Acórdão nº 1198/17.4T8PTM.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 14 de Fevereiro de 2019
Magistrado Responsável | PAULA DO PAÇO |
Data da Resolução | 14 de Fevereiro de 2019 |
Emissor | Tribunal da Relação de Évora |
Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Évora Relatora: 1. Relatório AA..., intentou ação declarativa, com processo comum, emergente de contrato individual de trabalho, contra “..., E.M., SA – em liquidação” e “Município de Portimão”, formulando os seguintes pedidos: «
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Deve ser judicialmente declarada a existência de transmissão do contrato de trabalho por tempo indeterminado do autor, da 1ª ré para o 2º réu, em 01 de janeiro de 2015, por força da transmissão do estabelecimento onde este estava integrado, e, em consequência, ser declarada a ilicitude da cessação do contrato de trabalho promovida pelas rés, nos termos das disposições conjugadas dos arts. 285º, 346º/3 e 389º do CT; B) Deve ser judicialmente determinado que a retribuição mensal que é devida ao autor, desde a transmissão de estabelecimento ocorrida em 01 de janeiro de 2015, é de € 2.822,00, e ser o 2º réu condenado a pagar as diferenças salariais entre o vencimento que estava obrigado a pagar ao autor, por força da transmissão de estabelecimento, e aquele que efetivamente pagou nos anos de 2015 e 2016, no montante de € 28.073,36; C) Deve também o 2º réu ser condenado a pagar juros de mora à taxa legal, relativamente às quantias em que vier a ser condenado, que se computam atualmente em € 2.029,28, bem como os juros vincendos, até integral pagamento; D) Deve ser judicialmente determinado que, para todos os efeitos legais, a antiguidade do trabalhador deve ser reportada a 01 de outubro de 2001; Sem prescindir, E) Caso seja considerado que não ocorreu transmissão de estabelecimento para o 2º réu, sempre o autor terá direito a receber os diferenciais remuneratórios referidos em B), por violação do disposto no art. 129º/1-d) do CT, a que acrescem os respetivos juros de mora, vencidos e vincendos; F) E de ver a sua indemnização calculada com base no nº 1 do art. 5º da Lei nº 69/2013, de 30 de agosto.» As posições das partes processuais face ao litígio judicial foram devidamente apresentadas nos respetivos articulados e são das mesmas conhecidas, remetendo-se para os termos processuais nesse âmbito.
Oportunamente, e para o que agora releva, realizou-se a audiência de discussão e julgamento, e, posteriormente, foi proferida sentença com o dispositivo que se transcreve: «Nos termos expostos, e com base nas disposições legais supra citadas, julga-se a presente ação procedente, porque provada e, reconhecendo-se a existência de transmissão do estabelecimento da ré ... E.M., S.A. para o réu Município de Portimão, nos termos previstos no artigo 285º do Código do Trabalho:
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Declara-se ilícito o despedimento do autor AA..., e, em consequência, condena-se o réu Município de Portimão a reintegrá-lo, com a categoria profissional de técnico superior e o vencimento mensal de € 2.822,00 (dois mil, oitocentos e vinte e dois euros), reportando-se a respetiva antiguidade a 01.10.2001; b) Mais se condena o réu Município de Portimão a pagar ao autor AA ..., as diferenças salariais relativas ao período de 01.01.2015 a 31.12.2016, no valor global de € 28.073,36 (vinte e oito mil e setenta e três euros e trinta e seis cêntimos), a que acrescem juros de mora, à taxa legal, desde a data do respetivo vencimento e até integral e efetivo pagamento.
Fica prejudicado o conhecimento dos pedidos formulados a título subsidiário.
Fixa-se o valor da ação em € 30.102,64 (trinta mil, cento e dois euros e sessenta e quatro cêntimos), em conformidade com o disposto nos artigos 297º, nº 1 e 306º, ambos do Código de Processo Civil)» O Município de Portimão veio interpor recurso, rematando as suas alegações com as seguintes conclusões: «
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O Recorrente não se conforma com a sentença proferida, pois entende que a mesma viola a Lei e faz uma errada interpretação da Lei.
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Efetivamente, entende o Recorrente que: c) O Tribunal deveria ter dado como provado outra matéria de facto, invocada pelo Recorrente, que indiscutivelmente ficou demonstrada nos autos por via dos depoimentos prestados e que, por efeito de uma correta ponderação da prova produzida, deveria ter sido incluída no elenco da matéria de facto provada.
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Caso tais factos tivessem sido dados por provados, sempre esses, devidamente relevados, não permitiam a condenação do Recorrente no pagamento de quaisquer créditos salariais ao Recorrido; e) A matéria de facto provada não é de molde a sustentar a existência de qualquer transmissão de estabelecimento da ... EM SA para o Recorrente; f) Mesmo que houvesse transmissão de estabelecimento, a mesma não dá lugar à constituição de um contrato de trabalho com o Recorrente, que seria pressuposto de qualquer despedimento; g) A sentença defende uma interpretação legal que padece do vício de inconstitucionalidade, por violação do disposto no artigo 8º n.º 4 e artigo 47, n.º 2 da Constituição da República Portuguesa; h) Em concreto assim deve ser concluído, por a sentença em crise sustentar a possibilidade de no Recorrente, por efeito do disposto na Diretiva 2001/23/CE e artigo 285º do Código do Trabalho, poder ser reconhecida e declarada a existência de contratos de trabalho aos quais será aplicável o Código do Trabalho e cuja constituição será permitida sem precedência de concurso público; i) Nunca o Recorrente podia ser condenado ao pagamento de quaisquer diferenças salariais, por essa parte do pedido do Recorrido padecer de manifesto vício de abuso de direito – art. 334º do CC.
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Da prova produzida no processo resulta provada a factualidade invocada pelo Recorrente nos artigos 80.º a 83.º da respetiva contestação, que a douta sentença nem deu como provado e que também não excluiu como não provada.
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Verifica-se assim deficiência da sentença, pelo que deverá a mesma ser objeto de correção no que diz respeito à factualidade em causa, e, consequentemente, ser aditada à matéria de facto provada a seguinte factualidade cuja prova o Recorrente realizou suficientemente: 1)- “o A. assinou aquele acordo de cedência de interesse público porque quis, plenamente esclarecido e ciente do teor do mesmo e respetivas condições”; 2)- “o A. sabia que aquele acordo de cedência de interesse público não permitia a constituição de uma relação de emprego pública”; 3)- “o A. estava consciente de que só adquiriria uma relação de emprego pública para aquele posto de trabalho por via de procedimento concursal a que deveria candidatar-se para esse efeito, conforme resultava da alínea b) da cláusula 8.ª do acordo que celebrara”; 4)- Acrescentar ao ponto 70. da matéria de facto provada em que se diz que “O autor nunca promoveu a extinção do ACIP que assinara em 02.01.2015”, o seguinte: “e nunca suscitou perante o R. qualquer vício na sua vontade de o celebrado ou o conteúdo nele vertido”; 5)- “O A. nunca se opôs ou fizeram qualquer reparo de nenhuma espécie, sequer quanto ao seu estatuto remuneratório, expressamente constante da cláusula 4ª do acordo de cedência de interesse público que assinara”; 6)-“O A. subordinou-se ao acordo celebrado até à sua extinção, que ocorreu apenas por iniciativa do R., e nunca do A.
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A douta sentença procedeu ainda a uma errada apreciação da matéria de facto invocada, designadamente no artigo 63.º da contestação, onde o Recorrente Município de Portimão alegara que “Contrariamente ao que o A. alega nos artigos 52.º a 57.º, que se impugnam por completo, nem a internalização se reportou a 1/1/2015, sequer os trabalhadores que decidiram outorgar com o R. um acordo de cedência de interesse público apenas nessa data tiveram dele conhecimento”.
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Aquilo que o Recorrente defende naquele concreto artigo do seu articulado da contestação é, sem qualquer dúvida, os trabalhadores que procederam à assinatura do acordo de cedência de interesse público em questão com o Recorrente não tiveram conhecimento do teor desse acordo apenas na data da respetiva assinatura.
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Por conseguinte, não se compreende o raciocínio plasmado na douta sentença que decidiu expressamente que: “Com relevo para a discussão da causa, não se provou que: a. O autor apenas tenha tido conhecimento do teor do ACIP que assinou em 02.01.2015 na data da respetiva assinatura (artigo 63.º da contestação do réu Município).
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De não se provou que o autor apenas teve conhecimento do teor do ACIP que assinou em 02.01.2015 na data da respetiva assinatura, isso é exatamente aquilo que o Recorrente defendeu no artigo 63.º da sua contestação, isto é, que o Recorrido conheceu antes, ou melhor, que já conhecia o teor do ACIP antes de proceder à assinatura do mesmo naquela data! p) Assim sendo, é manifesto o erro de classificação deste aspeto da matéria de facto como “facto não provado” quando é evidente que, tal como a douta sentença reconheceu e o Recorrente invocou em sede própria, o Recorrido já antes da assinatura daquele documento tinha conhecimento do respetivo teor e condições do mesmo.
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Nesta conformidade, deve este ponto da matéria de facto ser transferido para o conjunto da matéria de facto provada, com a seguinte redação: “(…), está provado que: “tanto o A. como os outros trabalhadores que decidiram outorgar com o R. o acordo de cedência de interesse público tomaram conhecimento do teor do mesmo e respetivas condições em data anterior àquela em que procederam.
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O Tribunal a quo entende que os elementos indiciariamente provados sustentam a existência de uma transmissão de empresa ou estabelecimento, por ter entendido “ter-se verificado a passagem do complexo jurídico-económico, onde o trabalhador se integra” para o Recorrente” .
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Discorda-se em absoluto dessa conclusão, essencialmente por duas ordens de razões: a. Uma, estrutural – que tem a ver com o facto de a deliberação tomada pelo Recorrente não ter sido configurada como uma transmissão, mas antes a uma dissolução da ... EM SA, por imposição legal, nos termos previstos no artigo 62º da Lei n.º 50/2012, de 31 de agosto; b. e, outra, teleológica - que decorre dos efeitos contra producentes que uma tal qualificação teria, da...
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