Acórdão nº 1759/20.4T8PTM-A.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 30 de Junho de 2021

Magistrado ResponsávelELISABETE VALENTE
Data da Resolução30 de Junho de 2021
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam as juízas da secção cível do Tribunal da Relação de Évora: 1 - Relatório.

C…, empresário, casado, residente na Rua …, Viseu, proprietário da Fração Autónoma “…”, CPR 1 e P…, casado, gestor financeiro, residente na …, Suiça, proprietário da Fração Autónoma “…”, CPR 1 e da Fração Autónoma “…” do CPR 2, vieram deduzir providencia cautelar não especificada contra “M…, gerente da Sociedade Allwaysuccess- Administração de Condomínios e Serviços Conexos, Lda, a citar na Estrada da Rocha, Lotes 2/4/6 R/C Loja 2, Praia da Rocha, 8500-804 Portimão, na qualidade de Administrador do condomínio do Clube Praia da Rocha, Bloco 1 e Bloco 2, que exerce, como gerente, em nome da Allwaysuccess-Administração de Condomínios e Serviços Conexos, Lda”, peticionando: • Impedir, desde já, que o Réu possa movimentar as contas bancárias do condomínio do Clube Praia da Rocha, Blocos 1 e 2, bem como quem estiver autorizado a fazê-lo, sem que as mesmas sejam assinadas por um dos três proprietários que se indicam.

Para o Bloco 1 indicam-se os proprietários: 1. C…, empresário, casado, residente na Rua …, Viseu, titular do C.C …, com o NIF. …, proprietário da Fração Autónoma “…” do Bloco 1; 2. M…, casada com… Contas do Bloco 1, conhecidas: - CC nº …- Crédito Agrícola; - CR nº … c/ordem- Crédito Agrícola; - CR nº …- Crédito Agrícola; conta das piscinas: Para o Bloco 2 indicam-se os proprietários: 1. P… 2. S…; 3. C… Procedimento Cautelar (CPC2013) Contas do Bloco 2, conhecidas: - Conta CC nº … – Crédito Agrícola; - Conta CR nº …, conta à ordem – Crédito Agrícola; - Conta CR nº …, fundo reserva – Crédito Agrícola; • Que o Réu, M…, só possa abrir novas Contas, em nome do condomínio do Clube Praia da Rocha, em contitularidade com os proprietários indicados para cada um dos Blocos; • Que, após a exoneração da administração, as contas possam ser movimentadas, por dois dos proprietários, aqui indicados, por Bloco, até que seja nomeada nova administração, para permitir que a gestão do condomínio decorra normalmente; • Que os proprietários aqui indicados tenham acesso às contas correntes de cada proprietário, para poderem controlar os pagamentos efetuados, a fim de apurar a utilização das mesmas; • Que o Réu seja condenado a disponibilizar, para consulta, a contabilidade do Condomínio; • Para além destas contas, deverão ser consideradas todas as contas bancárias de que o condomínio do Clube Praia da Rocha B1 e B2 seja titular.

Citado o requerido e após contestação, foi proferido o seguinte despacho: «Palavra aos AA. quanto à matéria de excepção da Oposição».

A audiência de julgamento iniciou-se a 04.12.20.

Em 17.12.20 os requerentes juntaram resposta à excepção.

Foi proferida decisão que julgou parcialmente procedente a providência cautelar e decidiu: a) Que os requeridos Condomínios da Praia da Rocha I e II sejam condenados a disponibilizar, para consulta, a sua contabilidade aos aqui requerentes; b) Absolver os requeridos do demais peticionado; c) Absolver ambas as partes dos pedidos de litigância de má-fé; Inconformados com esta decisão, o requerido recorreu, apresentando as seguintes conclusões (transcrição): “I - O requerido não se conforma com a sentença proferia na parte em que condenou “os requeridos” a disponibilizar, para consulta, a sua contabilidade aos requerentes e por isso vem dela interpor recurso.

II – O presente procedimento cautelar foi proposto exclusivamente contra o requerido M… (cf. art. 7.º n.º 1 e 2 da Portaria 280/2013), o qual não é administrador de condomínio, mas apenas gerente da sociedade administradora dos condomínios. Os condomínios dispõem de personalidade judiciária e devem ser representados através da sua administração de condomínio, no caso a sociedade “Allwaysuccess, Lda.” Ao não serem citados os condomínios, nem a sua administração de condomínio deve ser julgada parte ilegítima o requerido M…, e como tal absolvido da instância, tendo o tribunal violado o artigo 32.º do Cód. de Processo Civil.

III – Ao ser dado como indiciado que o Condomínio Clube Praia da Rocha – Bloco 1, NIPC 902006142, e Condomínio Clube Praia da Rocha – Bloco 2, NIPC 901972363, são dois condomínios distintos, com órgãos próprios diferentes, com assembleias e administrações próprias; que o Condomínio Clube Praia da Rocha – Boco 1 é constituído por 310 frações autónomas e tem uma assembleia e administração próprias; que o Condomínio Clube Praia da Rocha – Bloco 2 é constituído por 317 frações autónomas e tem uma assembleia de administração próprias; que a apresentação do Relatório e Contas é feita em dois relatórios e em duas Assembleias, não serve como fundamento para justificar a coligação uma mera ligação entre os prédios, mas essa conexão deve estender-se às matérias que estão em discussão (contabilidade dos condomínios), o que não é caso relativamente às matérias ou assuntos que acima enunciados como sendo autónomas e distintas relativamente a cada condomínio.

IV – Ao admitir-se que essa ligação fosse suficiente significaria então autorizar que os condóminos de um condomínio possam consultar a contabilidade de um outro condomínio distinto (do qual não são comproprietários das áreas comuns), sem que exista qualquer direito ou interesse legitimo que o justifique.

V - O facto de uma sociedade desempenhar simultaneamente as funções de administradora de dois condomínios não se pode confundir que se trate de uma mesma administração. Cada um dos condóminos tem a sua própria administração que,por acaso, pode e é exercida pela mesma sociedade. A referida ligação entre os prédios contíguos, no que diz respeito às matérias que se tratam nos presentes autos, não têm qualquer implicação no sentido de permitir a coligação, com violação do artigo 36.º do Cód. de Processo Civil, pois estas matérias são completamente autónomas e distintas para cada um dos condomínios, e por essa razão não se pode tentar misturar os assuntos que dizem respeito a um dos condomínios com os assuntos de outro.

VI – Apesar de previamente notificados para exercer o contraditório sobre as exceções deduzidas na oposição ao procedimento cautelar os requerentes não se pronunciam atempadamente, nem o fazem espontaneamente no início da audiência, tem o efeito comunitário de se verificarem as exceções de ilegitimidade e em consequência ser o requerido absolvido da instância.

VII - A providência cautelar não se traduz num meio de prova em si mesma e não se destina a tentar alcançar provas, que podem nem sequer existir, para os factos alegados na ação principal. Para esses fins estão previstos na legislação processual os instrumentos e meios adequados. A finalidade de uma providência cautelar é apenas e tão só a tutela provisória em quaisquer situações de “periculum in mora” relativas ao direito controvertido. Visa acautelar o direito tutelado pelalei substantiva, deforma a esconjurar o perigo decorrente da insatisfação, em tempo útil, de tal direito ou interesse, mas desde que o requerente alegue e demonstre o receio fundado e concreto de lesão grave e dificilmente reparável do seu direito.

VIII - Analisada a matéria de facto dada como indiciada pelo tribunal “a quo” (cf. os pontos 8, 9, 10 e 21 a 24) da sua fundamentação não se alcança sobre o perigo na demora na ação principal, ou seja, qual o direito que os requerentes pretendes ver salvaguardado com a providência cautelar no específico aspeto que o tribunal “a quo” admitiu o pedido dos requerentes. Inclusive resulta que não há qualquer facto que justifique que seja decretada qualquer pedido dos requerentes.

IX- Não se vislumbra em que medida a disponibilização da contabilidade de ambos o condomínio permite aos requerentes salvaguardar um direito que não possa ser acautelado em tempo útil na ação principal. Resulta até dos factos indiciados que os requerentes inclusivamente já pagaram o condomínio. Ao decretar a providência de disponibilizar a contabilidade do condomínio sem se verificar o pressuposto do periculum in mora mostra-se violado o disposto no artigo 362.º do Cód. de Processo Civil.

X - Não se pode confundir o direito de informação com o direito de prestação de contas. Disponibilizar a contabilidade do condomínio consiste essencialmente numa prestação de contas.

XI – Ma é na assembleia de condóminos, enquanto órgão donde emana a vontade do condomínio, que devem ser prestadas contas da administração das partes comuns, cabendo ao administrador aí prestar informação completa, pormenorizada e exaustiva bem como apresentar toda a documentação pertinente.

XII - A lei é clara na afirmação de que a prestação de contas é anual e realizada perante a assembleia de condóminos, pelo que desde logo está afastada a possibilidade de apresentação de contas (ademais parcelares) a um condómino em exclusivo. Se, porventura com a pretensão de apresentação de contas parcelares se está a pensar em termos de contabilidade organizada e balancetes, haverá de ter em consideração que os condomínios não estão sujeitos a contabilidade organizada.

XIII - A análise em termos de contabilidade analítica da imputação individualizada das despesas do condomínio às diversas fracções, porque tal imputação, mais do que um juízo factual, é matéria do domínio do poder deliberativo da assembleia de condóminos, no momento da fixação da medida da contribuição de cada fracção para acudir aos encargos de conservação e fruição das partes comuns.

XIV - Prestar informação aos condóminos é, entre outros, um dever geral do administrador, em cujo âmbito se inscreve o dever, especificamente enunciado na alínea j) do art. 1436º do Código Civil, de prestar contas à assembleia. Esta obrigação do administrador, no que à prestação de contas respeita, tem como beneficiário, não cada um dos condóminos individualmente considerados, mas o corpo colectivo por todos eles formado, reunido em assembleia, cabendo à assembleia de condóminos, e não a cada um deles, a titularidade do correspondente direito.

XVI - Dos elementos constantes nos autos são reveladores de...

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