Acórdão nº 1787/19.2YLPRT.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 09 de Setembro de 2021

Magistrado ResponsávelMARIA JOÃO SOUSA E FARO
Data da Resolução09 de Setembro de 2021
EmissorTribunal da Relação de Évora

I- RELATÓRIO 1.

A...

apresentou, junto do Balcão Nacional de Arrendamento, procedimento especial de despejo contra B... E MARIA DE LURDES SÁ DE JESUS SOUSA peticionando a desocupação do imóvel sito na Urbanização Quinta da Bela Vista, A2, 8200-230 Albufeira, com fundamento em resolução do contrato de arrendamento por mora superior a oito dias, no pagamento da renda, por mais de quatro vezes, seguidas ou interpoladas, num período de 12 meses. Juntou contrato de arrendamento, comunicação de resolução extrajudicial do contrato de arrendamento e comprovativo de pagamento do imposto de selo.

Não tendo sido recusado o requerimento inicial apresentado pelo Requerente, foram os Requeridos notificados, nos termos e para os efeitos do artigo 15.º-D do Novo Regime do Arrendamento Urbano, aprovado pela Lei n.º 6/2006, de 27.02, na sua redação atual.

Deduziram os Requeridos oposição à pretensão de despejo do Requerente, motivo pelo qual os autos foram distribuídos ao Juízo Local Cível da Albufeira, nos termos e para os efeitos dos artigos 15.º-F e 15.º-H do NRAU.

Em síntese, defenderam-se os Requeridos invocando: i) a exceção dilatória de erro na forma do processo; ii) a caducidade do direito do Requerente à resolução do contrato de arrendamento; iii) a nulidade da resolução operada pelo Requerente, por contrária à legislação em vigor; iv) a intenção, por parte dos Requeridos, em exercer a opção de compra estipulada no âmbito do contrato celebrado entre as partes, à qual se opôs o Requerente, e por conseguinte, o abuso de direito na conduta relativa a resolução do contrato, por parte do Requerente, pugnando, assim, a final pela sua absolvição.

Após ter sido notificado para o efeito, veio o Requerente exercer o seu direito ao contraditório, nos termos do disposto no artigo 15.º-H, n.º 2 do NRAU.

Depois, vieram os Requeridos responder ao requerimento apresentado pelo Requerente, pugnando, a final, nos mesmos moldes do requerido em sede de oposição.

Foi designada data para realização da audiência final e nela foi proferida sentença na qual julgou o procedimento especial despejo, intentado pelo Requerente A... contra aos Requeridos B... E MARIA DE LURDES SÁ DE JESUS SOUSA procedente, por provado, e, em consequência declarou resolvido o contrato de arrendamento, relativo ao imóvel sito na Urbanização Quinta da Bela Vista, A2, 8200-230 Albufeira, nos termos e para efeitos do disposto no artigo 1083.º, n.º 4, do CC, determinando que os Requeridos procedam à sua desocupação e entrega, livre de pessoas e bens, ao Requerente.

  1. É desta sentença e do despacho que a precedeu que recorrem os requeridos formulando, na sua apelação, as seguintes conclusões: “1) Vem o presente recurso interposto da sentença proferida pela Instância Local de Albufeira do Tribunal Judicial da Comarca de Faro, no processo supra referido, de acordo com a qual foi julgado resolvido o contrato de arrendamento, relativo ao imóvel sito na Urbanização Quinta da Bela Vista, A2, 8200-230 Albufeira, nos termos e para efeitos do disposto no artigo 1083.º, n.º 4, do CC e em consequência, determinado que os Requeridos procedam à sua desocupação e entrega, livre de pessoas e bens, ao Requerente. “a) Julgo resolvido o contrato de arrendamento, relativo ao imóvel sito na Urbanização Quinta da Bela Vista, A2, 8200-230 Albufeira, nos termos e para efeitos do disposto no artigo 1083.º, n.º 4, do CC; b) E em consequência, determino que os Requeridos procedam à sua desocupação e entrega, livre de pessoas e bens, ao Requerente.” – (Cfr. com sentença recorrida).

    2) A convicção do Tribunal assentou na prova oral produzida perante o Tribunal, incluindo a prova testemunhal e por depoimento de parte. O Tribunal desconsiderou em absoluto a prova documental junta aos autos e não impugnada, note-se! Foram julgados como provados factos que, salvo melhor opinião, deveriam antes dar-se como não provados, não se tendo atendido da melhor forma a elementos constantes dos autos com relevância para a decisão da causa os quais, a ter sido ponderados, conduziriam a decisão diversa da que veio a ser proferida e de que ora se recorre.

    3) Assim, não pode, todavia, e salvo o devido respeito, a apelante conformar-se com a decisão do tribunal a quo, insurgindo-se contra os seguintes pontos: a) Matéria de facto dada como provada; b) Apreciação e interpretação da matéria de facto dada como provada; c) Aplicação do direito à matéria de facto dada como provada.

    4) Na verdade, atenta toda a prova produzida, quer documental, quer testemunhal em sede de audiência de julgamento, de forma incompreensível e até contraditória com a própria fundamentação da motivação, foram dados como provados factos que, salvo o devido respeito por melhor opinião, deveriam ter merecido resposta negativa, e outros, ao invés, que foram julgados não provados quando deveriam ter sido julgado provados, e que a sê-lo, teriam levado certamente a uma decisão diversa. Tendo a prova sido devidamente gravada, o presente recurso pode ser, e é, de facto e de direito.

    5) Salvo o devido e merecido respeito que é muito, a justiça não se deve compadecer ou aceitar leituras leves ou na diagonal em prole de celeridade, isto porque, os tribunais devem primar em primeira linha pela administração da justiça e defesa do cidadão comum.

    6) O juiz tem, no modelo processual vigente, a possibilidade de investigar, mesmo oficiosamente, e de considerar na decisão, os factos instrumentais que resultem da instrução e discussão da causa. Factos instrumentais são os que interessam indirectamente à solução do pleito, por servirem para demonstrar a verdade ou falsidade dos factos pertinentes; não pertencem à norma fundamentadora do direito e são-lhe, em si, indiferentes, servindo apenas para, da sua existência, se concluir pela existência dos próprios factos fundamentadores do direito ou da excepção.

    7) Da audiência de discussão e julgamento realizada deveriam ter resultado como provados factos instrumentais, que a serem considerados o ponto dado como provado em 1. “A..., é proprietário do prédio urbano sito na Urbanização Quinta da Bela Vista, A2, 8200-230 Albufeira, descrito na Conservatória do Registo Predial de Albufeira, sob o artigo n.º 1798, e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo n.º 9642.”, teria que ser respondido como não provado. Note-se que o quesito vertido em 1 nem tão pouco é um facto mas sim uma conclusão de direito.

    8) Da discussão da causa resultou, como infra se demonstrará que Requerente e Requerido efectivamente assinaram e subscreveram um documento intitulado de “Contrato de Arrendamento para Habitação com Prazo Certo e com Opção de Compra”, nos termos do qual B..., tomou de arrendamento, a fração autónoma designada pela letra “D”, sito na Urbanização Quinta da Bela Vista, Correira, A2, Albufeira, descrito na Conservatória do Registo Predial de Albufeira sob o n.º 9642 e inscrito na matriz urbana sob o artigo 1998. No entanto, esse documento, não corresponde à vontade real das partes, pois que, como resultou da instrução da causa, aquilo que os Requeridos contrataram com o Requerente, foi um mútuo de 10 000, 00 €, tendo entregue o imóvel supra identificado ao primeiro como garantia de bom pagamento do empréstimo.

    9) Esses factos, apenas foram conhecidos em sede de discussão e julgamento, porque o Requerido marido, envergonhado naturalmente, apenas quando o Requerente recusou o exercício do direito de opção de compra (em Agosto de 2020) se conscientizou do logro que havia sido vítima.

    10) Naturalmente, e após o devido enquadramento jurídico dos factos foi apresentada a respectiva queixa crime junta aos autos a fls … (requerimento com a referência 38345133 de 22 de Março de 2021) e a respectiva acção de anulação tanto do contrato de compra e venda em que assenta a alegada propriedade do Requerente, como do alegado contrato de arrendamento, causa de pedir da presente acção junta a fls … (requerimento com a referencia 38614854 datado de 21 de Abril de 2021).

    11) E, foi requerida a suspensão da instância nos termos e para efeitos do disposto no artigo 272º, n.º 1 do CPC que mereceu a seguinte resposta do Tribunal: “não só se entende que a referida ação, entrada esta semana em juízo foi intentada unicamente para obter a suspensão dos presentes autos – podendo a questão alegamente ali invocada haver sido chamada à colação nos presentes e, ainda que, não o tendo sido, tal sendo revelado pelos sucessivos requerimentos juntos aos autos para o efeito, no momento exato em que as partes se preparavam para findar o processo, o que poderia sempre ser evitado. Por outro lado, e ainda que assim não seja, a verdade é que a presente ação encontra-se no seu final, sendo, abaixo, proferida sentença e, não se compadecendo a mesma com a espera que uma ação de processo comum iniciada neste momento desencadeará, pelo que nada mais se pode considerar que os prejuízos da suspensão superam as vantagens da mesma.” – (Cfr. com despacho recorrido negrito e sublinhado nosso).

    12) Efectivamente, refere a sentença à mingua de defesa que: “Em momento algum, em sede de articulados – aqui se contabilizando quer a oposição quer a resposta à resposta oferecida pelo Requerente à matéria de oposição, juntas aos autos pelos Requeridos – se faz referência ao referido negócio, tendo o tribunal apenas tido conhecimento do mesmo em sede de inquirição de testemunhas.

    De facto, não só não são alegados quaisquer factos constitutivos do referido negócio, como não são aventados factos relativos à vontade das partes na sua concretização e menos ainda tendo sido juntos documentos – como o sejam a escritura pública de compra e venda – que comprovassem a sua veracidade.” 13) Os factos que precederam a assinatura do documento intitulado de contrato de arrendamento com opção de compra só foram conhecidos pelo Tribunal e pelos advogados em sede de instrução. (Saliente-se que o cidadão comum/ o homem médio que não anda envolvido em negociatas, nem anda pelos Tribunais não...

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