Acórdão nº 1056/11.6TTSTB.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 13 de Julho de 2017

Magistrado ResponsávelMÁRIO COELHO
Data da Resolução13 de Julho de 2017
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam os Juízes da Secção Social do Tribunal da Relação de Évora: No Tribunal do Trabalho de Setúbal, BB demandou CC, Lda, pedindo: a) a declaração de nulidade do acordo remuneratório celebrado com a Ré; b) o reconhecimento da sua categoria profissional como motorista de transporte internacional rodoviário de mercadorias; c) o pagamento de € 1.314,24 a título de diferenças remuneratórias no subsídio de férias; d) o pagamento de € 7.679,36 pelo trabalho prestado aos sábados, domingos e feriados em serviço no estrangeiro; e) o pagamento de € 4.615,00 pelo trabalho prestado aos sábados, domingos e feriados em serviço nacional; f) o pagamento, a liquidar em execução de sentença, das quantias devidas pelo trabalho prestado aos sábados, domingos e feriados para além do horário normal de trabalho; g) o pagamento de € 10.259,48 pelos dias de descanso não gozados; h) o pagamento de € 15.210,00 a título de compensação por despesas com refeições ao serviço da Ré; i) o pagamento de todas as quantias que sejam devidas a título de subsídio de férias, refeições, por trabalho prestado aos sábados, domingos e feriados, bem como a eventual compensação pelo não gozo dos dias de descanso, que se vencerem na pendência da acção e a liquidar em execução de sentença; j) a condenação da Ré no cumprimento integral do CCTV e, em consequência, atribuir ao A. o direito aos descansos e remunerações nele previstas; k) caso não se julgue nulo o acordo remuneratório celebrado pelas partes, e em alternativa ao peticionado em d), e), f), g) e h), a condenação da Ré no pagamento da quantia de € 10,00 por cada dia útil de trabalho prestado entre Abril e Dezembro de 2011, bem como as quantias que se vencerem na pendência da acção e até efectivo e integral pagamento; l) a condenação no cumprimento do acordo remuneratório celebrado com o A.; e, m) a condenação nos juros vincendos sobre as quantias peticionadas.

Após contestação, realizou-se julgamento e foi proferida sentença, condenando a Ré a reconhecer ao A. a categoria profissional de motorista de transportes internacionais rodoviários de mercadorias desde a data da sua admissão, e ainda a pagar-lhe a quantia de € 1.314,24 a título de diferenças remuneratórias referentes aos subsídios de férias de 2009, 2010 e 2011, acrescida de juros de mora.

No mais, a causa foi julgada improcedente.

Interpõe o A. recurso desta sentença e conclui: I. Vem o presente recurso interposto da douta sentença que absolveu a apelada do pedido de condenação no pagamento de trabalho prestado pelo apelante em dias de descanso complementar, obrigatório e feriados, trabalho suplementar, descansos compensatórios não gozados e reembolso de despesas com alimentação.

  1. Mais se recorre da decisão do tribunal a quo de absolver a apelada do pedido subsidiário formulado pelo apelante.

  2. A decisão de absolvição da apelada tem na sua génese uma errada apreciação da prova produzida nos autos, quer testemunhal quer documental que determinou uma resposta à matéria de facto contraditória com essa mesma prova.

  3. Por outro lado, também, na decisão da matéria de facto, o tribunal a quo fez incorrecta aplicação e interpretação das normas jurídicas atinentes à inversão do ónus da prova.

  4. Na resposta à matéria de facto, o douto tribunal a quo deu como não provados os factos alegados pelo apelante nos artigos 36.º, 37.º, 39.º, 40.º, 42.º, 43.º, 45.º, 46.º, 47º, 51, 52º e 92º da petição inicial.

  5. Fundamentando a decisão sobre a matéria de facto na circunstância de o ónus da prova dos factos alegados naqueles artigos caber ao apelante, que não logrou fazer prova dos mesmos, e de não se verificarem os pressupostos da alegada e requerida inversão do ónus da prova, por falta de junção de documentos aos autos pela apelada, em violação do dever de colaboração com o tribunal e a descoberta da verdade.

  6. Os factos alegados nos artigos 36.º, 37.º, 39.º, 40.º, 42.º, 43.º, 45.º, 46.º, 47º, 51, 52º respeitam à prestação de trabalho pelo apelante à apelada em dias de descanso semanal complementar, obrigatório, feriados, trabalho suplementar, horas de início e termo da prestação de trabalho ao fim-de-semana e incumprimento de períodos de descanso obrigatório.

  7. Tais factos alegados pelo apelante reportam-se ao período compreendido entre 29 de Setembro de 2008 e 31 de Dezembro de 2011.

  8. Estando em causa mais de 156 Sábados e 156 Domingos e mais de três anos de duração da relação laboral no que concerne à prestação de trabalho suplementar e incumprimento de tempos de descanso entre duas semanas de trabalho.

  9. O apelante, para prova dos factos alegados nos artigos 36.º, 37.º, 39.º, 40.º, 42.º, 43.º, 45.º, 46.º, 47º, 51 e 52º da petição inicial requereu, logo nessa peça processual e ao abrigo do disposto no artigo 528.º do antigo CPC, que a apelada juntasse aos autos, entre outros, os registos do tacógrafo digital ou os discos do tacógrafo analógico dos camiões conduzidos pelo apelante ao serviço da apelada - indicando logo a matrícula dos mesmos - bem como os registos do cartão de condutor do apelante.

  10. Os tacógrafos digitais ou analógicos bem como o cartão de condutor do motorista de veículo pesado de mercadorias registam todos os tempos de trabalho e descanso do motorista; registo esse que é feito com tal precisão que é possível saber se o motorista, em determinado momento, se encontrava a conduzir, a proceder a operações de carga ou descarga, a executar outras tarefas ou a descansar; também permite saber o número de quilómetros percorridos bem como a velocidade a que o veículo conduzido circula.

  11. A apelada, notificada para juntar os aludidos documentos, veio juntar aos autos 276 documentos denominados "folhas de serviço", elaborados pelo apelante enquanto se encontrava ao seu serviço.

  12. Porém, os 276 documentos estão dispersos pelo tempo e correspondem apenas a metade do período compreendido entre 29 de Setembro de 2008 e 31 de Dezembro de 2011.

  13. Em resposta ao requerimento da apelada e à junção destes documentos, o apelante pronunciou-se sobre os mesmos, invocando que deveriam ser livremente apreciados pelo tribunal para efeitos probatórios, sem prejuízo da inversão do ónus da prova atenta a falta de junção dos documentos atempadamente requeridos pelo apelante.

  14. A apelada nada disse nem sequer justificou a não apresentação dos documentos a que vimos aludindo.

  15. O DL 109/2009 de 31 de Julho obriga as empresas proprietárias ou locatárias de veículos equipados com tacógrafo digital a descarregarem os dados do aparelho tacógrafo bem como os dados do cartão do condutor, aqueles com uma periodicidade de três meses, estes com uma periodicidade de 28 dias. O mesmo sucede relativamente à obrigação de conservar os discos de tacógrafo analógico.

  16. Ao não juntar, injustificadamente, os documentos requeridos pelo apelante e que estava obrigada a possuir a apelada violou de forma culposa e grosseira o dever de colaboração com o tribunal; conduta essa sancionável com a inversão do ónus da prova, conforme resulta da interpretação conjugada dos artigos 429.º (ex artigo 528.º), 430.º (ex artigo 529.º), 431.º, n.º 2 (ex artigo 530.º, n.º 2) e 417.º, n.º 2 (ex artigo 519.º), todos do CPC bem como o disposto no artigo 344.º, n.º 2 do Código Civil.

  17. Esta é, também, a doutrina vertida no Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa proferido no processo 1575/03.3TVLSB.Ll-2: U({( .. .) sendo seguro que os documentos em causa era idóneos a esclarecer os factos articulados, que a ré não podia deixar de os possuir, e que a sua junção aos autos foi logo requerida na petição inicial e não representava sacrifício para a parte, julgasse que nem haveria que discutir se havia meios alternativos de prova desses factos. Que passariam sempre pela obtenção de documentos de documentos que suprissem a falta dos que a ré não juntou. Parece claro que a demonstração da prestação de um tão elevado número de serviços, ao longo de um ano e meio, não se consegue fazer através de prova testemunhal. A prova pericial também só teria viabilidade se fosse fundada nos documentos de suporte da actividade da ré, supostamente os documentos em falta. ( .. .), não sendo questionável, por essa via, a inversão do ónus da prova." [itálico nosso].

  18. Pelo exposto, a decisão do tribunal a quo quanto à matéria de facto alegada pelo apelante deve ser revogada, julgando-se procedente a alegada inversão do ónus da prova e provados os factos alegados pelo apelante nos artigos XX. Verificando-se, assim preenchidos os pressupostos da inversão do ónus da prova, nos termos do disposto nos artigos 36.º, 37.º, 39.º, 40.º, 42.º, 43.º, 45.º, 46.º, 47º, 51, 52º da petição inicial.

  19. Ainda que assim não se entenda os aludidos factos impunham decisão diversa atenta a prova testemunhal e documental produzida nos autos.

  20. No artigo 47º da petição inicial o ora apelante alegou que, em regra, o serviço nacional por si realizado, aos fins - de - semana, terminava pelas 12h de Sábado e reiniciava às 14 h de Domingo.

  21. Sobre esta matéria depuseram as testemunhas (…).

  22. As testemunhas (…) XXV. Aliás, o momento da verdade da testemunha (…) XXVI. Porém, a testemunha (…) XXVII. Pelo exposto, o facto alegado no artigo 47.º da petição inicial, deveria ser considerado "provado" (…) XXVIII. O douto tribunal a quo julgou não provado que o apelante, entre cada semana de trabalho, não gozava mais de 26 horas de descanso (Art. 51.º da petição inicial), impondo-se decisão diversa face à prova testemunhal e documental produzida nos autos.

  23. Das folhas de serviço elaboradas pelo apelante, e juntas aos autos pela apelada, resulta provado que na semana de 23 de Março de 2009 (2.ª feira) a 30 de Março de 2009 (2.ª feira) o A. não gozou mais de 26 horas de descanso pois trabalhou no Sábado, dia 28.03.2009 e no Domingo, dia 29.03.2009; o mesmo sucedeu nas semanas de 17 de Agosto de 2009 a 24 de Agosto de 2009, de 12 de Outubro de 2009 a 19 de Outubro de 2009, devendo atender-se ao facto de aqueles documentos se reportarem a períodos de...

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