Acórdão nº 22/98.0GBVRS.E2 de Tribunal da Relação de Évora, 06 de Junho de 2017

Magistrado ResponsávelJOÃO GOMES DE SOUSA
Data da Resolução06 de Junho de 2017
EmissorTribunal da Relação de Évora

Processo 22/98.0GBVRS.E2 Acordam os Juízes que compõem a Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora: A - Relatório: No Tribunal Judicial de Faro - Tribunal Coletivo do 1º Juízo de Competência Especializada Criminal - o Ministério Público acusou os arguidos BB, filho de …, nascido no dia 8 de novembro de 1972, …residente…em Lisboa; CC, filho de…, nascido no dia 4 de janeiro de 1972, …residente…no Montijo e DD, filho de…, nascido no dia 29 de setembro de 1965, residente …em Faro imputando-lhes a prática de factos susceptíveis de integrarem a prática, em coautoria e sob a forma consumada, de um crime de homicídio qualificado, previsto e punível pelos artigos 26º, 131º e 132º, nº 1 e 2, alíneas. e), h) e j) do Código Penal [previsto e punível, à data dos factos pelos artigos 26º, 131º e 132º, nº 1 e 2, alíneas c), f) e g) do Código Penal (Decreto-Lei n.º 48/95, de 15 de Março)].

*EE foi admitido a intervir nos autos como assistente, deduziu acusação particular, que consta de folhas 3.025, aderindo à acusação pública, alegando mais alguns factos.

O assistente e esposa, FF, deduziram, a fls. 3.026 e seguintes pedido de indemnização civil contra BB, CC e DD, pedindo a sua condenação no pagamento de uma indemnização de 160.477,46 € pelos danos morais que os demandantes sofreram em virtude da morte de seu filho (causada por ato doloso dos demandados), pelos danos próprios da vítima, pelo dano morte e por danos patrimoniais.

Lavrada uma primeira decisão no Círculo Judicial de Faro, sensívelmente com o mesmo conteúdo e idêntica decisão de absolvição, veio este Tribunal da Relação por acórdão de 13-08-2013 a decidir declarar nulo o acórdão lavrado em primeira instância por “falta de fundamentação e exame crítico da prova” e a determinar a prolação de outro acórdão do mesmo tribunal.

*A final, lavrou o tribunal recorrido novo acórdão a 27-01-2014 no qual decidiu de forma idêntica ao anterior acórdão, como segue: - absolver os arguidos BB, CC e DD do crime de homicídio qualificado de que vêm acusados; - absolver os demandados BB, CC e DD do pedido cível contra eles formulado; - condenar o assistente na taxa de justiça, fixada em duas unidades de conta; - condenar os demandantes nas custas atinentes ao pedido de indemnização civil; - o mais legal.

*O processo veio a ser distribuído nesta Relação a 22-05-2014 e redistribuido ao ora relator a 04-05-2017.

Não se conformando com a decisão, interpuseram recurso o Ministério Público e os assistentes formulando as seguintes (transcritas) conclusões: O Digno Procurador da República a) o recurso visa a impugnação da matéria de facto fixada no acórdão e envolve, somente, o arguido BB; b) consideram-se incorrectamente julgados, e impugnam-se, os factos descritos em X a XXIV e XXVI a XXIX - os 3 últimos de forma limitada, só na parte que respeitam ao arguido BB – dos “factos não provados” do acórdão; c) as reconstituições em que os arguidos CC e DD participaram são meios de prova válidos e susceptíveis de valorização para a fixação da matéria de facto – conforme resulta dos arts. 150, 125 e 127 do CPP; d) decidindo em sentido contrário, considerando que tais reconstituições não podiam “ser valoradas como meio de prova”, o acórdão recorrido decidiu erradamente; e) as provas que impõem decisão diversa da recorrida são as referidas reconstituições, o depoimento de GG (nas partes especificadas) e as escutas telefónicas (também nas partes especificadas); f) face á apreciação e conjugação dessas provas, devem considerar-se provados os supra referidos factos impugnados; g) alterada a matéria de facto da forma referida, todos os elementos constitutivos do crime de homicídio qualificado imputado ao arguido BB passam a verificar-se; h) são irrelevantes no recurso, porque prejudicadas, as matérias respeitantes aos arguidos CC e DD, uma vez que está decorrido o prazo de prescrição do procedimento criminal pelo crime de sequestro; i) caso o Tribunal Superior, fixada a matéria de facto e integrada legalmente esta, não remeta o processo á 1ª instância para determinação da pena do arguido BB, o Mº Pº defende - tendo em conta o disposto no art. 71 do CP – que a pena não deverá ser inferior a 20 anos de prisão; j) consequentemente, deverá o acórdão recorrido ser revogado e, alterando-se a matéria de facto nos termos descritos, condenar-se o arguido Carlos Lopa pela prática de um crime de homicídio qualificado p. e p. nos arts. 131 e 132, nº:2, e), h) e j) do CP.

*O assistente EE e FF I. A razão do reenvio do processo para prolação de novo Acórdão foi ter sido doutamente entendido, por este Tribunal da Relação, que o anterior Acórdão de 1ª Instância enfermava de vício de falta de fundamentação e de exame crítico das provas, com a consequente nulidade do mesmo. Todavia, o novo Acórdão ora proferido continua a não efectuar o exame crítico das provas. Assim, o dever de fundamentação da sentença, com a necessária “explicitação do processo de formação da convicção do tribunal” para que se perceba como, na formação da convicção, se seguiu um procedimento lógico e racional, coerente com o sentido determinado pelas regras da experiência, continua a não ser feito II. Nem quanto às declarações das testemunhas GG, HH, II e JJ; nem quanto às sessões de escutas telefónicas e á prova resultante destas, nem quanto às esquivas e confusas declarações de KK, nem quanto à infalível prova pericial.

(…) XXI. Devendo ainda, face a tanto, os arguidos ser condenados como pedido nas acusações publica e particular. Ao assim não ter decidido o Tribunal “a quo” violou os artigos 150.º, 356.º, n.º 7, e 355 e 127 todos do CPP e o artigo 132.º, n.º 1 e 2, al. e) h) e j) do CP. OUTROSSIM XXII. Os Demandantes, face às conclusões anteriores, têm direito a ser ressarcidos pelos arguidos, se estes forem, como devem ser, condenados como autores do crime de homicídio qualificado.

XXIII. Pois que, provados que estão todos os factos do Pedido Cível, deve considerar-se procedente o pedido de indemnização formulado, excluindo-se dele apenas os montantes relativos aos factos não provados de XXXVIII a XL; e condenando-se os arguidos criminalmente, devem eles ser solidariamente condenados pelos danos que causaram com a prática do crime.

XXIV. Danos que são os peticionados no PIC, no montante que ali se peticiona, salvo quanto aos 3 factos não provados atrás referidos.

XXV. Ao não ter condenado os Demandados no PIC, o Tribunal violou os artigos 483.º e seguintes do Código Civil.

XXVI. Termos em que deve este Tribunal da Relação, provendo o Recurso, declarar a nulidade do Acórdão recorrido por falta de exame crítico das provas; e independentemente dessa nulidade, declarar que, face a toda a prova existente e válida, incluindo nela os actos de reconstituição neste processo, devem ser dados por provados os factos ora dados por não provados e referidos supra, com a consequente condenação dos arguidos e demandados, quer do ponto de vista criminal, quer enquanto demandados no PIC formulado; podendo já este Tribunal da Relação, face aos poderes de que dispõe, decidir revogar a decisão recorrida, substituindo-a por outra que declare o que neste recurso se pede, formulando desde logo a nova redacção dos factos provados, baixando o processo apenas para aplicação da medida concreta da pena. *O arguido CC apresentou resposta, concluindo: 1. O recurso interposto pela Recorrente, nada mais faz senão (i) pôr em causa a fundamentação da sentença e valoração feita pelo Tribunal “a quo” da prova produzida em julgamento e (ii) defender que os autos de reconstituição de fls. 1759 e seguintes, e fls. 1777 e seguintes não são verdadeiramente autos de reconstituição, sendo que, materialmente, os mesmos devem ser considerados como declarações dos arguidos.

2. Porém, analisado em concreto o vício de falta de fundamentação que o Recorrente pretende assacar ao Acórdão em crise, parece despropositada a sustentação daquele se atentarmos na circunstância de o Tribunal a quo ter dedicado mais de vinte e cinco páginas na exposição das razões (cfr. fls. 30 a 55) que justificam a consideração dos factos como provados e/ ou não provados.

3. Com efeito, a motivação e “conclusões” extraídas pelo Recorrente, nada mais fazem que pôr em causa a valoração feita pelo Tribunal “a quo” da prova produzida em julgamento.

4. Acontece que, a apreciação da prova pelo Tribunal se encontra sustentada pelo princípio da livre apreciação consagrado no artigo 127.º do CPP, segundo o qual “salvo quando a lei dispuser diferentemente, a prova é apreciada segundo as regras da experiência e a livre convicção da entidade competente”.

5. Analisada a douta Sentença proferida, facilmente se conclui que a convicção do Tribunal a quo se mostra suficientemente objectivada e motivada, sendo capaz de se impor a todos os que dela houverem de tomar conhecimento.

6. Resulta assim evidente, que o recurso apresentado pela Recorrente deve ser julgado manifestamente improcedente nos termos e para os efeitos do art.º 420.º n.º 1 do CPP.

7. Não obstante, o Recorrente considera que os autos de reconstituição de fls. 1759 e seguintes, e fls. 1777 e seguintes não são verdadeiramente autos de reconstituição, sendo que, materialmente, os mesmos devem ser considerados como declarações dos arguidos.

8. A convicção do Tribunal resultou dos depoimentos dos inspectores da Polícia Judiciária, II e JJ, que afirmaram os autos de reconstituição se destinaram e permitiram à polícia obter detalhes probatórios e factos que até então eram absolutamente desconhecidos.

9. Neste sentido, concluiu o Ilustre Tribunal Colectivo que a diligência não serviu para confirmar ou infirmar a possibilidade de qualquer facto ter acontecido, serviu antes para obter prova, prova essa que se traduz em declarações dos arguidos. E, bem assim considerou que os denominados “autos de reconstituição” não podem ser valorados.

10. Contudo, entende o Recorrente que tais autos de reconstituição devem valer autonomamente como meio de obtenção de...

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