já pago, o prédio rústico inscrito na respectiva matriz da freguesia de Asseiceira, concelho de Tomar, sob o artigo …, Secção …, descrito pela ficha predial …/…91”.

  1. Para tanto, invocou, em síntese, que na prossecução do seu escopo comercial a R. celebrou consigo um contrato promessa de compra e venda, nos termos do qual prometeu vender, livre de ónus e encargos, o prédio rústico denominado L…, sito na freguesia de Asseiceira, do concelho de Tomar, descrito na Conservatória do Registo Predial sob o n.º …/…91 daquela freguesia e concelho, inscrito na respectiva matriz sob o art. …-Secção …, que o A. prometeu comprar, pelo valor de 25.000,00€, que o A. já tinha pago, tendo a R. dado a quitação respectiva.

    Alegou ainda que ao referido pagamento foi atribuído o carácter de sinal e a escritura pública de compra e venda deveria ser outorgada até 31 de Janeiro de 2015, mas que, não obstante avisada para o efeito, a R., através do seu mandatário, em 28 de Outubro de 2014, remeteu um faxe aludindo que não era a gerência corporizada pelo Sr. DD, mas sim pelos filhos, que seriam desconhecedores da subscrição do contrato aqui apreciado e que, apesar da insistência que fez, os representantes da Ré acabaram por não comparecer à realização da escritura.

  2. Citada, veio a Ré contestar, alegando que nunca foi intenção das partes celebrar o contrato em causa, até porque a importância de 25.000,00€ não chegou a entrar na caixa social da Ré, que tem contabilidade organizada, não tendo o A. pago, em qualquer altura, o referido valor.

    Refere ainda que o contrato que as partes quiseram celebrar foi outro, invocando que o A. e o legal representante da R., que se encontrava a viver para França, prometeram celebrar um contrato de trespasse ou cedência da posição contratual de um negócio que aquele detinha naquele país, na área da comercialização dos móveis de cozinha, que tal promessa de cessão envolvia o apoio do A. na efectivação dos contactos comerciais dos potenciais clientes, e que o legal representante da R., DD, veio a outorgar o contrato promessa em causa nos autos, à revelia da R. e dos seus sócios.

    Acrescenta que o A. não prestou o prometido apoio no referido negócio, ficando o contrato sem efeito, e, por esse motivo, DD comunicou à R. e aos seus sócios que jamais quiseram celebrar com o Autor o contrato promessa de compra e venda que tinha sido celebrado apenas como garantia do contrato celebrado em França. Assim, não tendo este contrato sido celebrado, alega que também o negócio constante da promessa – negócio simulado –, ficou sem efeito.

    E, em sede de reconvenção pede a declaração de nulidade do referido contrato-promessa.

  3. O A. respondeu na réplica, na qual, além do mais ampliou o pedido, para o caso de procedência do pedido reconvencional.

    Realizou-se a audiência prévia, tendo sido proferido despacho de admissão da reconvenção e indeferida a ampliação do pedido.

    Saneados os autos, identificado o objecto do litígio e fixados os temas da prova, procedeu-se à audiência de discussão e julgamento.

    Após veio a ser proferida sentença, na qual se decidiu: - Julgar a presente acção totalmente procedente, por provada e, em consequência, determina-se a execução específica do contrato promessa celebrado entre o Autor BB e a Ré CC, Lda. em 11 de Fevereiro de 2013 [reportado no Ponto 3.° dos Factos Provados], produzindo a presente sentença os mesmos efeitos da declaração negocial da Ré, de que vende ao Autor, pelo preço de 25.000,00€, já recebido, o prédio rústico inscrito na respectiva matriz da freguesia de Asseiceira sob o art. …-… e descrito na Conservatória do Registo Predial de Tomar sob o n.º …/…91.

    - Julgar improcedente o pedido reconvencional deduzido pela Reconvinte, dele se absolvendo o Reconvindo.

  4. Inconformada interpôs a R. o presente recurso, nos termos e com os fundamentos seguintes [segue transcrição das conclusões do recurso]: 1.ª Devem ser alteradas as respostas dadas à matéria constante do ponto 5 dos factos provados, fazendo-se declarar que: “ O Autor não entregou ao gerente da Ré o valor de € 25.000,00 (Artº 5º e 6º da contestação), pois que este, o legal representante da Ré DD, nunca quis celebrar o contrato dos autos, servindo o mesmo apenas como garantia, e porventura para celebração posterior, caso a A . transferisse a sua carteira de clientes do mesmo em França referente ao comércio de móveis, o que não veio a suceder” 2.ª Tal resulta do declarado quer pelas partes em julgamento, quer das próprias testemunhas do Réu, e do contexto integral das mesmas.

    1. Que o contrato promessa de compra e venda, serviu para contornar, e garantir a celebração de outro - cedência da carteira de clientes – resulta do facto, de não se ter celebrado o contrato definitivo – no falso momento da entrega de € 25.000,00 - quando tudo estava em ordem para ser de imediato feito, - mas antes e para cumprimento do lateralmente acordado se fixou um pretenso prazo para quase dois anos depois, ou seja 31 de Janeiro de 2015.

    2. O que se mostra de todo injustificável, face a um declarado pagamento total, contrariando as regras do senso comum, e, assim constitui facto público e notório que importa validar.

      Mas se assim se não entender, 5.ª Devem os factos 9, 10, 11 e 17 dos factos provados da sentença entenderem-se como não escritos, e assim por não provados.

    3. A prova documental, que constitui os documentos de fls 19, 20, e 21 dos autos por corresponder a correspondência trocada entre o mandatário do A . e o mandatário da Ré, constitui matéria sujeita ao sigilo profissional do mandatário da A . , e assim insusceptível de constituir prova que o tribunal possa ter em conta nos termos do artº 92 nº 1 alínea e) e f) e nº 5 do Estatuto da Ordem dos Advogados .

    4. A Ré opôs-se à junção daqueles documentos como prova válida nos artº 21, 22 e 23 da sua contestação.

    5. E assim não pode entender-se como válida a marcação da escritura referenciada nos autos.

    6. A matéria do ponto 17º dos factos provados deve ser alterada para: “Por ter marcado a escritura, o Autor pagou a quantia de € 61,50, referente a honorários do Notário “eliminando-se a referência “não se realizou por ausência da Ré” 10.ª Os pontos 1, 2, 3, 4, 5 e 6 dos factos provados, devem ser julgados como provados.

    7. Assim o impõe a interpretação das declarações de parte do A. e do legal representante da Ré, e as declarações das testemunhas da Ré Vítor … e Celso …, transcritas e juntas a final.

    8. Sendo assim o contrato promessa dos autos nulo face ao quadro simulatório dos autos, ao que não se opõe o disposto no artº 242 nº 1 do C.C.

    9. Mas sempre o A . se mostra impedido de obter sentença que produza os efeitos da declaração negocial do faltoso.

    10. De verdade também a notificação da Ré invocada nos autos, para a outorga do contrato definitivo, não pode ser julgada como válida, uma vez que a mesma não se contem adentro dos poderes conferidos no âmbito do mandato forense, ao mandatário do A., em conformidade com o estabelecido no Est. da Ordem dos Advogados.

    11. Para a realização da escritura não se encontravam no Cartório Notarial os documentos necessários à outorga do contrato definitivo, nem se mostravam liquidados os impostos devidos pela realização de tal acto (artº 23 CIMI) 16.ª Independentemente da alteração da prova produzida, nunca se demonstra um verdadeiro incumprimento definitivo por parte da Ré face ao que dispõe o artº 830 do C.C.

    12. Contrariamente ao consignado na aliás douta sentença, para aferir de tal incumprimento definitivo por parte da Ré, sempre se imporia que a necessária interpelação desta tivesse sido efectivada pelo A., contestante, e não pelo seu mandatário forense como o foi, sendo assim elemento relevante para aferir dos pressupostos definidos no artº 830 do C.C.

    13. Impondo-se também que no Cartório Notarial estivessem todos os documentos necessários à celebração do contrato definitivo, e os respectivos impostos, o que não sucedeu e resulta da certidão que é o documento nº 10 junto à petição inicial.

    14. Assim, a aliás douta sentença, violou além do mais o disposto nos artº 830 e 242 do C.C. e artº 92 nº 1 alínea e) e f) e 5 do Estatuto da Ordem dos Advogados e artº 23º do CIMT e artº 76 nº 1 e 2 do C.R. Predial .

      Termos em que face ao exposto, alterando-se as respostas à matéria em conformidade com o exposto, deve revogar-se a aliás douta sentença e substituir-se por outra que julgue totalmente improcedente a acção e absolva a Ré do pedido com todas as consequências legais, declarando-se o contrato dos autos como nulo e de nenhum efeito, e assim julgado procedente o pedido reconvencional, tudo com as mesmas legais consequências.

  5. Não se mostram juntas contra-alegações.

    O recurso foi admitido como de apelação, com subida nos próprios autos e efeito meramente devolutivo.

    Colhidos os vistos legais, cumpre, agora, apreciar e decidir.

    * II – Objecto do recursoO objecto do recurso, salvo questões de conhecimento oficioso, é delimitado pelas conclusões dos recorrentes, como resulta dos artigos 608º, nº 2, 635º, nº 4, e 639º, nº 1, do Código de Processo Civil.

    Considerando o teor das conclusões apresentadas, importa decidir as seguintes questões: (i) Da impugnação da matéria de facto; (ii) Da verificação da validade do contrato promessa e dos pressupostos da execução específica.

    * III – FundamentaçãoA) - Os Factos [em destaque os factos impugnados no recurso] A.1. Na 1ª instância foram dados como provados os seguintes factos: 1. Encontra-se descrito na Conservatória do Registo Predial de Tomar sob o n.º … - freguesia de Asseiceira o seguinte prédio: rústico, situado em Lagoas, inscrito na matriz sob o art. …-S, com área total de 15.673m2, composto por terra de...

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