Acórdão nº 3088/12.8TBLLE.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 23 de Fevereiro de 2017

Magistrado ResponsávelMARIA JOÃO SOUSA E FARO
Data da Resolução23 de Fevereiro de 2017
EmissorTribunal da Relação de Évora

ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE ÉVORA I- RELATÓRIO RJ intentou em 8.11.2012 acção declarativa de condenação sob a forma de processo ordinário contra … Companhia de Seguros, SA (após integração por fusão da R… Seguros, SA), pedindo que a Ré seja condenada a pagar-lhe a quantia de € 1.079.470,58, a título de danos patrimoniais e morais, acrescida de juros de mora vincendos correspondendo:

a) Dano patrimonial com perda roupa, bicicleta etc.- € 245,00; b) Dano temporário (25-02-09/24-02-11)- € 55.000,00; c) Dano permanente incapacidade profissional absoluta- € 253.946,00; d) Dano permanente contratação terceira pessoa- € 430.279,58; e) Dano permanente necessidades ajudas técnicas. € 55.000,00; f) Dano permanente estético- € 95.000,00; g) Dano permanente actividade sexual - € 10.000,00; h) Dano biológico com sequelas existenciais - € 80.000,00.

Para fundamentar a sua pretensão alegou, em síntese, que foi vítima de um acidente de viação quando conduzia um velocípede na passadeira e foi atropelada por um veículo automóvel cuja responsabilidade havia sido transferida por contrato de seguro para Ré, tendo em decorrência do mesmo sofrido ferimentos graves e ficado com sequelas irreversíveis que lhe provocaram danos patrimoniais e morais.

Referiu igualmente que o condutor do veículo foi, pela prática dos mesmos factos, julgado e condenado, por sentença já transitada, por um crime de ofensas à integridade física grave por negligência.

A Ré deduziu contestação na qual invocou a prescrição do direito à indemnização, entendendo ainda que a responsabilidade na produção do acidente é da Autora, na medida em que não cumpria o estatuído na Código da Estrada relativamente à circulação de velocípedes, não tendo iluminação no mesmo nem usando capacete, para além de circular a pedalar na passadeira, não seguindo atenta ao trânsito, podendo e devendo ter-se apercebido da aproximação do veículo automóvel se tal não sucedesse, impugnando ainda os danos invocados e o montante do pedido, por excessivo.

Na réplica, a Autora pugnou pela improcedência da excepção peremptória de prescrição, vindo a ser proferido despacho saneador que a decidiu no sentido da sua improcedência. Procedeu-se à condensação, fixando-se a matéria de facto assente e a base instrutória.

Realizada audiência final, foi proferida sentença que julgou parcialmente procedente, por provada, a presente acção e, em consequência, condenou a Ré ... Companhia de Seguros, SA a pagar à Autora RJ a quantia de total de € 258.030,00, sendo € 90.030,00 a título de danos patrimoniais e € 168.000,00 a título de danos não patrimoniais (incluindo o dano biológico), acrescida de juros de mora desde o dia seguinte à data da prolação da sentença até integral pagamento, às taxas sucessivamente em vigor para os juros civis, com excepção do custo do velocípede no valor de € 30,00, cujos juros de mora são devidos desde a citação, absolvendo-a do demais peticionado.

  1. Desta sentença apelaram ambas as partes.

  2. A Autora formulou as seguintes conclusões: 1. Vem o presente recurso interposto da sentença proferida pela Mma. Juiz a quo, em 02.06.2016 que condenou a Ré ... COMPANHIA DE SEGUROS SA, a pagar à Autora RJ a quantia de € 258.030,00, sendo tal quantia correspondente a 60% do valor indemnizatório apurado em virtude de se ter considerado pela concorrência de culpa do lesado e do lesante na percentagem de 40% e 60% respectivamente.

  3. Na presente acção, a Autora (ora Recorrente), intentou acção declarativa de condenação com forma de processo ordinário contra ... Companhia de Seguros, SA (após integração por fusão da R… Seguros, SA), pedindo que a Ré seja condenada a pagar-lhe a quantia de € 1.079.470,58, a título de danos patrimoniais e morais, acrescida do juros de mora vincendos 3. Por sentença proferida em 30 de Maio de 2012, no âmbito do processo comum com tribunal singular n.º 737/09.9 TALLE, e transitada em julgado em 20 de Junho de 2012, foi o ali arguido B… condenado pela prática de um crime de ofensas à integridade física grave por negligência, previsto e punido pelos artigos 13º, 15º, al. a), e 148º, n.º 1 e n.º 3, do Código Penal, na pena de duzentos dias de multa, à razão diária de €6,00, no total de €1.200,00, 4. No dia 26 de Fevereiro de 2009, pelas 00.20 horas, antes do embate, a Autora seguia de bicicleta juntamente com o marido, na mão de trânsito contrária à do veículo de matrícula “OX” que seguia no sentido Vilamoura-Quarteira na Av. Dr. Carlos Mota Pinto, na localidade de Quarteira, que no local configura uma recta com dois sentidos de trânsito, precedida por uma rotunda, divididos por um separador central e tem duas faixas de rodagem para cada um dos sentidos, e, quando se encontrava imediatamente antes da rotunda, pretendeu mudar de direcção e iniciou a travessia da passadeira a pedalar, da direita para a esquerda atento o sentido de marcha Quarteira-Vilamoura, e sem se aperceber que o veículo “OX” circulava antes da rotunda e em sentido contrário que e aproximava com os faróis médios acesos, o qual circulava pelo menos a 60 km/h, cujo condutor, quando se apercebeu do velocípede travou ainda mas embateu no mesmo na hemi-faixa do sentido Vilamoura-Quarteira.

  4. Em consequência do embate, a Autora apresenta: I) Crânio-TCE com quadro de tetraparesia de predomínio esquerdo e distal com afasia parcial; membro inferior direito- cicatriz na coxa direita de 10 cm e 4,5 cm proximal para distal de carácter operatório, cicatrizes múltiplas com carácter operatório na face anterior do terço proximal com 7 cm e outra na região média com 13 cm e área cicatricial com crosta central e facilmente ulcerável na região anterior da perna com 13*5 cm e outra cicatriz distal com 13 cm e deformidade do terço distal da perna e rigidez com equino varo do pé; membro inferior esquerdo- cicatrizes múltiplas com carácter operatório na face anterior do terço proximal com 7 cm e outra na região mediana com 13 cm e área cicatricial com crosta central e facilmente ulcerável na região anterior da perna com 13*5 cm e outra cicatriz distal com 13 cm, para além de rigidez em equino do tornozelo e encurtamento de 2 cm.

    II) Défice Funcional Temporário Total de 323 dias; III) um Quantum Doloris no grau 6/7; IV) um Défice Funcional Permanente de Integridade Físico-Psíquica de 70 pontos em 100; V) Dano Estético Permanente no grau 6/7; VI) Em termos de Repercussão Permanente na Actividade Profissional, as sequelas são impeditivas do exercício da sua actividade profissional habitual, bem como de quaisquer outras dentro da sua área de preparação técnico-profissional; VII) Repercussão Permanente na Actividade Sexual no grau 5/7.

    VIII) Repercussão Permanente nas Actividades Desportivas no grau 5/7; IX) Necessidades, a título permanente, de ajudas medicamentosas, tratamentos regulares, ajudas técnicas, adaptação domicílio e/ou veículo, bem coo de ajuda de terceira pessoa a tempo parcial (artigos 13º, 18º a 21º, 24º e 28º a 36º da Base Instrutória).

  5. A Mma. Juiz a quo analisou os diversos pressupostos da Responsabilidade civil, tendo verificado pela existência dos mesmos, no entanto, quanto aos pressupostos da culpa e do dano, cremos que não esteve bem a Mma. Juiz a quo na valoração feita atribuindo concurso de culpa na percentagem de 60% para o lesante e 40% para a lesada, bem como ao valor indemnizatório fixado tendo-se afastando em larga medida do peticionado.

  6. Nos presentes autos estamos perante uma situação de colisão de veículos, tendo já uma decisão penal condenatória nos termos da qual ficou provada a culpa do lesante e conforme se verifica pela análise dos pontos 5 e 7 dos factos dados como provados o autor da lesão não conseguiu afastar a presunção de culpa que sobre si recaia nos presentes autos, demonstrando-se que actuava em excesso de velocidade e desatento, o que não lhe permitiu evitar a colisão, pois constam da matéria de facto no local do embate havia iluminação pública com visibilidade normal, e o lesante que circulava a uma velocidade de cerca de 60Km/hora e tinha ingerido bebidas alcoólicas, apresentando uma TAS de 0,46 g/lt.

  7. Ao se aperceber de que a vítima atravessava a faixa de trânsito por onde circulava, o condutor ainda accionou os mecanismos de travagem do seu veículo mas, atenta a forma desatenta como conduzia e a velocidade que imprimia ao veículo, só se apercebeu da presença da vítima mesmo à sua frente, já muito próximo desta, não conseguindo imobilizar a sua viatura, sem antes embater naquela, não tendo tido qualquer outra reacção senão travar e guinar o volante para a direita.

  8. Tal era a velocidade a que o autor da lesão circulava que as marcas de travagem do veículo “OX” começaram ainda na rotunda e têm a extensão de 21,40 m para o pneu esquerdo e 13,60 m para o pneu direito e na sequência do embate, o velocípede da Autora foi projectado na outra faixa de rodagem a 28,40 m do local daquela e a Autora foi projectada a 19,40 m do local do mesmo.

  9. Ou seja, se o Condutor, autor da lesão não fosse em excesso de velocidade, conforme se provou, teria tido tempo suficiente para travar ao ver a Autora a atravessar a passadeira. o Autor da lesão, ao conduzir da forma como conduzia dentro de uma localidade e conhecendo o local, conforme se provou que conhecia, sabia que qualquer pessoa poderia atravessar a passadeira e ele não teria tempo de travar, no entanto nada fez para o evitar, não conduzindo com a prudência devida conforme as condições o exigiam, acabando por colidir contra a A., provocando danos, agindo com culpa na modalidade de negligência na forma consciente.

  10. Entendeu a Mma. Juiz a quo aplicar nos presentes autos o disposto no art. 570.º que disciplina as situações em que o lesado contribuiu para a produção ou agravamento dos danos, cabendo, nestas situações, ao tribunal determinar, com base nas consequências que delas resultaram a determinação do valor indemnizatório, no entanto foi dado como provado que o A. conduzia em excesso de velocidade, com uma taxa de...

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