Acórdão nº 518/13.5T2STC.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 02 de Maio de 2019

Magistrado ResponsávelALBERTINA PEDROSO
Data da Resolução02 de Maio de 2019
EmissorTribunal da Relação de Évora

Processo n.º 518/13.5T2STC.E1 Tribunal Judicial da Comarca de Setúbal[1] *****Acordam na 1.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora[2]: I – RELATÓRIO 1.

BB, propôs a presente acção declarativa, com processo comum, contra CC, pedindo que seja: a) declarado que tem necessidade de acesso dos prédios da autora à via pública pelo caminho que integra o prédio da ré e consequentemente, b) constituída uma servidão de passagem a pé, e por veículo de qualquer natureza ou dimensão, a qualquer hora do dia e da noite com 4 (quatro) metros de largura, a favor dos prédios propriedade da autora descritos na Conservatória do Registo Predial de (…) como prédios dominantes e a recair sobre o prédio propriedade da ré inscrito na mesma Conservatória (…), como prédio serviente; c) a Ré condenada a reconhecer a referida servidão de passagem, devendo manter o caminho permanentemente livre e desocupado, abstendo-se da prática de quaisquer actos que impeçam o acesso e exercício da Autora à referida servidão; d) a Ré condenada a retirar a vedação que colocou abusivamente, e a repor os marcos nos locais e nas condições anteriormente existentes.

Em fundamento alegou, em síntese, que é respectivamente proprietária e comproprietária de dois prédios rústicos, situados em …, freguesia de Melides, concelho de Grândola (n.°s …), os quais não têm qualquer acesso à via pública, já que confinam a Nascente com um caminho propriedade da requerida e a Poente com o mar.

Aquele caminho, existente no prédio da Requerida n.° …/20070504, é o único acesso que a requerente dispõe para aceder aos seus prédios, não existindo qualquer outra alternativa, e tem sido a via de acesso aos prédios da Requerente, desde 1972 e 1973.

Quando a Requerente adquiriu os prédios em referência o dito caminho encontrava-se em mau estado de conservação, sendo o seu acesso só possível por veículo de tracção de quatro rodas, pelo que, em Setembro de 2009, executou diversos trabalhos com vista a melhorar a acessibilidade que passaram, além do mais, pela colocação de saibro, que a Requerida veio a retirar.

Nos prédios em causa a autora desenvolve a atividade de silvicultura, que passa pela plantação de árvores que permitam suportar os solos, de forma a impedir o avanço das areias provindas do mar, o que carece de rega e outras intervenções, que precisam de energia elétrica cuja instalação a ré não permitiu.

Finalmente aduz que a ré alterou o local dos marcos, que desde sempre limitavam a sua propriedade, tendo retirado alguns e colocado outros com as respectivas iniciais.

  1. Regularmente citada, a Ré contestou, excepcionando a ilegitimidade singular da Autora, por ser apenas comproprietária do prédio …, verificando-se assim preterição de litisconsórcio necessário, face aos demais comproprietários.

    No mais, alegou que no local já existe uma servidão a favor dos prédios da Autora, e aduziu que ainda que os prédios daquela estejam encravados, essa foi uma situação criada pela sua aquisição, além de que a constituição de uma passagem a norte será menos onerosa do que o trajecto ora pretendido.

    Invocou ainda que por via de loteamento o seu prédio passou a configurar-se como urbano, o que afasta a possibilidade de constituição da servidão pretendida.

    Deduziu pedido reconvencional onde peticionou a condenação da A. a pagar-lhe o que despendeu com os trabalhos realizados, e a realizar, para repor o caminho/aceiro e o seu prédio como se encontravam no momento anterior à intervenção que a autora ali operou, e ainda a realizar à sua custa os restantes trabalhos de reposição do aceiro e do prédio no estado anterior à lesão, como se ela não houvesse ocorrido, ou, se o não fizer em prazo razoável a assinalar pelo julgador, lhe pagar o respetivo valor, em montante a liquidar até final, ou em execução de sentença, em valor não inferior a € 30.001,00 (trinta mil e um euros); Subsidiariamente, em ordem a subtrair-se ao correspondente encargo de ceder passagem, pediu para adquirir os prédios encravados, pelo justo valor de cada um deles, a liquidar até final ou execução de sentença, emitindo-se sentença que produza os efeitos translativos de adjudicação da propriedade de cada um desses prédios à Reconvinte e condenando-se esta no pagamento à Reconvinda dos valores que vierem a ser determinados como justos; ainda subsidiariamente pediu a condenação desta e dos demais comproprietários a pagar-lhe o montante da indemnização agravada a que alude o artigo 1552.º ou o montante da indemnização a que alude artigo 1554.º, ambos do Código Civil[3], em montante a liquidar até final ou em execução de sentença.

    Mais solicitou a intervenção dos comproprietários do prédio ….

    Concluiu pela improcedência da acção e/ou procedência do pedido reconvencional.

  2. A A. replicou, alegando que por escritura pública celebrada no dia 15 de Maio de 2013, adquiriu a restante parte (16/40) do prédio …, face ao que deve ser julgada improcedente a excepção de ilegitimidade activa deduzida pela ré.

    No mais, alegou que os seus prédios não estão abrangidos pela servidão invocada pela R. e que não só não deu “azo” à sua situação de encrave, como tal hipótese não excluiria a constituição da servidão, face ao estatuído no artigo 1552.° do Código Civil.

    Aduziu ainda que os prédios a Norte dos seus têm um acesso mais difícil e longo, pelo que a opção por estes para a constituição da servidão dificultaria ou mesmo impediria, a exploração dos respectivos terrenos e que o prédio da R., ainda que objecto de loteamento, não tem qualquer construção implantada, nada obstando à implementação da servidão no caminho.

    Por último, refuta a existência dos pressupostos que permitiriam a aquisição dos seus prédios por parte da R., ou o estabelecimento de indemnização agravada, a que alude o artigo 1552.º, bem como o valor proposto para aquele desiderato.

    Concluiu pela improcedência do pedido reconvencional e pela não admissão do incidente de intervenção de terceiros.

  3. A R. treplicou, impugnando o valor probatório dos documentos apresentados com a réplica e pugnando por que se considerem improcedentes as excepções que entendeu terem ali sido opostas à reconvenção.

    (…) 11.

    Foi admitida a alteração ao pedido, em ordem a recair sobre o prédio n.º … e determinada a notificação da A. para vir alegar factos que possibilitem concluir se o caminho em causa abarca ou não alguma das áreas projectadas construir face ao loteamento operado, tendo ela vindo responder que a composição dos Lotes … já prevê a existência do caminho, que não recai sobre qualquer edificação, já que não constitui zona destinada a habitação.

    Em contraditório a R. veio mais uma vez salientar a possibilidade de constituição de uma passagem a norte.

  4. Realizada audiência prévia, a R. desistiu da invocação de que a A. não é a única proprietária do prédio em questão e da impugnação do contrato de compra e venda, junto como documento 1 com a Réplica de fls. 248 e 253. Nessa sequência foi decidido não ser admissível o articulado de tréplica. Foi admitida a reconvenção, e exarou-se saneador tabelar, salvo quanto à alegada excepção de ilegitimidade da A., que foi julgada parte legítima. Foi identificado o objecto do litígio e enunciados os seguintes temas da prova: «A instrução da causa terá por objeto apurar: 1. Se os prédios da A. estão encravados, no sentido de não terem acesso autónomo à via pública e contexto histórico e aquisitivo que ditou essa circunstância; 2. Largura e características do caminho antes da intervenção da A., forma por que o mesmo vem sendo utilizado e extensão da necessidade da sua utilização pela A.; 3. Da existência de qualquer caminho alternativo ao que está em causa nos autos; 4. Da possibilidade e menor onerosidade relativa de construção de outro caminho alternativo, em continuidade à servidão aludida nos art.º 20 e seguintes da contestação; 5. Se na sequência do loteamento do prédio da R. n.º …, os lotes … têm previstas construções ou equipamentos no local onde se situa o caminho; 6. Das obras realizadas pela A. no caminho, se procedeu ao seu alargamento, em que ordem e por que extensão; 7. Se as mesmas destruíram bens da R. e quais; 8. Trabalhos realizados pela Ré cuja necessidade decorreu das obras da A. e seu custo; 9. Da utilização dada pela A. ao caminho, largura e tipo de piso necessários à mesma; 10. Valor dos prédios do A. e dos lotes onerados com as servidões; 11. Qual a desvalorização dos referidos lotes, face à constituição da servidão pretendida; 12. Se a R. omitiu factos que eram do seu conhecimento e sabendo que os mesmos tinham relevo nestes autos».

  5. Realizada a audiência final, com inspecção ao local, conforme decorre do auto de fls. 768 a 772, foi previamente à sentença proferido o seguinte despacho: (…) «Os lotes … foram registados em 04.05.2007, sob os nºs …, respetivamente.

    Os dados são estes. E já o eram antes da autora ter, reiteradamente, requerido que o objeto do pedido fosse o prédio …, e eram do conhecimento da A., como ela própria veiculou nos seus requerimentos. Não sabemos se tinha conhecimento das concretas inscrições matriciais dos lotes em referência, mas se não tinha, esta era uma informação que facilmente podia ter logrado junto da Conservatória do Registo Predial, já que os lotes foram registados em 2007, não carecendo para tanto do auxílio da R.

    E face aos elementos examinados, é a A. que tem que decidir qual o pedido que quer formular, porque é isso que está em causa, não podendo transferir para o R. um ónus que é seu.

    E o pedido está formulado, inexistindo qualquer facto novo que justifique qualquer alteração, que também não foi solicitada. Assim se indeferindo ao Requerido».

  6. Imediatamente após foi proferida sentença que julgou: «a) Parcialmente procedente por parcialmente provado o pedido formulado pela A. sob a al. a) e em consequência declara-se que na atualidade a A. carece de transitar no caminho em causa para aceder ao seu prédio mais a norte.

    b) Totalmente improcedentes, por não provados, os demais...

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