Acórdão nº 540/13.1GFLLE.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 07 de Março de 2017

Magistrado ResponsávelGOMES DE SOUSA
Data da Resolução07 de Março de 2017
EmissorTribunal da Relação de Évora

Proc. n.º 540/13.1GFLLE Legislação referida: - Convenção Europeia de Auxílio Judiciário Mútuo em Matéria Penal, de 20 Abril 1959 (CEAJM); - Protocolo adicional à Convenção Europeia de Auxílio Judiciário Mútuo em Matéria Penal, de 17 Março 1978 (aprovado para ratificação pela Resolução da Assembleia da República n.º 49/94, DR I-A, n.º 186, de 12/08/1994); - Segundo Protocolo adicional à Convenção Europeia de Auxílio Judiciário Mútuo em Matéria Penal, de 8 de Novembro 2001 (aprovado para ratificação pela Resolução da Assembleia da República n.º18/2006, DR I-A, n.º 49, de 09/03/2006).

- A CAAS - Convenção de Aplicação do Acordo de Schengen, de 19 de Junho de 1990; - Convenção relativa ao auxílio judiciário mútuo em matéria penal entre os Estados membros da União Europeia, de 29 de Maio de 2000 (C 2000); - Protocolo da Convenção Relativa ao Auxílio Judiciário Mútuo em Matéria Penal entre os Estados Membros da União Europeia, de 16 de Outubro de 2001.

Acordam, em conferência, na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora: A - Relatório Nos autos de inquérito supra numerados que corre termos no Tribunal Judicial da Comarca de Faro - Instância Local de Loulé, Secção criminal, J 2 - e em que é arguido BB pela imputada prática de um crime de ofensas corporais, por despacho do Mº Juiz de 11-03-2014 foi comunicado ao arguido o indeferimento da audição de testemunhas por videoconferência.

A instrução foi requerida em 10-12-2013. Os autos estiveram parados, apesar de prontos para subida, desde 18-05-2015 (fls. 253 deste apenso). Subiram a esta Relação em 11-01-2017.

*Inconformado com o decidido o arguido interpôs recurso do referido despacho, com as seguintes conclusões: 1. O arguido, em sede de requerimento de abertura de instrução, requereu a audição das testemunhas CC e DD por teleconferência, uma vez que residem e estudam na Holanda, tendo tal pedido sido indeferido, pelo Tribunal a quo.

2. Nos termos do disposto nos art. 292º e 340º, nº 3 CPP, sempre que as provas não forem proibidas, ofensivas dos bons costumes, são atendíveis cabendo em juízo a sua discricionariedade de valoração ao caso concreto.

3. Estas testemunhas são essenciais à descoberta da verdade material, e tanto o são que a audição por teleconferência foi requerida aquando do arrolamento das mesmas, nos termos dos art.

os 318º e 111º, ambos do CPP e art. 502º, n.º 4 do CPC.

4. O Tribunal a quo profere um juízo de improbabilidade de lograr a audição das testemunhas CC e DD, por teleconferência, junto das autoridades judiciárias holandesas, sem sequer ter ordenado a diligência e verificar na prática, se a diligência seria atendida por aquelas entidades, ao abrigo da colaboração internacional.

5. O requerimento de audição das referidas testemunhas por teleconferência não é ilegal e/ou ofensivo de normas processuais, ou sequer, manifestamente infundado, impertinente ou dilatório.

6. A deslocação das testemunhas, a Portugal, implica previsíveis transtornos pessoais e monetários a ambas, conforme já foi invocado ao Tribunal a quo, implicando também graves dificuldades e inconvenientes inerentes, tanto a nível pessoal como profissional.

7. A decisão do Tribunal a quo viola os direitos constitucionais penais do arguido, consagrados nos art.

os 13º e 32º da CRP, sem qualquer fundamentação louvável e compreensível do ponto de vista processual, quanto à legalidade/oportunidade da diligência requerida e em consequência, compromete a sua defesa.

8. Ainda no que concerne aos artigos 13° e 32º da CRP, é inquestionável que todos os cidadãos têm a mesma dignidade social e são iguais perante a lei, pelo que, o arguido tem o direito fundamental de apresentar a sua defesa, oferecendo os meios de prova, que considere mais adequados, dentro dos limites que, in casu, é a própria lei processual penal que prevê.

9. A teleconferência foi introduzida em Portugal consignando que “em virtude da introdução de aparelhos de teleconferência nos tribunais …as testemunhas e as partes residentes fora do círculo judicial ou da ilha são ouvidas na própria audiência através de teleconferência, salvo se a parte se dispuser a apresentá-las em tribunal … reforçando-se o princípio da oralidade.” (cfr. preâmbulo do 183/2000, de 10 de Agosto).

10. A inquirição das testemunhas por videoconferência, tendo por base a legislação internacional, transposta para a legislação nacional, nomeadamente na CEAJM, Convenção de Viena, Convenção de Palermo e Convenção de Mérida dão plena importância ao uso das tecnologias para contribuir para a administração da justiça de forma mais célere, eficiente e eficaz, pelo que a sua não utilização, em virtude de juízos de probabilidade, dotada de inércia processual, violam normas de direito internacional, especialmente regulados para o efeito.

11. A decisão do tribunal a quo menospreza todos os direitos constitucionais, bem como directrizes de direito internacional, em virtude de deduções e juízos de valor, sem os confirmar, na realidade, ao considerar que, em virtude de as testemunhas referidas viverem na Holanda que é “dotada de um leque de operadoras aéreas de baixo custo”, “conjugado” com o facto de se lograr como improvável “o recurso à audição por teleconferência junto das autoridades judiciárias holandesas”.

12. Pelo exposto, o despacho judicial encontra-se ferido de nulidade processual, nos termos do artigo 122º do Código de Processo Penal., o que determina a invalidade de todos os actos posteriores, bem como invalida o julgamento, pelo que deverá ser revogado.

Nestes temos e nos demais de Direito que, V. Ex.ª doutamente suprirá, requer-se que seja concedido provimento ao presente recurso interlocutório, e em consequência, deverá ser revogado o despacho de indeferimento da inquirição de testemunhas, determinando-se que seja substituída por outra que se ajuíze a inquirição das testemunhas por videoconferência, designando data para a audiência da respectiva inquirição.

*Não admitido o recurso veio a ser deduzida reclamação para o Presidente deste Tribunal da Relação de Évora, reclamação essa que foi declarada procedente, ordenando-se a subida do recurso.

O relator lavrou despacho dando seguimento ao recurso, com o seguinte fundamento: “Foi lavrado despacho em instrução que admitiu implicitamente a inquirição de duas testemunhas. Após reclamação, despacho posterior não admitiu tais depoimentos por rogatória. O arguido interpôs recurso.

Prima facie a situação exposta cairia na previsão do nº 1 do artigo 291º do C.P.P. mas concorda-se com a decisão, no apenso reclamação, do Sr. Desemb. Vice-Presidente desta Relação no sentido de que o despacho lavrado é recorrível.

De facto, a regra geral é a da recorribilidade dos autos o que torna necessariamente restritiva a leitura do artigo 291, n. 1 do código.” *A Digna magistrada do Ministério Público junto do tribunal recorrido respondeu, sem conclusões, entendendo ser de manter o decidido.

Nesta Relação, o Exmº Procurador-Geral Adjunto emitiu douto parecer onde defende a improcedência do recurso.

*****B - Fundamentação: B.1 - São elementos de facto relevantes os que decorrem do relatório que antecede e o teor do despacho recorrido, com o seguinte teor: «Dê conhecimento da informação que consta a fls. 166 à ilustre mandatária do arguido.

De tal informação resulta, desde logo, a improbabilidade de se lograr o recurso à audição por teleconferência junto das autoridades judiciárias holandesas.

Por outro lado, e ao invés do que parece ser a interpretação da defesa, a suposta essencialidade que invoca (para a descoberta da verdade) é que justifica a audição presencial das testemunhas, à luz do que dispõe a al. b) do n. 1 do art. 318°, do Cód. P. Penal.

Por fim, encontrando-se a Europa Ocidental dotada de um leque de operadoras aéreas de baixo custo, sendo o tempo de deslocação entre a Holanda e Portugal pouco superior àquele que os cidadãos chegam a gastar em deslocações nas grandes áreas metropolitanas, sendo uma das testemunhas filha do próprio arguido e a outra amiga da primeira, não se compreende a dificuldade na presença ao menos da filha do arguido neste Tribunal.

E, para o efeito, notificou-se a ilustre mandatária a fim de informar se assegura a apresentação das testemunhas nesta comarca.

Mais ainda, se o conhecimento adquirido por ambas as testemunhas é semelhante, tudo aponta para a necessidade de se proceder apenas a audição de uma delas.

Com estes fundamentos, indefere-se a requerida audição por teleconferência, e concede-se 10 dias para que a ilustre mandatária dê cabal esclarecimento ao que se determinou aquando do despacho de abertura da instrução.

Notifique.» ****Cumpre apreciar e decidir.

Sendo o objecto do recurso penal delimitado pelas conclusões da respectiva motivação, a questão ali abordada pelo arguido reconduz-se a apurar se deve ser ordenada a inquirição por videoconferência das testemunhas arroladas no seu requerimento de abertura de instrução.

***B.2 – No primeiro ponto lógico de inconformidade o recorrente suscita a questão da nulidade da decisão judicial por ter negado a inquirição das testemunhas por si arroladas quando é certo, argumenta, que tal inquirição é permitida pelo ordenamento jurídico processual penal português.

Nas suas conclusões 1, 2, 9 e 10 (numeradas pelo recorrente como 29, 30, 37 e 38) invoca o recorrente essa nulidade nos seguintes termos: 1 - O arguido, em sede de requerimento de abertura de instrução, requereu a audição das testemunhas CC e DD por teleconferência, uma vez que residem e estudam na Holanda, tendo tal pedido sido indeferido, pelo Tribunal a quo.

2 - Nos termos do disposto nos art. 292º e 340º, nº 3 CPP, sempre que as provas não forem proibidas, ofensivas dos bons costumes, são atendíveis cabendo em juízo a sua discricionariedade de valoração ao caso concreto.

9 - A teleconferência foi introduzida em Portugal consignando que “em virtude da introdução de aparelhos de teleconferência nos tribunais …as testemunhas e as partes residentes fora do círculo...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT