Acórdão nº 1531/14.0TBLLE.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 14 de Setembro de 2017

Magistrado ResponsávelMANUEL BARGADO
Data da Resolução14 de Setembro de 2017
EmissorTribunal da Relação de Évora

Proc. nº 1531/14.0TBLLE.E1 Acordam na 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora I - RELATÓRIO AA instaurou ação declarativa de condenação, sob a forma de processo comum, contra BB e CC, S.A.

, pedindo que estas sejam condenadas a pagar-lhe a quantia de € 29.600,00, acrescida de juros, à taxa legal, desde a citação até integral pagamento.

Alegou, em resumo, que: - Casou com DD a 19/04/2008 no regime da comunhão geral de bens, tendo o casamento sido dissolvido por divórcio a 24/01/2011, não tendo sido feita a partilha dos bens comuns do extinto casal.

- O pai de DD faleceu a 06/02/2004, no estado de casado no regime da comunhão geral, e deixou como únicos e universais herdeiros a esposa e o seu filho DD.

- Da herança do pai do DD fazia parte a fração E do prédio urbano em regime de propriedade horizontal descrito na CRP Loulé sob o nº …, a qual, em 31/07/2012, foi inscrita a favor do dito DD com fundamento na sucessão hereditária, o qual a vendeu, em 27/09/2012, ao EE que por sua vez a registou a seu favor.

- A autora usou e ocupou a dita fração quer durante a constância do casamento quer depois da sua dissolução, nela vivendo.

- Em 26/09/2013 o EE instaurou uma ação contra a autora, pedindo que fosse declarado dono e legítimo proprietário daquela fração autónoma, tendo a mesma sido condenada a abrir mão da mesma e a restituir-lha, bem como a pagar-lhe 450 euros por cada mês em que a mesma a detivesse, a contar do dia 01/06/2013.

- A autora foi citada para contestar a referida ação em 01/10/2013, tendo a mesma requerido apoio judiciário também na modalidade de nomeação de patrono, o qual lhe foi concedido, tendo sido nomeada para a patrocinar a Dr.ª BB, ora ré, do que esta última foi notificada em 05/11/2013.

- O prazo para contestar terminou no dia 05/12/2013, e antes do mesmo expirar a autora falou com a ré e forneceu-lhe os dados necessários para o fazer, tendo a mesma dito que contestaria a referida ação, o que não fez, em consequência do que os factos ali alegados pelo EE foram considerados confessados, e a ora autora foi condenada no respetivo pedido.

- Em execução daquela sentença, a autora foi obrigada a sair da fração no dia 24/06/2014 e teve perdas materiais na ordem dos € 24.600,00 (vinte e quatro mil e seiscentos euros), e sofreu ainda danos morais.

- Caso a ré tivesse contestado a referida ação e alegado que a autora era, em comunhão com o DD, dona de 1/2 da aludida fração, por virtude do casamento deste com a autora e da sucessão do seu pai, teria impedido o êxito daquela ação, pois a venda efetuada pelo DD seria nula.

- A ré CC, SA emitiu uma apólice pela qual assumia a responsabilidade civil por atos praticados no exercício da advocacia por parte da ré, no âmbito de um seguro coletivo de responsabilidade civil contratado com a Ordem dos Advogados, com validade nos anos de 2012 e 2013.

Contestaram ambas as rés.

A ré BB alegou que a autora não lhe prestou a colaboração a que estava obrigada, impedindo a mesma de contestar a ação movida à autora no processo nº 2556/13.9TBLLE, sendo que as notas tiradas pela 1ª ré foram levadas pela autora, deixando aquela sem poder contestar.

A Ré CC, S.A. (doravante ré seguradora) arguiu a sua ilegitimidade passiva, alegando ainda que nos termos da apólice de seguro de responsabilidade civil profissional que celebrou com a Ordem dos Advogados, apenas responde pelas reclamações que sejam apresentadas no período da sua vigência, o que não foi o caso.

Mais alegou que a 1ª ré, apesar de obrigada a fazê-lo por força do contrato de seguro, nunca lhe comunicou os factos eventualmente geradores da sua responsabilidade, pelo que os mesmos se encontram excluídos da cobertura da apólice, sendo que, de todo o modo, de acordo com a apólice, ao montante limite da indemnização sempre deverá ser descontada a franquia geral contratada, no montante de € 5.000,00.

Realizou-se a audiência prévia, tendo sido formulados convites à autora e à 1ª ré no sentido de concretizarem a factualidade por si, respetivamente, alegada, tendo as mesmas aceite tal convite, após o que se seguiu o exercício do contraditório.

A autora respondeu também à matéria de exceção invocada pela ré seguradora, defendendo a sua improcedência, requerendo ainda a intervenção principal provocada de FF, S.A., o que foi indeferido.

Foi proferido despacho saneador que julgou improcedente a exceção dilatória de ilegitimidade da ré seguradora, com subsequente identificação do objeto do litígio e enunciação dos temas da prova, sem reclamação.

Teve lugar a audiência de julgamento, após o que foi proferida sentença que julgou a ação improcedente e absolveu as rés do pedido.

Inconformada, apelou a autora, tendo finalizado a respetiva alegação com as conclusões que a seguir se transcrevem: «I. Ficou provado que do acervo da herança deixada por óbito de GG, falecido em 06-02-2004, fazia parte a fracção autónoma designada pela letra E do prédio urbano sito na freguesia de Quarteira, inscrito na respectiva matriz predial sob o artigo … e descrito na Conservatória do Registo Predial de Loulé sob o número …, daquela freguesia.

  1. A A. foi casada com DD, filho e herdeiro de GG, no regime da comunhão geral de bens, tendo tal casamento sido dissolvido por divórcio em 23-02-2011, sem que tenha havido partilha da fracção autónoma.

  2. Tal fracção autónoma foi vendida pelo seu ex-marido, sem a intervenção da A., a EE e este, por essa fracção autónoma se encontrar a ser ocupada e usada pela A., contra ela intentou a acção nº 2556/13.9TBLLE no qual pedia, além do mais, que fosse declarado dono e legítimo proprietário da dita fracção.

  3. A aludida fracção não poderia ser vendida sem a intervenção da A., o que importa a nulidade da venda, uma vez que esta era também titular do direito à herança de que aquela fracção fazia parte.   V. A alienação deste património causou danos patrimoniais à A, pois que o seu direito à herança (em comunhão com o seu ex-marido) ficou amputado do valor daquela fracção autónoma e dos danos decorrentes da desocupação do imóvel.

  4. A recorrida era advogada nomeada à A. no âmbito do Apoio Judiciário e referiu-lhe, durante o prazo para tal, que apresentaria contestação no processo supra referido intentado por EE, mas não o fez, deixando passar esse prazo, o que levou a que fossem considerados confessados todos os factos articulados pelo seu A. e não tivessem sido alegados quaisquer factos em suporte da posição da R.

  5. Pelo facto de a recorrida não ter contestado a supracitada acção foi a recorrente condenada no respectivo pedido que era o de abrir mão da fracção autónoma em causa, ser condenada a pagar ao ali A. EE 450€ por mês a contar da citação e cancelamento dos registos prediais a favor da recorrente.

  6. Na sequência dessa sentença a recorrente foi obrigada a desocupar a mencionada fracção, o que só aconteceu por falta de contestação, por parte da recorrida, da mencionada acção do A. EE.

  7. Se tivesse havido contestação (e eventual reconvenção) na acção de EE e aí sido articulado que o direito à herança de GG (onde se incluía a fracção) era património comum da recorrente e de DD ela não teria sido procedente e a recorrente não teria sido obrigada a desocupá-la.

  8. A perda da acção mencionada ocasionou à recorrente o prejuízo de ter de desocupar a casa, ter ficado a dever ao EE 450€ mensais enquanto a ocupou e ter ficado com um sentimento de sofrimento, manifestado em inquietude, preocupação tristeza ansiedade e angústia, devendo tudo ser valorado em não menos de 25.000€.

  9. Foi a acção (ou omissão de acção) da recorrida que causou os danos da recorrente, o seu acto foi ilícito, pois lhe competia, segundo as leges artis, contestar a acção, sendo certo que o podia e devia fazer, pois conhecia os efeitos da sua falta e o prazo para a apresentar.

  10. O trânsito em julgado da sentença do processo 2556/13.9TBLLE fizeram caso julgado e a recorrente não pode mais invocar a nulidade do negócio, porquanto a propriedade do prédio foi atribuída agora a EE por sentença.

  11. Os danos não patrimoniais decorrentes da desocupação do imóvel são indemnizáveis e não podem ser invocados noutra forma processual, nomeadamente em processo de inventário.

Termos em que deve o presente recurso ser declarado provido e, em consequência, revogar-se a douta decisão recorrida, que deve ser substituída por outra que, acolhendo as razões da recorrente, condene a recorrida a pagar-lhe a quantia de vinte e cinco mil euros, com o que se fará a vossa boa e costumada Justiça.» Contra-alegou apenas a ré seguradora, defendendo a manutenção do julgado e, prevenindo a hipótese de procedência do recurso, requereu a ampliação do seu objeto, por forma a ser apreciada a questão da falta de participação do sinistro por parte da 2ª ré, o que no seu entender constitui uma causa de exclusão de cobertura prevista nas condições especiais da apólice do contrato de seguro em causa, com a sua consequente absolvição do pedido.

Corridos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.

II – ÂMBITO DO RECURSO Sendo o objeto do recurso delimitado pelas conclusões das alegações, sem prejuízo das questões cujo conhecimento oficioso se imponha (arts. 608º, nº 2, 635º, nº 4 e 639º, nº 1, do CPC), são as seguintes as questões a decidir: No recurso da autora: - se as rés devem ser condenadas a indemnizar a autora pelo facto de a 1ª ré, na qualidade de defensora oficiosa noutra ação em que a autora foi ré, não ter contestado a mesma, o que determinou a sua condenação a restituir a fração autónoma identificada nos autos e a indemnizar o aí autor pela ocupação dessa mesma fração.

Na ampliação do objeto do recurso da ré seguradora: - se ocorre in casu uma causa de exclusão de cobertura expressamente prevista nas condições especiais da apólice do contrato de seguro, por falta de comunicação atempada da 1ª ré dos factos passíveis de lhe serem imputados.

III – FUNDAMENTAÇÃO OS FACTOS Na sentença recorrida foram dados como provados os seguintes factos: 1. A 19.04.2008, a autora...

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